State of Grace escrita por Edmayra McHale


Capítulo 11
It Comes with a Price


Notas iniciais do capítulo

ATENÇÃO!
O capítulo possui menção a abuso e aborto, é só em um parágrafo, deixarei a primeira palavra da frase em negrito e ela inteira em itálico, então, se não se sentir confortável, é só pular pro próximo parágrafo.



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10 de janeiro de 2019

Três dias haviam se passado, mas Trevor não fizera nada. Até mesmo os Mikaelson estavam impacientes, mantendo sua atenção redobrada tanto no apartamento quanto no trabalho da mulher para evitar surpresas desagradáveis. Sentada em seu sofá, Mackenzie acreditava estar ficando mais paranoica a cada dia. A “ordem” de que ficasse dentro de casa só piorava as coisas.

Com mais tempo para pensar, se pegava relembrando detalhes que perdera da primeira vez. Detalhes sutis que ela foi inocente demais ao ponto de relevar. Uma escolha errada de palavras, uma mudança de hábito que não lhe pareceu nada no momento. Como um olhar diferente...

— Você realmente está levando aqueles caras a sério, não é? — Oliver perguntou enquanto fechava a porta atrás de si, aproximando-se da mesa para pôr as compras. — Os seus cães de guarda estavam lá fora...

— Não deveria se admirar com o quão odiado Trevor é. — Ela deixou um longo suspiro escapar, coçando a testa, e desviou o olhar do amigo. — Agora nós dois sabemos muito bem do que ele é capaz...

— Eu já sabia antes. — Se aproximou do sofá e sentou ao lado dela, apoiando a mão em seu joelho para apertar em conforto. — Mas não queria ser o motivo de você começar a olhá-lo diferente...

A expressão confusa dela lhe perguntava o que ele queria dizer, mas nem cinco segundos se passaram para que entendesse. É. Talvez ela tivesse suas ideias facilmente corrompidas. Como o fato de estar apaixonada numa hora e, na outra, estar procurando todos os sinais que havia perdido. Ou o fato de ter passado metade de sua vida fugindo do passado, mas ter voltado correndo para os braços de Nova Orleães quando as coisas ficaram feias.

— Você não queria ser o ciumento da história? — ela brincou com um riso fraco, respirando profundamente. Oliver apenas esboçou um sorriso forçado em resposta. — Obrigada. — Suspirou ao se inclinar na direção dele, segurando seu rosto com uma mão e depositando um beijo no lado mais próximo, sem desviar seus olhos dele. — Você sempre foi um bom amigo.

— Você sempre foi a minha irmãzinha, eu tinha que cuidar de você. — Ele sorriu de lado após devolver o beijo, mas logo se levantou. — Eu vou tomar um banho.

O loiro seguiu em direção ao banheiro, mas parou quando a amiga chamou seu apelido. Ela parecia pensativa de repente, séria demais. Ele sentiu um leve desconforto, mas inclinou a cabeça de leve e franziu a testa.

— Você lembra qual era o carro do meu irmão quando eu fugi? — Mack questionou com uma expressão um pouco aérea – tentando puxar algo de sua memória – e ergueu seu olhar para ele.

— Um Impala? — Oliver deu de ombros, apoiando as mãos na cintura e umedecendo os lábios. — O que foi? Ele cobrou a conta do mecânico? — brincou, ouvindo o riso fraco dela.

— Não, foi só algo que eu não conseguia lembrar. Obrigada. — Sorriu.

Ele assentiu e se virou para voltar ao caminho. Um longo suspiro aliviado escapou por seus lábios quando fechou a porta às suas costas. Havia escapado daquela por pouco. Pelo menos, era o que ele pensava.

 

Quando o amigo disse o carro, a garganta de Mackenzie quase fechou, mas ela precisava manter as aparências. Nunca havia conversado com Oliver sobre o carro, apenas sobre a ocasião. No entanto, ela o tinha desenhado em seu diário há algumas noites quando não estava conseguindo pegar no sono.

Ouviu a porta se fechar e levantou do sofá às pressas, mas tentou caminhar até o quarto sem fazer barulho. Abriu as portas francesas e viu a sombra do outro lado da rua olhar em sua direção. Klaus. Repetindo o gesto da mulher, ele abriu as portas de seu quarto e aproveitou o céu escuro para pular para a sacada do apartamento.

