Dépendance escrita por KarenAC


Capítulo 15
Capítulo 15 - Impulsos


Notas iniciais do capítulo

Capítulo gigante, socorro D:



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Na vida, não existem soluções. Existem forças em marcha: é preciso criá-las e, então, a elas seguem-se as soluções.

Antoine de Saint-Exupéry

 

Ladybug sentia as pernas sendo colocadas uma em frente à outra e o cenário à sua volta se modificar aos poucos. Ela estava andando, se movendo, mas apenas por instinto, apenas por reflexo. Alguém segurava sua mão firmemente, motivando-a a seguir, mas ela não sabia quem era ou para onde estava indo.

“Nós precisamos correr! Vamos!” ele gritava, puxando-a, mas ela não sabia o motivo.

Um estrondo alto sacudiu o chão e gritos se espalharam pelas ruas. Um zumbido agudo preencheu os ouvidos de Ladybug, abafando os sons do lado de fora. Ela respirou poeira pura e tossiu, o cheiro misturado de terra com fios queimando sua garganta. Sua cabeça girava.

“Nós já estamos quase lá, quase lá.” a voz repetia as palavras, volta e meia sumindo dentro do zumbido que ondulava na cabeça de Ladybug.

Sentiu o vento gelado entrar pelo meio dos seus cabelos, jogando-os contra o seu rosto, e notou que eles haviam se soltado em algum momento daquela noite das presilhas onde normalmente os fixava antes de sair de casa. No segundo seguinte, quando piscou, percebeu que estava dentro de um elevador.

“Quase lá.” a voz rouca repetiu novamente, e ela girou o pescoço para ver Chat Noir a seu lado.

O olhar verde estava fixo à frente, as sobrancelhas franzidas sob a máscara. Então era ele que falava com ela aquele tempo todo. Quando notou o olhar sobre si, ele virou a cabeça e olhou para ela, lançando-lhe um olhar preocupado.

“Você vai ficar bem.” por algum motivo Ladybug sentiu que ele falava aquela frase mais para si mesmo do que para ela, todavia concordou, balançando a cabeça devagar “A Tikki acabou de chegar aqui, o Plagg me avisou pela escuta.” Chat levou a mão até a orelha, retirando o aparelho “Eu disse que nós estávamos a caminho. Ele acabou de desligar.”

Ladybug sentiu os ombros começarem a doer pela tensão acumulada e fez menção de erguer os braços para massageá-los, mas algo em sua mão direita a mantinha presa. Quando desceu os olhos, percebeu que os dedos de Chat Noir estavam entrelaçados firmemente nos seus.

“Pode me soltar?” ela sentiu a voz sair raspando em um murmúrio baixo, como se não usasse as cordas vocais há anos.

“Não.” Chat respondeu desviando o olhar do dela, e o capuz cobriu seus olhos, impedindo-a de enxergar o semblante dele “Não até chegarmos lá em cima. Quero ter certeza que você está consciente e que não vai fazer nenhuma besteira.”

“Eu estou consciente.”

“Eu ainda não tenho certeza. Não vou arriscar.” ela sentiu os dedos dele pressionarem os dela levemente e não discutiu mais.

As portas duplas do elevador se abriram uma para cada lado, e Chat saiu à frente, com Ladybug em seu encalço. Ambos estavam quase lado a lado, a energia que emanava da mão dele era o que a impulsionava de seguir. Com certeza se ele não estivesse ali, ela já teria corrido.

 

Corrido para onde, Marinette?

Para qualquer lugar que você vá, vai levar destruição com você.

 

Ela sentiu um soluço prender na garganta e silenciou até ver a porta da agência. A porta havia sido trocada e as fechaduras reforçadas, e o que antes era uma placa de acrílico temperado sinalizando o nome da agência em letras desenhadas, agora era uma placa de vidro à prova de balas. Chat ergueu o punho e bateu quatro vezes na porta que abriu alguns segundos depois. Plagg apareceu com um cigarro aceso no meio dos lábios e franziu a testa ao pousar os olhos em Ladybug. Chat passou por ele, arrancou o cigarro em um puxão e trouxe Ladybug atrás de si. Plagg grunhiu e fechou a porta.

