WSU's Soldado Fantasma - O Riso da Caveira. escrita por Nemo, Lex Luthor, WSU


Capítulo 1
Prólogo


Notas iniciais do capítulo

Atenção, esse prólogo não é indicado para menores de 16 anos ou, que sejam sensíveis, pois envolve um tema bastante desconfortável: O abuso que a mulher sofre em nossa sociedade. Gostaria de dizer que não haverá: Sexualização, Banalização ou Romantização.

Sua leitura não é obrigatória para a compreensão da história, mas não deixa de ser importante. Outra coisa a ser destacada é que o tema da história não é esse, porém ele merece destaque, não por ser polêmico, mas por fazer parte de nossa realidade.



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Adentrei no consultório da doutora com cuidado, um lugar de paredes e pisos brancos, uma mesa e duas cadeiras, uma ocupada pela mulher de óculos. Atrás dela havia duas grandes janelas que permitiam uma boa iluminação e um clima bem arejado. Sentei-me tímida em sua frente. Ela era loira, vestia um jaleco branco e tinha uma estatura baixa, mantinha um olhar analítico sobre mim, mas não deixava de ser amigável:

— Bom dia.

— Bom dia. — respondi enquanto ela checava a ficha, seus olhos fitavam a prancheta e se voltaram para mim com questionamento, meu nome estava em branco, então esclareci: — Meu nome? Prefiro não dizer. Não sei se irei continuar.

— Qual o motivo? — indaga a Doutora curiosa.

— É algo complicado e não sei se quero comentar muito sobre... — digo de forma cabisbaixa.

— Entendo. Conte-me o que te trouxe, não irei interrompê-la ou julgá-la, pode se abrir comigo — diz ela de forma solidária.

Inspiro fundo, um pouco menos desconfortável do que quando cheguei, início:

 — Sou apenas uma estudante de história, tenho dezessete anos e moro na cidade do Corsário. O que vou contar não é fácil de desencavar... chorei por muitas noites, me culpei e jamais disse algo a alguém, nem a minha família ou aos meus amigos. — observei-a. Ela ouvia atenta e consente para que eu continue. — Tudo começou quando saí da faculdade. Por acidente acabei perdendo o ônibus e, se não bastasse, meu celular estava descarregado. Tive de voltar a pé. Não haveria problema nisso se as ruas fossem patrulhadas ou houvesse uma boa iluminação, mas a verdade é que a essa hora da noite as ruas estavam lotadas de sujeitos não muito confiáveis, fora o fato de minha casa ser longe...

 

 

Corsário, 07/04/2016 23:38

 

Minha caminhada inicialmente foi tranquila, havia poucas pessoas na rua, mas à medida que continuava seguindo meu caminho, o número de pessoas diminuía e o trânsito também. As horas se arrastavam, os vultos começavam a sair das sombras, a insegurança só aumentava e eu comecei a ter medo. Os vultos riam e eu podia ter certeza que ouvia passos atrás de mim. Seria paranoia ou seria alguém?

 

 

 

  00:12

 

  Com o tempo fluindo, restou apenas um homem caminhando atrás de mim. Pelo que eu pude ver, em poucos nuances, ele era alto, encorpado e estava inteiramente vestido de preto, portava uma mala grande, mas não pude analisar muito e não me importei, pois tudo o que queria era chegar em casa.

  No entanto, a cada rua que eu virava, lá estava ele. Apressei o passo o máximo que pude, avancei diversas quadras, estava ficando difícil de respirar, mas quando olhei novamente para trás, vi apenas o seu vulto sentar-se na calçada olhando o chão. Segui mais alguns metros rapidamente e parei um pouco para descansar, mas então surgiu algo que gelou minha espinha.

  — Vejam só, rapazes, o que temos aqui? — disse um sujeito, saindo do beco e acompanhado de outros cinco, todos com cicatrizes e cabelos estranhos. Mas não importava, corri o máximo que pude em fuga.

Um deles conseguiu me agarrar, o chutei nas partes baixas e ele me soltou, agonizando.

  — Vadia Maldita! — vociferou enquanto se retorcia.

Lembrei do homem da maleta que vinha atrás de mim, talvez estivesse a algumas poucas quadras dali, talvez ele tivesse um telefone e pudesse me ajudar. Corri com todas as minhas forças naquela direção, mas já estava cansada, e eles, por outro lado, ainda não. Antes que pudesse virar a primeira esquina, me pegaram e me arrastaram até o beco. Gritei e me debati, mas não adiantou. Não havia ninguém.

  Resisti o máximo que pude! Mordi, arranhei, soquei, chutei! Não importava se isso teria efeito ou não, eu não ia ceder. Em contrapartida, me espancaram várias vezes, mas aquele a quem apliquei o chute foi o que mais aproveitou, desferindo socos, geralmente na minha barriga. E então começaram a tirar minhas roupas. Implorei para que não fizessem isso, pois meu noivo não se casaria comigo. Em resposta, aquele que parecia ser o líder, deu um soco em meu rosto, gritando:

  — Cala a boca! — O gosto de ferro se materializou em minha língua. Minhas pernas, partes do meu corpo e meu rosto doíam, ao mesmo tempo pareciam anestesiados.

  A partir daí só conseguia pensar no quão culpada eu era por ter permitido que isso acontecesse, por ter sido desleixada ao perder o ônibus e tão desatenciosa ao ponto de ser pega. Talvez se tivesse corrido em vez de lutar, gritado mais. Devia ter vindo de jeans, quem sabe...?

