O dia amanheceu rapidamente na pequena cidade de Lima e antes que o despertador ousasse tocar, Kurt já estava de pé preparando suas roupas e ensaiando as coisas que iriam acontecer no decorrer de sua manhã, como se ele mesmo planejasse o roteiro da vida de todo mundo.

Escolhera uma de suas melhores roupas do guarda-roupa, que estava guardando especialmente para o dia que Sebastian o convidasse para um jantar chique e eventualmente o pedisse em namoro. Kurt era fascinado com como o namoro dele com Sebastian era centrado e certo em todos os momentos. Pegou o celular rapidamente para mandar uma mensagem para o namorado quando se lembrou que Sebastian não era mais seu namorado. Suspirou fundo e resolveu ligar para Blaine. O número chamou algumas vezes, até enfim atendendo e saindo uma voz estridente e preocupada do outro lado da linha.

"Aconteceu alguma coisa?!"

– O quê?! Não. Por que você perguntou isso? - Kurt colocou o celular no viva-voz e foi até o banheiro hidratar sua pele e passar uma pequena quantidade de base para esconder as olheiras dos últimos dias.

"São cinco e meia da manhã e você está me ligando." Respondeu como se fosse obvio. Do outro lado, Blaine sentou na cama e esfregou os olhos preguiçosamente.

– Não pensei que era tão cedo. - Respondeu o castanho. - De qualquer jeito, queria te lembrar de passar aqui em casa porque hoje vamos juntos à escola. Sebastian precisa pensar que dormimos na mesma casa.

Blaine revirou os olhos e ficou em silêncio por alguns segundos, sem saber ao certo como responderia o amigo. Aquele plano chegava a ser patético no começo, mas agora estava definitivamente fora do controle e Blaine sabia que não poderia mais parar o amigo daqui pra frente.

"Tudo bem. Estarei aí às oito."

– Oito?!! - Perguntou como se fosse uma ofensa, voltando para o quarto para vestir suas roupas. - Temos que chegar antes e ficar desfilando pelos corredores, felizes e amando a companhia um do outro! Vamos, Blaine... Você prometeu me ajudar! - Disse em um tom suplicante.

"Kurt..." Blaine pensou em advertir o amigo, mas por alguns instantes soube que aquilo seria o mesmo que tentar convencê-lo a não cantar, então desistiu. O Hummel era uma rainha venenosa. "Ok. Às sete e meia."

– Sete.

"Sete então. Posso voltar a dormir?"

– Sim, Be. Muito obrigado, você é o melhor amigo que eu poderia ter. E, aliás, quando for se vestir, esqueça ao menos por hoje as gravatas borboletas, por favor. Quero a impressão de que meu nível para namorados não caiu tanto. - Disse gargalhando, sabendo que o amigo estava em fúria ao ouvir a chamada ser terminada rapidamente. Ainda sorrindo, Kurt voltou ao seus afazeres.

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Blaine estava um caco. Definitivamente aquela não havia sido uma boa noite para o moreno que teve que passar a janta inteira explicando para os pais que seu namoro com Kurt era apenas uma manobra para fazer ele e Sebastian voltarem, e que dessa vez aquilo não poderia ser espalhado, que poderia ser um segredo maior do qual o governo escondia na área 51.

A noite havia sido ainda pior, com pesadelos e não conseguir achar uma posição confortável para dormir naquele colchão, como se as mentiras estivessem o atrapalhando. O Anderson nunca fora de mentir e sempre falou a verdade, independente de tudo. Não sabia ao certo quando tempo aguentaria aquela história, que no momento só fazia por Kurt e por querer ver Sebastian irritado, embora os resultados desse plano não o agradassem: a volta do namoro do amigo e inimigo.

Havia acabado de passar os últimos quarenta minutos desfilando de mãos dadas com Kurt pelo colégio, tentando convencer à todos ali que eles eram sim um casal. Podia ver os olhares sobre eles e os cochichos de como Blaine era um coitado que estava sendo usado por Kurt, que tentava superar o término de namoro com o primeiro que aparecesse. Sua mente agradecia à todos os possíveis e existentes deuses por Sebastian não ter aparecido até o momento em que Kurt se despediu e disse que iria até a biblioteca pegar um livro para a aula de Ciencias Biológicas.

Foi naquele intervalo de tempo que Blaine se pôs a suspirar fundo, deixando ir embora toda a frustração daquilo e de como sentia falta de ser apenas amigo de Kurt, com qual ele pudesse conversar sobre qualquer coisa. Sabia que, mesmo seu cérebro ignorando, a amizade nunca mais seria a mesma. Andou até seu armário no fim do corredor e colocava seus livros lá dentro, quando sentiu uma presença desagradável atrás de si.