Antes que qualquer um pudesse falar, Tikki andou em passos rápidos até Ladybug, abraçando-a com força e apoiando a cabeça no ombro da garota.

“Me desculpa.” ela disse com uma voz embargada “Me perdoa. Me perdoa ter te colocado nisso tudo.” no final da frase, a voz de Tikki já havia sido consumida pelos soluços.

Ladybug abriu os braços devagar, fechando os olhos e apoiando o queixo na cabeça de Tikki, abraçando a amiga com carinho. A culpa não era de Tikki. Não era da Miraculous. Ela não deixaria a Papillon lhe convencer daquilo. Sabia o quanto Plagg e Tikki se esforçavam para manter a cidade em segurança e quantas vezes haviam insistido que ela não pegasse missões que achavam muito perigosas. Eles se importavam com Paris. E se importavam com ela.

“Não é sua culpa, Tikki.” Ladybug respirou fundo, sentindo as forças voltarem aos poucos no calor do abraço de Tikki “Não é culpa de nenhum de vocês.” e novamente ela sentiu as lágrimas correrem pelo próprio rosto.

Atrás das duas, Chat Noir estava de costas, os braços cruzados sobre o peito e o olhar perdido sobre as coberturas do prédio que podiam ser vistas das grandes janelas de vidro no fundo da agência. A fumaça cinza subia no meio do céu escuro de Paris, e até ali eles conseguiam sentir o cheiro de queimado. Plagg olhou para a postura de Chat e sentiu uma ruga correr sobre a testa. Sabia o quanto devia estar sendo difícil para ele lidar com tudo aquilo. Sentiu o peito apertar pensando no que aconteceria quando Chat descobrisse que por baixo da máscara de Ladybug estava correndo perigo quem mais ele tinha se esforçado para proteger.

“Vamos tomar algo quente e conversar.” Plagg quebrou o silêncio profundo da Miraculous, indo em direção à cafeteira.

“Eu vou fazer um chá.” Tikki andou até Plagg que lhe deu um abraço forte e inclinou-se, afastando a franja cor de rosa para lhe dar um beijo na testa “Aposto que vocês só tomaram café enquanto eu estava fora.” ela sorriu para Plagg enquanto sentia o beijo, repreendendo-o.

“Só você mesmo pra sorrir desse jeito e me xingar ao mesmo tempo.” Plagg debochou de Tikki e Ladybug sorriu com o calor que emanava do casal. Eles eram perfeitos um para o outro.

Ladybug secou o rosto com as costas das mãos e ergueu os olhos, vendo Chat virado para a janela, de costas para todos eles. A expressão corporal indicava que ele estava se fechando, se isolando de tudo o que estava acontecendo à volta. Ela então se aproximou devagar e colocou a mão no ombro dele delicadamente.

“Hey.” ela falou baixinho, vendo os olhos dele pousarem sobre os seus, uma sombra negra se afastando devagar do seu rosto no momento em que ele ergueu a cabeça.

“Como você tá?” ele falou baixo, esperando a reação dela, e Ladybug sacudiu os ombros.

“Não sei ainda.” ela respondeu murmurando “Parece que quanto mais respostas eu acho, mais perguntas aparecem.”

“Bem-vinda ao meu mundo.” as palavras saíram no meio de um sorriso de dor.

Ladybug abriu os olhos mais do que o normal quando notou a mão dele vir em sua direção e esfregar-lhe a bochecha com o polegar delicadamente.

“Fuligem.” ele disse simplesmente e mais uma vez o silêncio tomou conta do espaço entre os dois.

Plagg e Tikki conversavam baixo no canto da sala, burburinhos misturados ao cheiro do chá de maçã que começava a invadir a agência. O aroma acordou o estômago de Ladybug, e ela notou que não comia há horas. Ergueu o pulso para olhar o relógio e suspirou pesadamente.

“O que foi?” Chat perguntou, descruzando os braços.

“Eu preciso voltar pra casa logo.” Ladybug gemeu, passando as mãos no rosto.

