Hangover escrita por Cannibal


Capítulo 1
Capítulo 1


Notas iniciais do capítulo

fic de tédio


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Acordei com a luz fraca do sol em meus olhos, machucando levemente minhas pálpebras enquanto tateava por algo para cobrir meu rosto até ter coragem para levantar da cama. Eu precisava de uma ponta de lençol, um travesseiro, podia até ser meu robe, se pudesse me lembrar onde ele estava.

Resmungo cansado de procurar por algo para afastar aquela claridade, mas agora o pior nem era isso, parecia que o sol havia encontrado outro ponto para queimar, comecei a pensar se havia tirado a roupa antes de simplesmente cair na cama ou se o calor que vinha de fora estava mesmo insuportável. Resmungo de novo, me forçando a abrir os olhos e descobrir onde estava. Primeiro: a luz forte me fez xingar alto, giro na cama até quase cair e encontro meus óculos escuros – pelo menos eu achava que eram meus -; segundo: eu não estava dolorido. Isso era bom, e estranhamente eu me sentia bem. Suspiro alto ao me apoiar no criado mudo para levantar.

Não, eu não estava bem. Na verdade eu me sentia péssimo, um gosto amargo na boca e estômago revirando, fermentando os litros de vodka e whisky de ontem a noite. Sentindo a dor de cabeça latejar ainda fraca eu olhei o visor esverdeado do relógio. Eram 7h 30 da manhã de um domingo. Por Deus, por que não fechei as cortinas? Arrastando os pés caminho até as janelas altas, olhando pelas lentes escuras o movimento dos carros sete andares abaixo, a porcaria de um caminhão deu reflexo com a luz do sol, voltando bem nos meus olhos. Queimou, e se havia algum jeito de aumentar instantaneamente a dor de cabeça era esse. Eu puxei as persianas com força, mandando o motorista do caminhão pra puta que pariu. E a cada passo até o corredor parecia um elefante pisando no meu cérebro, com força como se fosse um inimigo em potencial. O tique do relógio me irritava, podia ouvi-lo da sala, os olhos daquele gato de plástico encarando o vazio enquanto os segundos passavam, parecia uma bomba.

Uma maldita bomba querendo explodir com o mínimo ruído.

Caminho até o banheiro e, ao perceber a falta de vômito na banheira eu realmente não sabia se ficava feliz por não ter que suportar o cheiro azedo ou triste pelo o que estava por vir. Eu precisava de uma aspirina, analgésicos ou qualquer coisa para aguentar aquela dor. Depois de encontrar o que eu queria entre a pasta de dente e o enxaguante bucal eu me olhei no espelho. Eu estava horrível, e a careta que fiz enquanto engolia o comprimido só tornou minha avaliação sobre o estado em que me encontrava pior. Ergo os óculos escuros devagar, arregalando os olhos ao ver minhas olheiras, eu não queria saber de onde vinha o glitter ou os roxos no pescoço. Eu podia superar aquilo. Podia superar dois dedos da raiz do meu cabelo precisando ser retocado. Talvez Erwin tivesse razão e eu devesse voltar ao preto, daria menos trabalho. Mas eu gostava do meu cabelo descolorido. Passo as mãos pelo rosto, ignorando os lábios secos enquanto criava coragem para tomar banho. Ia doer; cada maldita gota de água ia parecer um minúsculo alfinete furando minha pele, e não era só isso, eu precisava tirar o cheiro de estranhos de minha pele, misturado com perfume, álcool e suor. Eu fedia.

A água quente em minha nuca fazia meu corpo tremer, meus olhos reviravam de dor enquanto eu lavava o cabelo; não demorei com o sabonete, o cheiro dele estava me deixando enjoado. Depois do banho eu vesti um pijama limpo e leve o suficiente para me sentir fresco.

Eu precisava de café, tirar o cansaço de meus ombros e enquanto a água fazia seu trabalho eu voltei aos óculos. A luz natural da sala parecia um pouco mais suportável agora.

Me encolho no sofá de canto, abaixando rápido o volume da TV e procurando pelo jornal da manhã. Pobres desgraçados que acordavam às 4h 00 da manhã para trabalhar só às 8h 00. A previsão do tempo foi bem... Previsível. Sol, temperaturas altas e alegres passeios no parque. Eu iria ao parque tomar sol se tudo isso não causasse dores em todos os poros do meu corpo. Até minha alma deveria estar doendo.

