Novamente Alice escrita por Sol


Capítulo 3
O não país das maravilhas


Notas iniciais do capítulo

Esse cap era pra ter saido antes, mas eu fiz o favor de atrasar tudo na minha vida, espero que gostem, é mais um cap de apresentação, logo tudo será entendido com mais calma.



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| Cheshire |


    Nem todas as pessoas nascem com a mesma sorte, isso foi algo que eu aprendi quando ainda era uma criança e nem sequer alcançava a quina da mesa de jantar, nem todos nasciam e cresciam sempre felizes, foi o que eu aprendi quando derramar sangue deixou de ser um tabu e passou a ser meu.. Destino.

 Por mais que sempre me dissessem que a felicidade era questão de buscar e se dedicar, eu sinceramente nunca acreditei, afinal se todos que se esforçam e trabalham duro fossem necessariamente felizes e se isso fosse uma linha reta,então eu seria o desvio, a curva... 

  Não, não somente eu, não era egoísta ao ponto de achar que eu era o único desvio da norma, o único no mundo que sofria, eu não era, mas isso nunca fez a dor ser menor. 

.  .  .

 

   O sol estava radiante como sempre, no país em que eu vivia não havia um dia que não fosse tão quente, até o inverno era quente, desde que cheguei aqui percebi que o sol não tinha piedade e quase nos queimava sem sequer pedir licença, nessas horas eu agradecia por ter nascido loiro e ter a pele um pouco parda, afinal, se eu fosse albino estaria tipo... Como dizia meu avô? "Em maus lençóis".

  Empurrei a ultima caixa de papelão para o topo da pilha, era a quinta fileira que eu terminava de empilhar e minhas mãos estavam vermelhas de tanta dor, passei o tempo todo querendo poder parar por um momento, beber uma água e descansar, mas seria querer de mais para alguém como eu.  

Olhei para o grande quintal ao redor, a grama molhada por causa da chuva na noite passada apenas serviu para dificultar meu trabalho e me fazer escorregar e me sujar mais. 

  Se o destino fosse uma pessoa acho que eu o jogaria de um penhasco, sendo otimista. 

  Respirei fundo, limpando a sujeira do rosto, algumas caixas estavam muito pesadas e sujas de lama, certamente repletas de armas que algum nobre comprou por aí, coisas desse tipo eram normais por aqui, armas eram vendidas à nobres aos montes todos os dias e não importava o que iam fazer com elas, se dessem dinheiro a rainha tudo estaria resolvido.

—Ches? - Ouvi a voz de uma das empregadas da casa e a encarei, a moça ruiva estava sentada na escada de madeira da varanda, enrolando os cachos do cabelo com o dedo indicador enquanto me esperava com um sorriso e uma carta na mão. -Pensei em te avisar, pediram para te entregar quando pudesse, acho que é do seu primo... 

  Meus olhos estavam um pouco pesados, talvez por causa sono, mas ainda assim caminhei lentamente até ela, eu praticamente nunca recebia cartas, poderia considerar hoje como um dia importante.

 Abri o envelope pardo sem pressa e dele retirei uma carta cuidadosamente dobrada, escrita com uma letra um pouco torta e rasurada:

"Quiridssimo issimo issimo primo!"

Comecei a ler quando a abri e logo revirei os olhos, ele queria algo, pode apostar.

"Abaixo tem a hora e o local, preciso de sua ajuda, me encontre lá, é urgente, vida ou morte, se você não for eu não sei o que pode acontecer, mas não é bom! 

Ass: W. Rabbit "

 Suspirei, com um sorriso debochado, White e sua mania de ser mandão e dramático. Dobrei de novo a carta e a guardei em meu bolso, acenando para a empregada em forma de agradecimento, ela sorriu enquanto pegava um pano velho do chão, ela se levantou e ajeitou o uniforme preto do serviço, que parecia sempre novo graças as muitas vezes pagando a costureiras para arrumá-lo, tornando a entrar na casa e provavelmente voltando aos afazeres. 

   Olhando assim, as vezes eu chegava a ter certa inveja, trabalhar para nobres com dignidade, recebendo uma boa quantia de dinheiro no fim do mês... Poder viver aonde quer e fazer o que quer... Esse estilo de vida tão comum sempre me causou muita inveja. Olhei para minhas mãos machucadas, eu era apenas um escravo do reino, me machucar era meu trabalho e tudo o que eu receberia no fim das contas era só mais dor.   

