Registro Panorâmico escrita por Titi


Capítulo 22
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Notas iniciais do capítulo

Aí vai outro...



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 O pregador pediu que quem estivesse disposto a aceitar a Jesus e se batizar, fossem até a frente enquanto a Naomi cantava. Seu timbre era tocante, acho que o mais tocante que eu já ouvi... Muitas pessoas se levantaram, entretanto eu não fui uma delas. Hebrom deu uma olhada lenta em mim, parecia triste por eu não ter ido. Então ele se levantou.

—Por que você vai lá? Já não é batizado? –perguntei.

—Sou. Mas estou sempre disposto a aceitar a Jesus todos os dias da minha vida. –o sorriso que ele deu naquele momento foi o mais sincero de todos.

Deu um aperto no coração... Eu não sei o motivo, já eu não acredito naquilo. Eu... Eu não sei o que deu em mim. Eventualmente eu fui rude... Deve ter sido isso.

Depois que tudo acabou, nós fomos lá pra fora. As pessoas cumprimentaram umas às outras. Salamander me deu um abraço longo e disse num tom baixo:

—Eu te amo. Espero que você volte mais vezes. Foi um prazer ter uma amiga como você aqui comigo.

—Hebrom? –uma moça com sobrepeso e um bebê no colo chamou a atenção do garoto.

—Oi! Ah, que lindinha! Eu vi as fotos! Como ela está? Foi tudo bem? –ele respondeu.

—Sim! Você quer segurar?

—Claro! –pegou a criança nos braços.

—Quem é essa? –a senhora se referiu a mim.

—Minha amiga, eu a convidei pra vir hoje. –o bebê abriu os olhos e começou a chorar. –Eh... Toma. –Salamander foi devolver.

—E-Eu posso segurar? Eu juro que vou tomar cuidado! –perguntei à mulher. Nunca me deixaram segurar uma criança daquele tamanho.

—Pode! Sem problemas. Não precisa jurar. –ao ouvir a resposta dela, Hebrom colocou a criança no meu colo.

Ela parou de chorar! Até eu fiquei surpresa.

—Você leva jeito com crianças... –ele comentou.

—Obrigada. Eu sempre quis ter filhos...

—Filhos?!

—Sim.

—Eh... Com quantos anos você pretende casar?

—Casar? Eu não quero casar.

—Você quer ter filhos, mas não quer casar?

—Isso. Qual o problema?

—E... E se um cara que gostasse de você... Por exemplo, de verdade, gostasse muito... E quisesse casar com você... Você aceitaria?

—Se ele prometesse me dar filhos, talvez.

Calúnia, eu nunca vou casar.

—Ela é sua namorada? –a mãe da criança perguntou. Eu tinha até esquecido que ela estava ali, de vela...

—Não, não. –ele respondeu por nós, me olhando estranho.

—Flor, tem um cara lá fora dizendo ser teu irmão e pediu pra te chamar. –Tamaris veio avisar.

—Ah, tá bem... –fui andando.

—Minha filha! –a moça exclamou.

—Ih, é! Foi mal aí. –entreguei o neném.

—Espera um pouco, né? –Hebrom reclamou e deu um beijo na minha mão e sorriu. –Vou com você até lá fora.

—Vocês não vão ficar para a entrega dos livros? –ela perguntou.

—Eu vou, mas a Qué já vai agora... –Salamander respondeu.

Lá fora nós encontramos o Zacur fazendo alvoroço com um garoto que sofria de albinismo Hebrom foi até os dois tentar apartar a possível briga e pediu pra eu esperar. Só que eu preferi ir com ele.

—O que houve com vocês? Isso não é lugar pra discutir...

—Garoto anfíbio, o teu irmão está tentando me convencer a voltar pra cá à força... De novo.

—Ahm... Pierre, se você não quer... Por que aceitou o convite dele? –o de olhos verdes replicou.

—Educação.

—Entendo... Mas por que estão debatendo desse jeito?

—Se o teu pai estivesse aqui, ele não ia gostar nada dessa tua história de ser espírita só pra encontrar com ele! Aliás, você sabe muito bem que não é ele, né? Você sabe muito bem que a Bíblia que você estudou a vida inteira diz exatamente o contrário! –Zac finalmente estava se manifestando.

—Dane-se! Como você disse, ele não está aqui. E se eu quiser fazer alguma coisa pra mudar isso AGORA, o problema é meu, não acha?

—Tá, tá, que seja! É o único ponto em que você está certo! Mas se aceitou vir até aqui por educação, você devia ao menos continuar com a educação e ouvir a pregação sem ficar se questionando! Fazendo perguntas idiotas que você sabe a resposta! Isso irrita! Tira a minha concentração!

—Ah, me desculpa! Não sabia que era tão importante pra você! Pode deixar que eu não volto mais aqui!

—Pierre... –o mundo de Hebrom parecia ter caído quando o outro disse aquilo.

