Leah Goldwyn: Entre dois Mundos escrita por Laurah Winchester


Capítulo 14
Romanos no Brooklyn




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JOE

— Leah! — chamou Joe, quando percebeu que esta desmaiara. Encarou Amós. — O que aconteceu?

— Estava lecionando um treino, ela simplesmente desabou no piso. — explicou ele, tocando a testa da garota, que fervia abaixo de sua mão.

— O que está acontecendo aqui? — perguntou uma voz, vinda de trás de todos eles... e que era extremamente familiar para Joe.

— Mãe? — virou o rosto para afrontar a mulher.

Os olhos verdes da mulher miraram o filho.

— Joe…

— O que está fazendo aqui? — inquiriu o garoto, breve e frio.

Nina tocou os cabelos do filho, que permanecia com o corpo rígido.

— Falamos sobre isso depois. — disse ela, voltando seu olhar para Leah inconsciente na cama da enfermaria, olhou depois para Amós.

— Temos que conversar — disse ela.

Joe saiu de lá. Ele não aguentaria ficar ali, com a prima desmaiada e a mãe, que passara anos distante e agora que voltara não parecia se comover tanto.

Enquanto vagava para seu dormitório, notou que Muffin o observava, os grandes olhos amarelados não pareciam pidões como de costume, mas tensos.
Nos dias recentes a Casa da Vida não passava a impressão de “tranquila e segura” que costumava, então não se surpreendeu com Bastet, a deusa que hospedava a gata, alarmada.

Continuou a vagar, perguntando-se o que havia acontecido com a prima e o que a mãe fazia ali. Todavia parou novamente, ao ouvir um som vindo de um dormitório que era destinado aos “indeterminados”. Ele deveria estar vazio, certo?

Atreveu-se a entrar. Caminhou para a parte feminina, quando chegou ao quarto de Leah, percebeu que era um iPod que reproduzia Waiting For The End de Linkin Park. Havia também a coruja, Ájax, que estava sobre o criado-mudo. Joe franziu a testa.

— Uma coruja que escuta Linkin Park — murmurou, encarando os grandes olhos da ave. Balançou a cabeça, descrente. Optou por não desligar a música, sentindo-se um completo idiota por temer que a coruja investisse contra ele.

Quando estava prestes a sair, notou que Sarah estava ali e que havia um garoto de estimáveis nove anos com ela. Um garoto que ele nunca havia visto no Vigésimo Primeiro Nomo. Franziu a testa, preparando-se para pegar a varinha do bolso.

Caminhou até lá e pigarreou, interrompendo ambos que brincavam com um jogo de cartas.

— Quem é você? — perguntou diretamente ao garoto, que tinha fios loiro-escuros, seus olhos eram cinzentos e seus traços eram muito amenamente familiares.

— Sou Sam Goldwyn — e estendeu a mão para Joe, cumprimentando-o.

Joe sentiu um sobressalto ao ouvir o sobrenome.

— É? — indagou.

— É. — afirmou Sam — Algum problema com isso?

— Não, nenhum. — disfarçou Joe, suando frio. Perguntaria sobre aquilo à sua mãe logo mais. Seria possível que seu tio Eric tivesse um filho? Não. Eric tinha vinte e quatro anos, não era possível que tivesse um filho de dez. E Thomas só tinha Leah.

— E então, Sam, você não é daqui, é? — sentou-se na cama, ao lado de Sarah.

— Tecnicamente sim, deste país, mas estudo no Primeiro Nomo.

Joe assentiu.

— Entendi. Hã, vou deixar vocês continuarem o que estavam fazendo. — disse, ao se levantar. Afastou-se do dormitório, olhando de esguelha para a coruja enquanto passava.

Sua cabeça parecia a ponto de explodir, decidiu sair, caminhar pelo Brooklyn, talvez parar no Starbucks ou no YogoBerry...

Ninguém se importou em perguntar aonde ele iria enquanto cruzava o Grande Salão, o que para ele foi um grande alívio, pois não desejava companhia.

Foi a pé até a Starbucks da Rua Front, observando o trânsito movimentado do Brooklyn naquele dia.

Pediu um cappuccino de chocolate e sentou-se a uma mesa próxima à janela. O local não estava tão cheio, mas a movimentação era eminente, como era dia de semana letiva, as pessoas apenas apanhavam o pedido e saíam, voltando ao trabalho ou partindo ao colégio.

Enquanto esperava, notou um casal bem aos fundos. A mulher aparentava ter chorado, pois seus olhos estavam vermelhos e o rosto um pouco inchado. O homem segurava suas mãos, eles pareciam ter por volta de vinte e três anos, discutiam muito baixo, porém Joe podia ouvir até o que os motoristas diziam por cerca de um quarteirão dali.

— Frank, não podemos voltar para lá, não antes de encontrarmos Nico. — disse a mulher, soluçando em seguida.

