Soberanos de Aço - O Paradigma de Igelivel escrita por Michel Zimmer


Capítulo 2
Old-Time Grudges


Notas iniciais do capítulo

AVISO IMPORTANTE: Os capítulos foram divididos novamente para melhor visualização, mas sem mudanças em seus conteúdos. Portanto, se você já é um leitor antigo, os 5 primeiros capítulos correspondem ao que antes eram prólogo + capítulo 01 e capítulo 02.
Boa leitura! Estou à disposição em caso de eventuais dúvidas!



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IV. Bad Standard

Um lento e familiar tique-taque despertou do sonho o jovem de sono frágil sentado em uma confortável – até demais – poltrona de leitura em seu quarto. O rapaz esfregou os olhos clareando a visão embaçada pelo sono e fechou o livro que repousava aberto sob seu colo, marcando cuidadosamente a última página lida.

À Sombra da Luz, de R. Serafim? – Questionou uma familiar voz feminina tentando acordar de vez o jovem. – Você já leu esse livro umas cem vezes, Elliot.

O jovem se levantou da poltrona devolvendo a obra à imensa estante de livros que decorava o quarto. A esbelta figura dona da voz permanecia de braços cruzados escorada na outra extremidade da estante, os grandes e curiosos olhos heterocromáticos fitavam o andar quase cambaleante de seu mestre.

— Poucas coisas me alegram nessa vida além de um bom livro, Cassandra. Então... – Elliot bocejou ainda cansado – Me deixe em paz.

A jovem Sentinela suspirou e revirou os olhos, lançando um rápido olhar ao relógio de parede situado logo acima da porta do cômodo:

— De qualquer forma é melhor você se recompor, temos hora marcada com Senhorita Sylvie em quinze minutos.

— “Senhorita Sylvie”. – Elliot debochou – É absurdo ter que marcar hora com minha própria mãe, dentro da minha própria casa.

Cassandra apenas balança a cabeça em concordância não havendo muito mais a ser dito a respeito da situação um tanto peculiar. Realmente, o clima da mansão dos Zummarch não era muito amigável já faziam alguns anos devido à tensão crescente entre Sylvie e Elliot – mãe e filho – e suas diferentes visões sobre o futuro de sua decadente família.

Elliot caminhou até sua cômoda, o largo espelho refletia uma feição abatida e as olheiras que insistiam em decorar o rosto do rapaz ainda estavam presentes apesar do longo cochilo daquele fim de tarde.

— Estou uma desgraça. – Reclamou o rapaz observando sua camisa amassada e desabotoada.

Enquanto o jovem nobre voltava sua atenção em abotoar as mangas da camisa, sorrateiramente Cassandra se aproximou pelas costas, repousando as delicadas mãos sobre os ombros de seu mestre:

— Eu sei que você está ansioso, Elliot, mas será mesmo um bom momento para confrontar sua mãe? – Deixando-o levemente desconcertado, as mãos antes nos ombros agora deslizam suavemente pelas costas, ajustando o colete em tecido negro enquanto desciam.

— Cass... – Elliot suspirou ao terminar de ajustar suas vestes – Se eu não a enfrentar agora não sei quando vou ter outra oportunidade ou vou me sentir confiante novamente. Você sabe que ela é uma argumentadora nata.

A jovem de pele alva e cabelos prateados como a luz da lua afastou-se, as pupilas azul e castanho perfuraram cruelmente em um olhar repleto de desaprovação:

— Sou sua Sentinela e não sua conselheira, eu sei. Mas só quero que você lembre que não precisa fazer isso.

— Se você lembra que é apenas minha Sentinela, aja como tal.

Cassandra se afastou novamente, frente a rispidez da resposta de seu mestre.

A jovem sabia que as atribuições de uma Sentinela na maioria esmagadora das vezes não eram algo muito fácil ou agradável e um dos piores males dessa relação profissional era a questão do apego.

Como poderiam duas pessoas – protetor e protegido – conviver por anos, por uma vida inteira talvez, e não se aproximarem?

