Anjo das Trevas escrita por Elvish Song


Capítulo 16
Acordo


Notas iniciais do capítulo

Sim, meninas! Mais um capítulo, porque estou inspirada! Espero que gostem!



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/662451/chapter/16

Não entendo mais nada! – gesticulou Gabrielle – Pensei que ia encontra-los brigando, e encontro... Isso!

– Olhe, não era o que eu pretendia, está bem? – devolveu a irmã mais velha, corada até a raiz dos cabelos – Nós brigamos, mesmo, eu mencionei Christine e ele... Ele me bateu. Ao me bater, ele se sentiu culpado, caiu de joelhos e começou a chorar, implorando perdão... Eu o abracei e... E começamos a nos beijar e...

E perderam o controle. – Finalizou a menina, cuja voz ainda não voltara após o susto. Surpreendentemente, ela sorriu – Sabia que ia acontecer, mais cedo ou mais tarde. Vocês gostam um do outro e, em algum momento, a atração ia ser muito forte. Especialmente quando você é experiente e ele, bem... – Gabi deu de ombros – Nunca teve uma mulher.

– Gabrielle! – Annika a censurou – Em primeiro lugar, isso não lhe diz respeito! E segundo, como pode saber? Erik certamente não lhe falou tal coisa!

– Meg falou. – respondeu a mocinha, recobrando a voz, com ar de travessa – ou disse que ele sempre foi temido, e que ninguém nunca se aproximou dele, o que dá no mesmo. Monsieur Destler não é o tipo de homem que contrata prostitutas, afinal. – e rindo ante o constrangimento da irmã – desculpe ter interrompido, Annie... Mas agora, vocês dois precisam conversar.

– Conversar?! Não consigo sequer olhar para ele, depois disso!

– Fala como se fosse o fim do mundo – disse a menina, jogando-se de costas na cama – o que há, Annie? Sete meses fora do bordel, e já se tornou uma dama recatada?

– Não somos prostitutas, Gabi. – disse a mais velha, séria – o que fizeram conosco não define o que somos.

– Não somos prostitutas, mas a vida que tivemos nos ensinou algumas coisas. E ser uma mocinha tímida não vai ajuda-la a lidar com nosso patrão. – ela se apoiou num cotovelo – Além disso, essa postura não faz o seu tipo. – alguns segundos de silêncio se passaram antes que prosseguisse - Está apaixonada por ele, vocês passaram muito perto de fazerem sexo e, se quiser conseguir viver sob o mesmo teto que ele, vai precisar esclarecer esta situação. Fugir de Monsieur Destler, fingir que nada ocorreu, não vai resolver nada.

Annika suspirou: a irmã às vezes era sensata demais. A voz dela ecoava os pensamentos da própria Annika, cujo constrangimento só não era maior do que a culpa; culpa por ter beijado Erik, sabendo que ele amava Christine, por ter deixado que a atração por aquele mascarado absurdamente fascinante e irritante ditasse meus atos... Por Deus, eu me portara como a prostituta que havia sido! Como a prostituta que eu tentava não ser a cada dia de minha vida! Como encarar meu senhor, depois daquilo?

– Pare de se culpar – disse Gabrielle – e resolva o problema. Você não fez nada que ele não quisesse, Annie. Eu, pelo menos, não o vi tentando afastá-la. – e antes que a irmã dissesse algo – Ah, por favor! Eu não vou aturar vocês dois se evitando outra vez, e me usando para mandar mensagens um ao outro, quando necessário. Vá resolver isso, de uma vez, Annika! – e piscando para a irmã – vá ser feliz.

Meneando a cabeça, entre a culpa, o divertimento e a irritação, a mulher sorriu e declarou:

– Você é um pequeno demônio, sabia disso? Quando ficou tão esperta?

– Uma de nós tinha de ser. Você estava ocupada roubando e matando para nos manter vivas. – devolveu a pequena. Era impressionante o modo como ela fingia não ser afetada por seu passado, muito embora os pesadelos de cada noite revelassem a farsa. Indicando a porta com a cabeça, Gabi insistiu – ele se trancou no quarto, aposto. Aconselho que o faça sair, porque, se entrar, não vão conseguir conversar.

