Três Desejos escrita por Kayra Callidora


Capítulo 22
Capítulo Vinte




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Capítulo Vinte

— Poseidon, você não vai acreditar no que aconteceu!

A porta do quarto foi escancarada com um estrondo, dando entrada para a figura magra e baixinha de Helena, que entrava aos saltos no cômodo. Atena, ainda em estado sonolento, custou a abrir os olhos para encarar a criaturinha alegre, parada cheia de expectativa à sua frente.

— Oh, Atena, não sabia que estava aqui - Helena disse, a malícia inundando seu olhar. - Parece que teremos muito a conversar mais tarde. Onde está Poseidon?

Atena olhou para o lado da cama bagunçada onde Poseidon dormira, se espreguiçando no processo. Quando sentiu os lençóis roçando ininterruptamente sua pele, a realidade veio à tona como uma pancada. Ela se lembrou de tudo como num flash: dos beijos, dos toques, de roupas voando pelo quarto, dos braços de Poseidon ao seu redor... E pareceu que todo o icor se esvaiu de seu corpo.

— Pelos sete mares, você está bem? - Helena correu para o seu lado, assumindo uma feição preocupada. - Você ficou pálida de repente.

Helena encostou uma mão em sua testa, então em seu pescoço, e em seguida pressionou dois dedos em uma veia para medir a pulsação.

— Hey, eu estou bem - disse Atena, afastando gentilmente os braços da menina. - Mas não sei onde Poseidon está.

— Oh, não tem problema - Helena voltou a saltitar como um duende na frente de Atena. - Eu posso contar para você mesmo. Você não sabe o que aconteceu... ELE ME PEDIU EM NAMORO!

Atena franziu as sobrancelhas, confusa.

— Pensei que você já fosse casada.

— Ah, fala sério - Helena fez um gesto de desdém. - Faz anos que o meu "marido" nem olha para mim. Eu mereço muito bem um outro relacionamento.

— Tudo bem - Atena estava muito confusa e distraída, mas concordou. - Meus parabéns, então. Quem é ele?

— Hamish - Helena soltou um suspiro apaixonado ao pronunciar o nome, embora aquele dificilmente fosse um nome pelo qual Atena suspiraria. - Ele é um tritão. Trabalha no palácio. Tivemos alguns encontros...

— Eu que o diga - Atena murmurou, se lembrando dos gemidos.

—... Mas eu realmente não esperava por isso - Helena completou, com os olhos brilhando. - Foi tão lindo, Atena! Estávamos na praça da cidade, e ele se colocou de joelhos na frente de todo mundo e me propôs. Ah, eu quase perdi o chão!

Atena não queria imaginar qual seria a reação do general Dolfim ao descobrir que sua esposa estava namorando; ele não parecia se importar com ela na maior parte do tempo, mas o casamento ainda era uma fachada e um tabu importante trazido do mundo grego antigo, e os seres que carregavam essa herança o levavam muito a sério. E apesar de, no geral, Dolfim não parecer, de forma alguma, ameaçador, ele com certeza tinha motivos para ser nomeado general de exército. Por outro lado, Atena tinha o alívio da certeza de que Dolfim não ousaria mover um dedo contra Helena, não quando Poseidon era seu pai adotivo e defensor com unhas e dentes.

Atena preferiu não compartilhar essas preocupações com a menina, e ao invés disso, sorriu.

— Isso é incrível, Helena - Atena tentou soar empolgada, embora ainda se sentisse um pouco zonza. - Meus parabéns!

Helena apenas agradeceu e saiu saltitando porta afora, provavelmente prestes a contar a todos os seres vivos e não-vivos do palácio sobre seu noivado. Atena agradeceu porque a alegria da menina havia prejudicado seu senso de observação, ou ela teria reparado no comportamento estranho da deusa.

Atena respirou fundo. E respirou fundo de novo. E mais uma vez. Repetiu para si mesma que era uma deusa adulta e podia perfeitamente lidar com aquilo. Nada adiantou. No momento, se sentia como uma criança acometida pela consciência de ter feito alto muito errado.