Os Sentinelas nada mais eram que mercenários pagos que dedicavam suas vidas em prol da segurança de algum nobre ou figura pública importante. Eram espadachins, ex-soldados, alquimistas, assassinos de aluguel, caçadores de cabeças e toda e qualquer outra pessoa desapegada de ter uma vida própria que se sentisse apta a se tornar uma Sentinela.

Era acima de tudo uma função de dedicação e total entrega ao contratante, visto que a morte de um Mestre – termo usado para classificar uma pessoa sob a proteção de uma Sentinela – é a maior das desonras e uma mancha, uma falha que atrapalharia qualquer um a ser contratado novamente.

Quanto menos “manchado”, mais cobiçado eram os serviços de um Sentinela e Cassandra era pura nesse quesito, dedicada desde criança à arte do combate corporal, embora sua aparência delicada denunciasse erroneamente o contrário.    

Repentinas batidas na porta do quarto quebraram o gelo do clima instaurado no cômodo:

— Elliot, trouxe seu remédio. – Disse uma voz abafada do outro lado da porta – Estou entrando.

A porta foi aberta com delicadeza, um mordomo de fraque negro e cabelos grisalhos igualmente impecáveis entrou cuidadosamente com uma bandeja de prata na mão. Sobre a bandeja repousavam um grande copo d'água acompanhado de uma pílula branca.

— Momento perfeito, Rowen! – Exclamou Elliot indo apressadamente em direção ao mordomo. – Estou um pouco ansioso demais.

— Lorde Elliot, acho relevante informar que sua mãe não está nos melhores dias hoje. – Começou o mordomo enquanto observava o jovem beber o copo d’água como se estivera dias vagando no deserto. – Tenha paciência com a Sra. Sylvie.

— Com certeza terei. – Respondeu Elliot seco, depositando o copo vazio sobre a bandeja trêmula de Rowen.

— Ah, e mais uma coisa: - Comentou o mordomo antes que Elliot pudesse deixar o quarto. – Independente do resultado, eu e Cassandra confiamos em você. Certo, Cass?

Apesar de descontente pelo tratamento ríspido de anteriormente, Cass não pôde manter a cara fechada por muito tempo, não em um momento importante para Elliot.

— Totalmente. – Respondeu a garota com um sorriso doce.

Elliot apenas balançou a cabeça negativamente:

— Esse é o problema, vocês esperam muito de mim.

• • •

V. Bitter Reality

Um longo corredor conectava a ala dos quartos, no segundo andar, à uma sacada interna que dava justo de frente à porta principal no andar abaixo. Uma escadaria dupla se estendia em ambos os lados da sacada, levando ao saguão principal no primeiro andar onde toda a mobília da grande sala de estar estava coberta por lençóis brancos. Com a falta de empregados na mansão, Rowen se concentrava em manter apenas os quartos em uso, cozinha e banheiros em dia, não sobrando tempo ou energia para o velho mordomo manter os demais cômodos limpos e organizados.

No segundo andar também ficava o temido território da mãe de Elliot, o escritório e a sala de reuniões de Sylvie Zummarch.

Os dois, em silêncio, permaneceram em pé frente a porta dupla de madeira trabalhada que levava ao escritório de Sylvie, enquanto Elliot se preparava mentalmente uma última vez.

— Pronta quando você estiver. – Comentou Cass calmamente.

— Agora ou nunca.

Após uma breve batida na porta, Cass a abriu com certo esforço, adentrando na sala na frente de seu mestre e se prostrando em uma curta reverência:

— Senhora Sylvie, obrigada por nos receber.

Elliot revira os olhos e entrando logo após fez questão de bater a porta com certa violência causando um grande estrondo. As narinas do jovem arderam levemente frente ao forte odor de tabaco impregnado no ambiente.

— Chega de formalidades, Cass. Ela é apenas minha mãe e não uma nobre ou oficial de alta patente do império.