— Tem alguma coisa errada — ela disse no tom mais baixo que conseguiu quando o homem aterrissou à sua frente. Olhou em direção à porta do quarto, então, ele entendeu.

— Oliver? — questionou no mesmo tom ao seguir seu olhar.

— Eu não sei se é ele — confessou e deu de ombros ao atrair os olhos cinzentos curiosos do híbrido. — Agora eu estou me sentindo uma idiota por ter demorado a perceber... Mas eu acho que não deveria estar me preocupando apenas com o meu marido.

— O que quer que eu faça?

— Não o mate.

Talvez Klaus devesse ficar ofendido com a frase, mas um pequeno sorriso surgiu no canto de seus lábios. Poderia fazer aquilo.

Na mesma velocidade com a qual atravessou a rua, ele seguiu até a porta do banheiro, quase a estraçalhando ao entrar, e arremessou o estranho contra a parede, nem lhe dando tempo para ver o que o atingira. Do corredor, Mackenzie o encarava de maneira assustada e repreensiva.

— Eu não o matei — defendeu-se, erguendo as mãos em rendição antes de desligar o chuveiro.

 

Assim que a mulher pisou no pátio do casarão do Quartel Francês, Elijah se aproximou com uma expressão confusa. Examinou-a brevemente, mas olhou sobre o ombro ao ouvir um ruído de alguma região sob o prédio. Sem querer deixá-la sozinha, sinalizou para que o seguisse e começou a andar ao seu lado.

— Está tudo bem?

Mackenzie negou com a cabeça, esfregando os braços cobertos pelo casaco. Seu estômago revirava de ansiedade, o vampiro entendeu o motivo quando avistou seu irmão prendendo a figura loira pelos pulsos. Arregalou seus olhos, dividindo sua atenção entre os dois antes de parar no homem desacordado.

— O que é isso?

— Um mal pressentimento — ela murmurou e deu de ombros, parando em frente à figura idêntica ao seu melhor amigo. — Ele se parece com o Oli, fala e se veste como ele, mas eu não tenho certeza de que seja ele — confessou. — Ele se lembra de coisas que já deveria ter esquecido, é como se...

— Se as tivesse vivido recentemente? — Klaus completou de maneira sugestiva.

Seu olhar surpreso foi a resposta que precisava. O híbrido cruzou os braços e deixou um longo suspiro sair pelos lábios, então, ergueu seu olhar para o irmão, que pareceu ter a mesma ideia que ele.

— O que foi?

— Eu nunca vi um pessoalmente, não tenho certeza de que existam mesmo — Elijah contou, atiçando a curiosidade da morena.

Schimbare — Klaus respondeu, mas a curiosidade se tornou confusão.

Não era de se admirar que ela nunca tivesse ouvido falar da criatura. Nem mesmo eles, com suas centenas de anos, haviam cruzado com algum confirmado, conheciam apenas os mitos sobre o híbrido de duas raças que, diferente de Niklaus, não tinha sede de sangue. Pelo menos, não a literal.

— Deve ter um livro em algum lugar — continuou antes de sumir de suas vistas rumo à biblioteca.

Quando Elijah e Mackenzie o alcançaram, alguns livros já estavam no chão enquanto o loiro procurava pelo livro específico onde estariam os detalhes sobre a criatura misteriosa. Já que não sabia onde procurar, Mack se apoiou na mesa e cruzou os braços enquanto os Mikaelson procuravam.

— Encontrei — avisou o vampiro antes de se aproximar. — “Mestiços de lobos e viajantes”.

— E isso é possível? — ela questionou após uma careta exagerada, inclinando-se para ver o desenho da página quando ele parou ao seu lado, porém, ao processar as próprias palavras, ergueu seu olhar para Klaus e fez outra careta. — Esquece.

— Não tem muitos detalhes aqui, só diz que não precisam de uma fase da lua para se transformar.

— Porque o lado viajante permite que usem os poderes quando bem entenderem — comunicou o híbrido, finalmente se aproximando com outro livro em mãos.

Klaus parou do lado oposto da mesa, pondo o livro sobre a superfície, e manteve os olhos na leitura enquanto os outros dois se inclinavam para olhar. Mack tentou ler de todos os ângulos possíveis antes de seguir para o lado do loiro, mas mordeu o lábio para conter a frustração, erguendo seu olhar para ele.

— Que idioma é esse? — perguntou ao se dar por vencida, apoiando uma mão na mesa e a outra na cintura.