Mas você não fez nada de errado. Tentou se convencer. Você nunca teve o voto.

Mas você não foi muito rápida? Outra parte de si contrapôs. Está parecendo mais uma das vadias atiradas que dão em cima de Poseidon.

Essa parte da sua consciência foi a que mais a aterrorizou. Era, na verdade, o que Atena mais temia. Afinal, depois de tudo, qual era a diferença entre ela e uma mortal qualquer se ela mesma havia transado com Poseidon no dia em que soube que ele, supostamente, a amava? Ele poderia muito bem ter dito "eu te amo" para mais um milhão de mulheres.

Mas não havia como negar, ela pensou com um sorriso envergonhado, que a noite passada fora diferente de qualquer coisa que Atena já tivesse vivido. Fora especial. Havia muito mais do que desejo nos toques, no cuidado de Poseidon, nos sussurros em seu ouvido, na forma como ele dizia seu nome. Mesmo que Atena sentisse aquele receio, sabia que nem todas as mulheres eram tratadas como ela fora na última noite.

O clique da porta do banheiro se abrindo foi como um tiro mortal. Atena paralisou na posição em que estava, olhando fixamente para o lugar de onde sua perdição viria. E ele veio. Veio como um anjo caído, os cabelos negros pendendo na frente dos olhos verdes e envolto em uma toalha branca da cintura para baixo.

— Ah, você acordou - ele abriu aquele sorriso que fazia o mundo de Atena desmoronar e se reconstruir, tudo em um segundo.

Atena tentou sorrir, mas no máximo devia ter exibido uma careta de sofrimento e empalidecido mais. Poseidon, como sempre, reparou em sua feição.

— Tudo bem, amor?

A pergunta destravou alguma função inerte de seu cérebro, e Atena conseguiu sorrir e se mexer.

— Claro.

Ainda parecendo desconfiado, Poseidon fez um breve "hum" e abriu o guarda-roupa. O pensamento de ter que se levantar veio sobre Atena como um segundo tiro. Ainda bem que Poseidon estava virado de costas para ela, ou ele teria visto a cor fugir ainda mais de seu rosto, e mesmo reparado na batida falhada de seu coração.

Com mais cuidado do que jamais tivera na vida, Atena enrolou um lençol em torno do próprio corpo e se levantou. Ela atravessou o quarto em passos leves, tentando chamar a mínima atenção possível, mas nem todos os seus esforços foram suficientes.

— Eu me pergunto... Para que o lençol?

Poseidon estava diante de um espelho, espiando pelo canto da moldura. Tinha um sorriso meio triunfante no rosto, que fazia Atena se sentir ainda pior.

— Eu não sei - Atena admitiu num murmúrio desesperado, o que resumia tudo o que ela sentia naquela manhã.

Poseidon caminhou até ela e pousou as duas mãos em sua cintura por cima do lençol, acariciando o local com os polegares.

— O que aconteceu dessa vez? Eu sei quando você está diferente, Atena. Foi a Helena que disse alguma coisa? - ele perguntou. - Eu acho que ouvi a voz dela aqui.

— Não, ela não fez nada - Atena se apressou em dizer.

— Então o que houve?

Atena queria falar. Realmente queria. Mas não sabia como expressar seu medo em voz alta sem soar ridícula. Talvez fosse fácil admitir para alguém como Afrodite, que entendia de sentimentos como ninguém, mas para Poseidon? Não, ela não podia.

— Eu já disse que estou bem, Poseidon.

— E eu acredito em você, meu amor - Poseidon começou a enrolar lentamente a ponta do lençol que cobria Atena em seu dedo. - Mas sei que alguma coisa te perturba. E quero que você me conte o que é.

Atena mordeu o lábio inferior com tanta força que poderia facilmente tê-lo furado com os dentes.

— É só uma ideia ridícula. Nada com que você precise se preocupar.

— Qualquer coisa que te preocupe é minha preocupação também, amor - seu tom era tão encantador que Atena pensou ser capaz de derreter bem ali. - Além do mais, algo que te perturbe com certeza é grave o suficiente para exterminar a raça humana da Terra.