– Olá, Sebastian. - Disse sem se virar, como se o Smythe emitisse uma onda particularmente irritante por onde passasse com aquele sorriso cínico.

– Oi, Be. - Disse sorrindo ao ver Blaine cerrar os dentes. Melhor do que ninguém, Sebastian sabia que aquele apelido era apenas de Kurt e de ninguém mais. Desde criança o pequeno Blaine nunca permitira ninguém a chamá-lo assim.

– O que você quer? - Perguntou educadamente, fechando seu armário e encarando o homem alto atrás de si. Isso era um pouco intimidador, porém Blaine continuou ali de pés juntos.

– Queria desejar felicidade ao casal, ora. - Disse como se fosse óbvia sua intenção, porém Blaine só focava naquele sorriso amarelo em seus dentes. - Quero mesmo que você seja feliz com Kurt, que se casem em uma linda cerimônia em Las Vegas e que tenham cinco lindos filhos. - Blaine arqueou uma sobrancelha. - E que, depois de sete anos de casados, ele perceba a pessoa horrível que você é e te traia, todos os dias, com dezenas de homens diferentes. Você sabe, Be. Ele nunca vai me superar. - Blaine riu em um suspiro.

– Você é tedioso. - E se virou novamente para o armário, não acreditando como Kurt não percebia que namorava uma cobra como Sebastian.

O mais alto sorriu ainda mais por ver o garoto de olhos cor de amendoas afetado com aquilo. Deu alguns passos, ficando a centímetros de distancia de Blaine, e colocou sua boca perto do lóbulo da orelha do moreno, sussurrando.

– Você pode tentar enganar quem quiser, mas todos sabem que você não é Sebastian Smythe. Que não consegue tratar Kurt do jeito que eu tratava. - Fez uma pequena pausa. - Excitá-lo do jeito que eu fazia.

Blaine cerrou os olhos e rangeu os dentes ouvindo aquele demente falar essas coisas de seu melhor amigo, sujando toda a honra que o Hummel talvez um dia tivera com aquele namoro. Chegava a dar ânsia pensar em Sebastian tratando Kurt como uma propriedade. O Anderson apenas suspirou discretamente e fechou seu armário novamente, saindo de perto do Smythe. Seus pulsos estavam fechados prontos à dar um soco no garoto, porém não o fez por Kurt. Blaine estava passando de seus limites por causa do amigo.

As aulas passaram como jatos e logo o sinal do intervalo ecoava por todos os corredores fazendo os alunos preencherem aquele lugar rapidamente. Agradecia por ser um ano mais novo que o Smythe e não precisar frequentar as mesmas aulas que aquele garoto insuportável, mas seu coração se apertava ao imaginar que Kurt talvez não tivesse tanta sorte assim.

Chegara no refeitório alguns minutos atrasados pois parara para conversar com o professor de espanhol sobre uma questão do trabalho que estava em dúvida. Ao entrar no pátio seu coração se partiu em dois ao ver aquela cena. A mesa do coral cheia e conversando animadamente com Sebastian e Robert, e Kurt sentado em uma mesa afastada com um semblante triste e desanimado, mexendo em seu celular, um tanto solitário.

– Oi. - Disse colocando sua bolsa sobre a mesa, chamando a atenção do Hummel que tinha os olhos azuis um pouco vagos. - Por que está aqui sozinho?

– Você demorou. - Disse em um tom baixo, guardando o celular e encarando o amigo de sobrancelhas triangulares. - Bom, eu estava sentado lá. - Apontou discretamente para a mesa com os amigos do New Directions. - Porém Sebastian e Robert apareceram animados sobre como haviam conseguido com o Mr. Schue uma audição para Robert fazer parte do coral. Eu não aguentei e vim pra cá, dei a desculpa que hoje era um dia especial pra gente e iria te esperar. - Deu de ombros.

– Me desculpe, se eu ao menos soubesse... - Kurt o interrompeu.

– Está tudo bem. - Sorriu fraco ao reagir à mão de Blaine pegando a sua por cima da mesa. - Me conte sobre seu dia, Be.

Blaine encarou aqueles olhos azuis sem expressão e questionou sobre assumir para o amigo ou não que Sebastian havia ido falar com ele logo cedo. Suspirou por alguns instantes e resolveu omitir essa informação, contando apenas a história de como Niccholas havia caído um tombo na classe e ficado bravo com Jefferson por não tê-lo ajudado a levantar. Kurt lentamente foi sorrindo e ficando radiante novamente, ignorando o que havia acontecido anteriormente.