— Romeno, os viajantes eram ciganos, a maioria deles é do leste europeu — respondeu sem olhá-la. — Mas isso não é um livro, é um diário.

— Eu deveria ficar com medo de perguntar como vocês conseguiram o diário de um viajante lobisomem? — Ela olhou para Elijah.

O vampiro Original pegou o objeto para observar melhor, estudando a textura das páginas e do próprio livro. Um murmúrio impressionado lhe escapou pelos lábios antes que ele pudesse responder.

— Não fomos nós, deve ser coisa da Freya.

— Freya? — Mackenzie franziu o cenho e umedeceu os lábios, dando de ombros. — Desculpem, eu só conheço a Deusa nórdica.

— Nossa irmã — Elijah esclareceu antes de notar o celular na mão de Niklaus. — Ela saiu, quer mesmo incomodá-la com isso agora?

— Você quer esperar até a criatura estranha no nosso porão acordar? — o híbrido ironizou, visivelmente impaciente, mas o mais velho apenas o ignorou.

— Mais uma Mikaelson? — A mulher suspirou de novo, se sentando na cadeira quando o loiro se afastou. — Acho que agora sim eu deveria ficar com medo, não é?

O moreno a olhou e apenas esboçou um pequeno sorriso, mas suspirou ao voltar à leitura.

Em poucos minutos, uma figura de vestido de lantejoulas brilhantes entrou no cômodo, atraindo os olhares dos dois morenos na sala, já que Niklaus era quem tinha o livro. Freya diminuiu o ritmo dos passos ao notar o que ele segurava e deixou os ombros caírem.

— Então, me tirou da festa por causa dessa coisa velha? — resmungou, apontando para o livro. — Você sabe que eu tive que dispensar uma mulher muito linda pra vir, não é? — Olhou para Elijah, esperando uma justificativa convincente, mas notou a mulher sentada na cadeira ao lado dele. Aproximou-se e estendeu a mão a ela. — Oi! Freya.

— Mackenzie. — Um sorriso sem graça estampou o rosto da loba quando aceitou o gesto, pigarreando de leve ao endireitar a postura. — A culpa é meio minha, então, desculpe...

— Olha! Alguém nessa casa sabe usar a palavra — implicou com o irmão caçula. — Por que o interesse nesse negócio? — perguntou ao notar Klaus se aproximar, mas foi a mulher que atraiu seu olhar de novo.

— Eles acham que o meu melhor amigo pode ser uma dessas coisas — Mack contou, vendo-a arregalar os olhos antes de assumir uma postura mais ereta. — E eu não sei se ele não consegue ler ou se só está guardando todas as informações para si — implicou com o loiro ao olhá-lo.

— Os schimbare são criaturas mestiças condenadas ao surgimento do primeiro da espécie — Freya começou e se sentou na mesa, permanecendo próxima à mulher. — Alguns dizem que o primeiro foi fruto da relação proibida de um lobisomem com uma feiticeira viajante. Outros dizem que foi um estupro e que a magia usada para remover o feto o transformou em uma aberração.

— “Schimbare” é a palavra romena para “mudança” — Elijah explicou para a Kenner.

— A única coisa que realmente interessa é que eles são imprevisíveis e extremamente perigosos. — A bruxa suspirou, passando uma mão pelos cabelos curtos. — Eles podem não ter uma sede insaciável, mas eles podem literalmente se transformar em qualquer um. Poderiam invadir a Casa Branca, assumir o lugar do presidente e as pessoas nunca saberiam — concluiu sob os olhares atentos dos três.

— Mas nem tudo pode ser perfeito — Klaus murmurou ao se aproximar.

— Como tudo envolvendo magia, isso vem com um preço — ela concordou. — Cada vez que se transformam, eles podem acabar se perdendo nos personagens, alguns realmente acreditam que são aquela pessoa e esquecem as próprias identidades. — Estalou dos dedos de uma das mãos. — Eu não sei dizer se também imitam os poderes, só que eles absorvem as memórias de quem se transformam, mas cada um tem seu tempo.

— E quanto tempo levaria para absorver vinte anos de memórias? — Mack perguntou com o olhar baixo, unindo as mãos sobre o colo.

— Alguns dias, talvez semanas... Depende da idade ou da experiência do schimbare. — A loira deu de ombros, batucando os dedos nos próprios braços.