—Me perdoa, Hebrom, mas não dá pra aguentar esse teu irmão. Espero que isso não mude o nosso relacionamento.  Permaneça tranquilo, eu tenho ciência de que você respeita as minhas crenças. Fiquem com Deus. –o albino foi embora.

—Zacur, você não deveria fazer assim... Não é briga que vai fazer alguém se interessar pelo teu cristianismo... –o garoto de olhos verdes falou.

—E do que você tá falando? Você também não é perfeito!

—Em momento nenhum eu disse que sou... –olhou pro chão.

Fatos psíquicos de Hebrom

Pierre e Zacur estavam rixando no pátio da igreja... Eles eram melhores amigos... Eram. O meu irmão começou a falar em francês comigo, obviamente ele queria que ninguém entendesse além de mim. Ele havia começado a falar os meus defeitos, me culpou pela amizade dele ter acabado... Depois começou a dizer “Ou você se esqueceu que esse amor que você tem por essa menina é jugo desigual? Era isso que eu estava querendo falar com você outro dia! Detesto quando você banca o bom-moço!” e foi embora...

Bem, eu estou tentando esquecer isso... Ele deve estar bravo pela namorada estar longe. Não quero estragar o Sábado por isso. Afinal, ele é dedicado a uma Razão muito mais importante. Pedi desculpas para Quésia e fomos procurar o seu irmão.

Fatos psíquicos de Quésia

Encontramos o meu irmão com a melhor expressão de raiva que ele conseguia fazer. De início, eu achei que fosse uma brincadeira.

—Por que você não me disse que era ESSA a igreja?!

—Como que não te disse, Edgar? Eu escrevi e coloquei na porta da geladeira, do jeito que você pediu. –falei.

—Não foi isso que eu quis dizer! Se eu soubesse que era essa a religião desse Zinho aí, nem deixava você andar com ele!

—O que há?! Tsc! Se você tem repulsa à crença dele, por que não entrou lá logo pra me levar?

—Nem morto que eu piso naquele centro de macumba!

—Ahm... Com licença... O nome da religião deles é “Umbanda” e não “macumba”... E não, não somos umbandistas. –Salamander foi contestar.

—E o que é que você tem contra umbandistas? Vocês não se dizem cristãos, a única igreja verdadeira? Hereges ridículos.

—Não temos nada contra eles. Senhor, o que você acharia de eu te chamar de uma coisa que você não é? Você não diria o contrário?

—Urr, durr, não vem bancar o moralista pra cima de mim, não, garoto! E sai de perto da minha irmã! Não quero ela andando com gente dessa seita podre.

—Senhor Cortês, sem querer interromper o diálogo entre você e o meu filho, mas... Sabe, de fato, o que seria uma “seita”? –Ramon apareceu tão calmamente quanto o filho em meio àquela cena.

—Ramon... Que nojo de você. Se eu soubesse que esse menino era obra tua, teria jogado uma pedra nele da primeira vez que veio falar comigo. Foi bem interessante a maneira que você o educou pra ser come-quieto igual a você.

—Você não quer parar e conversar com mais calma por aqui? Eu posso trazer um copo d’água. Você parece tenso... Eu gostaria muito de saber o motivo desse ódio para conosco...

—Eu não vou perder meu tempo tretando com religiosos fanáticos! Vamos embora daqui! Diz pra esse teu projeto de carola pra ficar bem distante da minha menina. –Edgar me pegou agressivamente dos braços do Hebrom e me pôs no carro.

—Que fogo foi aquele, Edgar?

—Fogo? Eu? Não fui eu que fiquei dando em cima de um beato qualquer! Eu não quero mais você perto dele, tá ouvindo?!

—Dependendo do que você me disser, eu vou pensar em obedecer.

—Ui, como você é rebelde! Vida louca! Uiiii! Até me arrepiei!

—Por que você tem tanto preconceito com a religião deles?

—Você não faz ideia das coisas que eu já ouvi falar e li na internet...

—Você tirou tuas conclusões pelo o que as pessoas disseram e não por uma experiência própria?! Sem sequer ter provas?!

Eu sei que não tenho muita moral pra dizer isso... Mas deu pra fazê-lo ficar quieto por um tempinho.

—A senhora está proibida de ver aquele garoto, certo? Certo. –ele disse enquanto abria a porta de casa.

—Não. Não pode fazer isso!

—Já fiz, bonitinha. Nem adianta vir com chororô pra cima de mim. E desfaz esse biquinho aí, aquele teu ex-namorado não tá aqui pra te beijar.

Subi as escadas e bati a porta com raiva. Não dava pra acreditar naquilo!

—E pode fugir de casa se quiser, essa cidade minúscula é umas trinta vezes menor do que você pensa! Vou te achar rapidinho!

Agora que ele proibiu, deu mais vontade ainda de falar com ele... Mandei uma mensagem, mas o Hebrom não respondeu. Espero que ele não seja lerdo ao ponto de deixar de me ver só porque me irmão rodou a baiana... Acho que eu me apaixonei. Como se eu já não tivesse passado por coisas horríveis de mais.


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Notas finais do capítulo

Acha mesmo, Quésia?



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