Gêmeos no Divã escrita por Lady Black Swan


Capítulo 33
16° Consulta - parte 2


Notas iniciais do capítulo

Feliz Halloween a todos!
Eu sei que não é um feriado comemorado aqui, mas mesmo assim eu queria dizer kkkk



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/628992/chapter/33

Agora vamos à segunda parte, não é?

Como conhecemos um dos irmãos de Ayume!

Tudo começou quando eu, Vinicius e Ayume estávamos os três observando uma das maiores batalhas dentro da escola enquanto comíamos pipoca.

—Quanto tempo vocês acham que vai levar até o primeiro aplique sair voando? — Vinicius perguntou passando um saquinho de pipocas para Ayume.

—Menos tempo do que vai levar para as unhas postiças começarem a serem arrancadas. — Ayume respondeu passando adiante o saco de pipocas sem comer nenhuma.

—Alguém ainda vai perder um olho naquilo. — comentei comendo algumas pipocas e devolvendo o saco para a pequena Ayume — E nossa! Como gritam!

—Um olho? Hum... Acho que não. — Ayume duvidou, novamente repassando o saco de pipocas a mim sem comer nenhuma sequer — Os cílios postiços? Talvez.

Vinicius estava erguendo a mão para pegar novamente o saco de pipocas quando, de repente, uma terceira mão apareceu de lugar nenhum, mergulhando e raptando nossas pipocas num piscar de olhos.

Quando nós três olhamos para cima, vimos ali o loirinho parado atrás de nós.

Claro, afinal já estava demorando mesmo para ele aparecer.

—O que está acontecendo ali? — perguntou comendo as últimas pipocas do pacote. — Oi.

Ele inclinou-se sobre Ayume, apoiando-se com uma mão entre o meu ombro e o dela no espaldar do banco de pedra, e a beijou, ato pelo qual meu irmão e eu respondemos adequadamente: enfiando os dedos nas gargantas e pondo as línguas para fora como se estivéssemos prestes a vomitar.

—Oi milorde. — ela respondeu, mas logo em seguida reclamou com uma careta: — Salgado.

Dos Reis sorriu, como que pedindo desculpas, amassando o saco vazio de pipoca entre as mãos, Ayume girou os olhos e voltou a olhar para o aglomerado de meninas escandalosas a distancia, comentando:

—A lista para inscreverem-se nos testes para a peça desse ano saiu, e elas estão digladiando por um lugar na lista, não percebem que tudo iria mais rápido se simplesmente formassem uma fila organizada... Parece até que acham que quem assina primeiro tem mais chance de ficar com um papel.

—Também devem achar que quanto antes assinar melhor o papel. — Vinicius comentou.

Ayume fez uma careta.

—Algumas delas devem até ter se ferrado de propósito nas matérias.

Sem entender essa última parte, Dos Reis nos olhou a procura de respostas.

—Aqueles que estão em condições mais críticas com relação às notas têm preferência para a peça, já que ela acrescenta pontos extras às notas de recuperação, e dependendo da quão crítica ou não for a sua situação a participação pode até ser obrigatória, sendo na atuação ou no apoio de palco. — expliquei.

—Como nós dois no ano passado. — meu irmão acrescentou.

—E por falar nisso, como vocês estão? — Ayume nos perguntou.

—Muito bem! — respondemos orgulhosos — Apenas uma nota vermelha!

O loirinho curvou-se sobre nosso banco, apoiando os braços cruzados no espaldar de pedra logo atrás de Ayume e deu um sorriso impressionado.

—As garotas daqui devem realmente amar teatro! — Comentou ingênuo.

Nós nos entreolhamos com Ayume, obviamente achávamos que ele estava brincando.

—Mas do que “amar teatro” eu diria que elas amam ao príncipe que beijará a princesa. — ela comentou inclinando-se para frente e apoiando o rosto entre as mãos.

—Nossa! — ele exclamou — E quem é esse príncipe pelo qual elas brigam tanto?