De repente, enquanto trocava os canais e ignorava a ânsia eu senti fome, tanta fome que meu estômago reclamou. Eu comeria uma pizza, ou um cachorro quente. Talvez uma lasanha. Deveria ter alguma sobra na geladeira, e eu agradeci ao exagero culinário do meu colega de quarto. Comi o último pedaço gelado mesmo, empurrando com mais uma xícara de café. Enquanto a cafeína começava a fazer efeito o telefone tocou. O barulho fez meus tímpanos apitarem de dor, era agudo demais para aguentar o próximo toque; então eu simplesmente desliguei da tomada. Eu não queria falar com ninguém, ver ninguém. Só queria me encolher no sofá e encarar ainda de óculos a mulher tentando vender um travesseiro ortopédico, ou o extrato de alguma coisa que ela julgava ser medicinal.

As 8h 30 eu já havia bebido quatro garrafas d’água, a dor havia melhorado um pouco. Foi quando meu colega de quarto acordou: sem camisa e com a calça de moletom dobrada até os joelhos, ele abriu a boca para me cumprimentar, mas eu o conhecia o suficiente para saber que sempre falava alto, eu ergo a mão para ele pedindo silencioso para que calasse a boca.

—Bom dia – sussurrou, ou pelo menos tentou – tão cedo em pé, parece que milagres acontecem.

—Vai se foder, Eren.

—A ressaca está tão forte assim?

—Cala a porra dessa boca. Por favor.

Ele terminou de beber o resto do café e levou uma xícara consigo enquanto voltava para seu quarto. As costas e braços arranhados. Fez sexo a noite toda, aposto.

As 14h 00 todas as cortinas estavam fechadas, e meus dedos melados da mistura de kethup e maionese enquanto literalmente devorava aquele saco de batatas com refrigerante de limão. Ignorei firmemente o iogurte que Eren tentou me oferecer na tentativa de evitar as perguntas sobre o barulho no seu quarto. Se eu comesse aquela pasta branca de leite azedo eu vomitaria no sofá novo. Eu demorei pra conseguir um sofá novo, não seria agora que vomitaria nele.

Afinal, eu nem tinha terminado de pagar.

As 14h 15 havia voltado para os óculos escuros, cochilos de dez segundos era necessários para ignorar as risadinhas vindas do quarto de Eren, ele quebrou a regra número 3 desse apartamento; mas estava cansado de mais para discutir com ele sobre isso. Minha cabeça pesava quando a tombei para trás, sentindo o controle remoto escorregar de meus dedos quando o sono me invadiu.

Quando acordei já estava escuro, e Eren se assustou com o barulho que fiz quando tentei me levantar. Minhas costas doíam, e de repente eu me lembrei da noite passada. Roupas no chão e vodka no umbigo. Eu liguei para Erwin, ele veio aqui e...

—Puta merda.

—O que? Ainda enjoado?

—Mais que tudo.

—Quer algum remédio?

—Quero meu celular – e me levanto meio grogue, caminhando devagar até meu quarto.

Encontrei meu celular entre os travesseiros, a última ligação era de Erwin, seguida de dezessete mensagens. Eu me masturbei pra ele pelo telefone, tinha áudios meus gemendo seu nome. Resmungo alto, entre o choro e o desespero. Eu havia feito uma bela de uma merda ontem. Mordo o lábio oscilando entre ligar ou ler as outras mensagens; álcool e celular era a pior combinação de todas. Respiro fundo, indo até o menu e rezando aos deuses quando abri as fotos.

Para o meu desespero, não era só uma. Da língua dele em minha virilha até as posições em que ficamos. Em uma delas eu estava montado nele, Erwin tinha umas das mãos afastando minha nádega enquanto a outra segurava o celular. Eu odiei o espelho do guarda-roupa, e o fato das fotos terem ficado bonitas. Na última delas eu estava de quatro, sêmen nas costas. O desgraçado tirou uma foto da minha entrada com os dedos dele dentro me abrindo, por deus, tinha a porra de um vídeo. Meu dedo tremeu até ter coragem de dar o maldito play. O vídeo tinha 30 segundos, e era a “continuação” da imagem dos dedos dele me abrindo. Eu gemia igual uma vadia enquanto ele fazia aquilo, eu rebolava na palma da mão dele, soltava gritinhos altos, contraindo-o; o acabava com ele me penetrando.