“Você não pode ir pra casa hoje.” Chat falou baixo, como uma ordem que não deveria ser discutida, voltando o olhar para a janela.

“O quê?” inclinou-se na direção dele, como se não tivesse entendido o que ele havia dito.

“Você não pode ir pra casa hoje. Não é seguro.”

“Seguro? Meus pais estão lá, Chat. Eu não posso deixar eles sozinhos!” ela sentiu que a voz começava a se alterar.

“Não interessa. Você é mais importante.”

Ela se irritou com as palavras dele. Não permitiria que ele insinuasse que seus pais não tinham importância ou que os colocasse em perigo. Nunca. Ladybug cerrou os dentes e sua raiva cresceu ao notar que a arrogância na voz dele lembrava-a de Adrien.

“Você não tem palavra no que eu faço ou deixo de fazer.” ela girou a cabeça na direção dos prédios, franzindo a testa, e viu ele suspirar a seu lado.

“Posso não ter, mas não muda o fato de que você não pode proteger eles, Ladybug. A Miraculous sim.” o tom dele era impassível.

“Proteger como!?” ela notou que a voz saiu alta, todo o cansaço da noite empilhando em seus ossos “Como protegeram a Tikki!? Como me protegeram!? Eu fiquei presa em uma merda de uma sala com um cara do outro lado ameaçando destruir tudo o que eu amo!” ela bradava, os punhos fechados ao lado do corpo “E onde você estava!? Onde você estava, Chat!?”

 

Não é isso que eu quero dizer.

Não é isso.

Eu quero dizer que eu estou com medo, Chat.

Eu estou morrendo de medo.

 

“Eu estava fazendo o que nós fomos lá pra fazer, Ladybug! Qual é o problema com você?” ele se virou totalmente na direção dela, a testa franzida furiosamente.

“O problema comigo é que ninguém me conta nada! Ninguém me diz o que tá acontecendo! A cada dia que passa alguém aparece com algo novo que eu deveria saber, e isso tá me enlouquecendo!” ela sentia as mãos tremerem, as palavras pronunciadas em desatino. Plagg a ouvia com a expressão dura no rosto, enquanto Tikki não tirava os olhos do chão.

 

Me digam o que está acontecendo.

Por favor, me digam o que está acontecendo.

 

“Se tem coisas que você ainda não sabe é porque tem pessoas tentando te proteger.” Chat disse em um tom severo, com a paciência nos limites “Você deveria agradecer por isso.”

“Eu não quero ser protegida.” ela baixou a voz, os tremores ainda tomando conta do seu corpo “Eu não quero ver as pessoas machucadas por minha causa. Isso tá me matando, Chat!” ergueu os olhos para ele, o rosto retorcido em fúria “Você não sabe como isso faz me sentir, você não-“

“EU NÃO SEI!?” Chat bradou antes mesmo que ela pudesse terminar a frase, inclinando-se na direção dela, a voz ecoando por toda a agência como um trovão “Você acha que eu não sei!? Que eu nunca estive onde você está agora!?” ele se aproximou dela com o dedo em riste, fazendo-a recuar “Enfia nessa cabeça que todo mundo aqui tá no mesmo barco! Nós não somos seus inimigos!” o dedo dele tremia no ar, a voz entrecortada de raiva.

Ladybug deu um tapa na mão de Chat Noir, e o estalo seguiu-se de um silêncio aterrorizante onde Ladybug e Chat se olhavam ofegantes, ambos de olhos arregalados.

Chat Noir pressionou os punhos fechados nas têmporas como se pudesse segurar os pensamentos lá dentro, como se pudesse trancafiar as palavras, os dentes à mostra no meio de um rugido frustrado. Não podia explodir daquele jeito. Não podia. Ele olhou na direção dela como se fosse continuar falando, mas saiu a passos largos, dirigindo-se para a sala do fundo da agência onde ficava o depósito. Se ficasse mais um segundo sequer ali, iria explodir. Plagg seguiu atrás dele em passos calmos.