— De novo, não dessa vez - Atena garantiu. - Eu já disse, é uma ideia ridícula.

Poseidon puxou o próprio dedo, e o lençol que cobria o corpo de Atena deslizou sinuosamente para o chão, jazendo ali como uma bandeira de rendição. Agora completamente nua, Atena se sentia ainda mais indefesa. Embora Poseidon já houvesse visto seu corpo por completo, a presente situação era bem diferente.

— Você tem alguma ideia do quanto é linda? - Poseidon sussurrou em seu ouvido, escorregando as mãos para as costas de Atena. - Por que eu demorei tanto para ter você?

Seus dedos desceram até as coxas da deusa, mas ela não conseguia se mexer ou dizer nada. Tinha um homem maravilhoso à sua frente dizendo o quanto a desejava, e ela o amava mais do que a qualquer coisa, mas tudo o que sentia era uma vontade inexprimível de se esconder.

— Você não vai mesmo me contar o que te preocupa? - Poseidon insistiu.

— Eu já disse, Poseidon, não é nada que você queira saber - Atena manteve a palavra, mas sua voz não soava convincente nem para si mesma.

— Talvez eu tenha que te persuadir - suas palavras eram como fogo, deixando sua boca para penetrar a alma de Atena e queimar seu corpo lentamente de dentro para fora. - Eu vou mesmo ter que chegar a esse ponto?

— Me persuadir? - Atena franziu as sobrancelhas. - O que isso quer dizer?

— Quer dizer... - Poseidon começou a caminhar para frente, e consequentemente Atena caminhou para trás, acompanhando os passos dele. - Que se eu tentar fazer com que você me conte alguma coisa, Atena - Poseidon finalmente a empurrou sobre a cama e se inclinou sobre ela, levantando suas pernas. - No final você vai estar implorando para que eu te deixe falar.

— Eu não imploro, Poseidon - Atena garantiu com firmeza, porque era verdade. - Para ninguém. Nunca.

— Isso é o que vamos ver.

Os dedos de Poseidon foram novamente pousados na coxa de Atena, deslizando suavemente para o lado inferior de sua perna e subindo lentamente até que estavam... Lá. Atena arregalou os olhos, estupefata. Estava tendo muitas experiências novas nas últimas horas, mas essa... Era golpe baixo, até para os padrões de Poseidon.

Em questão de minutos, a surpresa de Atena já não existia mais. Na verdade, nenhum dos seus aspectos racionais existia. Nenhum sentimento, nenhum pensamento, nada além do puro prazer.

— Poseidon... - ela o chamou, como se estivesse se afogando e ele fosse sua única salvação. - Por favor...

— Quase lá - Poseidon abriu um sorriso. - Mas você ainda não está implorando. Eu disse que te faria implorar, não disse?

Atena apertou os lábios. Dane-se o que ela disse que não faria. Ela já nem se lembrava mais de quem era. Tudo o que importava era Poseidon e o quanto ela o queria, o quanto precisava dele.

— Tudo bem - Atena assentiu com a cabeça. - Eu te falo o que você quiser, mas por favor...

Mas Poseidon não parou. Continuava a matá-la com prazer, selando seus lábios de tempos em tempos. Atena se agarrou a ele desesperadamente, entrelaçando os dedos no cabelo cor de petróleo e sussurrou em seu ouvido:

— Poseidon, por favor... Eu te imploro...

E ele finalmente parou. Bom, Atena não exatamente queria que ele parasse. Ela não sabia bem o que estava pedindo, mas definitivamente não era que ele parasse. Fora simplesmente uma das melhores coisas que ela já sentira em toda a sua vida.

— Aí está, amor - ele disse, satisfeito. - Eu ganhei. Você me deve uma explicação.

Ofegante e suada, Atena se apoiou nos cotovelos e deu um impulso forte para se levantar.

