Suburbia escrita por Eduardo Mauricio
Max saiu de casa e parou na calçada e olhou a caixa de correio. Não tinha nada. Mas é claro que não tinha, era domingo. Ele só estava ali para observar a vizinhança. Virginia estava aparando a grama com um grande cortador. Ela sorriu e acenou para ele quando o viu. Max acenou de volta.
O que tinha de errado com aquela mulher? O que tinha de errado com todas aquelas pessoas? Ele sabia que tinha algo.
— Bom dia — disse Pixie, pegando-o de surpresa.
— Oh, bom dia — falou ele. Talvez ela fosse a única pessoa normal daquele lugar, afinal.
— O que está fazendo aqui fora?
— Nada, só olhando.
— Eu vi a sra. Swanson sair da sua casa ontem, o que ela queria?
— Eu não sei bem, na verdade, ela queria que eu revisasse um roteiro, mas depois pediu para ver o sótão.
— O sótão? — Ela pareceu confusa.
— Sim, eu também não entendi muito bem.
— Ela é meio louca — disse Pixie. — Uma rainha do drama total, outro dia ela fez um escândalo porque meu cachorro cagou na grama dela.
Max riu.
— É sério. — Ela também.
— Oi gente — disse uma doce voz feminina, pegando-os de surpresa como Pixie havia feito.
— Ah, oi Sophia — falou Max, olhando para a garota de vestido branco de bolinhas vermelhas que segurava um pacote de batatinhas de churrasco.
— Oi, Soph — disse Pixie.
— Quem mora naquela casa? — perguntou ele, apontando para a enorme mansão do outro lado dos muros que fechavam a rua.
As duas se entreolharam.
— Ela é uma mulher reservada — disse Sophia. — Nós só a vemos sair daquela casa uma vez por mês.
— Sério?
— Sim — respondeu Pixie. — O nome dela é Eve.
— Ela tem uma casa legal — falou Max.
— É verdade — Sophia concordou, colocando algumas batatinhas na boca.
Os três ficaram olhando a casa por alguns instantes, até ela quebrar o gelo:
— Está na hora da banho da minha mãe — disse ela. — É melhor eu ir andando.
— Ei, vai fazer alguma coisa hoje à tarde? — perguntou Pixie.
— Não, por quê?
— Vamos ver um filme lá em casa?
— Ok, eu passo lá depois das duas.
— Tudo bem.
Sophia se virou e começou a caminhar em direção à sua casa no fim da rua, quase saltitando, como sempre.
— Por que você não vem também? Traga seu parceiro também — ela falou.
— É, pode ser legal.
— Então eu te vejo às duas.
— Tudo bem.
— Tchau tchau.
— Tchau.
Pixie também foi embora, alcançando Sophia. Ele voltou para dentro de casa, onde encontrou Henry, sentado no sofá e assistindo ao jogo, que estava quase no final.
— Você nunca sentiu curiosidade em saber quem mora naquela casa grande no fim da rua? — Max perguntou, sentando no sofá ao lado do marido.
— Que casa?
— A mansão no fim da rua, não é possível que você não tenha percebido.
— Ah sim, a mansão... Quem mora lá?
— Não sei, as garotas falaram sobre uma mulher, Eve, mas elas mal a veem. Agora estou mais curioso... Enfim, o que você está fazendo?
— Que tipo de pergunta é essa?
— Não sei, só estou entediado.
— Quer transar?
— Não, obrigado. — Ele riu e ajeitou os óculos no rosto.
— Então assista ao jogo comigo.
— Ei, você quer ir à casa da Pixie hoje à tarde? Ela nos convidou.
— O que vamos fazer lá?
— Sei lá, assistir a filmes de terror adolescentes, conhecer alguém normal, essas coisas...
— Eu sinto como se tivesse 15 anos de novo.
— Não seja um chato, vai ser melhor do que ficar em casa sem fazer absolutamente nada, só olhando para a minha cara.
— Mas a sua cara é linda.
— Querido, você vai ou não?
— Não sei, vou pensar.
***
A casa de Pixie era bem aconchegante. O piso era de madeira, mas as paredes eram brancas, o que deixava a casa muito bem iluminada.
A sala era pequena, com um sofá bege e uma grande TV na parede.
Sophia estava no sofá, com um balde de pipocas nas mãos. Quando Max e Henry entraram, Pixie fechou a porta atrás deles e correu para o tapete em frente ao sofá, onde havia algumas almofadas rosas.
— Mi casa, su casa — ela falou. — Sintam-se à vontade.
Os dois sentaram no sofá.
