Dois Verões escrita por Mia Lehoi


Capítulo 26
O mesmo erro


Notas iniciais do capítulo

Feliz natal (quase atrasado) gente! ♥



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Algum tempo depois, a turma estava de volta dentro do salão, quase todos embrulhados em toalhas para tentar tirar pelo menos um pouco da água das roupas e dos cabelos. Os funcionários já começavam a recolher os itens de decoração e preparar o local para os próximos eventos, mas permitiram que os jovens continuassem ali por mais um tempo.

— Então galera, quais são os planos pra agora? – Cebola perguntou – Meus pais ainda não decidiram se vão alugar um apartamento pra mim ou me colocar numa república... – comentou, pensativo.

— Os meus estão pensando em ir pra São Paulo comigo. – respondeu Marina – Lógico que vamos manter nossa casa aqui no Limoeiro, né... Mas eles não querem ficar longe de mim de jeito nenhum! – riu.

— Vai sobrar alguém aqui no Limoeiro além de mim? – Nimbus perguntou, arqueando as sobrancelhas.

— Eu vou sossegar aqui por um bom tempo. – disse Aninha, feliz por finalmente estar de volta. – Acho que vou começar um curso de design de interiores ano que vem.

— Eu também não saio daqui tão cedo. – continuou Jeremias – Quero manter esse trampo que eu tô por pelo menos mais um ano. – completou, dando uma olhadinha para a morena que deu uma risada animada. Titi, por outro lado, encarou a interação dos dois amigos com aborrecimento.

— Carmem, é verdade que você vai sair do país? – questionou o dentuço, tentando desviar o assunto.

— É. Vou estudar moda na França. – a patricinha respondeu dando de ombros, como se fosse a coisa mais casual do planeta.

— Vou sentir sua falta, Carmita. – Denise sorriu para a amiga, logo recebendo um sorriso em resposta. Por mais que todos acreditassem que a amizade delas sempre fora falsa, as duas meninas tinham muito em comum e gostavam muito uma da outra.

— Bobagem gata, quando estiver por aqui vou fazer questão de te visitar no seu campus.

— Quando a gente vai se reunir de novo, hein galera? – Cascão prosseguiu a conversa. Ele mesmo só sairia do Limoeiro daqui a algum tempo, mas sabia que alguns dos amigos iriam antes.

— Então... – Xaveco deu um sorriso meio sem graça – Amanhã eu desço pra praia de novo. Vou passar uns três dias lá, depois vou visitar a base da Hoshi com a minha irmã e acho que quando voltar já vou direto pro campus. – contou, coçando a própria nuca. Observou os olhares tristonhos dos amigos e se sentiu um pouco mal por não compartilhar aqueles últimos dias de férias com a galera.

Era um pouco egoísta a decisão de se afastar de todos num momento como esse, ele sabia. Mas precisava ficar um pouco sozinho. O ano seguinte traria muitas mudanças e o loiro só queria se ocupar com outras coisas e esquecer o que sentia por Denise de uma vez por todas. Tinha certeza de que, como o destino parecia odiá-lo, os dois esbarrariam muitas vezes na faculdade e seria muito mais difícil conviver com isso se ele não se permitisse esse tempo para pensar.

Depois dessa revelação, a conversa prosseguiu. A maioria do pessoal que sairia do Limoeiro só iria mais para o fim do mês, então tentaram combinar alguns programas juntos. Porém era notável que as coisas nunca mais seriam como eram no colégio.

A ruiva rolou na cama pela milésima vez. Tateou a mesinha de cabeceira em busca do celular. Já era quase meio dia e até agora ela não conseguira pregar os olhos por um segundo sequer.

Estava se sentindo um tanto idiota. Honestamente, aquele era um sentimento com o qual já estava até se acostumando. Sabia que só não estava feliz ao lado do garoto que amava por culpa de seu orgulho bobo, porém continuava não fazendo nada a respeito.

E apesar de a festa de Marina ter sido incrível, ela saíra de lá se sentindo péssima. Ver os amigos tão felizes juntos parecera esfregar em seu rosto o quão idiota ela mesma vinha sendo. A cereja do bolo foi quando o loiro anunciou que já iria embora. Sabia que estudariam no mesmo campus, no mesmo prédio e talvez tivessem até algumas aulas em comum, mas não seriam mais os mesmos.