Voltando a nos entreolhar por um momento, nós três nos viramos para olhá-lo.

—Hã... Você? — Ayume respondeu (ou perguntou).

Ele arregalou os olhos, erguendo-se surpreso.

—O que? Eu? Quem disse?

Voltamos a nos entreolhar e então o olhamos novamente.

—Hã... Não vai? — perguntei.

—Não. Ninguém me disse nada sobre isso. — ele deu a volta no banco para ficar a nossa frente. — Eu tenho boas notas, sabiam? Estão todas na média, essa é uma das exigências quando se trabalha mesmo ainda estando na escola... — deu mais uma olhada para trás, as coisas estavam começando a parecer realmente violentas ali — E se Igor sequer sonhasse que eu ando aceitando papéis sem consultá-lo antes, ele ficaria bem irritado comigo... E ele já não anda muito manso desde que descobriu que meio que “deixei escapar” o meu “lado nerd” aqui na escola.

Claro, “deixou escapar”, sei...

—Então você não vai mesmo atuar na peça?

Ayume perguntou só para confirmar, levantando-se e se sentando no meu colo enquanto puxava meu irmão pelo braço para junto de nós, para assim dar espaço para o loirinho sentar conosco.

—Não. — ele aceitou o espaço oferecido e sentou-se conosco, equilibrando-se no canto do banco — Então, que peça vão encenar?

—Esse ano será “A Pequena Sereia”. — respondi.

—A versão da Disney, nossa escola parece ser apaixonada pela Disney. — Vinicius completou — Ano passado a peça foi “Enrolados”, ainda bem que você ainda não estava aqui, ou a peruca da Rapunzel teria virado a corda para o cabo de guerra que essas lunáticas iam fazer. Quem será que começou esse boato de que você seria o príncipe?

—Garotos, se foram vocês que... — Ayume começou a perguntar-nos de forma desconfiada.

—Não, não. Somos inocentes eu juro! — erguemos as mãos.

—Ah, então tudo bem. — ela relaxou novamente.

Dos Reis deu mais um assovio admirado olhando as meninas à distância.

—Eu é que não quero ser a pessoa que vai dizer a elas que tudo não passou de um engano ou brincadeira de mau gosto qualquer. — ele estalou a língua e inclinou-se para frente com o cotovelo sobre as coxas e o rosto entre as mãos — E vocês sentaram aqui só para apreciar o show?

—O show é apenas um extra — Ayume acenou com desdém — Na verdade estamos aqui esperando aquelas loucas acabarem de se digladiarem ali e se dispersarem de uma vez, para que eu possa me aproximar e tentar arranjar um espacinho que seja na lista e colocar meu nome também.

Isso definitivamente chamou a atenção do Dos Reis, ele se endireitou imediatamente no banco.

—Como é? Minha querida Ayume, não me diga que você também está sonhando com a possibilidade de receber um beijo do príncipe encantado? — ele deu um sorriso brilhante.

Não era difícil prever o rumo que os pensamentos do loirinho estavam tomando naquele momento, com certeza ele já estava planejando realmente se inscrever para os testes e tentar o papel de príncipe. Mas Ayume logo tratou de acabar com todas as fantasias dele:

—Que nada. Para que eu precisaria disso se já posso beijar o “príncipe” a hora que eu quiser?

Vou te contar doutora, como a Ayume está ousada esses tempos!

De novo meu irmão e eu reagimos de maneira muito adequada e madura: Colocamos os dedos nas gargantas e nos inclinamos para frente como se fôssemos vomitar.

Ayume girou os olhos e me estapeou no ombro.

—Parem com isso. — nos repreendeu e voltou a atenção para o Dos Reis — Em fim, eu não estou interessada no papel de princesa.

Ele estalou a língua e relaxou inclinando-se novamente para frente.

—É? E que papel quer então?

Nós dois focamos a atenção em Ayume, também a espera da resposta, porque apesar de estarmos ali com ela esperando a sabe-se lá quanto tempo — talvez uns dez ou quinze minutos — até agora ela ainda não havia nos dito que papel pretendia tentar.

