A Lagarta escrita por Vatrushka


Capítulo 23
Toca




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Lana acordou em uma sala.

Esta tinha um formato octogonal e era grande, luxuosa. Tinha o piso em bronze e as paredes douradas - enfeitadas com cortinas belíssimas. 

No centro, encontrava-se quatro sofás bem dispostos. Ghunter, Giullian e Luce estavam desacordados em cada um.

A Lagarta olhou para baixo. Aquele não era só um sofá qualquer. Era o seu sofá. O que se parecia com um cogumelo, que ficava em sua antiga biblioteca.

As engrenagens foram se encaixando um pouco. 'Parlamento... Quer dizer que, depois que nós fomos embora, os revolucionários fundaram um Parlamento... E eles nos localizaram... E se conseguiram esse sofá...' Seus olhos se arregalaram. 'Conseguiram achar a minha biblioteca. E as Flores do meu povoado.'

Se pôs de pé, em alerta. Haviam conseguido tirar o feitiço de proteção que havia posto em sua vila, antes de toda aquela história estranha começar.

Arrepiou-se de medo. O quê teriam feito com as Flores? Teriam sido consideradas conspiradoras, traidoras, cúmplices da Lagarta?

"Não. Não!" Lana tentou abrir a janela. Inútil.

Tacou todos os tipos de feitiço que conhecia para sair dali. As paredes estavam cercadas com um contra-feitiço.

O desespero a dominou. Tarde demais. Seu julgamento chegara. Conseguira fugir por tempo mais que o suficiente.

Olhou para Ghunter, Giulliane e Luce, lacrimejando. Era o fim.

Ghunter se inquietou um pouco com todo o barulho que Lana fizera. Acordou aos poucos, também tentando entender onde estava e o que estava acontecendo.

Lana esperou a linha de raciocínio de Ghunter se completar, sentada no chão.

"Não vamos conseguir sair daqui, não é?" Sussurrou o Gato. Lana negou com a cabeça.

"Desculpe." Sussurrou Lana, cabisbaixa. Não se preocupou em domar suas lágrimas desta vez. "Desculpe."

Ghunter foi até ela, ajoelhando-se em sua frente. "Ninguém está te culpando, Lana. Você fez tudo o que pôde e um pouco mais."

Lana soltou um suspiro exasperado e o abraçou. "Eu peço desculpas a você."

"Você não tem que se desculpar."

"Tenho sim." Teimou a moça. "Todo esse tempo, vim me dedicando de corpo e alma àqueles que amo. Mas por algum motivo mesquinho, sempre faço questão de te desprezar, de te diminuir, te deixar de lado."

Ghunter ouviu a tudo silencioso.

"Mas só faço isso porquê você me afeta, Ghunter. Você me faz sentir insegura, exposta, fraca. Acho que de todos aqui... Você é o único que conhece minha fratura exposta. Que me conhece atrás de toda a idealização da Lagarta. Da amiga que vai solucionar os problemas de todos, a imbatível e invencível."

Lana tentou domar seu soluços ao máximo, sem sucesso. Falava isso apertando-o cada vez mais forte.

"E por isso... Eu te odiei. Por muito tempo, Ghunter. Você derruba as minhas barreiras, e eu odeio isso."

Ela se afastou para olhar em seu olhos. O rapaz parecia abatido.

"Mas você é importante pra mim. Muito importante. Eu gosto muito de você. Você é a minha família." Lana enxugou o rosto. "Desculpe por só ser capaz de admitir isto agora."

Para sua surpresa, Ghunter deixou escapar um sorriso trêmulo. 

Em seu diálogo, os feiticeiros não haviam notado o despertar de seus outros dois amigos. Giullian e Luce se entreolharam, receosos.

Sem mais palavras, deram as mãos.

"Meu único arrependimento," Sussurrou Giullian. "é não ter a oportunidade de contar a nossa história a mais ninguém depois."

A Lebre apertou sua mão mais forte, em um sinal de carinho. Sua garganta estava fechada demais para sair qualquer voz.

Foi neste momento de aparentes despedidas que uma porta surgiu na sala. Todos se levantaram, atentos.

A porta se abriu.

Dela saiu Alan.

Todos se assustaram. 

O quarteto ficou surpreso 1)Ao vê-lo, 2) Ao vê-lo vivo, 3) Ao vê-lo ali 4) Ao supor que ele tivesse sido inocentado perante ao Parlamento, que supunham até então ser revolucionário, 5) Ao vê-lo de barba.