— Bela casa — disse Henry.
— Obrigada.
— Então, vocês estão juntos há quanto tempo? — perguntou Sophia, com seu sorriso simpático no rosto.
— Três anos — respondeu Henry. — Ou um pouco mais do que isso, é? — Ele olhou para Max, que assentiu com a cabeça.
— Vocês têm namorado? — perguntou ele.
Sophia pareceu ficar acanhada.
— Eu nunca namorei sério, para falar a verdade — respondeu Pixie. — Só uns rolos aqui e ali.
Interrompendo a conversa, a campainha tocou. Pixie se levantou e foi atender. Todos olharam para a porta e viram Virginia, que ficou surpresa ao ver Henry e Max na sala.
— Venha comigo — disse ela.
Parecendo assustada, ela saiu.
Sophia observou um pouco preocupada também.
— O que houve? — perguntou Henry.
— Eu não sei — respondeu ela. — Ela deve ter comprado algo errado de novo.
— Como assim?
— Virginia nunca vai ao supermercado, ela sempre manda alguém.
— Ela nunca vai? — disse Max, um pouco cismado.
— Não, ela é bem folgada.
— Eu a vi lá ontem, achei que ela estava me seguindo.
A garota pareceu surpresa.
— Ela te disse alguma coisa?
— Não, o que ela me diria?
— Não sei... Quer dizer... Sei lá, é, não sei.
Sophia se levantou e foi até a cozinha, apressada.
Henry e Max se entreolharam, estranhando. Quando ela voltou, parecia nervosa. Se sentou no tapete e olhou para a janela. Correu até ela e fechou a cortina.
— Eu preciso falar uma coisa — disse.
— O quê? — perguntou Henry.
Ela correu até o outro lado da sala e fechou as outras cortinas.
— Sophia, o que houve? — perguntou Max.
A garota voltou ao tapete e se sentou.
— Ninguém pode saber que eu estou contando isso, mas é bem provável que eles estejam escutando.
Ela se aproximou dos dois e começou a falar muito baixo.
— Não façam perguntas, ajam normalmente.
— O que está acontecendo?
— Vocês estão correndo perigo — ela disse, olhando para os lados como se alguém estivesse observando por trás das paredes. — Precisam sair daqui o mais rápido possível.
Logo depois, ela voltou a colocar seu sorriso simpático no rosto.
— Pipoca? — ela perguntou, sacudindo o balde na frente dos dois.
***
Durante a noite, Henry e Max estavam deitados na cama, com os abajures ligados. Como sempre, Henry mexia em seu celular.
— Qual a sua opinião sobre gatos? Eu sempre quis um — falou ele.
— Você vai ignorar totalmente o que Sophia disse hoje à tarde? — disse Max, mudando de assunto.
— Ela é meio louquinha, provavelmente ela só estava brincando.
— É claro que não estava! Você não viu como esses vizinhos são estranhos? Vai ver eles estão tramando alguma coisa.
Henry começou a rir.
— Max, você está começando a ficar paranoico — ele disse.
— Você nunca acredita em mim, porra!
— Ok, ok, não precisa ficar estressado. — Ele beijou seu pescoço e passou a mão pelo seu peito, mas Max recusou os carinhos, virando-se para o lado.
Henry voltou a mexer no seu smartphone.
— A luz do corredor está acesa, você pode ir desligar? — perguntou ele.
Max se sentou na cama e olhou para a fresta de baixo da porta, por onde passava a luz do corredor. Ele se levantou e caminhou até lá, mas parou na metade do caminho quando viu duas sombras do outro lado.
— O que houve? — perguntou Henry, vendo que ele estava paralisado.
— Venha aqui, agora — ele falou.
Henry olhou de longe, mas podia ver as duas pequenas sombras embaixo da porta. Havia alguém do outro lado.
— Oh meu deus — disse ele, perplexo.
— Quem está aí? — perguntou Max, sem obter resposta, como já esperava.
— Eu estou ligando para a polícia — falou Henry. — Seja quem for, sugiro que vá embora!
Max se abaixou e colocou o rosto no chão, olhando por debaixo da porta. Podia ver os dedos daqueles pés apodrecidos e ensanguentados. A mesma mulher de antes.
Ela saiu correndo para a direita, mas o sangue continuou gotejando da porta.
Ele se levantou e a abriu, olhando para o corredor. Ela havia sumido.
— Merda — disse ele, ao ver a porta.
— O que foi? — perguntou Henry, caminhando até lá.
Na porta branca, escrito amadoramente com sangue:
Não confie em ninguém.
Não quer ver anúncios?
Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!
Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!