Uma mesa abarrotada de documentos, livros e outros manuscritos decorava a mesma de aparência envelhecida posicionada bem ao meio daquela sala.

A figura imponente sentada por de trás da mesa tinha uma aura poderosa, era definitivamente uma mulher de fibra e não toleraria desrespeitos em seu “santuário pessoal”. Os longos cabelos castanhos eram levemente ondulados nas pontas e a pele outrora clara, era agora manchada e enrugada já não tendo a vivacidade de anos atrás.

— Se você veio aqui para me afrontar gratuitamente, pode pegar sua cachorrinha, dar meia volta e ir se lamentar de como a vida é injusta. – Sylvie respondeu com força, a voz levemente rouca camuflava o tom ameaçador.

— Isso já faz parte de minha rotina então pensei em algo diferente para hoje. – Respondeu Elliot com um tom forçadamente irônico gerando outro dos famosos olhares de desaprovação de Cass, que após vários anos de convivência, havia se acostumado com as provocações de Sylvie, mas não com os papéis de tolo que Elliot protagoniza.

Um confronto de olhares tomou o lugar de uma possível resposta igualmente intensa vinda de Elliot, que preferiu continuar com uma recíproca mais diligente frente ao humor alterado de sua mãe.

— Não quis parecer rude, mãe. – Continuou ele, tomando assento na poltrona frente a mesa de Sylvie. – Sei que você passou o dia negociando com lordes, barões e outros tipinhos arrogantes e é justo esse o tópico que gostaria de discutir novamente hoje.

Sylvie suspirou como se já soubesse onde o filho estava querendo chegar, e, pressionando a ponta de seu cigarro contra o cinzeiro já transbordante, respondeu de forma clara e dolorosamente direta:

— Eu sei que ando ausente ultimamente, não vem sendo fácil convencer nossos sócios a manterem suas partes no negócio da nossa família, tampouco vem sendo tranquilas as reuniões do conselho da cidade onde além dos Lioncourt, aparentemente agora a maioria das casas nobres deseja nos ver fora da bancada.

Cass dedilhava alguns livros da estante empoeirada do escritório de Sylvie, prestando atenção a cada palavra proferida naquela sala.

— Eu sei que você deve querer ajudar ou no mínimo sente alguma vontade em ser útil, - Continuou Sylvie – Mas não existe absolutamente nada que você possa fazer além de tentar não causar mais preocupações.

Elliot esperava palavras duras, talvez alguma discussão e resistência da parte de sua mãe, mas tais palavras lhe trouxeram o pior dos sentimentos: a rejeição. Um calor tomou conta do peito do jovem, a garganta pareceu fechar em um nó seco e olhos ardiam em um quase lacrimejar repentino.

— Você ainda não me acha capaz de participar nos negócios da família?

— Enquanto não superar seu complexo com aquela garota...

— Alexia. – Interrompeu Elliot corrigindo sua mãe pouco empática.

— Sim, Alexia... – Um semblante triste tomou conta do rosto enrugado de Sylvie - Enquanto você não admitir que essa garota está morta e não há nada que possamos fazer para reverter isso, não posso confiar a você nenhum cargo importante.

— Mas eu estou me medicando como você sugeriu, seguindo as instruções do Dr. Plinio, treinando um pouco de esgrima com Rowen e estudando política, história e até mesmo alquimia nos velhos livros do papai... O que mais devo fazer para lhe agradar? – Esbravejou Elliot se levantando de supetão e batendo o punho fechado sobre a mesa. – Não posso abandonar minha resolução de que Alexia está viva em algum lugar, esperando por mim!

— É exatamente disso que estou falando! – Exclamou Sylvie também exaltada, levantando e se aproximando do rosto do filho – Enquanto você não amadurecer e deixar essas desilusões de lado, nunca poderei confiar em você. Nunca! Já fazem quase quinze anos que Alexia desapareceu, você não percebe que todo esse seu esforço é inútil?