Ladybug estava com um pé atrás e as mãos altas, como se algo fosse atacá-la a qualquer minuto, mas baixou-as assim que viu Tikki se aproximar em passos silenciosos com uma xícara na mão e uma cadeira na outra.

“Aqui, senta e toma isso.” a voz de Tikki era como veludo para os ouvidos de Ladybug depois dos gritos de Chat Noir, e a garota obedeceu sem pestanejar, deixando o corpo cair sobre a cadeira e juntando a alça da xícara entre os dedos, sorvendo um gole do líquido quente nos lábios trêmulos.

“Eu perdi o controle, Tikki.” Ladybug choramingou com os lábios presos na xícara.

“Perdeu, mas todos estamos á flor da pele hoje. Foi uma noite difícil.” Tikki respondeu pausadamente.

“Ele não tem direito de falar assim comigo.” Ladybug resmungou.

“Não tem, mas você também não tem direito de falar com ele assim.” Tikki repreendeu, mas a voz era tão suave que soou mais como um conselho.

“É, eu sei que fui.” Ladybug suspirou pesadamente, sabia que Tikki tinha razão. Ela sempre tinha “Mas não vou deixar meus pais correrem perigo por minha causa, Tikki.” ela sentiu os dedos apertarem ao redor da xícara “Você me disse que isso não aconteceria.”

“E não vai. Eu e o Plagg já pensamos em tudo.” Ladybug ergueu o rosto na direção de Tikki, a esperança crescendo em seus olhos “Daqui a alguns minutos vai chegar na caixa de correio dos seus pais duas passagens com tudo pago para uma viagem para a Flórida que eles ganharam em um suposto sorteio. Três semanas. Até lá tudo deve se resolver por aqui.” Tikki baixou a cabeça, mexendo nos dedos onde antes haviam anéis, uma mania que adquirira ao longo dos anos.

Ladybug franziu a testa, a cabeça percorrendo cada canto do plano em busca de falhas enquanto olhava o rosto plácido de Tikki.

“É seguro?” Ladybug sentiu-se perguntar enquanto engolia a seco. Lembrava das palavras do homem dentro do Teatro Adyar e da maneira que ele falara fazia parecer que tinham controle sobre tudo.

“Mais do que qualquer coisa.” Tikki sorriu confiante “Já acionamos a Miraculous de lá para darem proteção extra também. É a nossa melhor agência. Colocamos uma mensagem no seu quarto avisando que você saiu mais cedo para a escola para usar a biblioteca. Quando sua mãe for te acordar para a escola, ela vai ver o bilhete e se acalmar. Isso deve manter seus pais tranquilos por mais algumas horas até você voltar.”

Ladybug respirou fundo, sentindo-se mais leve. Seus pais sabiam o quanto ela andava preocupada com o trabalho de História, então o bilhete funcionaria. Sempre se impressionava como Tikki sabia das coisas mesmo sem saber. Ela nunca a decepcionava. Já não tinha tanta certeza quanto a Chat e Plagg. Pensando nos dois, lançou um olhar para o fundo da agência, notando um sentimento de culpa tomar conta do seu peito.

“Você foi bastante dura com ele.” Tikki pegou a xícara vazia das mãos de Ladybug e se levantou.

“Eu sei.” ela entrelaçou os dedos das mãos uns nos outros, sentindo-se envergonhada.

“Vai lá. Vocês precisam conversar.” Tikki sorriu e inclinou a cabeça na direção do depósito da Miraculous, caminhando em passos delicados até a pequena sala que eles usavam como cozinha.

Ladybug colocou as mãos sobre os joelhos e impulsionou o corpo para cima, os músculos começando a esfriar e ficarem doloridos. Ela andou até o depósito e notou as vozes de Plagg e Chat conversando.

“Ela não sabe, Chat. E se você não contar, ela nunca vai saber.” Plagg murmurava em um tom de consolo e Ladybug colocou as costas na parede do lado de fora da porta aberta, não querendo interromper a conversa.

“Eu sei, eu sei que não. Eu sou um idiota.” Chat grunhiu e Ladybug precisou conter um sorriso.