— Ainda era o Oliver antes de você partir? — O moreno se abaixou ao lado da cadeira, repousando uma mão no braço da loba enquanto a observava. Ela pareceu pensar por alguns instantes, mas assentiu. — Vamos encontrá-lo.

— Trevor não perderia a vantagem sobre ela — Niklaus comentou, atraindo o olhar do irmão enquanto ele mesmo olhava para a mulher.

— Oli está vivo e com ele. — Mackenzie suspirou, erguendo seus olhos para o híbrido. — E ele está na cidade. Esse schimbare saía demais pra alguém que não deveria ter conhecidos aqui...

— Eu vou ver o que mais consigo sobre eles — Freya garantiu e tocou levemente o ombro da morena, ouvindo seu agradecimento baixo antes de se retirar da biblioteca.

— Eu acho que seria uma boa ideia se passasse a noite aqui. — Elijah se levantou, batendo as mãos nas roupas enquanto olhava para a loba.

Mackenzie ainda tinha seu olhar perdido, mas concordou e estalou os dedos por ansiedade. Seu estômago estava embrulhado, provavelmente nem conseguiria dormir.

— Vá ajudar a Freya, eu fico de olho nela — Klaus ofereceu ao irmão e o acompanhou com o olhar até a porta.

Observou a Kenner por alguns instantes, mas ela não parecia disposta a conversar, então, o híbrido seguiu até uma das prateleiras e pegou um livro de feitiços e encantamentos, pondo sobre a mesa antes de sentar em frente à morena. Recebeu seu olhar confuso e apenas empurrou o objeto em sua direção.

— Vai te ajudar a não pensar nele.

Os ombros dela caíram. Era evidente que se sentia culpada por ter deixado o amigo para trás e ter demorado a identificar o impostor, mas ele estava certo. Deixar o desespero tomar conta não ajudaria em nada.

Mesmo com o olhar nela, o Mikaelson puxou o diário de volta e cruzou as pernas sob a mesa, esperando que a mulher começasse a ler antes de fazer o mesmo.

 

Exausta, Mackenzie acabou dormindo pouco antes de amanhecer, debruçada no livro sobre a mesa. Mesmo quando Klaus a pegou no colo e a levou até um dos quartos, ela não acordou. O híbrido garantiu que as janelas estivessem trancadas antes de deixar o cômodo, soltando um longo suspiro quando fechou a porta.

Aquilo estava se tornando um hábito, mas se perguntava até quando. Balançou a cabeça em negação para afastar seus pensamentos e usou sua velocidade sobrenatural para chegar ao “covil” de Freya, avistando os dois irmãos à beira da mesa.

— O que encontraram? — perguntou, parando ao lado da primogênita.

— Um feitiço para absorver as memórias dele — ela respondeu e indicou o papel antigo que haviam encontrado, respirando profundamente ao alongar as costas. — Mas não tenho todos os ingredientes, então, talvez seja uma boa ideia tentar fazê-lo contar o que sabe para ganhar tempo. Vou pedir ao Kol para comprar algumas coisas.

— E a garota?

— Dormiu, acabei de deixá-la no quarto — contou e coçou a sobrancelha. — Vai avisar os lobos?

— Ela estará segura conosco, vamos esperar amanhecer — Elijah declarou e olhou no relógio em seu pulso antes de voltar sua atenção aos irmãos. — Tentem descansar um pouco. Foi uma longa noite. Vamos deixar que Mackenzie acorde para contar e ver como ela quer lidar com isso.

Os dois loiros concordaram e Freya foi a primeira a deixar o cômodo. O vampiro estava pronto para seguir seus passos, mas parou na porta quando notou que o mais novo continuava com as mãos apoiadas na mesa. Os dedos batucaram leve, mas rapidamente, deixando sua ansiedade evidente.

— Ela me chamou quando percebeu.

— Como? — Elijah perguntou ao se aproximar, não entendendo bem as palavras do irmão.

— Quando ela percebeu que não era o Oliver, ela foi até a varanda do quarto. Eu ouvi os batimentos acelerados, ela sabia que eu estava no ateliê — contou, retomando a postura, e olhou para o mais velho. — Ela estava com medo. Ainda está.

— Você a salvou antes e agora têm um objetivo em comum. — O moreno deu de ombros, levando as mãos aos bolsos. — Ela confia em você e nós não precisamos de mais ninguém nos odiando, então, tente não estragar tudo — aconselhou, recebendo um olhar torto do irmão. — É, você faz isso às vezes.

