Não consegui dormir à noite. Tudo o que aconteceu passava pela minha cabeça, as coisas de Madrid e tudo o que eu vivi até agora em Buenos Aires. Toda vez que uma cena passava pela minha cabeça eu pensava em uma maneira diferente que eu poderia ter agido naquela momento. Eu poderia ter sorrido, dito o que estava pensando ou até mesmo gritado mais alto...

Nos poucos minutos que eu conseguia fechar os olhos o meu subconsciente me levava para longe, para os meus piores pesadelos e na maioria das vezes eu me sentia afogando, engolindo toda a água e tomada pela solidão. Ninguém iria me ajudar? Era nesse momento que eu acordava sem conseguir respirar, coberta de suor e o que me restava era encarar a escuridão do quarto. Eu me encolhia na cama, abraçando os meus próprios joelhos em uma posição fetal. As lágrimas desciam e eu só torcia para não dormir novamente.

...

Maria: Nós não iremos demorar muito – ela falava enquanto enxia mais uma xícara de café – Seu pai chegará perto das 23:00 eu provavelmente terei que ficar até mais tarde.

Violetta: Tá tudo bem – só concordei com a cabeça.

Maria: Eu não gosto de deixar você aqui sozinha.

Geralmente eu não demorava tanto tomando o café da manhã, mas quando acordei hoje descobri que o meu pai já tinha saído para trabalhar e tanto ele como a minha mãe só retornariam quase de madrugada. Às vezes eles acham que eu não percebo, mas a relação deles está desgastada a muito tempo, papai acha que eu nunca percebi que quando morávamos em Madrid ele chegava em casa tarde da noite, bêbado. Ele nunca conseguiu ser sutil com as mensagens que ele escondia.

Tinha dias que eu conseguiu escutar alguma discussão dos dois e logo depois o som dos choro da mamãe acabava mais ainda comigo. Às vezes eu ia até ele e a consolava, dizia que ia ficar bem, mas como eu posso servir de apoio para uma pessoa se eu mesma estou desmoronando?

Eu tento ao máximo não preocupa-los, eles não sabem muito sobre tudo o que aconteceu e como eu me sinto. Eu apenas sorriu e concordo com a cabeça, e por trás dessa máscara eu estou quebrada. Eu me perdi, eu sei.

Violetta: Eu vou ficar bem – sorri para ela – Eu tenho que ir.

Levantei da mesa, peguei uma maçã e guardei na bolsa. Dei um beijo na sua bochecha e fui em direção à rua. O grande desafio era lembrar do caminho que eu tinha feito com o León ontem, eu tenho um bom senso de direção, mas talvez ele tenha falhado um pouco. Entrei em três ruas errada antes de encontrar a certa.

Quando vi os quatro prédios da escola foi que eu congelei. Eu teria que encara-los... Todos eles. Como eu iria explicar o motivo deu ter saído correndo da livraria ontem? Como eu iria encarar o León depois dele ter me visto chorando? Eu sou muito idiota mesmo, eu deveria ter apenas dito um não ontem, pegado um livro novo e saído da livraria. Mas não, Violetta Castillo sempre tem que cavar mais ainda a sua própria cova.  

León: Oi! – ele apareceu por trás me fazendo dar um pulo de susto – Desculpa, não queria te assustar – ele disse rindo.

Violetta: Oi – falei baixo e voltei a caminhar em direção à escola.

León: Pelo visto você aprendeu o caminho – ele começou a caminhar ao meu lado.

Violetta: Sim... – e então o silêncio tomou conta.

León: A sua primeira aula será de Biologia? – confirmei com a cabeça – Se quiser eu posso te mostrar a sala, tenho aula de filosofia agora e salas ficam uma do lado da outra.

Violetta: Tudo bem – olhei para ele por um estante e agradeci com um sorriso.

Quando chegamos no gramado ele seguiu em direção ao prédio 3 e eu continuei na sua cola. Não vi o pessoal em lugar nenhum, talvez já estivessem na sala, o que por hora eu agradeceria muito. Fomos até o segundo andar e ele parou na frente da sala 306. Algumas pessoas já estavam lá dentro, incluindo a Camila que quando nos viu acenou.

León: Está entregue senhorita – ele disse fazendo um tomo de voz diferente, inconscientemente eu ri.

Violetta: Obrigada – agradeci, ele sorriu e virou as costas indo em direção a sua sala, mas antes dele dar mais um passo eu o chamei – León!