—Úrsula. A Bruxa do Mar. — respondeu orgulhosa, certamente ela esperava algum tipo de reação com isso, mas depois de um tempo começou a perceber que nós três já estávamos calados há tempo demais.  — O que foi? Por que estão me olhando assim?

Dos Reis engoliu em seco.

—Nada. — respondeu desviando os olhos lentamente.

Mas Vinicius e eu permanecemos com os olhos fixos na pequena Ayume.

—Você. — dissemos. — A Bruxa do Mar de A Pequena Sereia.

Tentamos não parecer muito pasmos.

—É. Algum problema? — Ayume cruzou os braços desafiadoramente.

—Não... — respondemos o mais impassível possível — Nada.

E lentamente desviamos os olhos também.

É só que imaginar a nossa Pequena e magricela Ayume como a Bruxa do Mar, era no mínimo... Inusitado, por assim dizer.

—A Úrsula não tinha uma irmã? — Vinicius perguntou como quem não quer nada — Uma que aparece no filme dois?

Dos Reis olhou-nos com as sobrancelhas arqueadas.

—Existe um filme dois?!

—Ah sim, mas quase ninguém conhece, e não é um filme lá muito bom também, se quer saber. — meu irmão respondeu dando de ombros.

—Essas sequências quase nunca são.

—Eu também me lembro dessa irmã da Úrsula. — retomei — Seu nome era Morgana, ela tinha um tubarão de estimação e também era bem magricela...

Nós dois olhamos para Ayume, analisando-a dos pés à cabeça, até que ela ficou vermelha e começou a se levantar do meu colo.

—Era por isso que eu não tinha dito nada! Vocês estão rindo da minha cara! — reclamou.

Mas eu puxei-a de volta para meu colo e segurei-a ali a abraçando pela cintura, enquanto meu irmão tentava mantê-la quieta no lugar, segurando-a pelos ombros.

—Calma, calma Pequena Ayume! Não estamos rindo, é sério! — juramos entre risadas.

—Ei, isso já não está durando um pouco demais? — O loirinho perguntou olhando para as garotas ainda aglomeras aos gritos — Por que é que nenhum professor veio intervir ainda?

Ele começou a olhar em volta ajeitando os óculos no rosto e procurando algum professor, embora elas já fossem menos da metade do que eram no começo, mas ainda conseguiam fazer uma barulheira daquelas!

—É a Verônica. — nós dois e Ayume imediatamente olhamos surpresos para o aglomerado de garotas, esperando vê-la ali no meio também, o que ela seria bem capaz. — Não, ali.

Ele apontou-nos a direção certa, e nós vimos Verônica vindo correndo a toda velocidade em nossa direção, com os cabelos e a minissaia ao vento.

Ayume assoviou admirada.

—Ela está mesmo querendo uma vaga na peça! — comentou — A última vez que a vi correr assim foi quando nosso professor de Ed. Física, o Mr. Músculos disse que se ela não corresse três voltas em volta da quadra em dez minutos ela ia tirar nota vermelha, ser reprovada e repetir o último ano do fundamental.

—Mr. Músculos? — Dos Reis repetiu, mas Ayume limitou-se a dar de ombros.

Provavelmente “Mr. Músculos” é só um apelido que Ayume deu a algum professor seu, mas juro que fiquei imaginando o cara da televisão, dos comerciais de produtos de limpeza, dando aula, tipo... A próxima aula será como deixar o chão do banheiro da escola brilhando!

Voltando... Diferente do que tínhamos suposto a principio, Verônica não passou correndo para se jogar de cabeça na batalha por um lugar na lista, ao invés disso ela veio direto até nós, agarrou Ayume pelo braço e tentou puxá-la.

—Levanta! — exclamou no mesmo tom urgente que alguém usaria para gritar “Fogo!”.

