Por quê? Vocês aí em baixo! Por que não olham para a Lua, a tão bonita e brilhante lua? Todas as noites ela olha para vocês, e vocês...? Nada! Nem sequer a notam!

Por que não olham para a Lua? Seu brilho intenso, quase não é possível vê-lo! Vocês estão ofuscando-a com essas luzes artificiais. Apaguem essas luzes, deixem-na brilhar e iluminar suas vidas. Garanto que não vão se arrepender!

Pelo menos, eu não me arrependi... A Lua, iluminou minha vida... Enviou-me aquela menininha indefesa e ao mesmo tempo tão persistente: Mitsuki. Ainda me lembro daqueles momentos em que, eu lhe ensinava sobre o universo e contemplávamos a Lua.

Em um desses momentos expliquei que a Lua, apesar de ser brilhante, não emitia luz própria, apenas refletia a luz do Sol. Mitsuki me fitou com seus olhos grandes, pensativa, depois de um tempo, voltou-se para mim com seu sorriso contagiante, e disse: “Eichi, se eu sou a Lua, você é o meu Sol, sem você eu não poderia brilhar”.

Nesse dia, parecia que o calor havia crescido em meu peito e começava a brilhar, fortemente, Mitsuki, surpreendentemente, havia me tirado da solidão. Eu começava a amá-la.

Essa frase me foi muito importante, entretanto, também deixava uma dúvida no ar: se eu sou o Sol e ela a Lua, nunca poderíamos nos encontrar, nunca poderíamos viver juntos. Como resolver esse problema?

Não havia como resolvê-lo. Simplesmente eu seguiria a minha vida e ela a dela. Poderíamos nos encontrar apenas no Eclipse – que eu não me lembro do que significava, mas lembro de termos falado sobre o assunto –, que para nós significava: quando eu me tornar astrônomo e ela se tornar cantora, esse era o nosso Eclipse.

Mas a vida dá voltas e eu, Eichi Sakurai, morri e Mitsuki não sabe. Observo-a daqui de cima e posso ver que ela ainda tem em mente que nos encontraremos e continua pensando: “Eichi-kun, eu vou te alcançar”. É claro que eu adoro vê-la tão determinada, tentando ser o que sempre sonhou, mas há algo errado. Ela não deveria tentar seguir seu sonho pensando em me encontrar, vendo a mim como objetivo. Seu objetivo deveria ser sempre ela mesma, como realização de seus sonhos.

Pergunto-me o que acontecerá quando ela descobrir que eu não existo mais na Terra. Espero que seu brilho não desapareça. No momento em que morri, eu disse àquele shinigami que aquela não podia ser a minha hora, não enquanto não a reencontrasse. Mas era, nem eu, nem ele, poderíamos fazer nada, apenas aceitar.

Aquele shinigami é o mesmo que agora cuida da Mitsuki, posso ver que dentro dele, a mesma luz que nasceu em mim está para surgir. É por isso que vocês aí em baixo devem olhar mais para a Lua, é certeza que irão amá-la e darão mais valor a vida. Já disse e repito: deixem-na iluminar suas vidas. Nunca é tarde para vê-la.

Mas espera... Hoje ela não está como deveria! Está sumindo! Alguém faça alguma coisa! Olhem para ela! Notem que ela existe e que algo está errado!... Se a lua está estranha, como estará Mitsuki, minha lua?

Mal pensei nisso e já me movi para seu encontro. Não era lá que eu queria que ela estivesse, não naquela casa, onde um dia eu chamei de lar.

— O avião caiu... Ele e os pais estavam nele e... Não sobreviveram – dizia minha avó adotiva.

Agora, Mitsuki havia descoberto a verdade e fora puxada para as trevas do medo e desesperança. Seu brilho desapareceu... posso dizer que não por acaso a lua de agora também se encobria, como eu disse: Mitsuki é como a lua, na verdade, é a própria lua, portanto, não é de se admirar que seus sentimentos tenham sido refletidos.