Um pânico tomou, particularmente, Luce e Lana. Quanto tempo havia passado no País das Maravilhas? Ele não parecia muito mais velho, mas... Mais velho estava.

Alan também parecia muito receoso. Não tinha muita noção do quanto eles haviam envelhecido também. Encarou a irmã por alguns segundos.

Os dois correram para se abraçar. Riram.

"Não somos gêmeos mais." Comentou Alan. Luce sorriu.

"Quanto tempo se passou por aqui, Alan? Está tudo bem, o que aconteceu nesse meio tempo? Que raio de Parlamento é esse? Por quê pouparam a sua vida?"

"Calma, uma coisa de cada vez." Alan foi explicando, enquanto abraçava os outros. "Desde que vocês foram embora, um ano se passou aqui."

Todos suspiraram de alívio. Um ano, comparado a dois anos do mundo de Lewis. A diferença de tempo poderia ter sido pior.

"Onde está a Duquesa?" Perguntou Ghunter, alarmado.

"Ela foi uma dos poucos nobres que foi inocentada em julgamento. Afinal, ela nos ajudou - e nunca cometeu nenhum crime. Ela está bem, estamos vivendo juntos."

Ninguém entendeu muito bem como interpretar a última parte. Perguntariam mais detalhes depois.

Lana franziu o cenho. "Espere... Nós fomos inocentados?"

"Sim!" Exclamou Alan, com um sorriso triunfal.

A Lagarta foi desconfiando-se cada vez mais. "Mas nós éramos inimigos dos líderes da revolução... Não descobriram nada?"

"O julgamento e investigação que fizeram de vocês aconteceu por muitos meses. Tinha que ver, foi uma loucura. Pesquisaram testemunhas entre os revolucionários - estes disseram que Alice estava atrás de vocês. Mas, por outra mão, as Flores fizeram questão de desmentir qualquer coisa que acusassem vocês. Principalmente a Lagarta."

Lana suspirou de alívio - as Flores de sua vila estavam bem.

"Pois bem. Por um tempo ficou meio nebuloso o que vocês realmente tinham feito - afinal, eu só pude testemunhar até certa parte - mas muitos magos analisaram as cenas dos crimes a fundo. Viram que nenhum de vocês haviam matado Alice ou Pan. Viram que vocês estavam sendo manipulados por Alice, para que a antiga família real fosse morta. Viram inclusive que foram vocês que... Executaram a Dinastia Vermelha. Reconheceram o ato de vocês como um favor."

Giullian cruzou os braços. Reparou em uma leve marca na testa de Alan - como se tivesse usado uma tiara nas últimas horas.

"Mas claro que não divulgaram toda a história que descobriram no julgamento de vocês. Ainda era o início do Parlamento, não queriam que a população soubesse que a líder da revolução era uma louca obsessiva manipuladora que escravizava a mente de Pan. Eles divulgaram tudo de uma forma... Diferente."

Ghunter e Lana suspiraram.

"Eles pintaram nossa imagem como heróis. Guerreiros que foram contra a Dinastia Vermelha para salvar a todos e trazer justiça. Contaram que nós éramos aliados de Alice e Pan."

Giullian perguntou: "E como justificaram a morte deles?"

Alan deu de ombros. "Exaltaram como um sacrifício. Assim como fizeram com Carl."

Lana e Luce reviraram os olhos. Giullian ainda estava curioso. "Mas você e Carl eram da Dinastia Branca. A Revolução não queria acabar com todas as dinastias?"

"Alice queria." Respondeu Alan. "Mas os Revolucionários... Os Verdes decidiram que seria melhor vangloriar a Dinastia Branca. Não nos colocar de volta ao poder, mas nos deixar populares o suficiente para passar uma mensagem de misericórdia dos Verdes para aqueles que se arrependem e ajudam. Entendem?"

"E como." Murmurou Luce, receosa. Ela, como Giullian, também havia reparado na marca de tiara na testa de Alan.

Se perguntava se no País das Maravilhas havia se instaurado uma Monarquia Parlamentar, que nem a que havia na Inglaterra - país que vivera nos últimos dois anos.

Não queria saber. Então preferiu não perguntar.

"Vamos." Convidou Alan, apontando para a porta. "Estão nos esperando."

Lana entendeu para quê haviam os colocado em uma sala com feitiço. Para que não fugissem antes de explicações.


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