— Tudo bem. Mas Poseidon, eu juro que não vai fazer diferença - Atena segurou com força nos braços dele. Não conseguia se equilibrar perfeitamente de pé. Sua cabeça rodava como um carrossel ultraveloz. - É só que, veja bem... Você supostamente me ama...

— Supostamente? - Poseidon já parecia indignado.

— ... E você queria transar comigo; bem, você conseguiu. Então, isso não me faz igual a todas as outras mulheres com quem você ficou? Por qual motivo você não me esqueceria como o resto delas?

Atena não sabia dizer nem mesmo como conseguira falar tudo aquilo. Sua boca parecia estar colada com super cola, suas pernas ameaçavam ceder a qualquer segundo e sua mente não estava muito melhor do que o físico. Aquilo realmente deveria sair, porque ela não conseguiria mais formular uma frase completa nem se sua vida dependesse disso.

— É esse o motivo pelo qual você está pálida como uma morta? - Poseidon perguntou. - Você acha que eu vou te dispensar como qualquer outra?

Atena só conseguiu concordar. Poseidon suspirou e balançou a cabeça negativamente, sem, contudo, dizer nada. Ele beijou a testa de Atena por um longo tempo e então, se trocando num passe de mágica, saiu do quarto, deixando a deusa ali, nua, no meio do cômodo, se perguntando como raios havia chegado àquele ponto.

                                                                           ¶¶¶

Parada diante das portas que levavam à sala de jantar, Atena sentia como se aquele fosse seu primeiro dia ali. Respirou fundo por diversas vezes, alisou a própria roupa e repetiu para si mesma que podia fazer aquilo, mas nada podia afastar o tremor que percorria seu corpo perante o simples pensamento de entrar ali e ter que encarar o olhar malicioso de Poseidon e o inquérito de Helena. Pensou, e não foi uma única vez, em dar meia volta e pedir para ter o café da manhã servido no quarto novamente, mas desistiu da ideia assim que lhe ocorreu que teria que enfrentar os dois uma hora ou outra, juntos ou não, e tudo o que estava fazendo era sendo covarde. Atena então endireitou a postura, ergueu o queixo, empurrou as portas e entrou na sala com toda a graça que podia ter - e não era pouca. Dois pares de olhos curiosos se viraram em sua direção e acompanharam silenciosamente seus passos até que Atena se sentasse em seu lugar de costume, à esquerda de Poseidon, na frente de Helena. Um criado se aproximou imediatamente e serviu seu café da manhã - a porção exagerada de comida que era suficiente para alimentar boa parte da população mundial que passava fome. No entanto, Atena não reclamou. Não naquele dia. Não queria um motivo para falar com Poseidon ou Helena, embora ela tivesse percebido, eventualmente, que era a única da sala envolta em tensão. Poseidon e Helena pareciam perfeitamente confortáveis (Helena ainda radiante relatando o recente namoro para Poseidon, que ouvia atentamente). Mas a deusa da sabedoria, comprimida por nervosismo e uma pontada de raiva que surgia do fundo do peito, mal comeu uma torrada e pediu licença para se retirar. Helena objetou, perguntando o que Atena tinha, mas Poseidon permaneceu quieto, examinando um livro à sua frente como se sequer se importasse. Isso fez a raiva de Atena se expandir ainda mais e começar a fervilhar ao ponto de ela se sentir uma fornalha ao deixar a sala de jantar. Ela não se deu ao trabalho de subir dezenas de escadas e correr o risco de se perder e se teleportou diretamente para o escritório de Poseidon, trancando a porta logo que chegou - não que isso fosse impedi-lo se ele quisesse entrar. Atena se sentou na cadeira onde ele geralmente sentava, sem se importar com isso. Era só uma cadeira estúpida, que logo não significaria nada. Ela tirou do bolso o pequeno frasco contendo o líquido negro equivalente ao sangue do monstro capturado pelos semideuses, conjurou um microscópio e se pôs a trabalhar.

Atena raramente precisava de livros, já que tinha todo o conhecimento possível reunido em seu cérebro, mas depois de horas e horas analisando a matéria sem obter nenhum resultado, começou a cogitar a possibilidade.