Ele com certeza não seria mais o mesmo. Xaveco mudara muito nessas semanas desde o início da viagem. Até mesmo o olhar um tanto apaixonado que ele sempre sustentara por ela parecia não estar mais lá. Era como se ele se esforçasse ao máximo para ficar o mais longe possível, evitando-a como se ela nem estivesse lá.

Queria odiá-lo por isso. Na verdade queria odiá-lo por qualquer razão que fosse, apenas para se livrar de todas as borboletas que ele lhe causava, mas era impossível. Sabia que ele se afastara para se proteger, para tentar esquecê-la, para poder seguir em frente com sua vida. Ela mesma fizera isso por anos a fio desde que conhecera Xavecão.

Obviamente a tática não funcionara.

Olhando novamente o teto branco do quarto, ela se deu conta de como o Xaveco do futuro parecia tão distante agora. Quando ele apareceu da primeira vez, ela se apaixonou quase instantaneamente. Na época não soube explicar o porquê, se era apenas pelo corpo escultural, ou pela maneira apaixonada com que ele a olhava. Hoje a razão era clara: por baixo de todo o desdém e distanciamento, ela sempre amara aquele menino.

Ele era muito diferente de Xavecão hoje em dia. Um pouco menos preocupado e confiante, um pouco mais bem-humorado e bobão. Ainda assim, os dois eram claramente ele. E Denise sentiu naquele instante que mesmo que vivessem um milhão de realidades paralelas diferentes, ela o amaria em todas elas.

De repente todas as coisas no mundo deixaram de ter importância e sua única preocupação foi dizer tudo isso a ele. O relógio tornou-se seu pior inimigo. Não sabia que horas ele tomaria o ônibus para a praia e rezou internamente para que ele ainda estivesse no Limoeiro.

Procurou o número dele na agenda e ligou apressadamente, sentindo o coração disparar e a respiração falhar a cada toque que o telefone dava. E quando a mensagem gravada avisou que ele estava fora da área de cobertura, ela sentiu a garganta fechar.

Sentou-se na cama, parando pra pensar. Podia deixar pra lá, ou tentar ter essa conversa mais tarde, quando ele estivesse em casa. Mas parecia tão urgente que ele soubesse disso o mais rápido possível... Já perdera tanto tempo não tendo coragem de se arriscar que cada segundo a mais de espera parecia sufoca-la.

Suspirou pesadamente, decidindo que agora não voltaria atrás. Não perderia esse rompante de coragem por nada.

Buscou o número da irmã dele na agenda. Ela atendeu logo no segundo toque, não dando tempo nem para que a ruiva planejasse o que ia dizer.

— Denise? — perguntou, a voz obviamente incrédula.

— Oi Xabéu... – ela começou, suspirando pesadamente. – Eu... Er... O seu irmão já foi embora?

Hm... Você...— ela começou, parecendo pensar se devia ceder aquela informação ou não – Ele já foi pra a rodoviária, mas acho que o ônibus só sai às duas.— respondeu por fim.

— Sério?! – a menina praticamente saltou da cama, abrindo um sorriso sincero.

Sério. — a outra deu uma risadinha – Se você correr ainda dá tempo...

— Merda! – gritou, sem pensar, ao ver que já mais de uma da tarde. – Ai desculpa Xabéu... É que... Ah, deixa! Eu hm... Preciso desligar! – gaguejou, tentando desesperadamente calcular uma rota para a rodoviária que não levasse tanto tempo.

Eu chego aí em cinco minutos.

— O quê?

Eu chego aí em cinco minutos, ué.— ela riu – Que tipo de irmã eu seria se deixasse ele viajar sem ouvir essa coisa tão importante que você tem a dizer? — continuou, com o mesmo tom meio debochado que o menino usava às vezes. – Cinco minutos. Esteja pronta. – e desligou.

Denise encarou o telefone, perplexa. Levou alguns segundos para se dar conta do que estava acontecendo e se levantou num salto, logo encarando a própria imagem no espelho. Estava uma bagunça, os cabelos desalinhados, sem maquiagem nenhuma, ainda vestindo pijama e tudo.