Klaus revirou os olhos e deu um tapinha no ombro do mais velho ao passar por ele, voltando ao ateliê para manter a vigília sobre o apartamento dela. Se os soldados de Trevor não a viram sair, talvez ainda pudessem tentar algo durante a madrugada.

 

 

11 de janeiro de 2019

Quando lhe disseram da primeira vez que o irmão havia invadido o cativeiro do prisioneiro, Trevor se irritou, mas preferiu não dizer nada, já tinha coisas demais para se preocupar. No entanto, quando o viu entrar no casarão pela manhã, constatou que ele tivesse feito de novo.

Lance seguiu até seu quarto e estendeu a jaqueta sobre a cadeira da escrivaninha, deixando a estampa com o lobo virada para a cama. Se sentou no colchão e encarou o desenho. Quando a mãe contou quem era seu pai, ele não sabia o que esperar, mas certamente não era um lobisomem.

Daniel nunca lhe disse nada, talvez não tivesse coragem, ou só acreditasse que o rapaz jamais chegaria a tal ponto. Mas Trevor disse. O que ele teria que fazer para ativar sua maldição, como a raiva tomaria conta de seu corpo e ele simplesmente não conseguiria lutar.

 

— É inevitável — o mais velho garantiu e bateu a mão no joelho do irmão, deixando que um longo suspiro escapasse pelos lábios. — O instinto animal é normal do ser humano, eles fazem isso para se proteger e nós também. — Olhou para Lance, que não desviava seu olhar confuso e nervoso dele. — A diferença é que nós evoluímos, eles só continuam os mesmos.

 

A lembrança fez o estômago do rapaz embrulhar. Ele se lembrava como se tivesse acabado de sair daquela conversa, mesmo que ela tivesse sido há alguns meses. Desde então, Lawrence andava ainda mais cauteloso. Oliver tinha razão, ele não era como o irmão, muito menos como seus amigos.

Encarou as próprias mãos, mas ergueu os olhos assim que a porta do quarto se abriu. Encolheu os ombros e prendeu a respiração por alguns instantes, engolindo em seco para se recompor sob o olhar do híbrido. O semblante dele era sério, certamente desgostoso com algo, mas parecia não querer assustar o caçula.

— Onde estava? — Usou um tom calmo conforme se aproximava e sentou ao lado dele, apoiando os cotovelos sobre os joelhos.

— Não se preocupe, eu não fui até o Oliver de novo — Lance respondeu com a voz baixo e desviou o olhar de volta para a jaqueta antes que olhasse o chão. — Eu fui dar uma volta pela propriedade, me admira que não tenha colocado ninguém pra me vigiar — resmungou.

— Eu não preciso que ninguém te vigie, irmãozinho — Trevor garantiu e pôs a mão no ombro dele, sentindo-o encolher um pouco mais com o toque. — Somos irmãos, não há segredos entre nós. Não é?

— Eu não tenho nada pra esconder. — O caçula mordeu o lábio sem perceber, sentindo seu estômago embrulhar de novo. — Quanto tempo a gente tem que ficar aqui?

— Já sente falta da internet? — O Blake soltou um riso um tanto forçado e o analisou com o olhar, notando o desconforto do outro, que ainda não o olhava. Suspirou. — Não muito, espero. Eu só tenho que encontrar a Kenzie e podemos ir.

— Mas você já sabe onde ela está, não pode só ir até ela? — perguntou curioso e finalmente o olhou, estreitando seus olhos na direção do irmão, que fechou a expressão quase instantaneamente.

— Acha mesmo que ela quer falar comigo? — Trevor revirou os olhos e passou a mão pelos cabelos, notando a falta de alguns centímetros nos fios que havia cortado. — Se ela estivesse interessada em conversar, não teria fugido como uma covarde.

Lance abriu a boca para responder, mas desistiu assim que terminou de calcular a frase e apenas balançou a cabeça em negação. “Delilah”. A bruxa logo lhe veio à mente. Não podia culpar a fugitiva, conhecia o irmão há menos de um ano, mas sabia que ele não era do tipo que aceitava críticas. Muito menos as usava para melhorar.

— E se eu falar com ela? — sugeriu, se arrependendo imediatamente.