Não seja estúpida, disse para si mesma. Não há nada em um livro de química que você mesma não saiba.

Atena pousou a mão livre na testa, apertando os olhos. Tinha alguma coisa que ela estava deixando passar. Não era possível. Não existiam enigmas sem solução. O que é que ela estava esquecendo? Sobre qual titã ela não havia pesquisado? Ela foi poupada de vasculhar a própria mente em busca de respostas por Poseidon, que surgiu de repente no meio da sala, com um livro fino em mãos. O semblante de Atena se fechou no mesmo instante, e ela fingiu estar profundamente interessada na molécula do microscópio.

— Eu preciso da sua ajuda.

A voz de Poseidon soando tão natural e indiferente foi um puxão para a realidade, e Atena ergueu o rosto, incrédula. Como ele podia, depois de tê-la abandonado sem uma resposta no quarto, pedir sua ajuda sem mais nem menos? Será que Atena era tão insignificante assim?

— Você o quê?

— Preciso da sua ajuda - Poseidon repetiu descaradamente, se sentando na cadeira ao lado de Atena, perigosamente perto da deusa. - Eu não queria te interromper, mas isso é algo que só você pode fazer.

A proximidade de Poseidon era como um gás tóxico; fazia Atena perder o ar e sentir vontade de correr para longe, ao passo que, quando se lembrava da noite passada, queria se jogar em seus braços e não sair nunca mais. Atena afastou esses pensamentos e focou no que realmente estava em jogo: quanto mais rápido fizesse tudo, mais rápido voltaria para casa e todo esse drama teria fim. Talvez ela até se esquecesse de tudo o que passou com Poseidon. Poderia pedir isso como seu terceiro e último desejo das moiras. Não era muito inteligente e talvez fosse um tanto repetitivo, mas era o que ela precisava.

— O que foi? - Atena suspirou, se virando ligeiramente para ele, sem olhar em seus olhos.

Poseidon depositou o livro fino sobre a mesa e o abriu em uma das primeiras páginas, onde havia o desenho de um lindo trono, claramente feminino, cheio de entalhes e desenhos minimalistas por toda a sua extensão.

Era só o que faltava, Atena pensou. Agora ele quer Anfitrite de volta e vai me torturar com isso.

Mas Atena não se deixaria vencer. Mostraria para Poseidon que ele não podia tirar a vida dela novamente. Que ela agora tinha força para lidar com ele.

— O desenho é lindo - Atena comentou casualmente. - Foi você quem fez?

— Sim - Poseidon assentiu. - Eu sou bom com os dedos.

Atena entendeu o duplo sentido da frase, e logo sentiu o sangue quente correr até suas bochechas.

— Você é engraçada, Atena - disse Poseidon com um meio sorriso. - Como pode ainda ficar corada?

— Eu não sei - Atena respondeu simplesmente, querendo encerrar a conversa o mais rápido possível. - Para quê, exatamente, você quer a minha ajuda?

— Quero que você me diga se está bom, se falta alguma coisa ou se algo deveria sair.

Atena fez uma análise milimétrica do desenho, apreciando cada pedacinho do móvel que provavelmente seria de ouro. Definitivamente não havia o que mudar. Nem ela teria feito tão bem. Anfitrite tinha sorte.

— Não. Está perfeito - murmurou secamente. - Mas para que você quer a minha opinião nisso?

— Ora, eu não poderia mandar fazer o seu trono sem antes ter certeza de que você gostou, não é mesmo?

Atena se virou para ele tão rápido que chegou a sentir tontura.

— Como assim meu trono?

— Todas as rainhas têm um trono, não tem? - Poseidon perguntou, sério, mas Atena podia jurar que ele estava se divertindo com aquilo. - Por que você não teria?

A mente de Atena girava, uma mistura de informações se unindo rápido demais para que ela pudesse acompanhar.

— Poseidon, você está me deixando confusa. Explique direito essa história.