Meu irmão me disse depois que foi como ver um daqueles comerciais sobre acidentes de trânsito: Ayume foi puxada para frente, mas acabou ricocheteando para trás graças ao cinto de segurança, isto é, eu mesmo, que ainda a segurava, infelizmente ela bateu com a cabeça na minha boca no processo.

—Ai. — ouvi Dos Reis dizer baixinho.

—Mas qual o seu problema?! — Ayume reclamou com a prima, puxando o braço e esfregando a parte de trás da cabeça.

—Ayume eu acho que você quebrou meu dente. — reclamei baixinho com a mão cobrindo a boca

—Eu acho que o seu dente ficou na minha cabeça. — ela respondeu ainda esfregando a cabeça — Pra que foi isso Verônica?

—Me deixa ver. — Vinicius me pediu, tirando a minha mão da frente para analisar bem a situação, por sorte não parecia ferido nem nada, ainda assim ele fez uma careta — Espero que não fique inchado.

—Se ficar vamos ter que pedir para a Pequena Ayume dar uma cabeçada na sua boca também. — eu sorri.

Ele acabou sorrindo junto.

—Quem diria, não é? — perguntou — Que a nossa Pequena Ayume seria capaz de dar uma cabeçada na altura das nossas bocas.

—Oras...! — Ayume virou-se zangada — Eu posso dar uma cabeçada em vocês agora!

—Não temos tempo para isso, Ayume levanta logo! — Verônica a chamou com urgência puxando-a novamente, e dessa vez conseguindo fazê-la levantar-se aos tropeços — E vocês, fora daqui, fora! Xô!

Ela sacudiu a mão para nós como se fossemos um bando de pombos.

—Hã... O que está acontecendo? — Dos Reis ergueu a mão como se estivéssemos em sala de aula.

De nós três ele era o mais confuso ali, porque com certeza não era enxotado para longe por garotas com muita frequência.

Ayume tentou se soltar, mas o braço dela era tão fino que era ridiculamente fácil segurá-lo com firmeza.

—Verônica, o que está fazendo?! — ela reclamou — Me solte logo!

—Guilherme está aqui! — Verônica anunciou com os olhos arregalados.

E nossa pequena Ayume parou de tentar se soltar.

—Que Guilherme? — ela arfou.

—O carteiro! — Verônica respondeu, porque apesar de tão afoita parece que ainda lhe restava tempo para ser sarcástica — Seu irmão é claro!

—Mas o que ele faz aqui? — Ayume perguntou chocada.

Verônica em fim a largou.

—E como vou saber?! — perguntou impaciente — Fugi assim que o vi no corredor, antes que ele me visse e vim aqui te avisar! E vocês três? O que ainda estão esperando? Andem e saiam daqui logo! Xô! Xô!

Ela sacudiu as mãos para nós como se espantasse um bando de pássaros.

Ainda meio sem saber o que fazer nós três começamos a nos levantar de forma desajeitada — quase parecendo atordoados —, mas rapidamente caímos sentados de volta — com o loirinho quase passando direto para o chão, por causa de sua posição precária na ponta do banco de pedra — quando, de repente, Verônica praguejou:

—Droga!

E tão rápido quanto havia chegado, ela fugiu dali.

Ayume virou a cabeça para a direção da qual Verônica viera e arregalou levemente os olhos praguejando baixinho antes de voltar-se novamente para nós e dizer em tom rápido e apressado por entre os dentes:

—Fiquem quietos, não se mexam e nem ousem respirar!

Ao menos ela não tentou nos expulsar dali, não é? Talvez porque não houvesse mais tempo.

—Quem diria que Verônica é capaz de correr assim quando tira os saltos? — alguém, sem dúvida o irmão de Ayume, comentou se aproximando pela mesma direção que Verônica viera antes.

—Nem me fale. — Ayume respondeu com as mãos nos bolsos e deliberadamente evitando olhar na direção do irmão. — Talvez ela estivesse atrasada para alguma liquidação?

