-Pra onde você vai, Peter?

A garota perguntava para o amigo que já estava na porta com uma mochila nas costas.

-Tenho que ir para casa, aconteceram alguns imprevistos por lá - respondeu por sua vez, ficando de frente para a garota, que agora estava com uma expressão de confusão e preocupação no rosto.

-De novo? Ontem à noite você disse a mesma coisa quando estávamos no cinema... É só você receber uma ligação, que já fica assim e diz que tem de ir para casa. Tem certeza que não quer me contar nada?

O garoto se aproximou dela com um sorriso compreensivo no rosto.

-Não está acontecendo nada demais, não precisa se preocupar com isso. É sério... Daqui a pouco já estou de volta, mas tenho que ir resolver isso agora. Tudo bem?

Ela forçou um sorriso assentindo com a cabeça. Ainda não estava convencida de que as saídas repentinas de seu amigo fossem para resolver simples problemas de família. Problemas de família não demoravam tanto assim para serem resolvidos, especialmente da família dele.

-Sabia que você iria entender, Ash... - disse depositando um beijo na testa dela - Juro que não vou demorar.

A garota sabia que isso não iria acontecer, sabia também que o mais cedo que ele poderia chegar ali, seria no outro dia de manhã.

Então, resolveu que hoje iria descobrir o que seu melhor amigo fazia todas as noites e nunca sequer contou para ela.

Ashley

Logo após Peter sair do meu quarto, corri para o banheiro e tirei o pijama colocando uma roupa descente para sair de casa numa noite fria.

Peguei minha jaqueta e a coloquei descendo a escada praticamente voando.

Gritei um "tô saindo”, como se alguém se importasse com isso e saí de casa.

O vento gelado foi contra o meu rosto fazendo com que eu me abraçasse e quase desistisse de saber daquilo, mas logo mudei de ideia quando vi uma luz virando a esquina e entrei dentro do carro.

Segui o carro de Peter até uma parte mais isolada da cidade, pensei em que raios ele estava fazendo ali e desisti de pensar. Fui agir.

Desliguei o carro e andei na direção em que ouvia algumas vozes. Péssima ideia.

-Qual é cara, você tem que arrumar uma desculpa nova para quando for caçar... Assim ela vai acabar descobrindo - uma sombra no meio das árvores disse

-Na hora não dá pra pensar em desculpas boas... Afinal, um dia vou ter que contar pra ela.

Era a voz de Peter.

Cheguei mais perto de uma árvore e vi que a outra voz pertencia a um dos caras do time do colégio. Ele e Peter seguravam armas e olhavam para os lados a todo momento.

Então era isso, eles só saiam pra caçar. Tá, o que tem de tão mal nisso que ele não possa me contar?

Uma sombra passou rasgando entre as árvores me causando arrepios. Os dois seguiram em frente e eu fui atrás deles. Péssima ideia, de novo.

Alguma coisa passou por mim num piscar de olhos. Pensei que fosse mais uma das minhas paranoias, mas para minha tristeza... Não era.

Não tinha como descrever aquela coisa que estava na minha frente. Ela se aproximou de mim e dei um passo para trás batendo as costas numa árvore. Chegou mais perto de mim, prendendo suas garras ou unhas, seja lá o que aquilo tinha, ao meu braço.

Deixei um grito escapar. As garras percorreram meu braço e aquilo realmente doía.

Nunca pensei que iria ficar feliz em ouvir o som de um tiro em toda minha vida.

Aquela coisa caiu nos meus pés. Olhei para frente e vi Peter com a arma apontada pro mesmo lugar me encarando.

-O que você tá fazendo aqui?

-Te pergunto a mesma coisa - falei ainda encostada na árvore e então ele abaixou a arma chegando mais perto de mim - Quando ia me falar?

Ele suspirou encarando o chão.

-Logo...

-Logo? Ah, eu sei que você já estava pensando em outras desculpas só pra me enrolar. Não adianta negar, eu ouvi.

-Você tava espionando? -disse finalmente olhando para mim - Sério isso? Depois de tanto tempo de amizade, você não conseguiu esperar mais um pouquinho pra eu te contar e você não ter que passar por isso?! Porque acha que eu não te contei antes? Porque eu queria ter um segredinho? Não. Era pra te proteger disso tudo, pra te poupar dessa vida.

Respirei fundo. Meu braço já estava começando a arder mais ainda.

-Me desculpe, tá bem? Eu só não aguentava mais ver você ficar mantendo segredos assim. É irritante - murmurei a última parte e ele riu. - Então, é isso que você faz? Sai por aí caçando coisas.

-Basicamente...

-E eu posso fazer isso?

-Não, nem pense nisso Ashley. Não mesmo.

Eu ia cruzar os braços e começar a fazer pirraça, só que ao invés disso soltei um gemido devido ao meu braço que agora estava doendo mais que o normal.

Peter jogou a arma pro carinha do time ainda não identificado e se aproximou me puxando pra fora de lá.

-Viu? Você não vai querer correr o risco de passar por essas dores ou piores todos os dias.

Resolvi calar a boca por enquanto. Eu ainda ia conseguir fazer ele me ensinar tudo que sabia. Porque eu que não iria correr o risco de ser atacada por aquele troço de novo e bem... No fim, eu consegui o que queria.

2 anos depois

Peter acabou cedendo e me ensinando quase todo o necessário, não para me tornar uma caçadora. Mas para simplesmente me defender em certas situações que envolvessem... aquelas coisas.

Não que eu não quisesse ser uma caçadora e tal, só não via motivo nenhum pra começar a caçar como ele. Peter tinha motivos. Motivos traumatizantes e dolorosos, dos quais ele preferia não falar muito.

Pois bem... Agora eu tenho motivos e eles com certeza são bem mais dolorosos.