Suburbia escrita por Eduardo Mauricio


Capítulo 2
Capítulo 02 - Abominação




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No fim da tarde, Henry chegou do trabalho e parou seu carro, que ele havia buscado na oficina naquele mesmo dia, em frente à garagem da casa. Estava usando um elegante terno preto, como seu emprego de diretor de marketing exigia. Ele desceu do veículo, segurando uma sacola de papel, e o trancou.

Pestes a caminhar até a porta da frente, ele percebeu que havia uma mulher na calçada, como se tentasse observar algo dentro da casa. Ela usava um vestido cinza que se estendia até a altura das canelas, com mangas compridas e botões fechados. A mulher também tinha longos cabelos ruivos e um rosto pálido. Deveria estar perto dos seus sessenta anos.

Ela olhou para Henry com um misto de desconfiança e raiva e ele estranhou.

— Posso ajudá-la? — perguntou.

— Não te deitarás com um homem como se deita como uma mulher, é uma abominação — respondeu ela, friamente. — Levítico, capítulo 18, versículo 22.

Ele abriu um sorriso educado. Era só o que me faltava, ele pensou. Uma fanática religiosa.

— Desculpa, eu não entendi.

— Você entendeu — disse ela.

— Eu posso ajudá-la em alguma coisa?

Ela o olhou com desconfiança mais uma vez, mas não respondeu nada. Virou-se e começou a caminhar tranquilamente pela rua.

Henry caminhou pela passarela de pedra entre o pequeno jardim de grama e entrou em casa.

Caminhou até uma porta dupla corrediça depois da sala e entrou. Max estava sentado em frente a um notebook em uma mesa de madeira.

— Como está meu querido marido? — disse ele.

Max abriu um sorriso e Henry caminhou até ele, dando-lhe um beijo na boca.

— Com um bloqueio criativo dos infernos — Max respondeu, esfregando as têmporas.

— Por que tanta pressa para escrever um novo livro? Black Water está vendendo como água.

— Ha ha ha, muito engraçado.

— Mas é sério. — Henry ficou atrás de Max e começou a massagear seus ombros. — Está vendendo bem.

— De qualquer forma, eu tenho uma entrevista de emprego em uma revista de moda amanhã, vamos ver como me saio.

— Moda? Isso é tão gay — ele brincou.

Max riu.

— Tinha uma mulher bem estranha parada na nossa calçada hoje — disse ele.

— Quem?

— Eu não sei, mas ela era ruiva.

— Acho que eu nunca a vi.

— Pois é, ela estava olhando nossa casa... Eu perguntei em que podia ajudá-la e ela citou uma passagem homofóbica da bíblia.

— Uh, fanática religiosa? Acho que seremos bons vizinhos — brincou Max.

— Pois é, não me passou uma boa primeira impressão... Ela poderia ter sido um pouco menos agressiva, né? Quem sabe um "oi" funcionaria antes de vomitar toda essa merda de que o homem não deve se deitar com outro homem como se fosse uma mulher. Enfim, ela me pareceu bem louca de pedra, coitado dos filhos, se ela tiver...

— Acho que você deve convidá-la hoje à noite para vir ver você deitando com um homem como se fosse uma mulher.

Henry riu.

— Eu te trouxe um sanduíche de almôndegas — disse ele, sacudindo a sacola de papel.

— Com muito molho? — perguntou Max.

— Eu sei como você gosta — ele respondeu. — Afinal, sou seu marido... Ainda soa estranho, né? Falar "marido"?

— Um pouco. — Max sorriu.

— Eu vou deixar o sanduíche na cozinha.

— Eu já vou comer, mas preciso entregar a bandeja daquela mulher primeiro, a da torta.

— Tudo bem.

— Você não vai trabalhar hoje à tarde?

— Dia livre, baby! Podemos ir ver aquele filme que você está querendo, o de terror.

— Ótimo!

***

Max saiu de casa com a bandeja de porcelana em suas mãos. Lembrou que Virginia dissera que morava a duas casas da dele, então ele caminhou pelas duas casas no caminho, todas muito parecidas, espaçosas e com jardins bem cuidados, e chegou até a dela. Caminhou pela passarela de pedra, equilibrou a bandeja em uma das mãos e apertou o pequeno botão vermelho da campainha.

Esperou alguns segundos, mas ninguém veio atender, então tocou novamente.

Ele virou-se e olhou ao redor, sem saber muito o porquê; Depois de alguns instantes, tentou novamente. Ninguém veio atender.

— É melhor desistir — disse alguém. Ele se virou e viu que era uma bela mulher, jovem, de cabelos loiros e levemente ondulados e grandes olhos verdes. Ela usava camiseta e calça jeans e seu pequeno cachorro branco e felpudo estava parado ao seu lado, olhando para os lados. — Ela provavelmente foi ao mercado, e eu provavelmente não contaria com o Hoyt para vir atender.

— Hoyt?

— Sim, é o filho dela... O mais velho.

— Que nome incomum — disse Max, caminhando até a calçada. — Eu sou Max.