Disquei o seu número, sendo atendido no terceiro toque.

Se sente melhor?— a voz estava baixa, com um barulho ao fundo e risadas altas.

—Não exatamente. Eu... Encontrei as fotos Erwin, e um vídeo. Como me deixou fazer aquilo?

—Espere um minuto, eu vou pra outro lugar. – sua voz ficou mais baixa, sendo substituída por alguns ruídos de taças e vozes alegres. De repente o som ao fundo era apenas as ondas do mar quebrando na areia da praia. – Pronto.

—Está em Hampton? – perguntei circulando a cama e indo até a janela, afastando as cortinas o suficiente para ver as luzes lá fora.

Estou. Cheguei hoje de manhã, e você?

—De ressaca. – ele riu.

—Você exagerou na vodka ontem. Fiquei preocupado.

—Por que você filmou?

Você pediu isso enquanto rebolava de quatro na cama.

—O que?! Eu não me lembro disso.

É porque estava bêbado.

—E mesmo assim fez sexo comigo.

Em minha defesa, já estava bêbado quando me ligou.

—Nove fotos Erwin, nove.

Eu sei quantas foram eu tirei todas lembra?

—Me diga que não as tem...

Só uma versão mais longa do vídeo.

—Puta merda, Erwin.

—Desculpe.

—Eu... Eu só estou com raiva, eu prometi a mim mesmo que não tocaria em você, ou pensaria em você até o final do mês, então eu bebi e te liguei e agora estamos falando sobre as nove fotos que provam que o sexo foi...

Foi incrível— acho que corei.

—Eu não me lembro dos detalhes Erwin.

Quer que eu narre pra você?

—Não! – eu não podia acreditar – você tem que ficar quieto sobre isso.

—Não quer saber como conseguiu ficar naquela posição na foto número quatro?— eu tive um flash de memória, as mãos dele erguendo minhas pernas enquanto eu me apoiava nas guarda da cama. Eu não sabia que era tão flexível.

—Não, não quero.

Certeza?— ele riu. Eu podia ver os lábios se curvando, os dentes brancos e perfeitos, a linha do queixo, a barba por fazer...

—Quando você volta? – pergunto voltando para a cama, me jogando entre os travesseiros e sentindo algo cutucar minhas costas.

Na terça eu acho, por quê?

—Advogados tiram folga no meio da semana? – brinquei, me virando e pegando o que estava me cutucando.

Eu sou um sócio. Você sabe.

—Deixou a aliança aqui. – minha voz saiu mecânica, olhando o aro de ouro entre meus dedos, não havia nada gravado nele, era apenas um aro grosso e pesado para ser um anel.

Você a tirou ontem. Disse que não queria vê-la nunca mais.

—E eu não quero. Por que a deixou aqui?

Não consegui encontra-la quando você dormiu. Sinto muito.

Eu estava sendo infantil, era só a única coisa que me mantinha longe dele. A maldita aliança.

—Então – limpo a garganta, tentando parecer indiferente sobre ainda estar segurando aquela merda de dezoito quilates - terça-feira?

Sim.

—Que mentira disse a ela? – não tinha como fugir, eu queria saber. Precisava saber o que aquela mocreia lhe disse.

Disse que deixei no joalheiro porque estava um pouco apertado.

—Ela acreditou? – por que a opinião dela me importava tanto?

Sim. Até porque eu ia mesmo fazer isso. Mas não essa semana.

—Sei. – a vida feliz deles se formou na minha cabeça: casa grande, dois filhos e um cachorro, cercas brancas, piscina e sexo nas quintas. – E como está a festa?

Meu pai já está bêbado, e se jogando nas tias dela. Vomitou camarão depois do almoço.

—Eu adoro camarão – equilibro a aliança até ela deslizar em meu anelar. Era realmente pesada.

Quer almoçar comigo na sexta-feira?

—Acha que me pagando um almoço vai poder transar comigo?

Claro. Ou prefere um jantar?— eu juro que senti a respiração dele em minha orelha.