— Atena, meu amor, eu esperava mais da sua mente brilhante - Poseidon segurou sua mão, enviando uma onda de eletricidade por todo o corpo de Atena. - Olhe só, é um raciocínio muito simples. Eu sou rei de Atlântida. Independentemente de você se casar comigo ou não, eu quero que você seja minha rainha, se você aceitar. E todas as rainhas precisam de um trono, embora eu goste mais do que seria considerado saudável da ideia de você sentada no meu colo o dia todo. Então eu pensei muito em algo que combinasse com você e representasse tudo o que você gosta para que seu trono seja só seu. Entendeu agora?

— Então... Você realmente vai levar isso a sério? Nós vamos mesmo seguir em frente com tudo isso?

Poseidon suspirou.

— Eu achei que tivesse deixado isso bem claro ontem à noite, Atena. É claro que eu quero ficar com você. Afinal, ninguém mais te aguentaria pelo resto da eternidade.

Atena não podia conter o sorriso que crescia em seu rosto. Quem poderia imaginar que um dia Poseidon estaria ali, na sua frente, dizendo tão naturalmente que queria viver com ela? Nem ela mesma fantasiava isso em seus sonhos mais loucos. Mas Poseidon sempre superava suas expectativas. Ele era sempre muito mais do que ela imaginava que qualquer um pudesse ser. E ela, inundada de felicidade, mal pôde pensar no que fazia antes de se jogar sobre ele e o abraçar com força. Poseidon a envolveu com os braços em retorno, depositando um beijo curto em sua testa.

— Hoje quando você me disse que tinha medo que eu te dispensasse... Eu juro que quis te jogar pela janela, Atena - Poseidon balançou a cabeça negativamente. - Depois de tudo o que eu te disse, de todas as coisas que você poderia temer... Você tinha medo que eu te deixasse. Como se eu conseguisse fazer isso.

Atena sorriu envergonhada, descansando a cabeça sobre o ombro de Poseidon.

— Desculpe. Mas você precisa concordar que foi um motivo justo.

— Não foi não - Poseidon negou, passando os braços ao redor de sua cintura. - Eu, dizer que amo uma mulher sem eu realmente amá-la? Jamais. Se eu disse que te amo, dormi com você e de manhã ainda estávamos no mesmo quarto, entenda, eu sou perdidamente apaixonado por você.

— Eu sei. Eu sou encantadora.

— O ego de quem está quase nos derrubando agora?

— Eu só estava concordando com a sua afirmação - Atena se defendeu.

— Sei - Poseidon a beijou, mordendo seu lábio inferior ao fim. – Sabe, estive reparando em algo. Você não é o tipo de pessoa que se cansa fácil, não é mesmo?

Atena franziu o cenho.

— Claro que não. Eu costumo treinar por horas todos os dias, e ainda fazer a parte burocrática.

— Hum, ainda bem - Poseidon a puxou para cima de si, deixando as pernas de Atena ladeando seu corpo. - Porque eu planejo muitas e muitas noites como a noite passada para nós. Pensando bem, eu estou desocupado agora...

Poseidon selou seus lábios novamente, mas Atena o empurrou, rindo.

— Mas eu não estou. Inclusive, um pouco de ajuda seria ótimo aqui.

— Você espera que eu fique sozinho numa sala com você e preste atenção no trabalho? Sabemos que isso não deu certo da última vez.

— Ah, mas dessa vez vai dar - Atena garantiu. - É o destino do seu filho, da minha filha e provavelmente do mundo inteiro que está em jogo. Tenho certeza que existe uma célula no meio da sua testosterona que pode processar essa informação.

— Tudo bem - Poseidon suspirou pesadamente. - Mas eu digo, você é um ser desalmado, Atena.

— Sou? - Atena riu.

— Sim. Sem sentimentos. Aposto que seu coração é só um pedaço de matéria escura preenchida por trevas...

Atena ergueu a cabeça rapidamente, como se uma lâmpada houvesse se acendido sobre sua cabeça.

— É isso! - ela exclamou. - Poseidon, você é brilhante!

O deus esboçou confusão por um momento, mas logo em seguida se encheu de pompa.

— Eu sei. Mas, ahn... O que, exatamente, é o tal isso?