Chega, desse jeito ela vai desaparecer para sempre! Vamos, seja forte Mitsuki! Tentei tocá-la, mas era impossível, com esse corpo (se é que posso chamar essa transparência de corpo) não consigo fazer nada. Por pouco ainda me lembro de quando era vivo – quando se fica entre a terra e o paraíso, aos poucos as memórias vão se desgastando –, tenho de me esforçar para lembrar dos detalhes. Por exemplo: eu já vi a lua desse jeito antes, mas quando? QUANDO?

O lampejo de um livro me veio a mente, meu livro favorito sobre lua a página específica sobre “Eclipse” se abriu a minha frente, eu lembrava da palavra, mas não de como realmente acontecia. É isso! Se for apenas um eclipse não tenho com que me preocupar, logo a lua voltará a brilhar e assim, a Mitsuki também! Com esse pensamento fiquei mais tranquilo.

Uma hora se passou, agora, a lua estava pela metade, encoberta pela sombra da terra. Mitsuki se ajoelhou frente a lápide onde fui enterrado.

A segunda hora começava. Mitsuki se dera conta de que tudo era verdade e a tristeza assolava seu peito. A Lua fora toda coberta pelas trevas da noite. Uma neve alva caia dos céus.

Três horas... Quanto mais isso demorará? Takuto, onde você está em uma hora dessas? Ela PRECISA de você! “Na verdade ela precisa do Eichi”, diria Takuto se me ouvisse agora, enciumado. Mas eu não posso fazer nada! Salve-a! SALVE-A!

Num gesto de desespero, toquei o ombro de Mitsuki novamente. E... consegui. Eu senti aquele toque!

— Eichi... – Mitsuki sussurrou bem baixinho sem se virar para me ver.

Se ela sentia o meu toque, será que ela poderia me ouvir também? Aquilo não era um bom sinal, não é? Afinal, sou um fantasma, que só continua vagando por esse mundo. Se ela me sente, então, ela também está desaparecendo, é isso?...

Ou será que, era aquele o momento que eu poderia encontrá-la? Aquele único momento em que o sol e a lua estariam unidos no céu também seria o nosso momento? Essa era a melhor das hipóteses.

Mas por que precisaríamos nos ver? A não ser que... afinal, por que eu continuo aqui?

— Mitsuki – falei e, como esperado, ela me ouviu e se virou com as lágrimas ainda escorrendo, com a face de surpresa – eu sinto muito, não consegui cumprir a nossa promessa e não estarei mais ao seu lado para te ver virar uma incrível cantora.

Mitsuki se levantara e ainda me olhava confusa. Eu também estaria se um fantasma estivesse falando comigo. Mas eu tinha que fazê-lo.

— Eichi!! Você está vivo?

Sorri de maneira triste e balancei minha cabeça em sinal negativo. Eu queria estar vivo, queria mesmo, mas não poderia. Nunca estaria novamente e ela teria que enfrentar o mundo sem a minha ajuda, mas mais importante que tudo...

— Eu sempre te observei desde que morri, eu não fui para o outro lado e acho que agora entendo o porquê – comecei a falar, olhando a garota de cabelos cacheados a minha frente – o motivo de eu não ter ido embora, foi você. Porque o modo como você está seguindo os seus sonhos, não é para ser assim.

— Eu só queria te reencontrar... – Mitsuki sussurrou em resposta – O motivo pelo qual eu canto era para minha música te encontrar. E mesmo assim... mesmo assim, eu não consegui – as lágrimas transbordavam em forma de desespero – Não consegui! Eu falhei!

— Não! Você não falhou, pare de se culpar. As coisas só aconteceram do jeito que tinha que ser! Por algum motivo resolvemos ir a uma viagem, por agum motivo era para eu estar naquele avião que iria cair, não dava nem para prever – toquei seu rosto, e eu sentia cada toque, como se estivesse vivo.

— Mas eu cantava para você! E agora? Como vou fazer? Não tenho motivos para continuar! – agora ela me olhava fixamente, ainda transparecendo a dor que sentia – eu pedi para o Takuto e para a Meroko, meus shinigamis, para me permitirem viver só mais um sonho antes de me levarem e assim eles fizeram: me emprestaram um corpo saudável e sem problemas nas cordas vocais, para eu cantar e te alcançar. Pelo menos agora, eles vão poder terminar o trabalho sem problemas, né? – sorriu.

