Maldita foi a hora em que eu aceitei entrar nessa loucura com a desmiolada da Abby. Ao virar o rosto para a direção do ser que havia me chamado, jurei que ela pagaria por todo aquele constrangimento.

Diante de mim, ninguém menos que Kate Foster. Ela sempre foi uma das meninas mais desejadas do colégio, com seus belos cabelos ondulados e olhos verdes, com seu corpo curvilíneo e o jeito doce de ser. Inclusive, Eric chegou a levá-la para algum baile a fim de que ficassem mais próximos e quem sabe se desenrolasse algo entre eles, no entanto, tal foi sua surpresa quando o capitão do time de futebol americano ganhou o título de rei do baile ao lado de Kate como a rainha. Rapidamente Eric se tornou um mero coadjuvante naquela história. E aquilo não o agradou em nada.

Na verdade, Eric ficou desolado. Ele não acreditava que sua parceira do baile havia deixado-o de lado para se esfregar e posar para milhares de fotos com o “rei do baile”. Isso não deveria importar, não é? Se ela foi com ele, deveriam passar aquele tempo juntos, ao menos para dizer que realmente os dois não davam certo.

Desde aquela época, passei a ver Kate com maus olhos, pois ela simplesmente não devia ter feito meu amigo sofrer daquela forma. Para agravar a situação, há cerca de seis meses, a exibida havia me adicionado a seu círculo de amigos no Facebook e, como era comissária de bordo, passou a postar milhares de fotos viajando pelo mundo, para minha surpresa, ao lado de David Shore. É. Meu antigo sonho de consumo. Talvez não tão antigo quanto eu queria que fosse.

David foi o meu típico amor de verão. Daqueles bem quentes e inesquecíveis. Nós ficamos juntos durante todo o verão de 2004 e foram os três melhores meses de nossas vidas num pedaço do paraíso chamado Cancún. Eu e minha família viajamos para lá para aproveitar que todos estávamos de férias e lá encontramos os Shore. Rapidamente os adultos fizeram amizade e, claro, as crianças também. A irmã mais velha de David, Denise, ficou grudada com Rebecca e, assim, nós ficávamos livres para passear por aí e nos embrenharmos em qualquer local vazio.

Com o final das férias, os Shore voltaram para San Francisco e nós para Loveland. David e eu trocamos os números de telefone celular, mas incrivelmente nenhum dos meus SMS foi respondido. Fiquei muito decepcionada. Talvez tanto quanto Eric com o “episódio Kate”.

Lembro-me de Eric ter me dado sua sobremesa no almoço por mais de um mês para ver se eu me animava, mas nada me fazia crer que eu tinha me iludido com o que vivi ao lado de David no caribe mexicano.

Anos mais tarde, lá estava eu, achando que havia me recuperado, cheia de planos e expectativas depositadas em Jason, mas querendo berrar “que porra de mundo pequeno é esse”. Pois é! Que droga de mundo minúsculo e injusto é este onde a vaca da Kate, destruidora de corações, encontra o gostoso do David, também destruidor de corações, e os dois vivem um romance nômade pelo mundo?

Essa desgraçada estava na minha frente com tudo o que eu sempre quis: o mundo e o David. E Kate estava determinada a esfregar o brilho de seus olhos na minha fuça e, em resposta, eu tinha que ser educada?

— Kate… — Eu finalmente disse, antes de cumprimentá-la com um sorriso falso seguido por um abraço superficial. Olhei rapidamente para David. — Quanto tempo…

— Pois é! Muito tempo! — Animada, Kate finalmente desviou seus olhos para Eric e seu sorriso foi contido por alguns instantes. — Como vai? — Ela apertou ainda mais a mão de David e seu sorriso voltou a crescer, ao passo que ela tornou a me fitar.

— Vou bem e você? — Rebati sem demonstrar minha falta de interesse na resposta. “Estou ótima”.

— Estou ótima! — Enquanto Kate desviou-se de nós para encarar David, eu olhei para Eric por sobre o ombro e revirei os olhos. — Conhece David?

Eu engoli em seco. Eu não sabia o que responder. Resolvi estender a mão para ele.

— Muito prazer. Eve Turner.

Ele demorou alguns milésimos de segundos para reagir. David parecia surpreso com minha reação. Talvez ele imaginasse que eu fosse fazer uma cena, ou me esgoelar de tanto chorar, ou, ainda, que eu fosse delatar nosso grau de conhecimento para Kate e Eric. Bobinho!

Aquela sensação foi boa.

— David Shore. — Com cara de tacho, ele balbuciou o próprio nome cujo conhecimento eu já tinha. Ele pensava mesmo que eu não me lembrava dele?

Ao meu lado, vi uma movimentação inquietante.

— Lembra-se de Eric? — Eu cutuquei Kate, prolongando aquela sensação de estar por cima.

— Marshall? Eric Marshall? — Kate se fez de desentendida. — Oh, claro! Como vai você?

Eu me apoiei no ombro esquerdo de Eric e ele sorriu para o casal de pombinhos ao perceber que ambos pareciam atônitos com a situação.

— Se melhorar, estraga! — ele disse.

Eu queria gargalhar. Eric parecia gostar daquilo tanto quanto eu. Voltamos no tempo como se realizássemos mais uma de nossas traquinagens. Foi então que o braço de Eric misteriosamente foi parar em minha cintura e, quando dei por mim, ele havia me puxado para mais perto de seu corpo.

Nossos olhares se encontraram. Eu tentei não parecer tão surpresa e sorri. Eric riu, eu só não sabia se era de mim ou dos dois otários em nossa frente. Voltei a encará-los e a expressão de Kate e David chegava a ser cômica.

— Vocês… Estão… Juntos? — De forma hesitante, Kate indagou e ao final de sua frase fragmentada, ela parecia arrependida de tê-lo feito.

— Legal, né? — O outro braço de Eric envolveu minha cintura, puxando-me para um abraço por trás.

— Incrível! — Kate forçou um riso e olhou para David, que sequer correspondeu-a. — Bem… Vamos cumprimentar o restante do pessoal… Foi ótimo encontrar vocês!

— Nós vemos por aí! — Respondi com falsa animação.

Quando Kate e David se distanciaram o suficiente, eu e Eric nos rendemos e gargalhamos até não poder mais respirar direito. Ainda em seus braços, eu me virei para ele e o riso foi se suavizando. Novamente nos olhamos de muito perto e, desconcertados, nos soltamos.

— Aquele era o David? O David de Cancún? — Eric tentou desviar a atenção, pois provavelmente eu estava mais vermelha que uma plantação de cranberries.

— O próprio! — Tornei a rir. Tive que forçar um pouco pelo nervosismo de ter estado tão próxima de Eric e de David em questão de segundos. — Você viu a cara deles? Isso, sim, foi incrível!

— Demais! — Eric concordou ainda rindo.

Vendo que a situação provavelmente sairia do controle devido a minha excessiva falta de jeito para intimidade, pedi licença a Eric, dizendo que logo voltava e fui em direção à saída do ginásio, buscando o banheiro feminino. No caminho procurei Abby, mas haviam tantas pessoas e tantas luzes que eu não consegui identificá-la na multidão.

Quando a porta fechou, eu só podia ouvir o som abafado das músicas que tocavam, das conversas e risos vindos de dentro ginásio e o eco que meus sapatos faziam pelo corredor. Lembrei-me que o banheiro feminino ficava ao lado do armário de troféus que eu havia visto mais cedo e fui até lá, torcendo para que sendo continuasse ali.