Em choque pelas palavras ásperas de sua mãe, Elliot cambaleou alguns passos para trás, sendo rapidamente acolhido pelos braços de Cass:

— Shhhhhhhhh, vai ficar tudo bem. – Cass abraçou o fragilizado Elliot, acariciando suas madeixas negras.

— Você e Rowen mimam esse garoto demais. Se ele não puder ouvir algumas verdades dolorosas, nunca será um homem de verdade.

Antes de deixar o cômodo, Elliot lançou um último olhar repleto de indignação e tristeza em direção a sua mãe, e, com lágrimas nos olhos, decidiu trazer a ela uma dose de suas próprias verdades dolorosas:

— Espero que você saiba, lembre e nunca esqueça que é a razão pela qual papai nos deixou e a razão pela qual eu deixarei você apodrecer sozinha nessa casa também.

As grandes portas de madeira se fecharam finalmente, deixando Sylvie sozinha com um turbilhão de pensamentos. Trêmula, a mulher solitária abriu a última gaveta de sua escrivaninha de onde tirou um porta-retratos, a foto envelhecida pelo tempo mostra um jovem casal de mãos dadas, um pequeno e sorridente menino agarrado na perna de sua mãe e um segundo homem de aparência jovial com o braço em torno das costas do primeiro, aparentando serem bons amigos.

— Eu realmente sinto muito, Ewan. – Sussurrou Sylvie, deixando algumas lágrimas tímidas brotarem em seus olhos castanhos e caírem sobre a fotografia. – Eu não sei mais como manter essa família. Preciso de você de volta.

• • •

VI. Cold Dark Crimson

Elliot havia saído apressadamente de casa, levando apenas sua velha capa de chuva e nada mais. Cruzou as ruas iluminadas e normalmente cheias de vida noturna do distrito nobre e adentrou no escuro e praticamente vazio distrito industrial. Cassandra o seguiu obviamente.

Uma leve chuva caía serena sobre o embaraço de aço e concreto do distrito industrial de Lowel. O vapor das caldeiras que alimentavam o maquinário - desde a tubulação do correio a vácuo até as forjas e workshops dos mecanicistas e alquimistas - se mesclava ao céu noturno acinzentado, criando um clima mórbido nas ruas mal iluminadas daquela parte pouco privilegiada da cidade. Após o doloroso diálogo com sua mãe, Elliot nunca havia tido tanta certeza que enquanto não provasse ser mais do que um jovem nobre mimado, sua mãe o veria como apenas um empecilho nos negócios da família e ele continuaria se sentindo um peso morto para a sociedade, entre outras afirmações negativas e distorcidas que o jovem fazia  e tinha como verdade absoluta sobre si mesmo.

 — Elliot, não parece ser um bom momento para irmos tão longe. – Comentou Cass protegendo o rosto da chuva enquanto bate o grande portão de ferro que separava os distritos atrás de si.

— Não parece um bom momento para ficar em casa também.

— Eu sei o que deve estar sentindo, mas...

Elliot interrompeu sua Sentinela antes que a mesma pudesse continuar:

— Você sabe? – Questionou o jovem apressando o passo mesmo que sem rumo. – Você não sabe de nada, nem ao menos conheceu Alexia ou entende o que ela significa para mim. Não preciso da sua piedade.

As palavras novamente ríspidas de Elliot fizeram o sangue da jovem ferver, mas ela simplesmente não conseguia odiá-lo ou sequer pensar em abandoná-lo, ela havia se convencido que esse não era o Elliot que ela conheceu ainda criança e jurou lealdade.

— Eu sei que não sou Alexia, nem nunca pretendi ser. – Cassandra se defendeu, tentando não alterar o tom de voz e piorar a situação. – Mas eu estou aqui com você e ela não, essa é a realidade. Assim como seu pai não está mais aqui, mas a Sra. Sylvie está e vem fazendo o possível todos esses anos para evitar a ruína dessa família.

A chuva caía com cada vez mais intensidade e um breve silêncio preenchia a caminhada sem rumo da dupla, apenas o som opaco das gotas se chocando contra as capas de chuva e contra os telhados de zinco quebravam aquele clima infeliz.