“Bom, isso aí ela sabe!” Plagg riu e gemeu em seguida, e Ladybug imaginou que Chat havia dado um soco nele.

“Eu não quero assustar ela.” Chat falou baixo, quase um sussurro, e Plagg suspirou.

“Não tem como impedir isso, bichano. Você sabia que mais cedo ou mais tarde a sua vida ia vazar na dela. Parceiros, lembra?”

“É, mas eu achei que podia impedir.”

“A gente nunca sabe do futuro.” Plagg falou com uma voz que fez com que ele parecesse muito mais velho do que realmente era, e Ladybug imaginou que o moreno também já devia ter passado por maus bocados na vida “Esquece o passado, Chat. Ele já foi, já acabou.”

“Não acabou, Plagg! Essa merda não acaba nunca!” Ladybug percebeu pelos sons que Chat andava pela sala “Quanto mais eu tento limpar esse buraco, quanto mais eu cavo, mais fundo ele parece!” ele respirou fundo “Eu não sei por quanto mais tempo eu vou ser capaz de lutar contra isso tudo.”

Ladybug piscou ao ouvir um estouro próximo ao seu ouvido e arregalou os olhos. Pequenos pedaços do reboco caíram no chão em um farfalho suave. Alguém tinha batido na parede com força. Ela mordeu o lábio inferior em nervosismo e grudou mais ainda o corpo na parede.

“Não me vem com essa merda, Chat. Eu não quero ouvir isso da sua boca nunca mais, tá entendendo? Nunca mais. Não vou deixar você se afundar de novo.” a voz de Plagg era ameaçadora, o tom baixo e rouco de uma ordem que ninguém seria capaz de desobedecer “A gente já passou por isso uma vez, e vamos passar de novo. Eu tô aqui dessa vez. E tem a Tikki e a Ladybug. Você não tá sozinho. Não mais.” a ameça na voz se tornou ternura e Ladybug ouviu Chat soluçar.

“Eu não posso, Plagg. Não posso manter vocês tão perto. E agora ela tá passando por tudo isso por minha causa também.” Ladybug sabia que ele estava falando ela, e trancou a respiração na garganta.

“Você precisa parar com isso, Chat. Nada disso é sua culpa. Nada.”

“Mas você sabe-“

“Eu sei! Eu sei!” Plagg gemeu “Mas agora o problema é outro, tá bem? Os pais dela vão ser mandados pra América do Norte. A nossa melhor agência é de lá, eles vão estar em segurança. A pergunta que eu quero te fazer é outra. Ela vai estar em segurança aqui?” Plagg perguntava, e Ladybug ergueu a sobrancelha.

“Vai.” Chat respondeu sem pensar duas vezes.

“Vai? Por que você precisa estar no seu melhor estado pra que isso aconteça. Você sabe, né?” Plagg perguntou novamente, como se querendo ter certeza da resposta.

“Sei.”

“Então respira fundo e vai lá falar com ela, porque se a Papillon fizer vocês brigarem as coisas só vão piorar. Vocês precisam estar em sincronia, ela precisa de você agora.”

“Ela nem deve querer olhar na minha cara agora.” Ladybug sentiu as sobrancelhas torcerem em tristeza. Ele levava os sentimentos dela mais em consideração do que ela imaginava. Tinha sido injusta com ele, muito injusta.

“Ela é mais fácil de lidar do que parece. Vai lá e conta o que você tem que contar pra ela.”

“E se ela-“ Chat começou, mas não conseguiu terminar.

“Tu pensa demais, bichano. Chega disso, é hora de agir. Só vai lá e fala com ela, tá bem?”

Ladybug baixou os olhos ao notar que Plagg saía pela porta. O moreno olhou na direção dela com um sorriso calmo, como se soubesse o tempo todo que ela estava ali, e fez sinal com a cabeça para que ela entrasse. Plagg viu Ladybug andar para dentro do depósito e chegou à sala principal da agência, onde Tikki lhe alcançava uma xícara de café.

“Café?” Plagg perguntava, com a testa franzida. Tikki não gostava que Plagg tomasse tanto café. Dizia que ele ficava insuportável de tão elétrico.

