O Bosque escrita por KyonLau


Capítulo 3
Terceiro Contato


Notas iniciais do capítulo

CONSEGUI! T^T Postei esse capítulo!
Desculpa gente, a semana anda meio corrida por uns motivos e outros.
Mas hoje eu sentei a bunda na cadeira e disse a mim mesma que não sairia até terminar esse capítulo. PARA ONTEM.
De qualquer forma, tomara que gostem, pois estamos na reta final. Falta só um capítulo para acabar aquilo que na verdade deveria ter sido uma one-shot! YEEEY o/



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O serviço dominical era sempre o mais agitado. Todas as manhãs de domingo, um número gigantesco de famílias ia até a igreja professar sua fé em Deus. Mas não dessa vez. Não hoje.

As pessoas agrupavam em torno dos degraus que levavam à igreja. Alguns colocavam a mão na boca, outros arregalavam os olhos e outros ainda davam berros e tapavam os olhos das crianças. Mas todos estavam horrorizados.

Uma faixa amarela posta pela polícia no momento em que chegaram apenas chamava mais a atenção para o corpo contorcido e para a cabeça decapitada de uma infeliz senhora. Seus olhos estavam fechados, embora seu rosto se contorcesse em horror. Seu corpo estava completamente seco, sem uma única gota de sangue para manchar a calçada.

***

Um trovão ressoou levemente, deslizando por entre as nuvens cinzentas e carregadas que despejavam uma chuva fina e gelada. Esta chuva descia e penetrava o solo onde os mortos descansavam e molhava a cabeça dos vivos, logo acima, que lamentavam tal descanso.

Todos ficaram a mercê do clima tempo suficiente apenas para observarem o caixão deslizar suavemente para dentro da gaveta escura e repleta de pó. Fora, na verdade, um alívio ter a tampa do caixão finalmente posta em seu devido lugar, escondendo o corpo mutilado e costurado novamente. Algo tão grotesco, que em pouco ou em nada lembrava o indivíduo ainda vivo, só trazia horror aos que tentavam se entristecer.

Agora, após a caixa ser finalmente lacrada com cimento e pedras, apenas uma figura se mantinha parada em frente ao túmulo, absolutamente imóvel, enquanto todos os outros já haviam andado o mais depressa que a lama escorregadia pelos caminhos havia permitido, diretamente para a segurança e conforto da capela.

Depois de vários minutos apenas encarando, seus dedos tocaram, hesitantes, a escritura da lápide como se estivessem acariciando um recém-nascido. Ali estava escrito simplesmente: "Aqui jaz dona Graça da Conceição. Que seu espírito descanse em paz", seguido pela data de nascimento e morte, respectivamente.

Da segurança da capela, a empregada da família olhava aquilo com apreensão, os lábios pressionados em uma linha.

Tomando, no entanto, uma decisão, ela abriu uma segunda vez o guarda-chuva preto e ligeiramente torto que carregava e dirigiu-se pela estradinha cuidadosamente até chegar na figura solitária, protegendo-a da chuva enquanto se deixava molhar.

— Vamo voltar, princesa — sua voz estava rouca de tanto chorar agora e sua cabeça doía, mas ela estampou seu melhor sorriso, mesmo que a outra não pudesse vê-lo — Chega de ficar na chuva. Tua mãe não ia querer isso.

Silêncio.

— Não — disse Vitória por fim — Não ia. Vamos voltar, Babi...

Mas seus olhos vidrados permaneciam fixos no túmulo. Não estavam vermelhos, tampouco molhados. Não havia um único sinal de choro.

Babi inclinou-se para olhar melhor a moça. Durante todo o serviço ela não demonstrara estar nem remotamente triste pela mãe. Nenhum traço de dor. Todos, logicamente, pareceram escandalizados com toda essa indiferença, mas Babi conseguia compreender. Ela estava em choque, e não era para menos!

A empregada era um palmo mais baixa do que Vitória, mas conseguiu esticar a mão e prender uma mecha de seus belos cabelos atrás de sua orelha com carinho.

— Tu é adulta agora, Vi — falou baixinho — Mas adulto também chora. Quando cê precisar chorar, a Babi vai estar aqui procê, tá?

Vitória não demonstrou ter ouvido. Continuou encarando a lápide da mãe como alguém encararia um programa de televisão levemente interessante, mas não o suficiente.

Com um suspiro de profunda tristeza e um aperto no coração, Babi voltou lentamente para a capela, já bastante vazia agora, no intuito de orar pela sua princesa.

Em algum momento, depois daquilo, o chuvisco foi se reduzindo até parar completamente. As nuvens foram se separando e deixando passar os últimos raios de luz antes do sol se por. Uma mão gentil pousou no ombro de Vitória. Era o padre, que viera dizer para ela ir para casa de descansar.

A moça murmurou qualquer coisa que o deixou satisfeito o suficiente para voltar para o interior iluminado da igreja logo em frente.