Não eram aquelas palavras que eu queria ouvir. Não era aquela falta de esperança que eu queria. Não era. Aquela não era a Mitsuki que eu conhecia. Não com toda aquela fraqueza. E naquele momento, minhas lágrimas caíram. Acho que a muito tempo elas estavam lá, só esperando o momento certo.

— Você não é assim! Cadê aquela criança que me dizia que seria uma incrível cantora no orfanato? Cadê aquela menina que iluminava meus dias com a sua alegria? Cadê a lua encantada que eu conheci?

— Se foi quando descobriu que você nunca mais estaria por perto.

Retirei minha mão que ainda estava pousada no seu rosto. No fim, era exatamente como eu esperava que seria. Em parte, a culpa é minha. Não tinha como prever o futuro, por isso, não era bom que fizéssemos uma promessa, mas... Por trás da promessa havia um sentimento maior.

— Sabe, você já escreveu músicas, gravou um single, fez shows, cantou em rede nacional. O que você sentiu em todos esses momentos?

Mitsuki me olhou confusa, as lágrimas aos poucos paravam de cair, olhei para o céu e vi um pedacinho da lua voltando a aparecer, sorri de canto dos lábios.

— Eu sinto calor! – colocou as mãos sobre o coração e sorriu, fechando os olhos – É uma sensação de felicidade saber que em algum lugar alguma pessoa vai ouvir aquilo e vai sorrir. Ou melhor ainda, vai se sentir aquecida também! Eu quero alcançar as pessoas, quero transmitir amor, verdade, bondade, tudo, quando canto!

Respirou fundo e naquele fiapo de voz cantou parte da letra de “Myself”, seu primeiro single, que ela mesma tinha composto. Fiapo de voz porque o câncer em suas cordas vocais jamais teria permitido que cantasse para o mundo todo o amor que ela possuía. Obrigado, Takuto e Meroko, vocês permitiram que ela continuasse brilhando.

Doushite doushite suki nan darou

Por que, por que gosto tanto de você?

Konna ni namida afureteru

Por que não consigo impedir minhas lágrimas de cair?

Ano koro wa ushinau mono ga oosukite nani mo utaenakatta

Naquela época, perdi tanta coisa que não conseguia cantar

Sukoshi hanareta basho soko ga watashi no ibasho datta

Aquele lugar que você teve que deixar, era o lugar onde eu estava

         Então, ela abriu os olhos como num susto e levou uma das mãos sobre a boca. Ela também havia percebido. E quem sorria agora, era eu.

— Viu só? Por trás do sentimento de querer me alcançar, existe um muito maior que é o de alcançar outras pessoas! – cheguei mais perto e sussurrei em seu ouvido – Não era necessário que você me alcançasse, nunca foi! Eu já estava perto de você e você já estava no meu coração muito antes de nos separarmos. Eu sempre estarei com você, não importa a hora nem o lugar, então viva! – me afastei o suficiente apenas para ver seus olhos – E um dia a gente se encontra.

Não sei se ela sentiu aquele beijo, mas acho que sim, pois foi retribuído. Quando nos afastamos, suas lágrimas começaram a cair novamente, mas aquelas eram lágrimas de quem entendia as circunstâncias. Sorri para ela e Mitsuki acenou com a cabeça sorrindo daquela forma carinhosa que sempre teve. Aquela era a Mitsuki que eu conhecia!

— Mitsuki! – A voz de Takuto se fez ouvir, voando ao alcance dela. Ele parou abruptamente quando me viu. Eu apenas sorri e ele deve ter entendido que aquilo significava que tudo ficaria bem.

Não fiquei para ver como tudo aquilo continuaria. Engraçado como o momento do eclipse, do Sol e da Lua juntos no céu, foi o momento de meu reencontro com ela, no final, talvez, o objetivo tenha sido alcançado. Nem sempre as coisas são como a gente espera, não é mesmo?

Era chegada a minha hora, o eclipse tinha acabado, a Lua voltava a brilhar e com ela a luz para deixar a terra me foi oferecida novamente e eu aceitei. Não havia mais nada para fazer ali: havia alguém que poderia cuidar dela tão bem quanto eu faria e ela havia encontrado novamente forças para uma nova jornada na vida. Estava feito.

Aliás, você já viu a lua hoje?