“Vou te dar um desconto hoje, você merece.” Tikki colocou-se na ponta dos pés e tocou os lábios dele com os seus delicadamente.

“Eu tô precisando de um desconto, aqueles dois tão me enlouquecendo.” Tikki riu vendo Plagg sentar-se na cadeira giratória atrás da própria mesa.

“Não dá pra culpar eles.” ela deu um gole na própria xícara sorrindo enquanto sentava na cadeira de madeira do outro lado da mesa “Ele me lembra você quando era novo.”

“Quando eu era novo? Você tá me chamando de velho?” Plagg empurrou a cadeira giratória na direção dela.

“Nunca!” ela arregalou os olhos, sorrindo debochadamente ao ver ele se aproximar “Até porque se eu disser que você tá velho, é a mesma coisa que dizer que eu tô velha, e nós dois sabemos que isso é uma mentira.”

Plagg riu por alguns segundos enquanto via Tikki beber o chá de olhos fechados. Ele sentiu o próprio sorriso sumir do rosto e levou a mão até a xícara dela, tirando-a das pequenas mãos e colocando-a sobre a mesa à frente dos dois. Ela o fitou com uma pergunta no olhar que logo foi respondida quando ele a puxou em um abraço que a tomava por inteiro.

“Eu não consigo sem você. Nunca vou conseguir nada sem você” a voz de Plagg estava abafada no pescoço de Tikki que passava os dedos levemente no meio dos cabelos morenos.

“Você consegue qualquer coisa, biscoito, e a prova disso é que eu tô aqui agora.” ela sorria, pensando que desde que fora levada da Miraculous a única coisa que a mantinha firme e forte era pensar em voltar para os braços dele “Mas juntos nós conseguimos mais ainda.”

Plagg ouviu o apelido que Tikki usava para adereçá-lo desde que começaram a namorar e não conseguiu segurar o que sentia. Tikki notou que o ombro da sua blusa começava a ficar úmido. Ele estava chorando, mas ela preferiu manter-se em silêncio. Sabia o quanto Plagg tinha dificuldade em demonstrar certos sentimentos. Tikki então beijou o topo da cabeça dele e os dois ficaram ali, recolhidos em silêncio e calor.

Ladybug estava parada na porta do depósito, os olhos baixos nos dedos que se entrelaçavam em vergonha por ter estourado com a pessoa que menos merecia.

“Desculpa.” Chat não havia visto Ladybug parada à porta e se virou em surpresa quando o murmúrio dela o acordou de seu estado pensativo.

“Você não tem pelo que se desculpar.” ele sentou-se no chão, encostando-se nas caixas empilhadas no fundo da sala, parecendo subitamente muito exausto “Mas se acha que tem, eu também tenho. Me desculpa.” ele baixou a cabeça para o próprio colo e notou na visão periférica que ela caminhou e sentou-se ao lado dele.

“Tá tudo bem. A gente não devia brigar.” ela grunhiu ao final da frase “Eu tinha que aprender a me controlar melhor.”

“Não é fácil.” Chat admitiu “Pra nenhum de nós.”

Ladybug fitou-o pelo canto do olho e viu que ele ainda tinha o olhar pousado sobre o colo. Queria saber o que estava passando pela cabeça dele, mas tinha plena consciência de que ele não lhe entregaria as informações de graça. Ele era o tipo de cara que escondia tudo o que podia, e agora ela começava a entender o motivo. Lembrava do olhar que ele fizera para ela no meio do corredor do teatro quando vira o cartão da Papillon. Lembrava da expressão de dor, de preocupação.

“Chat...” ela começou, juntando coragem “A gente pode conversar sobre o que aconteceu hoje?”

“Pode.” ele respondeu vagarosamente, como se pesando a resposta.

“Tinha um cara” ela começou baixando os olhos para as mãos “Ele me trancou naquela sala, me disse um monte de coisas.” engoliu a seco, tentando colocar as ideias em ordem.

“Nós não precisamos falar sobre isso se você não quiser.” Chat murmurou.