O silêncio se instaurou no cômodo, fazendo o coração do rapaz acelerar. Ele tinha dito algo errado? Trevor estava considerando arrancar sua cabeça? Não, só estava pensando em mandá-lo como uma oferta de paz. Talvez tivesse menos resistência se mostrasse uma bandeira branca primeiro.

— Eu vou pensar no assunto, está bem? — O mais velho suspirou ao apertar o ombro do irmão e sorriu de lado quando atraiu seu olhar. — Nós falamos sobre isso mais tarde. Por que não descansa antes do almoço?

Lance assentiu, relaxando os ombros, e respirou profundamente quando a porta se fechou. Passou as mãos pelos cabelos castanhos e jogou as costas contra a cama, sentindo seu coração e a adrenalina se acalmarem aos poucos.

Olhou para o seu lado no colchão e encontrou o celular, então, desenrolou os fones de ouvido e os colocou. Deu alguns cliques na tela enquanto seus olhos passeavam pelas músicas, mas selecionou a primeira que lhe parecia boa o suficiente e deixou o aparelho sobre o peito, fechando os olhos para aquietar sua mente.

 

 

Já havia passado do meio dia quando Jackson e Hayley chegaram à Mansão Mikaelson. A pedido de Elijah, deixaram Hope no Bayou, já que a situação não era favorável para tê-la por perto.

Quando o alfa abriu a porta do quarto, deixou um pequeno suspiro aliviado escapar pelos lábios. Avançou em direção à cama e sentou com cuidado ao lado da irmã, acariciando seu rosto ao depositar um beijo em sua testa.

Não demorou para que ela abrisse os olhos lentamente, fazendo um pequeno sorriso estampar os lábios dele quando voltou a fechá-los e resmungou baixo, virando para o lado oposto à janela para se acomodar. Jackson riu, afagando os cabelos da gêmea, e acabou deitando com ela.

— Pelo visto, você continua preguiçosa — acusou, a fazendo abrir os olhos de novo.

— Você sabia que é feio ofender mulheres grávidas, Jackson? — o repreendeu, estreitando os olhos em sua direção, e uniu as mãos sob o travesseiro.

— É mais feio ainda não implicar com a minha irmã — se defendeu, esboçando um sorriso travesso. Um novo suspiro ecoou, dessa vez, dela, e Jack pôde notar a mudança em sua expressão. — Elijah nos contou. Eu sinto muito.

— É, eu também — murmurou sem olhá-lo e mordeu os lábios.

O corpo dela se encolheu na cama, mas Mackenzie voltou a fechar os olhos ao sentir a mão do irmão em seu rosto. O coração apertou no peito e ela não conseguiu conter as lágrimas antes de ser puxada para os braços acolhedores do irmão.

— Vai ficar tudo bem, nós vamos trazê-lo de volta — ele garantiu num sussurro enquanto alisava suas costas. — Eu prometo.

 

Os Kenner permaneceram na cama até que a mulher se sentisse bem para levantar e enfrentar o restante do dia. Após jogar uma água no rosto, Mackenzie passou a mão pelos cabelos pretos e seguiu os passos do irmão, encontrando o grupo reunido no que seria a sala de Freya.

A bruxa explicou o feitiço que havia encontrado, como funcionaria e do que precisavam, assim pôde explicar que ainda não tinham todos os ingredientes. Por fim, os olhares se voltaram para a mulher de olhos azuis.

— Querem que eu fale com ele? — perguntou num tom receoso.

— Como Freya disse, às vezes, eles se perdem no personagem, se esse cara se apegou a você como Oliver, ele deve confiar em você — Elijah respondeu com sua calma de sempre.

No entanto, o frio na barriga da mulher a garantiu que sua tranquilidade não tinha sido contagiosa daquela vez. Ela abraçou o próprio corpo e encolheu os ombros, hesitante.

— Do contrário — Klaus começou, atraindo seu olhar. — Ele deve querer saber onde errou pra você suspeitar. Você não seria a única querendo respostas.

— Eu vou estar do seu lado — Jackson garantiu num sussurro para a irmã e alisou suas costas para confortá-la.

— Tem algum jeito de machucá-lo? — Nem mesmo ela acreditou quando tais palavras saíram de sua boca. Mackenzie olhou diretamente para Freya.

— Prata — a bruxa contou, então, se aproximou enquanto tirava a própria pulseira e prendeu ao pulso da outra. — Não será o suficiente para matar, mas, quando encostar na pele dele, deve ter um efeito parecido com acônito — usou um exemplo prático para os lobos.