– Diabinha! – acusou a mais velha, jogando um travesseiro na mais nova. Gabrielle lidava com o passado melhor do que ela, isso era fato. Annika nunca conseguia se livrar da culpa por não ter conseguido proteger sua irmãzinha, por não ter impedido que ela fosse violentada, prostituída e espancada... Gabrielle era mais estoica e, embora não houvesse passado incólume aos traumas, simplesmente aceitava as coisas tais como eram, sem se rebelar contra um passado que não podai mudar. Personalidades diametralmente opostas e, ainda assim, complementares. Annie era a força ativa, Gabrielle, a passiva. Uma resistia lutando, a outra, colocando-se acima do que a feria, e essas duas estratégias diferentes eram o que havia permitido a ambas sobreviver aos horrores que lhes haviam sido infligidos. Horrores que, de certa forma, haviam contribuído para aumentar o amor e o laço entre as irmãs, que já não se lembravam da última vez em que haviam brigado.

Sabendo que tinha de falar com seu patrão, a mulher se levantou da cama e deixou o quarto, ignorando o olhar satisfeito e maroto de sua irmã. Queria muito não precisar fazer aquilo, uma vez que sentia profunda vergonha de seu comportamento, mas sabia que era um assunto que não poderia deixar passar. Não se quisesse poder olhar Monsieur Destler nos olhos, outra vez.

*

– Erik! – Annika bateu à porta do quarto, chamando o Fantasma pelo nome. Não parecia certo trata-lo por Monsieur, naquele momento – Erik, por favor, abra a porta! Temos de conversar!

Um longo período de silêncio se passou, antes que a porta se abrisse devagar; Erik estava vestido com camisa e calça negras, de máscara, e os cabelos molhados diziam que acabara de sair do banho. Ele tinha o semblante sério, e parecia constrangido quando perguntou:

– O que foi, Annika?

– Precisamos conversar sobre... O que aconteceu. – ela sentiu o sangue fluir para seu rosto e deixa-la corada outra vez. Pensou que ele ia lhe dar as costas e fechar a porta e, por um instante, foi o que ele tencionou fazer; entretanto, algo o impeliu a conversar com a jovem, e o homem apenas anuiu.

– Vamos para a biblioteca, sim? – e fechou a porta do quarto, acompanhando a moça para o outro cômodo.

Sentaram-se cada um em uma cadeira estofada do aposento e, para constrangimento da moça, o Fantasma perguntou:

– O que quer falar?

– Eu... – ela meneou a cabeça, com raiva da própria timidez, que nunca antes se manifestara – Queria me desculpar por meu comportamento. Minhas ações fugiram ao controle e... – ela foi interrompida por um gesto do músico, que falou:

– Também as minhas atitudes não foram adequadas, Mademoiselle. Um cavalheiro deveria ter reagido a seu beijo afastando-a, e não, correspondendo. – ele se levantou e fingiu estar observando os volumes na estante, para que ela não visse a timidez em seu rosto – Mas não é fácil resistir a uma mulher com sua beleza. Então, também devo lhe pedir desculpas por meus atos. – ele se voltou para a mulher – creio que estamos quites. Então, a menos que queira me dizer algo importante, vou me retirar.

Erik teria saído da biblioteca, não fosse a voz da jovem o interromper:

– Erik, não podemos continuar desse jeito! – havia um tom de súplica na voz dela, que o fez se voltar e fita-la outra vez – Não consigo mais viver desse modo!

– De que modo, Annika? – ele parecia quase amável.

– Como temos vivido! Não podemos continuar a nos tratar como inimigos... Vivemos sob o mesmo teto e, gostando ou não, sou sua escrava. Não podemos continuar nos ignorando, brigando como temos feito...

Ele parou por longos instantes, antes de se aproximar da jovem e se ajoelhar ao lado dela, segurando-lhe a mão:

– Annika... Eu não sei o que está havendo: você me perturba muito. Sua presença aflora o que tenho de melhor, mas também o que tenho de pior. Não sei o que é, nem compreendo por que você me encanta e irrita tanto; num instante quero beijá-la, e no momento seguinte poderia mata-la. Se finjo ignorá-la, é porque só assim você estará segura. Sou uma pessoa instável, e o único modo de saber que não farei uma tolice é ficar longe de você.

– Eu não preciso que você me proteja, nem dos outros, nem de si mesmo. – respondeu ela - mas não suporto mais ser prisioneira nesta casa, com alguém que me evita a todo instante.

– Você pode sair do sobrado.