Mas nós dois, por outro lado, nos viramos na mesma hora para vê-lo.

O primeiro irmão de Ayume que conhecemos estava carregando um livro debaixo do braço e tinha, por trás de um par de óculos que pendiam tortos em seu rosto, os mesmos olhos puxados da irmã mais nova, e era tão magro quanto ela também, mas ao contrário dela ele era alto — nós meio que estávamos esperando alguém com tamanho mais “de bolso” como aquele minion de cabelos cacheados — e usava uma franja de lado com as pontas descoloridas.

—E quanto a você? Foge de casa, mas não falta à escola, não é? Mas que aluna exemplar você é. — ele ironizou ajeitando os óculos.

Ele obviamente não estava nada feliz, o que era compreensível considerando a situação — se Maya fugisse de casa da mesma forma que Ayume, pode acreditar que nossos pais já teriam colocado grades na janela dela, e nós com certeza ajudaríamos — mas ainda assim não parecia o bicho papão que nossa Pequena Ayume gostava de pintar.

De repente ele nos notou ali.

—E aí Loiro? — moveu a cabeça em direção ao Dos Reis.

Dos Reis ergueu a mão.

—Fala. — o cumprimentou.

Ele definitivamente não parecia tão mau.

—São amigos de Ayume também? — ele nos encarou.

—Hum... Somos. — respondemos.

Ele colocou as mãos nos bolsos, inclinando a cabeça levemente de lado.

—Um fato interessante: Sabiam que a forma mais eficaz de estrangular alguém com as mãos é pressionando os polegares na traqueia?

Não apenas nós, como também o loirinho, arregalamos os olhos.

—I-isso é muito interessante... — meu irmão gaguejou.

Acenei vigorosamente com a cabeça.

—Sem duvida. — engoli em seco.

Ele sem duvida era o irmão de Ayume. Guilherme voltou a ajeitar os óculos.

—Ayume tomou mamadeira até os nove anos de idade, até JJ largou a mamadeira antes d...!

Mas ele saltou repentinamente para trás para esquivar-se do chute certeiro que Ayume tentou dar nele.

—Oito anos e sete meses! — ela defendeu-se — Afinal, como você entrou aqui?!

Guilherme ergueu o livro que tinha debaixo do braço.

—Eu disse que minha irmãzinha tinha esquecido esse livro em casa e eu vim trazer para ela.

—Fácil assim? — Ayume ficou boquiaberta — Você podia até ser um terrorista!

O irmão dela colocou o livro debaixo do braço novamente e começou a limpar os óculos na camisa.

—Isso é porque eu tenho “cara de inteligente”.

Nossa amiga franziu o cenho.

—“Cara de inteligente”?

—Querida irmãzinha, eu sou um cara asiático que usa óculos, as pessoas me vêm e automaticamente me associam à figura de uma pessoa inteligente, talvez até um gênio da matemática que manja muito de computadores, porque é isso que os estereótipos dizem a elas que eu sou. — ele recolocou os óculos. — Isso é um fato social.

—Hum... — Ayume inclinou-se e cochichou para nós: — Ele ficou metido assim depois que conseguiu entrar na faculdade, nem parece que reprovou da primeira vez, e que tem pânico de matemática... — o irmão a acertou na cabeça com o livro — Ai!

—Sem gracinhas! — a repreendeu de repente sério — Ayume Guinevere. — Ayume se retraiu ao ouvir o seu segundo nome. — Você tem ideia do estado que o papai ficou quando desceu e soube que você não estava dormindo na casa do Adam?!

Dos Reis virou-se para nós com as sobrancelhas arqueadas e moveu os lábios perguntando silenciosamente “Guinevere?”.

Também em silencio nós gesticulamos com as mãos, deixando-as retas e passando as pontas dos dedos horizontalmente rentes aos pescoços “Melhor deixar quieto ou cabeças iam rolar”.

—Eu nunca disse que ia dormir na casa do Adam. — ela defendeu-se — E não diga o meu segundo nome em voz alta Keijiro!