Ela estendeu a mão e ele apertou.

— Pixie — falou ela, com um sorriso.

— Obrigado por evitar que eu ficasse meia hora apertando a campainha... Acredite, eu faria isso.

Ela riu, mas depois parou, encarando o rosto dele com familiaridade.

— Oh meu deus — disse ela, arregalando os olhos. — Você é Max Walker?

Ele se espantou, mas abriu um grande sorriso.

— Sim, sou eu mesmo — ele respondeu, ajeitando o óculos no rosto.

— Oh meu deus, oh meu deus, eu amo o seu livro, Black Water, eu amo muito mesmo.

— Uau, eu nunca tinha conhecido um fã... Posso te considerar uma fã, né?

— Definitivamente!

— Eu nem sei o que dizer, isso é maravilhoso!

— Eu não acredito que moro na mesma rua que você, isso é demais!

— Então você gosta tanto assim de Black Water?

— Sim, muito!

— Uau, obrigado.

— Você é muito talentoso.

— Obrigado de novo.

Neste momento, eles foram interrompidos por uma garota loira de cabelos curtos. Sophia. Ela usava uma camiseta azul-marinho por baixo da sua jardineira e tinha em mãos um sorvete de casquinha, provavelmente de morango.

— Oi, gente — disse ela, simpaticamente.

— Oi, Sophia — falou Pixie, educadamente.

— Ah, oi.

— Sabe aquele livro que eu te mostrei? Black Water?

— O dos garotos que perdiam a mãe e começavam a alucinar? Sim.

— Ele é Max Walker!

Ela olhou para Max com surpresa.

— Não brinca!

— É verdade!

— Pois é — disse ele, começando a ficar um pouco acanhado.

— Uau, um escritor por aqui... Quem diria?

Sophia deu uma lambida no sorvete e o encarou com um sorriso, como se tivesse algo a esconder.

— Bem, eu preciso ir agora, minha mãe está doente — disse ela. — Vejo vocês depois.

— Ok, tchau — falou Pixie.

— Tchau.

— Eu sei o que deve estar pensando — ela continuou, enquanto observava Sophia caminhar quase saltitando pela calçada. — Ela é um pouco louquinha mesmo, mas é gente boa.

— Ela parece legal.

— Bem, eu preciso ir também — Pixie concluiu. — Foi ótimo te conhecer, Max, nos vemos por aí?

— Claro. — Ele sorriu.

Pixie começou a caminhar pela rua sem saída.

***

Pela noite, Max estava deitado em sua cama, com os dois abajures acesos e os olhos concentrados no livro que tinha em mãos.

Henry entrou no quarto, vestindo apenas um calção folgado.

Ele se deitou ao lado de Max e tocou seu peito nu.

— Você fica sexy quando está lendo — disse ele. — Essas piscadinhas que você dá a cada quinze segundos são adoráveis.

Max sorriu, sem tirar os olhos do livro.

— Então, eu estava pensando... — disse Henry. — Você quer ter mesmo um filho?

— Claro que sim, nós fazemos agora ou o quê?

— Eu estou falando sério.

Max fechou o livro e colocou sobre o criado-mudo. Fez o mesmo com os óculos. Depois olhou para Henry e sorriu.

— É tudo o que eu mais quero — disse ele.

Henry abriu um sorriso branco e o beijou. Em seguida, se aproximou e passou a perna por cima das coxas de Max, ficando por cima dele.

— Então nós vamos fazer o filho agora? Ok.

Henry beijou seu pescoço e as mãos de Max passearam pelas suas costas nuas.

As mãos de Henry logo estavam mais embaixo, por dentro da cueca dele.

Max passou as mãos pelos cabelos dele e fechou os olhos enquanto Henry acariciava seu corpo. Quando abriu, se assustou ao ver, por cima dos ombros dele, uma pequena cabeça na porta, os observando. Era uma criança, um garoto pálido. E estava sorrindo.

— Merda! — exclamou Max.

— O quê? — perguntou Henry, olhando para trás. Não havia nada, apenas a porta semiaberta.

— Tinha alguém ali — respondeu ele, realmente assustado.

— Do que você está falando?

Max se levantou, vestiu suas calças de novo e correu para o corredor. Nada.

— Eu vi uma criança aqui.

— Por que diabos teria uma criança aqui?

— Eu não sei, porra.

Ele correu e desceu as escadas. Henry foi atrás.

— Max! — chamou ele.

Quando desceu também, Max estava olhando pela janela. Depois verificou se a porta estava trancada e foi até a cozinha.

— Não seja paranoico — falou Henry. — Não tem ninguém.

— Eu vi uma criança, Henry, eu juro.

— Max, você está sem óculos, talvez tenha se confundido.

— Eu não estou ficando louco.

— Vamos voltar para o quarto e continuar fazendo nosso filho — ele brincou.

— Você pode voltar e bater uma no banheiro, porque eu não estou no clima. — Max passou por ele e subiu as escadas, irritado.

Definitivamente havia uma criança ali. Ele não estava louco e nem era cego.


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