Blaine o fazia bem, isso era inegável para todos naquela escola. Os que viram Kurt desanimado antes e vira Kurt feliz com a presença do amigo agora podiam jurar que o namoro era real, que Blaine e Kurt realmente pertenciam um ao outro, que se completavam. Sem pensar, Mercedes se pegou olhando para o novo casal e rindo sozinha sobre o sorriso que se abria nos lábios dos castanhos.

– Eles são tão lindo juntos. - Soltou.

– Quem? - Perguntou Artie fazendo a negra sair do transe. Quando realizou onde estava e que todos a encaravam com uma sobrancelha arqueada, sentiu suas bochechas esquentarem.

– Kurt e Blaine. - Disse engasgada enquanto olhava para Sebastian tentando evitar qualquer surto de raiva do colega do coral, e logo tentou consertar o que havia falado. - Não que você e ele não fossem um casal bonito. - Mexia as mãos. - Mas ele estava muito cabisbaixo nos últimos dias, e quando ele está com Blaine, parece que tudo muda.

Sebastian não disse nada, apenas virou o olhar para a mesa onde os falso namorados estavam. Kurt realmente tinha um sorriso sincero e acolhedor no rosto, enquanto Blaine contava alguma história animadamente. Em uma fração de segundos, os olhos do Hummel saíram dos de Blaine e se encontraram com os de Sebastian o olhando. Ficaram se encarando por poucos segundos, até Kurt soltar um sorriso torto em direção ao ex-namorado e voltar a atenção para o Anderson, que contava como havia sido a experiência de jogar Banco Imobiliário durante a aula de Literatura Estrangeira.

Sabendo que Sebastian ainda o encarava, Kurt apenas ignorou qualquer coisa que o moreno estivera falando sobre comprar terrenos e se inclinou sobre a mesa, aproveitando os lábios abertos de Blaine e o capturando em um beijo. O Anderson ficou extremamente surpreso com a atitude do amigo, porém instantaneamente fechou os olhos e levou sua mão até o rosto de Kurt, o puxando mais para perto. As línguas quentes dançavam entre si e o beijo era definitivamente melhor do que o anterior.

Os lábios de Blaine sugavam, mordiam e aproveitavam os de Kurt no seu. Seu cérebro nem havia conseguido processar as informações direito quando Kurt quebrava o beijo enquanto trazia o lábio inferior do amigo pra si. Seus olhos rolaram até Sebastian, que não mais encarava a cena. Antes que Blaine pudesse falar alguma coisa, Kurt interviu.

– Sebastian estava olhando.

– Oh.

Claro que Sebastian estava olhando. Por qual outro motivo Kurt se inclinaria sobre a mesa e o beijaria daquele jeito? Blaine piscou algumas vezes e pôs-se a continuar contando sobre o acontecido na aula, porém duvidava muito que Kurt estivesse prestando alguma atenção. Foi diminuindo o tom de voz aos poucos e cessou qualquer tipo de conversa que poderia ter, se despedindo rapidamente dando a desculpa que falaria com um professor sobre uma dúvida na aula, saindo do refeitório com passos largos.

Blaine fora até o banheiro masculino do primeiro andar, que ficava perto da secretaria. Esse era o banheiro mais deserto da escola, já que as descargas não funcionavam. O moreno parou em frente ao espelho e se observou por alguns instantes. Os lábios vermelhos e as bochechas da mesma cor. Gotas de suor frio se formando sobre sua testa e os olhos com as pupilas mais dilatadas do que o normal.

Abriu a torneira e jogou um pouco de água sobre o rosto, tentando acordar e assentir com o fato de que Kurt havia o usado novamente para fazer ciumes em Sebastian. Não que isso não fosse parte do plano, porque era. Basicamente todo aquele fingimento seria sobre fazer Sebastian com ciúmes para ele voltar à Kurt, mas e Blaine? Ele se sentia horrível, porém Kurt parecia sequer se importar, e lá acontecia outro beijo para mostrar à Sebastian que aparentemente o Hummel estava em outra.

Beijos que o Anderson prezava serem especiais. Blaine poderia ter beijado outros caras, tivera oportunidades, porém sempre acreditou que beijaria apenas quando se sentisse confortável com a pessoa. Mas agora... Agora beijava Kurt apenas por uma aposta. E talvez a falta de beijos nos últimos anos tivessem o afetado, porque os beijos de Kurt conseguiam hipnotizar o Anderson de uma maneira muito errada, desejando proibidamente outro beijo daqueles lábios, não sabendo ao certo se conseguiria se segurar na próxima vez.

Suspirou longo e passou outra água em seu rosto, encarando o espelho e suas pupilas dilatadas ao se lembrar da sensação que era ter os lábios de Kurt nos seus.

– Droga, Blaine. - Deu um soco fraco na pia. - Não se apaixone por Kurt, por favor. - Suspirou e encarou seu reflexo mais uma vez naquele espelho.