—Cala a boca.

Queria estar com você agora. – eu aceitaria o jantar, o almoço, o chá da tarde, o café... qualquer merda só para tê-lo comigo.

—Podia ter esperado eu acordar.

Você acorda tarde quando bebe.

—Ironicamente, hoje não foi assim.

Jura?

—Esqueci as cortinas abetas.

Oh— gemeu dolorido.

—É, achei que meus olhos fossem derreter.

Ainda está com dor de cabeça?

—Não – suspirei, tirando a aliança e a deixando no criado mudo – só estou com fome. Muita fome. Mas isso não importa. Você não me contou como foi o seu dia.

Não foi bom.

—Erwin, eu passei o dia inteiro comendo e dormindo. Você está em Hampton! Por favor, só me conte como foi o seu dia.

Erwin suspirou pesado, o som das ondas ficou mais próximo e a voz voltou rouca, eu me arrepiei.

Sempre que podia eu via o vídeo, conheci os avós de Mary nesse almoço/jantar desnecessário. Meu pai acabou de se jogar em alguém e eu tive que ser o noivo perfeito o dia inteiro. Foi uma merda. Até me ligar.

—Você mergulhou?

Não. – sorriu.

—Sem marcas de sol?

Sem marcas de sol, eu sei que você gosta de passar as unhas.

—Culpado.

Eu ouvi alguém o chamar, voz de mulher. Era ela, eu sentia nos meus ossos.

—Desligue.

Shii.

—Erwin eu não quero ouvir – eu não conseguia desligar o telefone. No fundo eu queria ouvir, mas a voz dela era a última coisa que queria me lembrar.

—Vai ser rápido, espere na linha... Oi amor!— eu senti um punhal atravessar meu peito.

Acho que gemi de dor enquanto me deixava cair na cama de novo, imaginando pela primeira vez o rosto dela. Depois de cinco anos eu a imaginei da cabeça aos pés, eu a vi passando as mãos por Erwin, juntando os lábios e mexendo em seu cabelo. Eu me senti enjoado com o som do beijo, com a voz dela. Eu não queria me sentir culpado.

Eu já vou queria, só vou terminar essa ligação.

Nem na sua folga você para de trabalhar— ela riu – Desligue o telefone querido, eu tenho uma surpresa pra você— Erwin odiava surpresas – Por favor, Wini!

Wini? Eu comecei a rir, imaginando a expressão de Erwin com tudo isso. Houve mais alguns beijos e risadinhas, tive que morder a língua quando Erwin voltou.

—Para de rir.

—Estou tentando Wini.

—Eu vou ter que desligar agora. Eu te mando uma mensagem mais tarde.

—Tudo bem, vá ser parte da família.

Sabe que nunca quis isso— o som das ondas foi diminuindo até sumir, e lá estavam as vozes alegres de novo.

—Então por que ainda faz isso?

Quer mesmo discutir isso?

—Não.

Eu te ligo amanhã.

—Boa noite Erwin.

Boa noite Rivaille.

***

Já passava da meia noite quando o celular vibrou sob meus travesseiros, achar o celular não foi o problema, mas desbloquear a tela sim. Havia uma mensagem de Erwin, enquanto aquela coisa abria eu tive que ficar ouvindo Eren transando no quarto ao lado. Alguém gemia vários “ele vai nos ouvir” enquanto a cama batia na parede. O celular piscou de novo e eu li a mensagem:

Adiantaram a data do casamento, sinto muito.

Eu senti uma estranha vontade de vomitar enquanto o gosto da comida chinesa voltava em minha boca. Me levantei e caminhei até a cozinha, bebendo quase de uma vez uma garrafa de água gelada. Eu podia ouvir o tique do relógio, o motor da geladeira aberta, os aviões lá fora e os gritinhos do parceiro de Eren, até mesmo o “lá vem à noiva” tocou no fundo de minha mente enquanto voltava para o quarto e me enrolava nos cobertores, xinguei Erwin, e Eren pela barulho até adormecer de novo. Eu ainda tinha que trabalhar amanhã, não tinha tempo para chorar o casamente do cara que amo há mais de dez anos.


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Notas finais do capítulo

é sério, eu não tinha nada pra fazer