— Matéria negra - Atena levantou o frasco contendo o sangue do monstro. - Por isso eu não consegui identificar antes. Mas se for matéria negra está tudo explicado, e o líder dos titãs é... Ai, droga.

— O que, Atena? Por que "ai, droga"?

— Porque o lí...

— Vossa Majestade - uma voz que Atena reconheceu ser a do general Dolfim soou do outro lado da porta. - Peço perdão se o atrapalho, senhor, mas trago notícias sobre o garoto novo.

— Entre - Poseidon ordenou, soltando um suspiro.

Atena fez menção de voltar para seu lugar, mas Dolfim adentrou a sala rápido demais, e ela sequer teve tempo de se mover. O golfinho revestido de sua armadura verde fez uma reverência longa e exagerada para Poseidon e em seguida se curvou, mais contidamente, para Atena.

— Milady.

— General - Atena acenou com a cabeça, embaraçada demais para estender quaisquer outras palavras ao golfinho.

Se Dolfim achou estranho encontrar Atena sentada no colo de Poseidon, teve o bom senso de não deixar transparecer, mas provavelmente não era surpresa nenhuma encontrar seu rei com uma mulher.

— O que você quer? - Poseidon perguntou.

— O treinamento do novato terminou por hoje, senhor - Dolfim anunciou. - Ele se saiu... Excepcionalmente bem para alguém que nunca foi parte de um exército.

— Novato? Ele está falando de Jack? - Atena perguntou para Poseidon.

— Sim - Poseidon anuiu. - Eu não podia deixar aquela lombriga desnutrida fazer parte do meu exército com aquele porte físico. Por isso o mandei para treinamento, e agora recebo relatórios diários sobre como ele está se saindo - ele se virou para Dolfim. - Onde o garoto está agora?

— No salão dos tronos, aprendendo os termos teóricos da ordem unida, senhor.

— Ótimo - Poseidon apertou os braços ao redor de Atena. - Está satisfeita agora, amor?

Atena sorriu e assentiu.

— Era só o que eu precisava - Poseidon disse, e em seguida se virou para o general. - Obrigado, Dolfim. Já pode sair.

— Com sua licença, senhor - Dolfim se curvou novamente para ambos os deuses e deixou a sala, fechando a porta atrás de si.

— Então, você finalmente aceitou Jack - Atena sorriu.

— Não somos melhores amigos. Mas como eu disse, se você confia nele, eu também confio.

— Olhe só - Atena apontou um dedo em seu peito. - Você soa como um bobo apaixonado.

— Talvez eu seja um - Poseidon beijou a base do pescoço de Atena, depositando ali uma mordida fraca.

Quando ele fez menção de seguir em frente com suas investidas, Atena se levantou e arrumou a própria roupa. Se continuasse ali, uma hora ou outra seria convencida a jogar tudo para o alto e passar o resto do dia com Poseidon. Mas ela, ao contrário dele, se preocupava com o fato de que o fim do mundo pudesse estar próximo, e fazia alguma coisa para impedir essa catástrofe.

— Chega. Teremos todo o tempo do mundo para isso depois que derrotarmos aqueles... - Atena engasgou com as próprias palavras, procurando um termo adequado. - Nossos inimigos.

Poseidon suspirou, derrotado.

— Às vezes eu odeio o quanto você é racional.

— Um de nós precisa ser - Atena fez desaparecer o microscópio e o frasco contendo a matéria negra. - Olhe, eu vou checar como está o Jack e volto já para explicar o nosso plano de ataque. Não temos muito tempo.

— Como assim não temos muito tempo? - Poseidon se aprumou na cadeira.

Surgiram na mesa diversas folhas cheias de desenhos e anotações, os possíveis ataques nos quais Atena vinha trabalhando durante todo aquele tempo.

— Vamos atacar amanhã de manhã. Nunca se sabe quando um grupo de titãs delinquentes vai tentar destruir o mundo. Só vamos torcer para que não seja essa noite. Estude esses planos enquanto estou fora. Te explico tudo quando voltar.