— Hazel, ele nos viu morrer. — sussurrou Frank, sutilmente.

— Não éramos nós lá. Não podemos chamá-los, eles o matarão.

Joe não sabia o porquê, mas sentia uma pontada de apreensão, por mais que não os conhecesse.

Observou-os atentamente, precisando apenas de um olhar lacônico.

A mulher, Hazel, tinha longos e volumosos cabelos cacheados castanho-avermelhados, moldando o rosto impecável, tinha olhos amendoados e pele na cor de avelã. Em seu braço era possível notar uma tatuagem que se assemelhava a um código de barras.

Frank era grandalhão e tinha traços asiáticos, possuía uma aljava pendurada ao ombro, o que levou a Joe notar o arco ao lado. Ele também possuía uma tatuagem como aquela.

Depois de pegar o cappuccino, Joe foi até a livraria, observando os livros sem muito interesse. Algo em Frank e Hazel lhe chamava atenção e ele não sabia o que era.

Apanhou “O Código da Vinci" de uma estante e passou a folheá-lo, sem estar, realmente, focado naquilo.

— Sabe que não é seguro somente nós dois irmos. — murmurou Frank.

Hazel bebericou seu café.

— Vamos dar um jeito — disse, apesar de não parecer confiante.

— Hazel, faz muito tempo que não o vemos. Plutão lhe disse que não pode senti-lo. E se ele já estiver...

— Não vamos desistir. Quero ver com meus olhos. Acho que já sei quem pode nos ajudar a encontrá-lo. — alegou Hazel, seus olhos brilharam por um segundo, em esperança. Os dois se entreolharam, pagaram seus pedidos e saíram.

Joe foi pouquíssimo tempo depois, daquela vez resolveu ir para sua antiga casa. Não almejava encontrar seu tio àquela hora, porém deixaria um recado para que o encontrasse na Casa do Brooklyn.

Enquanto caminhava, pensava no casal que vira na Starbucks. Eles definitivamente não eram pessoas comuns. Que tipo de pessoa vai a um café com um arco e uma aljava?

A citação de “Plutão” refletia em sua mente. Seriam eles semideuses ou legados romanos? Se sim, seria essa a explicação para o nervosismo inusitado em Joe. Egípcios e gregos poderia ser estimável, mas egípcios e romanos era uma ideia inoportuna, para o lado egípcio ao menos.

Os romanos haviam tomado seu império, ou o que sobrou dele, afinal o período Ptolemaico era quase uma colônia dos tempos de Alexandre, o Grande. Além do mais, os romanos haviam tentado perseguir aos faraós em sua pós-vida, arriscaram se misturar aos cultos egípcios. Era como ter um irmão mais novo copiando a tudo o que você faz, te perseguindo por todos os lugares. Azucrinante.

Hazel e Frank haviam sumido de sua visão pela Rua York, Joe não os seguiria, não se tornaria um infortúnio. Não era da conta dele o que aqueles dois faziam.

Entrou em um ônibus. Sentou-se rente à janela, observando enquanto o automóvel rumava ao sudeste, pela Avenida Flatbush, virando ao sul pela Quarta Avenida. Desceu em Garfield Place. Quando avistou a casa, expirou pesadamente.

Pegou sua chave no bolso do casaco, abrindo a porta em seguida.

Assim que entrou, Mike, o gato, se esfregou em suas pernas, miando afetuosamente.

— Também senti saudades, garoto. — murmurou Joe. Fechou a porta atrás de si e abaixou-se, acariciando o pescoço do felino, que ronronou.

Não havia grandes mudanças. A não ser pelo silêncio contínuo, o sofá vazio e os videogames desligados. Também não vinha nenhum aroma da cozinha, diferente do costume, já que sua avó tinha sua estadia com a companhia de Sarah ali nas tardes em que Joe e Leah voltavam do colégio enquanto Thomas estava no trabalho.

Joe andou até a cozinha, iria utilizar um papel que encontrara sobre a mesa para deixar o recado, mas logo parou quando percebeu que havia algo escrito nele, endereçado a ele e Leah.

“Estou no Segundo Nomo, se precisarem de qualquer coisa, falem com Phill”.

— Que diabos ele está fazendo lá? — grunhiu Joe, também perguntando-se como sabia que poderiam contar com seu pai. Pegou o papel e guardou no bolso do casaco.

Aproveitando que estava ali, trocou a água de Mike e deu-lhe ração.

Saiu da casa. Caminhou até um ponto de ônibus na Rua Union, onde haviam diversos prédios pichados, inclusive o Liceu do Brooklyn, com exceção do Banco Williamsburg Building.

Assim que subiu no ônibus que o levaria para a Broadway, arrependeu-se profundamente por ter entrado justamente naquele.

