Konzen estava concentrado na enorme pilha de papéis que se erguia sobre sua mesa. O tédio daquele repetitivo trabalho parecia consumir suas energias, e ele pensou — mais de uma vez — em simplesmente por fogo em tudo aquilo e fingir que fora um acidente.

— Konzen!

A conhecida voz de Goku o despertou de seus pensamentos destrutivos. Ele olhou na direção da porta, vendo o pequeno garoto entrar correndo, com um enorme sorriso em seu rosto redondo e radiante. Konzen fez menção de perguntar o que ele queria, quando o mais novo pulou em sua direção, e Konzen só teve tempo de virar o rosto para o lado, evitando assim um beijo acidental em seus lábios, o qual acabou por pousar em sua bochecha.

— O que você está fazendo, seu macaco estúpido?! — questionou ele, irritado. Por pouco aquilo não tinha resultado em algo bem problemático...

Goku olhou para ele, ainda parecendo animado, já acostumado com aquele xingamento.

— Eu te dei um beijo. — explicou, como se aquilo não fosse óbvio o bastante.

— Eu sei disso! — disse Konzen, impaciente — Estou perguntando por que fez isso.

— Ah! — Goku alargou seu sorriso — O Ten-chan disse que é normal beijar as pessoas que você ama, então eu quis beijar você, Konzen!

Konzen encarou o mais novo, sentindo sua irritação se dissolver diante da sinceridade daquelas palavras.

— Por que, afinal, o Tenpou te disse uma coisa dessas? — perguntou.

— Porque eu vi ele e o Ken-chan se beijando. — explicou Goku — E ele me explicou que é normal fazer isso com uma pessoa que você ama.

Konzen levou a mão à testa, suspirando de forma cansada. É claro que era culpa daquele casal enrustido, e é claro que eles haviam jogado toda a responsabilidade sobre os ombros dele.

— Ouça, Goku... — disse Konzen, chamando a atenção do mais novo — Não sei como foi que o Tenpou te explicou essas coisas, mas você não pode sair por aí beijando outras pessoas sem mais nem menos.

— Então, o Ten-chan não disse a verdade? — Goku entortou os lábios, parecendo um pouco desapontado.

— Não, é verdade que pessoas se beijam quando se amam. — prosseguiu Konzen, sem acreditar que estava mesmo explicando algo como aquilo para o mais novo — Mas existem vários tipos de amor, e tipos diferentes de beijos para cada um.

Goku o encarou, inclinando a cabeça para o lado, parecendo confuso. Konzen suspirou mais uma vez antes de prosseguir.

— O Tenpou e o Kenren tem um tipo... — ele tentou encontrar a palavra certa — Especial de relação. O beijo que você viu só acontece entre pessoas que se amam de um jeito romântico, como um casal.

— Hm... — Goku pensou por aquilo por alguns instantes — Então, como é com as pessoas que não são um casal?

— Tem vários jeitos diferentes. — disse Konzen — Elas podem se beijar no rosto, por exemplo.

O rosto de Goku se iluminou ao ouvir aquilo.

— Então eu fiz certo! — disse ele.

— Sim, sim... — concordou Konzen — Você fez certo. Agora, vá encher o saco do Kenren e do Tenpou, eu tenho trabalho pra fazer.

Goku concordou com a cabeça, e deixou o cômodo com passos quase saltitantes. Atrás dele, Konzen o seguiu com o olhar, um discreto sorriso se formando em seus lábios.

— “É mesmo um macaco estúpido...” — pensou, com mais afeto do que ele seria capaz de um dia admitir.

~*~

Sanzo acordou com a sensação de que havia sonhado algo estranho. Estavam no meio do verão, e ele havia adormecido sobre o chão do templo em uma tentativa de se refrescar ao menos um pouco.

Sentindo-se preguiçoso, ele virou a cabeça para o lado, e só se surpreendeu um pouco ao ver Goku deitado ali, ao seu lado, dormindo profundamente.

— “É mesmo um macaco estúpido...” — pensou, vendo certa graça na situação.

Ele olhou para o mais novo por alguns instantes, e então, tomado pelo que pareceu ser um súbito impulso, se curvou sobre ele, e deu um rápido beijo na lateral de sua cabeça.

— “O que diabos foi isso?” — questionou-se, franzindo o cenho, confuso por seu próprio gesto.

Ele pensou por alguns segundos, e então, suspirou de forma impaciente, voltando a se deitar.

— “Bem, não importa.” — disse para si mesmo, assim que voltou a fechar os olhos, e a última coisa que pensou antes de voltar a adormecer foi no quanto ouvir o som da respiração e sentir a presença do outro haviam se tornado coisas tão naturais e confortáveis para si.

A ligação entre eles era profunda e inquebrável, e não havia no mundo qualquer beijo ou palavra capaz de fazer jus àquela agradável proximidade.