Algumas poucas luzes foscas se atreviam a atravessar as janelas das residências e guiar Elliot e Cass através das ruas de pedras irregulares tornadas perigosamente escorregadias devido à chuva.

— Eu fiz papel de idiota hoje de novo, não é? – Questionou subitamente Elliot, em sua caminhada apressada rua abaixo – Mostrei fraqueza em frente minha mãe, destratei você.... Não sei onde estava com a cabeça quando decidi ir conversar com ela sabendo que nada mudaria.

— Não se culpe tanto, ela nem deixou você falar!

— Esse é o problema, Cass, não consigo fazer minha voz ser ouvida.

No momento em que a dupla estava prestes a adentrar o coração do distrito, onde haviam apenas as fábricas e nada mais para ser visto, um forte estrondo vindo da porta de uma das residências chamou a atenção de Elliot e sua Sentinela.

— E-Eu sinto muito! – Gaguejou um homem momentos antes de ser arremessado porta a fora se chocando de costas contra a rua.

Um feixe de luz vindo de dentro da residência iluminava a rua em frente aquela casa, revelando a feição aflita de um velho homem de trajes humildes levantando com certa dificuldade após o ataque sofrido.

— Hey! – Exclamou Cass, fazendo menção em socorrer o velho homem.

— Não. – Elliot à impediu, a segurando firmemente pelo ombro e a puxando com rapidez para o beco em diagonal à casa do velho – Por hora vamos apenas observar, pode ser algo interessante.

— Ou perigoso. – Completou a Sentinela.

Momentos após a dupla se esconder, uma segunda figura pôde ser vista deixando a residência, essa sem ser arremessada. A figura de fato era outro homem, porém de aparência bem mais jovem, pele negra e cabelo curto com alguns dreads surgindo pouco acima da altura da nuca. Elliot nunca havia visto algo daquele estilo, sendo os dreads decorados com algumas penas e pedras em tons prata e ouro envelhecidos. Mas de todos os detalhes percebidos pelo par de olhos curiosos, o mais marcante naquele rapaz era sua capa vermelha escura - visivelmente surrada pelo tempo – que mantinha oculto um de seus braços.

— Você é uma fraude ambulante, uma vergonha para os alquimistas. É uma perca de tempo negociar com você.– O jovem misterioso se aproximou lentamente do velho alquimista.

— Nem todas as fórmulas funcionam! Você deveria saber disso, Soren!

— Você me prometeu, me garantiu algo. – Continuou o rapaz chamado Soren, com um tom de ira crescente em sua voz – E cobrou caro pelo serviço.

O velho agora trêmulo, retirou uma pequena bolsa de tecido recheada de moedas de ouro do bolso de sua veste e a lançou aos pés de seu agressor em uma tentativa final de persuadi-lo:

— Pegue, pode levar! – Exclamou o velho – Tem até mais do que você me pagou aí dentro! Apenas me deixe em paz.

O jovem, em um ataque de fúria, pisou na bolsa de moedas a arrebentando e espalhando o dinheiro por toda a rua, sacando em seguida a adaga presa em sua cintura e à apontando para o alquimista:

— Você pode ficar com esse ouro. Eu ficarei com sua mão direita como pagamento pelo tempo perdido e pela oferta enganosa. Agora, estenda sua mão! – Ordenou Soren.

— N-não! Isso não é justo! – Exclamou o velho aos prantos, porém, estendendo lentamente sua mão direita em direção ao jovem.

— É agora que nós agimos. – Elliot puxou Cass e deixou o beco em direção àquela cena sinistra – Pode ir parando por aí, yoliano.

Ao ouvir tais palavras, Soren voltou imediatamente sua atenção à Elliot o avaliando da cabeça aos pés.

— O que você disse? – Questionou Soren intimidador, girando a adaga com maestria entre os dedos.