— Tudo bem. Às suas ordens, minha rainha.

Atena piscou um olho para Poseidon.

— Fico feliz que tenha finalmente entendido seu lugar.

Dito isso, Atena se dirigiu à porta e deixou a sala. Circular pelos corredores do castelo até o salão do trono foi fácil. Ela começava a se acostumar com a estrutura complexa e a decorar certos atalhos para onde queria ir. Um sorriso de pura alegria desabrochou em seu rosto quando lhe ocorreu o pensamento de que muito em breve poderia chamar aquele lugar de lar. Seu lar. Junto com Poseidon. Ainda parecia um sonho.

As portas do salão do trono estavam abertas, dando vista direta para duas figuras no outro extremo da sala, uma delas mais magra - inegavelmente Jack - e a outra mais corpulenta, circulando em torno do garoto e analisando sua postura.

— Ombros mais altos, soldado - ordenou o homem corpulento com um sotaque pesado que Atena não conseguiu identificar de onde vinha. Alemanha, talvez. - Sua postura enquanto na formação de guerra deve ser impecável.

— Com licença, senhor - Atena decidiu interromper a cena. - Preciso falar com o soldado Jack, se não for incômodo.

O homem corpulento se curvou em uma reverência desajeitada assim que seus olhos pousaram sobre Atena.

— Minha senhora. Peço perdão por não tê-la notado anteriormente - ele se virou para Jack e o cutucou com os ombros. - Curve-se, garoto.

Jack estampou um sorriso maroto antes de curvar elegantemente o tronco do corpo na direção de Atena.

— Vossa Graça. É um imenso prazer recebê-la.

— Acho que houve um engano, senhor - Atena se dirigiu ao primeiro. - Eu não sou a rainha.

— Se as informações que me chegaram aos ouvidos estiverem certas, acredito que o será muito em breve, minha senhora - o homem sorriu.

— Se você diz... - Atena deu de ombros, sorrindo. - Então... Será que eu poderia pegar Jack emprestado por alguns segundos?

— O tempo que desejar, minha senhora - o homem parecia implorar, apesar de ser Atena a pessoa que fazia os pedidos ali. - Com sua licença...

Atena apenas assentiu com a cabeça e o homem saiu às pressas. Jack voltou a se endireitar e, parecendo mais desenvolto do que nunca, segurou a mão direita da deusa e a beijou displicentemente.

— Minha bela dama. A Milady está reluzente nesta tarde, se me permite dizer.

— Obrigada, Jack - Atena sorriu. - Você também parece muito bem hoje.

— Oh, eu? Apenas algumas horas de treinamento - Jack alisou o abdômen por cima da camisa vermelha de algodão. - Nada que beire sua beleza, milady.

Até o momento, Jack ainda segurava a mão de Atena, e apesar de estar muito consciente de seu toque, a deusa não se desvencilhou.

— Ah, pare com isso - Atena riu. - Como está indo seu treinamento, por falar nisso?

— Difícil, mas produtivo, milady - Jack respondeu.

— Sem milady, por favor - Atena pediu. - Fica irritante depois de um tempo.

— Como desejar... Atena.

— Melhor.

— Então... - Jack caminhou para perto de uma grande lareira no centro do salão, puxando a deusa consigo. - Eu soube que Atlântida terá uma nova rainha em breve.

Atena tentou a todo custo se manter impassível, mas seus lábios insistiam em repuxar, e quando se deu por si, já estava sorrindo.

— Parece que sim.

— Fico feliz pel...

Jack ergueu a cabeça subitamente e olhou para a porta por onde Atena havia entrado com olhos atentos, como se ouvisse algo. Quando voltou a mirar a deusa, com os olhos arregalados e duas gotas de suor escorrendo da testa, sua expressão era de puro terror.

— O que foi, Jack? - Atena pousou a mão em seu ombro, preocupada.

Uma lágrima escorreu da vermelhidão que começava a preencher o olho esquerdo de Jack.

— Me perdoe, Milady.

Ele segurou o rosto de Atena e a beijou.


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