Quando chegou ao cobrador — um cara tremendamente esquisito. Com um chapéu Fedora cobrindo-lhe parte do rosto, sobretudo comprido de lã com um suéter de mesmo material por baixo e um visual semelhante ao de Amós —, foi parado com uma afirmação no mínimo muito suspeita:

— A passagem para as profundezas do Duat é grátis. — disse, com um sorriso perturbante que exibia dentes afiados e podres.

Joe não teve tempo de reagir, o homem metamorfoseou-se em algo tremendo que mal cabia no corredor do veículo, ao tirar o chapéu e literalmente se despir em um único movimento. O monstro tinha tronco de leão com pelo ruivo, asas de morcego enormes e negras em suas costas, seu rosto era algo próximo de humano. Ele tinha uma cauda pontiaguda como a de um escorpião, cheia de espinhos. Seus olhos eram de cores diferentes, um vermelho e outro verde.

O restante das pessoas não pareceu notar, exceto por um garoto, até que o cobrador-monstro atirou-se contra Joe, rugindo ferozmente próximo ao rosto dele.

O garoto que estava sentado ali perto, encarando a cena, levantou-se. Ele tinha traços asiáticos, idade próxima a dezesseis anos, cabelos e olhos negros. Joe assustou-se ao perceber que ele vestia uma camiseta roxa com a sigla “SPQR” e, apesar de parecer jovem, tinha uma tatuagem no braço direito.
Uma linha, duas, três, quatro, cinco... Joe continuaria contando se a criatura que estava sobre ele não estivesse quase babando em seu rosto.

Os passageiros agora abandonavam o ônibus desesperadamente, exceto pelo motorista, que agora ralhava ameaças para os três, “Parem de brigar no meu ônibus”, “Vou chamar a polícia” e coisas do tipo.

O garoto tatuado ignorou-o, pegou uma besta do banco e posicionou um dardo. O problema foi que quando o soltou, o leão/morcego/escorpião/porco-espinho pulou para trás, fazendo com que o dardo quase atingisse Joe, rasgando sua camisa ao passar de raspão.

Joe ligeiramente se levantou.

— A’max! — gritou.

Chamas irromperam da anomalia, porém ela não pareceu tão afetada. Sacudiu a cauda rija, soltando espinhos para todos os lados, dois deles atingiram o braço de Joe, que grunhiu ao retirá-los. A partir disso o motorista saiu do ônibus, cambaleando. Àquela altura estavam em Downtown, prestes a rumar para a Avenida Bedford, em direção à Broadway.

Joe pegou sua varinha do bolso e mirou a criatura.

— Sadewx! — murmurou o primeiro feitiço que lhe veio em mente.

Fitas de papiro surgiram, envolvendo o monstro em alta velocidade e força.
Quando o indivíduo estava completamente embalsamado, o garoto asiático atirou três dardos de bronze contra ele, que explodiu em pó dourado para todos os lados, restando apenas as fitas de linho.

— Um romano no Brooklyn — observou.

— Papel higiênico foi boa ideia. Sou Yuri Hassan — apresentou-se o rapaz.

— Joe Newton. Você, por acaso, não está procurando por Hazel e Frank?

Yuri arregalou os olhos, surpreso.

— Hazel Levesque e Frank Zhang? Você os viu? — perguntou, altamente excitado.

— Acho que sim. — admitiu Joe.

— Eu disse à Reyna e Louise que eles estavam vivos! — Yuri sibilou para si mesmo. — Sabe onde eles estão?

Joe balançou a cabeça negativamente.

— Sinto muito. O que posso dizer é que na última vez em que os vi, afastaram-se pela Rua York. Se ajudar, estão procurando por um tal de Nico.

Yuri ergueu as sobrancelhas.

— Nico. — dito isso suspirou, triste. — Então tenho que ir! Até mais. — disse, enquanto saia correndo o mais rápido que podia pela Avenida Atlântica. Joe ergueu as sobrancelhas.

Desceu do ônibus e pegou um táxi até a divisão da Broadway com a Avenida Driggs, próxima à ponte Williamsburg. Caminhou até avistar o prédio abandonado. Quando chegou ao topo, pôde avistar a agitação familiar do Vigésimo Primeiro Nomo.

Assim que pisou no chão do Grande Salão, Sarah correu e abraçou-o fortemente. Joe pegou-a no colo e aproximou-se de Ben, que parecia aguardá-lo no canto.

Ben afastou-se um pouco, saindo da dianteira de Liz, que o esperava ali. Sua pele novamente tinha uma tonalidade sadia, os olhos dourados estavam mais brilhantes. Parecia perfeitamente bem.

Ao lado dela estava Jared. Um garoto de doze anos, cabelos ruivos e olhos verdes. Este também exibia saúde.

— O que...

— Estamos curados. — disse Liz, com um sorriso.

Joe franziu a testa.

— Como?


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Notas finais do capítulo

Os feitiços que não foram citados em livros de As Crônicas dos Kane foram originalmente adaptados por mim, com significados coerentes aos feitios.
"Sadewx" - Embalsamar
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