Correu até o banheiro para escovar os dentes e dar um jeito nos cabelos. Na pressa acabou deixando-os soltos mesmo, só penteando para tirar um pouco do volume. Vestiu uma calça jeans qualquer, quase caindo ao enfiar o pé no buraco que fizera no joelho. Colocou a primeira blusinha que encontrou e encarava suas maquiagens pensando no que passar quando ouviu a buzina do carro lá fora. Com uma rapidez invejável, enfiou a chave de casa, a carteira e o celular numa bolsa e correu pra fora gritando um “mãe, eu já volto!” já na porta de casa.

Encontrou Xabéu sentada no banco do motorista com um sorrisinho animado. A loira não demorou nem um segundo para dar a partida, correndo mais do que parecia sensato pelas ruas do limoeiro, enquanto a ruiva ofegava no banco do passageiro, tentando não ter uma síncope nervosa e ao mesmo tempo decidir o que dizer.

— Eu imagino que ele seja muito importante pra você estar desse jeito. – a mais velha sorriu, sem desviar os olhos do caminho. A outra não respondeu simplesmente porque não conseguia dizer uma palavra sequer tamanha a ansiedade.

— Xabéu eu... Er... – ela começou, quando já estavam chegando no terminal rodoviário. – Não sei nem como te agradecer.

— Nem precisa. – ela sorriu, parando o carro logo na entrada, embora não fosse permitido – Agora vai lá!

Denise sorriu e saltou do carro, checando o grande relógio pendurado na parede que avisava que faltavam quinze minutos para as duas. Desesperada, ela procurou o painel com os embarques e desembarques, tentando encontrar o local onde ficava o ônibus dele. E assim que descobriu só pode correr, numa cena digna de filme romântico, esbarrando nas pessoas, os cabelos voando com a velocidade, os pulmões pedindo por uma pausa para pegar um pouco mais de ar.

Avistou o ônibus à distância, o motorista já entrando para começar sua rota. Por um segundo ela achou que fosse tarde demais e embora soubesse que sabia muito bem como chegar à casa de praia, queria fazer isso aqui e agora. Então reuniu um pouco mais de coragem, antes que perdesse aquele momento. Sem saber nem como, pulou a catraca que separava os passageiros dos passantes, ignorando os gritos do segurança, que logo foi atrás dela.

— Ei menina! – ele gritou, prestes a alcança-la. Alguns passageiros e o motorista do ônibus observaram a cena, intrigados. – Você não pode ficar aqui! – continuou, fazendo-a parar.

— Eu... – ela começou – Eu só preciso chamar uma pessoa e... Eu juro que vai ser rápido! – pediu, com os olhos enchendo d’água.

— Olha moça, se eu for deixar todo mundo que pede pra entrar... – ele suspirou pesadamente – Eu posso pedir pra alguém chamar essa pessoa aí, mas o ônibus já tá pra sair e... – o senhor foi interrompido por uma vez que a menina parecia conhecer de cor.

— Denise? – ele chamou, às duas costas. Quando ela se virou o viu lá, do mesmo jeito de sempre, com os cabelos uma desordem absurda, um fone de ouvido pendurado no pescoço e uma expressão mais confusa do que nunca.

Ela não conseguiu nem pensar. Ignorou o segurança, os passageiros, os funcionários, o mundo inteiro, e correu para abraça-lo de um jeito que já desejara fazer um milhão de vezes e nunca tivera coragem.

Já não se importava mais. Mesmo que se apaixonar por ele acabasse sendo equívoco, ela escolheria cometer o mesmo erro um milhão de vezes.


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Notas finais do capítulo

Alguém aí leu o título do capítulo e pensou "ah não, lá vem Xavenise estragar tudo de novo!"? hahaha
Na verdade esse título está aí por uma razão muito especial: é o título da música Same Mistake do James Blunt (mais precisamente a versão do Boyce Avenue) que me deu a ideia da fic! (e que apareceu na minha primeira fic de TMJ, que escrevi em 2008! hahaha :P)
Não tenho muito o que dizer sobre esse capítulo, só pedir desculpas pela demora, o que já virou costume, né? Ah, creio eu que o próximo seja o último. ):
Feliz natal e um ano novo maravilhoso pra vocês!