León: Sim? Deseja mais alguma coisa da minha pessoa? – ele continuou fazendo aquela voz e fez uma pequena reverência.

Violetta: Para com isso – eu ri – Eu só queria pedir desculpas.

León: Desculpas pelo o que? – ele pareceu confuso.

Violetta: Por ontem... E-E tudo o que aconteceu – eu olhei para o chão.

Eu não sei quanto tempo passou, mas sei que a cada segundo que eu olhava mais para o chão e o León me encarava com os seus olhos verdes, mais envergonhada eu ficava por tudo o que aconteceu ontem. Por fim senti a sua mão no meu queixo, fazendo com que eu o encarasse. Ele sorriu antes de falar qualquer coisa e abaixou a mão.

León: Você não precisa pedir desculpas, nós não deveríamos ter insistido você a ir. Só queremos fazer você se sentir em casa, nós não nos conhecemos direito – ele deu sorriso de lado – E você é simplesmente uma caixinha de surpresa – o sinal toco assim que ele terminou a frase e ele se aproximou me dando um beijo rápido na bochecha e seguindo para a sala ao lado.

Eu teria passado uns 30 minutos parada lá tentando entender o que tinha acabado de acontecer, mas vários alunos começaram a entrar na sala e alguns esbarraram em mim. Puxei minha mochila para mais perto do corpo e entrei logo na sala.

Camila: O que foi que aconteceu ali? – ela logo perguntou assim que eu me sentei em uma cadeira do lado dela. Ela tinha um sorriso presunçoso no rosto, como se já soubesse a resposta, mas mesmo assim perguntou.

Violetta: Não sei... – falei abaixando a cabeça e me afundando na carteira, mas eu podia sentir um pequeno sorriso formado nos meus lábios.

....

Talvez eu tenha tomado essa decisão rápido demais. Era 17:40 e eu estava em casa, sozinha assistindo um programa de culinária quando decidi que iria ao cinema. O que eu tinha a perder? Se eu não gostasse poderia vir para casa a qualquer momento, mas é um filme da J.K., quem não gostaria?

Eu tomei um banho rápido e vesti uma calça jeans preta e coloquei uma blusa rosa regata bem soltinha, calcei meu all star e peguei uma jaqueta preta. Aí chegamos no problema número 1: Eu não sabia para qual cinema eles iriam. Cheguei à conclusão de que se eles fossem sair talvez se encontrariam na livraria, então tudo certo, era só ir para a livraria. Só que chegamos no problema número 2: Onde estava a porcaria da chave? Eu juro que deixei em cima da mesinha da sala, eu lembro muito bem de ter entrado e jogado ela lá em cima, ou foi na bancada da cozinha?

Depois de muito procurar a encontrei pendurada no porta chaves ao lado da porta. Lugar obvio, não? Já são 18: 12. Talvez eu não encontrei mais eles por lá, mas é melhor tentar. Corri até a livraria e pela vitrine eu já consegui ver todos eles lá. Eles estão esparramados nos puffs e o León estava com uma cara de impaciente.

Eu parei um momento antes de entrar e respirei fundo. Quando empurrei a porta e o sino avisou a minha chegada todos olharam logo para mim. Senti minhas bochechas esquentarem, eu desviei o olhar deles por um segundo.

Violetta: Oi – falei baixo.

Camila: Quem bom que você resolveu vir Vilu.

Eu olhei para ela, o “Vilu” me pegou de surpresa.

Camila: Tudo bem te chamar assim?

Violetta: Não tem problema.

Francesca: Eu estou pronta – ela saiu apresada da área de funcionários da loja – Violetta? Ainda bem que você resolveu ir, eu e as meninas estávamos planejando fazer algumas compras depois do filme, o que você acha?

Violetta: Talvez seja legal... – desviei meu olhar para o León que estava me olhando com um sorriso um tanto tímido no rosto.

Maxi: Então vamos indo, já estamos um pouco atrasados graças a italianinha aí!

Francesca: Eu não me atrasei de propósito!

León: Você sempre diz isso – León foi até a porta a área dos funcionários e se inclinou um pouco para dentro – Mãe, já estamos indo!

Ouvi como resposta um tudo bem e um divirtam-se. Nós seguimos para o lado de fora da livraria e quando ele chegou ao meu lado me encarou.

León: Fiquei surpreso por você ter decidido vir.

Violetta: Como você disse: Eu sou uma caixinha de surpresa – também olhando para ele corando logo em seguida.