— Obrigada. — Mack assentiu e olhou para o irmão.

O caminho para o subsolo da propriedade pareceu mais longo do que ela se lembrava. Talvez fosse a ansiedade lhe consumindo, mas o tempo parecia não passar. Viu o irmão parar e abrir o portão. O estalo do ferro lhe causou um arrepio involuntário, fazendo com que fechasse os olhos.

A iluminação era mínima na área onde o prisioneiro estava, tinha apenas um filete de luz no corredor, mas seus olhos se adaptaram depressa antes que as tochas se acendessem — um dos vários truques de Freya.

A respiração do mutante estava pesada, então, os gêmeos puderam ouvi-la de longe. Mackenzie hesitou, mas Jackson segurou sua mão firmemente, fazendo-a respirar fundo.

— Eu já estava pensando em quando ia aparecer — a voz rouca do prisioneiro ecoou.

Os irmãos se aproximaram, encontrando o homem de cabelos longos e loiros acorrentado ao teto pelos braços, com os joelhos tocando o chão. Oliver, ou quem quer que fosse, ergueu o tronco para observá-los, apoiando o peso sobre os calcanhares.

— Eu imagino que isso seja obra do seu namoradinho híbrido, não é? — Ele forçou um riso, balançando os punhos para se referir às correntes grossas de ferro. — Eu já ouvi histórias sobre o grande Klaus Mikaelson... Também sei que ele está ouvindo. — Sorriu irônico.

Mackenzie não disse uma palavra, apenas se aproximou alguns passos enquanto o irmão decidiu ficar próximo à parede do corredor. Ela uniu as mãos às costas e deixou os ombros caírem, mantendo sua atenção no estranho.

— Qual é, Kenzie.

Um forte arrepio percorreu a espinha dela, a forçando a fechar os olhos. Enfiou as unhas no pulso e respirou fundo para se recompor, então, alongou o pescoço e o olhou.

— Você trabalha para o Trevor — afirmou.

— Você o irritou bastante.

— Ele não precisava mais de mim, por que perder tempo? E dinheiro.

— Ele é um cara possessivo. — Deu de ombros. — Não posso culpá-lo nesse ponto, você é mesmo boa demais para deixar ir embora...

— Não é como se eu tivesse outra escolha, divórcio nunca seria uma opção — se defendeu e cruzou os braços.

— Vocês, lobos, são muito tradicionais. — O estranho riu enquanto balançava a cabeça em negação. — Cheios de rituais e cerimônias. — Soltou o ar contra os lábios e revirou os olhos. — “Até que a morte os separe”.

— Mas você não é meio lobisomem? — Mack acusou, vendo a surpresa estampar o rosto dele.

— Sabem o que eu sou?

— Não com certeza — confessou, tentando demonstrar que precisava tanto dele, quanto ele precisava dela. — Schimbare?

— Algo que vocês chamariam de "troca-peles" — ele afirmou, umedecendo os lábios. — Ou "metamorfo".

— E será que você pode assumir a sua forma original? — ela pediu num tom um pouco menos rude. — Ou mais confortável pra você? É estranho falar com alguém que parece o meu melhor amigo...

— É uma pena. — Ele riu, erguendo as mãos, e suspirou. — Eu gostava do Oli.

O estranho fechou os olhos, parecendo se concentrar. De repente, um ruído alto ecoou e ele se contorceu, como se sua espinha quebrasse. Mackenzie recuou os mesmos passos que o irmão avançou, se encontrando no meio do caminho.

O schimbare emitiu mais alguns sonhos estranhos, grunhidos de dor, ossos quebrando e se realocando. Sua pele tomou uma espessura mais pegajosa, parecendo se soltar aos poucos. Ele inclinou o corpo para a frente e uma pequena massa gosmenta caiu de sua boca.

Ela fez uma careta desgostosa ao notar que eram seus dentes e partes da gengiva. O cheiro do sangue exalou pelo local, fazendo seu estômago revirar ainda mais, mas ela apertou a mão do irmão para se conter. Não podiam ir embora ainda.

Depois de alguns minutos, a criatura de nova aparência ergueu o rosto para a dupla, balançando levemente a cabeça enquanto os pedaços da antiga pele caíam no chão.

— Desculpe. — Um sorriso um tanto presunçoso estampou seus lábios. — Eu devia ter avisado que seria nojento.

 


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