— Eu disse para você parar, yoliano. – Repetiu Elliot em um repentino surto de valentia – Não estamos na sua terra natal, nossas leis não incluem mutilação como punição, então eu pensaria duas vezes se fosse você.

— Então você é familiarizado com os costumes de Kul’Yolia? – Questionou Soren com um sorriso sarcástico – Vai dizer também que não somos bem-vindos em Lowel? Ou melhor, - complementou o jovem – não somos bem-vindos em toda a maravilhosa e avançada Igelivel?

— Não coloque palavras em minha boca. – Rebateu Elliot – Vocês são bem-vindos desde que não tentem mutilar alquimistas indefesos na calada da noite.

“Hmmm, então Elliot identificou o yoliano pelo hábito de mutilar as mãos de criminosos, comum em Kul’Yolia? Brilhante! ” – Pensou Cass corando levemente, totalmente alheia a tensão daquele momento.

Inesperadamente e contra as expectativas de Elliot em resolver a situação com uma conversa pacífica, Soren afastou a capa revelando seu braço esquerdo – até então oculto pelo tecido vermelho – e aplicou um ágil e poderoso soco em direção ao rosto de Elliot.

Não havia tempo de resposta ou defesa possíveis para o jovem lorde, o porte físico com força e agilidade superiores de seu agressor lhe davam toda a vantagem, além do fator surpresa.

Bem, teria sido um golpe perfeito se não fosse a intervenção de Cass.

Centímetros antes do golpe conectar com o rosto de Elliot, Cass segurou o punho de Soren sem dificuldade, gerando um forte estrondo de metal se chocando contra algo igualmente sólido.

— Como você... – Questionou Soren incrédulo com a defesa da jovem Sentinela. – Parou um golpe do meu braço de metal?

— Assim!

Com agilidade superior à Soren, Cass soltou o braço direito metálico do rapaz, e, com um golpe rápido desarmou sua mão esquerda o fazendo soltar a adaga, completando com um poderoso chute na altura do estômago o empurrando alguns metros para trás com o impacto.

— Argh! – O yoliano parecia sem fôlego e aparentemente assustado pela força extraordinária de Cassandra, um filete de sangue escorreu no canto de sua boca.

— Então você conseguiu defender o golpe no último segundo usando o braço metálico? – Observou Cass com um sorriso ligeiramente orgulhoso – Bem pensado, caso contrário estaria vomitando seu estômago em pedaços agora.

Elliot não apresentou nenhuma surpresa ou demonstrou qualquer medo, de fato, ele confiava sua vida à Cass, completamente. O jovem lorde percebeu faíscas e leves correntes elétricas pulsando no braço direito de Soren, sinalizando que a força incrível do golpe de sua Sentinela havia danificado o braço mecânico do yoliano.

— Acho que isso resolve as coisas por aqui, não? – Comentou Elliot, observando a chuva que já havia enfraquecido novamente. – Vamos embora, Cass.

— Obrigado! Obrigado! – Exclamou o velho que assistia a tudo abismado com o desenrolar dos acontecimentos, enquanto agarrava a manga da capa de chuva de Elliot, quase o derrubando. – Talvez isso ensine esse fedelho algumas boas maneiras.

— Não fique tão feliz, velhote. – Disse Elliot, afastando o velho – Amanhã cedo irei denunciar sua conduta irregular ao Conselho Alquimista de Lowel e você irá pagar da maneira correta por seja lá o que você tenha feito.

— Mas isso é um absurdo! – Protestou o velho alquimista.

— Se você quiser perder uma mão, o yoliano ainda...

Quando Elliot apontou para o local, o rapaz ferido não estava mais lá.

— Cass? – Questionou Elliot arqueando as sobrancelhas.

— Não vi nada. – Respondeu a Sentinela de prontidão. – Devo ir atrás dele?

— Não é preciso, só espero não topar com esse maluco por aí de novo.

Para o bem ou para o mal, Elliot nem imaginou que aquele encontro predestinado seria apenas o começo de algo muito maior.


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Notas finais do capítulo

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