  E enquanto eles discutiam sobre quem iria primeiro, eu pensava na humilhação que teria que passar na delegacia, no rosto dos policiais me encarando, nos olhares de pena das minhas irmãs, do meu pai e do meu noivo. Se ainda estivesse viva depois de tudo isso.

  Por um pequeno momento tive esperança assim que vi o vulto de um homem em frente ao beco. Ele olhou para nós e pensei que diria para pararem ou chamaria a polícia, mas tudo o que ele fez foi recuar. Naquele instante eu entendi a única verdade que consegui formular: Eu não fui salva, porque não merecia ser salva.

 Toda a minha vontade de viver, minha percepção e consciência se foram. Dizem que isso é o cérebro tentando se proteger, mas eu ainda sentia aquelas mãos ásperas e sujas me envolvendo de forma brusca, dos tapas e dos socos, do cheiro fétido daqueles homens e o gosto de ferro.  Mas, em meio à humilhação, consegui ouvir algo. Passos... passos apressados. Vi na escuridão um vulto em frente ao beco. Os homens pararam, houve vozes, ameaças, uma pergunta... e um ‘não’.

  Os movimentos foram rápidos e desprovidos de pena, os homens gritaram de dor, seus corpos se chocaram contra a parede e o chão. Um deles disparou contra o vulto, mas este não pareceu afetado e avançou. O rapaz próximo a mim me agarrou, colocando algo frio contra a minha cabeça após vociferar alguma coisa. Ele gritou, enquanto um líquido negro e quente escorria sobre meu ombro. Sangue. Logo em seguida me soltou, enquanto a sombra avançava. No instante seguinte, fiquei inconsciente.

 Quando despertei no outro dia, eu estava na minha cama. Meu corpo doía e minha cabeça parecia querer estourar. Foi então que meu mundo quebrou, desabei no desespero, no choro e comecei a tremer convulsivamente, me sentia humilhada, enojada, suja!

  Minha colega de apartamento chegou logo depois. Como a porta estava aberta, entrou e levou horas para que eu conseguisse explicar o que aconteceu naquela noite. Ela quis ligar para a polícia e eu implorei que não fizesse isso. Disse que ninguém deveria ficar sabendo e tentou por diversas vezes me convencer, mas me neguei a ceder.

  Mas as dúvidas permaneceram: Quem havia me salvado? Como encontrou e entrou na minha casa? Como pôde derrotar meus agressores?  Até que minha amiga encontrou a bolsa em cima da mesa, estava aberto e ao lado dela jaziam: uma conta de luz com meu endereço grifado e meu celular na tomada com o GPS ligado — aparentemente ele deveria ter usado o dele e deixado isso para mostrar como chegou nesta casa — e depois achamos a chave do meu quarto no trinco pelo lado de fora.

  Eu não imaginava quem teria feito tudo aquilo. Inicialmente, minha amiga e eu pensamos que fosse obra do vigilante de Corsário: o Temerário ou a Caveira, que era como os chamavam. Mas naquele mesmo dia recebi a notícia de que meus agressores foram brutalmente espancados, alguns até em coma, com vários ossos quebrados e diversas fraturas, e isso, certamente, não é nada comparado ao que fizeram comigo.

 Contudo, houve algo que deixou minha colega e eu paralisadas: os que podiam falar confessaram o crime, ou melhor, os crimes, porque eu não fui a única a quem eles tentaram abusar, no total foram mais de dez.

Porque confessaram? Por arrependimento não foi. Foi medo!

 

  — Depois de ter espancado a gente... — disse com dificuldade o rapaz com o rosto parcialmente enfaixado, enquanto a outra parte agonizava de forma humilhante para dizer a verdade. — Ele disse que devíamos confessar nossos crimes e, se não nos entregássemos... — ficou desesperado, enquanto sua respiração falhava — Ele... iria encontrar a gente... e finalizar...

 

 

 

*******

  

— Dois dias depois, eu tinha um nome e um vídeo, Doutora. Não foi um homem quem fez aquilo e também não foi um anjo. Foi um fantasma. Um assassino fantasma.

  — Entendo — disse a mulher à minha frente. O nome dela era Érica Fernandes, uma psicóloga de Corsário.  — Fico muito feliz que tenha, posteriormente, decidido compartilhar sua experiência e procurar ajuda. É difícil para algumas pessoas relatar esse tipo de experiência.

Eu me inclino sobre a cadeira e indago insegura:

— A senhora não vai se incomodar se eu não contar qual é meu nome verdadeiro?

Ela se levanta da cadeira e fica de frente comigo:

— Acredito que seja uma conduta inadequada, mas abrirei uma exceção confiando que você se abra mais comigo — disse a psicóloga, me estendendo a mão gentilmente. — Vamos trabalhar nisso juntas. — Apertei sua mão mais segura de mim mesma e passamos um bom tempo conversando.

 


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Notas finais do capítulo

Para escrever esse prólogo foi necessário, muita pesquisa, seja de documentários a respeito do assunto, artigos relacionados (o seriado Law & Order: Special Victims Unit, também ajudou consideravelmente e é claro os depoimentos (que me fizeram suar frio) Mas tenho que agradecer profundamente a Natália (não tenho autorização para divulgar seu nome), ela foi minha guia, puxou a minha orelha quando preciso e me ajudou na tentativa de fazer desse prólogo o mais verossímil possível, ainda que eu não seja o mais indicado para tratar sobre o assunto. Não desejo tomar a fala de ninguém, apenas desejo fazer uso da ficção para expor a realidade ao nosso redor (o mais assustador é que isso é realidade e não ficção).



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