– Idas ao mercado? Pequenas caminhadas? – ela arfou – não é disso que estou falando, Erik. Estou falando de ter uma vida. Você tenta me impedir de ver meus amigos, impede-me de ir a outros lugares, prende-me nesta casa e, ainda assim, evita-me sem parar. Estou completamente só, a não ser por minha irmã... E isso me faz sentir raiva. Raiva de você, e isso não é certo. Por sua causa, minha irmãzinha e eu deixamos o bordel, e sou-lhe grata... Mas trocar uma prisão por outra não é liberdade.

– Não lhe prometi liberdade, Annika. Você é minha, e não vou deixa-la partir.

– Sei disso. Você me lembra disso todos os dias. Mas não podemos continuar desse modo, Erik: tem me tratado como uma prisioneira, não como uma serva... Por favor, não consigo mais... – ela se levantou e começou a andar pela sala, enquanto ele se levantava:

– E o que espera que eu faça? Que a liberte?

– Que confie em mim. – respondeu a moça, olhando pela janela - Não vou tentar fugir: não vou tentar, por causa de Gabrielle. Ela nunca foi tão feliz, e eu não estragaria a alegria dela por um desejo egoísta. Mas, se ficarmos ambos confinados sob o mesmo teto, se eu não tiver algo para direcionar minha mente, nunca vamos conseguir conviver! Meu mau gênio não o permitirá, acredite em mim! – antes, toda a atenção da moça se direcionava aos crimes que cometia, e ao cuidado para garantir que Lucian não teria pretexto para espancar ou vender Gabrielle. Agora, contudo, a segurança de Gabi já não era ameaçada, e toda a energia da moça se dispersava na forma de raiva e frustração, que os livros não podiam aplacar. A música a acalmava, mas quando o silêncio reinava, a jovem se tornava uma fera enjaulada.

O Fantasma meditou por longos minutos, apenas considerando as palavras dela, antes de dizer afinal:

– Quero-a pronta todas as manhãs, para ir comigo e com Gabrielle ao teatro. Você começará a ter aulas de canto, e providenciarei para que possa ensaiar com a orquestra. Se a acharem competente, pode mesmo se tornar parte desta... Quem sabe, até uma solista. – ele entrelaçou a mão possessivamente aos cabelos dela – fará amigos, terá pessoas para conversar, e nos veremos com menor frequência. Terá pequenos trabalhos a fazer por lá, que irão tomar sua atenção. Porém, estará ao alcance de meus olhos, e poderei vigiá-la. Continua pertencendo a mim, senhorita Anjou.

Annika teria estourado, se não soubesse que isso seria inútil. O que Erik lhe oferecia era muito mais do que tinha, no momento; com o tempo, quem sabe, pudesse conquistar sua confiança e ganhar maior liberdade. Por hora, contudo, teria de se contentar com aquilo. Ficava satisfeita em reduzir a proximidade com seu amo, uma vez que já era impossível negar a atração que havia... Uma atração muito perigosa, para ambos.

– Obrigada, Monsieur. – disse ela, enfim – é muito bondoso.

– Não, Annika. Não sou. – retrucou ele – e é por isso que providencio para que fique mais tempo longe de mim. Sua beleza, seus olhos e até seu cheiro me perturbam, e fazem com que não tenha controle sobre mim. Para seu próprio bem, é melhor ter algo mais a fazer, além de ficar nesta casa. Algo que a deixe longe de meu alcance. – e o modo como ele disse aquilo deixou uma enorme dúvida na mente da mulher: poderia seu patrão sentir por ela algo mais do que o puro e cru desejo carnal? Haveria nisso qualquer possibilidade?

Sem sequer se despedir, o Fantasma retornou a seus aposentos, deixando uma confusa, feliz e surpresa Annika sozinha na biblioteca. Como haviam chegado àquele acerto, mesmo? Havia ido até ali pedir desculpas por um motivo, e a conversa se desvirtuara completamente... Mas não parecia ter sido um fracasso. De algum modo, parecia antes um sucesso maior do que podia compreender. E a ideia de que seu amo pudesse, mesmo que infimamente, corresponder a seus sentimentos, a alegrava de um modo inexplicável.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

E aí? viajei muito na conversa dos dois, ou ficou convincente? Se eu tiver viajado muito, me avisem, por favor, porque às vezes me empolgo e as coisas saem meio sem noção, mesmo.
De qualquer jeito, espero que tenham curtido o capítulo, e me despeço com beijo grandes!



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Anjo das Trevas" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.