Ao longe, por entre as árvores e o mato, um vulto alto e pálido se mexeu ligeiramente, captando a atenção de Vitória. Ela o encarou de volta apenas por breves instantes antes de virar as costas e começar a caminhar em direção à saída.

Ela sabia que Tera não poderia entrar ali. Portanto não faria nada.

Agora.

A voz soou em sua mente como um número incontável de unhas arranhando a superfície de um quadro negro, desconjuntadas, e a fez se arrepiar em desagrado.

Um outro olhar, ligeiramente aborrecido, foi lançado para o ponto onde anjo estivera segundos atrás, mas já não havia mais nada ali. Vitória parou na altura no portão do cemitério e olhou as primeiras estrelas do céu. Depois inspirou fundo, enchendo de ar seus pulmões como há muito não fazia. Articulou os dedos das mãos e dos pés como se tivessem câimbras, fazendo-os estalarem o máximo que podia. Depois expirou.

O frio condensara sua respiração e ela pode vê-la se esvaindo rapidamente até desaparecer por completo.

E pôs-se em direção ao Bosque da Solidão.

***

Tudo estava morto.

Não havia folha alguma nos galhos das árvores. Tudo estava cinza ou marrom e absolutamente imóvel. Uma coruja olhou apenas brevemente Vitória passar por entre os arbustos repletos de espinhos, sem se incomodar em rasgar sua roupa ou pele. Havia um rangido incômodo produzido pelos troncos cansados e expostos ao vento, mas a moça não deu atenção a nada disso e prosseguiu decidida.

Parou.

Estalos e o ruído de galhos sendo partidos anunciaram a aproximação de Tera.

De qual lado?

Parecia que a circulava e ela só podia olhar de um lado para o outro, topando com as árvores e com a escuridão.

Dedos gelados se fecharam na mão esquerda de Vitória, que virou-se depressa, deparando-se com o já bastante familiar sorriso de Tera. Suas unhas finas foram subindo lentamente pelo seu braço até seu ombro e, finalmente, parando em seu peito. Ela pode sentir seus dedos finos pressionarem com mais força o local, arranhando e arrancando sangue.

Vitória suspirou.

— Agora?

— Agora.

Vênus brilhou no céu noturno, impossível de ser visto por debaixo daqueles galhos tortuosos que se abraçavam freneticamente, se enrolavam e se torciam numa tentativa desesperada de se fecharem para o mundo.

— Tudo bem... Pode levar — respondeu ela displicentemente — Espero que consiga ir embora, finalmente.

Lentamente, Vitória agarrou a barra da blusa e foi levantando, expondo seu umbigo, depois suas costelas e subiu até acima dos seios.

Fechou os olhos.

Primeiro, sentiu uma dor aguda na altura do estômago. Sentiu o sangue aflorar e escorrer pelo seu abdômen, queimando contra sua pele fria. A dor se intensificou à medida que os dedos de Tera foram penetrando sua carne e perfurando seus órgãos e então, mudando de direção, começou a ir perfurando seu caminho para cima, adentrando sua caixa torácica lentamente. Seus joelhos finalmente cederam e ela caiu, mas a mão não parou seu progresso, perfurando seus pulmões e provocando um forte acesso de tosse misturado ao sangue. Já não havia mais ar. Era como se alguém tivesse posto um travesseiro em seu rosto e estivesse mantendo-o ali, firmemente.

E então, finalmente, Vitória sentiu a mão gelada se fechar triunfalmente em torno de seu coração que batia enlouquecido.

Com um agitar de asas, Tera puxou coração ainda pulsante, colorindo seu próprio corpo e rosto de vermelho e o retirou cuidadosamente pelo mesmo caminho que abrira para chegar até ele.

A criatura aproximou o órgão de seu rosto para olhar melhor. Sua língua pulou para fora da boca quase que instintivamente e deu uma prazerosa lambida em toda a sua extensão e então, como se temesse que seu tesouro desaparecesse, no segundo seguinte engoliu-o inteiro.

Ele ficou parado, imóvel por alguns instantes.

Bateu suas asas novamente, mas apenas por hábito. Elas jamais o fariam voar novamente.

Foi até uma árvore e começou a escalá-la com movimentos rápidos como nunca antes tivera. Não parou até alcançar a sua copa, onde parou em cima dos galhos que rangiam sob seu peso e lançou um demorado olhar para Vênus.

Finalmente.


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Notas finais do capítulo

Eu não consigo me livrar da nóia de ter escrito algo indigno de se chamar "terror"... vocês falariam se estivesse ruim, né? ;w;
Mas não vou falar muito mais disso, daqui a pouco alguém vai pensar que estou tentando cavar elogios ;v
Bom, vou calar a boca para não me complicar mais.
Calei.
Podem falar o que quiserem agora s2 (quanto tempo não vejo alguém usar o s2?) s2s2s2s2s2
Prontinho :3