“Não, eu quero falar. Eu preciso falar.” Ladybug levantou o rosto e olhou Chat seriamente “Porque se eu não falar, você não vai falar.”

Chat suspirou e esfregou a palma de uma das mãos na testa. Apenas alguns dias de convivência e ela já o conhecia tão bem. Da mesma forma, ele conseguia lê-la como um livro. A ligação que eles tinham era algo que ele não sabia explicar.

“Eu vou te fazer uma pergunta, mas você não precisa responder, tá bem?” Ladybug assentiu olhando para ele no momento em que Chat girou o pescoço na sua direção para falar com ela “O que eles têm?”

“Como assim?” ela não tinha entendido a pergunta.

“Sobre você. O que eles têm sobre você que te impede de dizer que não vai trabalhar pra eles? Que te deixou daquele jeito lá no Teatro?”

Ladybug flexionou as pernas, abraçando-as enquanto descansava o queixo nos joelhos. Ela lembrava do seu nome pronunciado atravessando a porta de madeira da sala de projeção do teatro e invadindo seus ouvidos. Eles sabiam quem ela era. As piores pessoas que já haviam cruzado seu caminho sabiam sua identidade, e ela se perguntava se algum dia aquilo tudo se resolveria sem terminar em morte e sangue. O pensamento lhe arrepiou.

Olhou para Chat Noir que a mirava em expectativa, esperando uma resposta que ela tinha medo de dar. Se perguntava se o que sabiam sobre ele era tão ruim quanto aquilo. Será que eles também sabiam a identidade dele? Será que aquela expressão que ela vira no rosto dele era por aquilo? Se ela não falasse, ele nunca contaria.

“Eles sabem quem eu sou.” ela então pronunciou em um sussurro “Por baixo da máscara.”

“Desde quando?” ele perguntou calmamente, mas ela sentia que as palavras estavam duras, como se ele estivesse escondendo raiva.

“Não sei. Não faço ideia.” ela suspirou, percebendo que não estava tão nervosa quanto achava que ficaria ao contar aquilo para alguém. Podia ser o fato de ser ele, e conteve um sorriso pensando que, no final das contas, ele era alguém com quem ela sempre podia contar “Depois do que aconteceu hoje à noite, eu percebi que passei todo esse tempo escondendo a minha identidade das pessoas que eu confio pra que logo as que eu não confio descobrissem.” ela gemeu em frustração “Talvez se eu não tivesse tantos segredos, eles não seriam tão difíceis de manter.”

“Faz parte da nossa vida, Ladybug. Os segredos podem te consumir por dentro, mas se você não os proteger, as pessoas os julgam ou os usam contra você.”

Ela ouviu as palavras e entendeu exatamente o que ele quis dizer. O que os pais dela iriam pensar se soubessem o que ela faz durante as noites enquanto eles dormem? Seus amigos talvez entendessem, mas seus pais não. Eles nunca permitiriam que ela continuasse naquela vida. Contar para eles seria o mesmo que dizer que não faria mais aquilo, e ela sabia que o caminho a ser percorrido ainda era longo para deixar tudo para trás. Ainda tinha muita coisa naquele mundo que ela queria consertar antes de desistir da vida de Ladybug.

“Eles sabem? Sobre... você?” ela perguntou timidamente, se referindo à Papillon saber a identidade de Chat.

“Não.” ele murmurou.

Ladybug baixou os olhos para o chão, o queixo repousando nos joelhos e os dedos agarrados firmemente nas pernas contra o corpo. Então, naquela sensação, ela estava sozinha.

“Aquele cara na sala de projeção disse que tinha algo sobre a Miraculous que eu não sei, e que isso me faria aceitar entrar pra Papillon. Ele falou sobre...” ela fez uma pausa, tentando pescar as palavras no fundo da cabeça “Farfalle?”

Chat Noir gemeu e dobrou os joelhos apoiando os cotovelos neles e afundando o rosto nas mãos.

“Eu não quero falar sobre isso.” a voz dele saiu abafada no meio das mãos.

“Chat...”