    Chutei uma pedrinha pra longe, tentando afastar de mim os pensamentos depreciativos, se eu me permitisse cair mais eu chegaria no fundo do poço e isso não era agradável. Respirei fundo e comecei a andar em direção ao grande portão de saída do quintal, havia terminado meu trabalho por hoje e precisava encontrar White para ajudar na "grande urgência". 

 

. . .  

 

   -- Está me ouvindo falar com você?

Sorte: Eu definitivamente não a possuía.

  O local em que White havia me chamado, para minha surpresa, era a localização de um portal escondido, pouco usado e conhecido. Apenas o reino o usava para missões especiais.
  Se tratava do fim de uma das trilhas da densa floresta no norte do país e tudo ao redor era verde, silencioso e escuro, a minha frente estava uma pequena gruta, vulgo esconderijo do portal.

   Eu havia ido até lá após me livrar do serviço, como era um lugar deserto de pessoas não esperava encontrar ninguém. Até que a voz de Ás soou irritante aos meus ouvidos e eu engoli em seco, vendo minha vida passar pelos meus olhos.

  Ás era o comandante do exercito da rainha e meu tutor, eu olhei de relance em seus olhos,  sorrindo fracamente, os olhos dele me confundiam, pois o da esquerda era vermelho e com este ele não enxergava, por isso parecia sempre ser o olho mais sem vida e sem brilho, enquanto o seu outro olho era negro e parecia fuzilar os outros a todo momento, foi algo um pouco complicado de entender no começo.

— Já lhe disse tudo o que sei... - Reclamei, desviando o olhar e tornando a encarar o céu, ele entrou na minha frente, era um homem de quase trinta anos e muito mais alto do que eu, sua capa se agitou por causa do movimento e ele deu um peteleco na minha testa.

—Cheshire, eu não vou perguntar novamente, esse local é restrito, o que faz aqui? 

—Dando um passeio! - Disse sem nem pensar duas vezes, com a melhor expressão de "paisagem" que consegui.

 Ás respirou fundo, ajeitando o cabelo pra trás e tornando a me encarar, até o cabelo dele me confundia, as pontas eram ruivas enquanto a em cima era negro, céus, nada nele fazia sentido.

  -Eu acabo de vir de uma missão, como você deve ter notado já que está vigiando o portal, e não faça essa cara de desentendido! - Ele reclamou quando eu ergui as sobrancelhas. -Sei o que está fazendo aqui, mas gostaria de lembrar a você da sua obrigação... Será que esqueceu? Ou quer arrumar problemas, querido Cheshire? - Apenas abaixei a cabeça, eu sabia que iria me dar mal, mas assim tão rápido? —A rainha te deu uma ordem! - Ele olhou fixamente em meus olhos. -Nada de visitantes indesejados, se alguém diferente passar por aquele portal você deve cumprir seu dever, deve matar, como fez em toda sua vida até agora. Vai simplesmente desobedecer e continuar agindo como se não fosse com você? Já me basta seu primo sendo imprudente e rebelde. 

—Às eu... - Respirei fundo, era difícil recuar sobre seu olhar, era difícil escapar da sensação de pavor que ele sabia causar. -Eu não posso continuar... - Disse, por fim, quase como uma suplica, e ele desviou o olhar, recuando alguns passos. - Eu não aguento mais!

—Você ainda tem dezesseis anos, não brinque comigo! E sua função não é opcional.

—Mas...

—Você tem que decidir logo a quem você é leal. E então eu decido se estamos ou não do mesmo lado.

Eu o encarei, seus olhos tinham um brilho estranho, encará-lo era um tanto assustador, mas ele tinha razão, eu não poderia me esconder para sempre.

—Eu entendo Ás, por mais difícil que seja... Eu já decidi!

 

. . .    

 

      Quando Ás foi embora só me restava esperar meu primo voltar, certamente ele estaria trazendo alguém consigo pelo portal, e eu certamente não teria muito tempo, eu deveria procurar um esconderijo e esperar, no momento certo descobriria quem era a pessoa que preocupava tanto Ás e enfim saberia se deveria ou não seguir minha função e matá-la. 


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