“Eu não quero falar sobre isso, Ladybug.”

Ela sentiu que ele estava se fechando novamente. Seja lá o que tivesse acontecido com ele, estava guardado a sete chaves, mas a cada segundo que se passava, ela tinha mais certeza que precisava saber tanto quanto ele precisava contar. Eles precisavam falar sobre aquilo.

“Eu preciso saber, Chat. E só você pode me falar sobre isso.”

Chat bufou no meio das mãos, e ergueu o rosto para o teto, suspirando pesadamente.

“A Farfalle é a divisão da Papillon onde eu trabalhei.”

Ladybug inclinou-se para trás como se tivesse recebido um golpe. Ela não conseguia acreditar nos próprio ouvidos. Chat trabalhara para a Papillon? Ele era um deles? Imaginou-o sendo o homem ameaçando-a por trás da porta do teatro e um violento calafrio correu pela sua espinha, atingindo sua cabeça como uma corrente gelada.

“Você é-“ ela titubeou.

“Era. Eu era de lá. Já saí há muito tempo.” ele falava como se estivesse com dor, e ela percebeu o quanto aquilo era difícil para ele.

“Por quê?” a pergunta dela era pequena, mas a resposta era tão complicada que Chat ficou em silêncio por muito segundos antes de responder, escolhendo palavras que chegaram simples e diretas.

“Eu não tive escolha, não na época.”

“Eu me pergunto se eu tenho.” Ladybug disse pensativa, encolhendo os joelhos e apoiando o queixo sobre eles.

“Eu estava sozinho, não tinha experiência nenhuma. Eles queriam o que eu tinha, não quem eu era. Eu fui um alvo fácil. Não é o seu caso.” ele sorriu tristemente na direção dela.

“Você acha que eu sou diferente?” ela estava surpresa.

“Você tá brincando?” ele parecia incrédulo com a pergunta dela “Olha tudo o que você pode fazer! Olha pra você! Você é incrível!” ele falou aquilo com um grande sorriso no rosto e mais intensidade do que planejou e viu Ladybug corar, pigarreando a seguir para esconder a vergonha.

“O-Obrigada.” ela gaguejou, olhando para o chão enquanto o rosto aquecia.

Os dois averteram olhares, tentando se distrair com outra coisa no ambiente que não fossem os braços que roçavam um no outro cada vez que respiravam. Chat Noir coçou a nuca embaixo do capuz do uniforme, sentindo a vergonha acumular sob a pele. Não queria fazê-la se sentir desconfortável, mas não havia mentido. Ele lembrava como tinha sido destruído a primeira vez que se deparara com toda aquela situação pela primeira vez, mas ali estava ela, quebrando, mas segurando todos os próprios pedaços no colo para que quem dependia dela também pudesse se sentir seguro.

Ele desejou tê-la conhecido quatro anos antes, quando tudo havia começado, para que ele o tivesse ensinado a ser forte. A lutar contra tudo aquilo sem se perder completamente. A proteger o que ele amava. E uma tristeza imensa cresceu no peito dele ao fechar os olhos e pensar em Marinette.

Ladybug aproximou-se ao lado dele, e ele não se moveu. Deixou o calor lhe invadir, sentindo-se inebriado com o cheiro do cabelo dela que havia se soltado, permitindo-se sentir humano e afundar-se nas sensações que ela lhe passava. Já havia esquecido como era ser humano. Havia esquecido como era se comportar, como era se relacionar com outras pessoas. Fechou os olhos e inspirou o perfume dela, sentindo a testa franzir.

 

Será que eu posso, Ladybug?

Posso ser humano hoje?


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Notas finais do capítulo

Nota: Farfalle é borboleta/mariposa em italiano, assim como Papillon é borboleta/mariposa em francês ;3

Eu podia ter dividido esse capítulo em dois, mas eu gosto de sofrer e botei tudo num só!
ALGUÉM ME MATA PFVR! HAIUEHIASUHEIUSAHE!
Obrigada por lerem :~~~
Please, favoritem e comentem que eu tô me matando nas escritas pra seguir essa fanfic xD