—O ponto não é esse aqui! — ele reagiu irritado. — Você não pode simplesmente sumir dessa forma Guinevere!

Aquilo virou uma guerra de nomes odiados.

—Pare de me chamar desse jeito! — Ayume recuou, cruzando os braços com as orelhas ficando vermelhas.

É claro que àquela altura os dois já estavam chamando alguma atenção para si — mesmo que pouca —, mas ainda assim, ignorando completamente tanto os olhares dos curiosos quanto os protestos da caçula o irmão de Ayume continuou em seu sermão:

—Onde foi que você dormiu?! — devo acrescentar que, nesse momento, nós ficamos sensatamente em silêncio — Dessa forma quando menos esperarmos ao primeiro espirro você vai pegar um voo para o Canadá! E a mãe está uma arara com você também!

—Só que não foi só um “simples espirro”! — Ayume tentou defender-se, ela claramente não sabe quando é a hora de ficar quieta. — Era uma epidemia! JJ estava começando a ter febre, e a temperatura dele continuava a subir, Santhiago estava com aquela tosse horrível e o nariz completamente entupido, e você...! — ela parou franzindo o cenho — Você parece bem.

—Eu estou ótimo agora, obrigado pela preocupação. — Guilherme respondeu com cinismo, e então, acertando o livro mais uma vez na cabeça da irmã a advertiu em tom sombrio — Volte para casa. Hoje.

Ele deu o livro a ela e foi embora.

♠. ♣. ♥. ♦

Murilo suspirou deitando a cabeça no ombro do irmão.

—Então Ayume voltou para casa? — Dra. Frank questionou.

—Ah, não. — Murilo negou erguendo a cabeça novamente.

—Na verdade ela está na sua sala de espera nesse exato momento. — contou Vinicius.

—Provavelmente trocando mensagem com o loirinho. — acrescentou Murilo.

—É.

—Meninos, não acham que seria melhor Ayume voltar para casa antes que os pais dela se irritem? — Frank Lorret opinou — Ela não acabou de sair de um castigo por gastar demais com produtos online?

—Ela vai voltar para casa. — os gêmeos garantiram — Depois daqui vamos voltar para casa e ela vai com a gente para pegar as coisas dela.

—Bom. — Dra. Frank aprovou.

—Se bem que... — Murilo ponderou — Ela provavelmente vai enrolar até ser tarde da noite e aí vai pegar o celular, ligar para casa e dizer algo do tipo “Desculpe, ficou muito tarde, mas eu prometo que volto amanhã de manhã bem cedo. E só por acaso, o JJ ainda está com o nariz entupido?”.

—E no dia seguinte enrolar até de noite novamente e assim sucessivamente até não restar ninguém com coriza em casa. — Vinicius completou.

Dra. Frank Lorret suspirou.

—Meninos eu realmente acho que Ayume deveria...

Mas ela foi interrompida pelo soar dos alarmes dos relógios de pulso dos meninos.

—Opa! Parece que a sessão de hoje acaba por aqui doutora! — exclamaram juntando as palmas das mãos e se levantando.

Ayume estava esperando por eles na sala de espera, assim como os gêmeos disseram.

—Ah! Meninos eu acabei de bater meu recorde no Candy Crush!

—Que bom. — os irmãos estenderam, cada um, uma mão para ajudá-la a levantar. — Então vamos para cara casa a...?

—GUINEVERE!

Ayume sobressaltou-se no sofá ao mesmo tempo em que os gêmeos surpresos saltaram meio metro para trás quase entrando novamente no consultório da doutora, quando um jovem de feições asiáticas e cabelos amarrados à altura da nuca abriu a porta de repente.

—San...! Por que de repente vocês cismaram com meu segundo nome?! — Ayume reclamou, depois de meio segundo surpresa.

—E por que você não voltou para casa? — o recém-chegado perguntou de volta.

Talvez um pouco mais baixo, e não tão magro quanto o anterior, esse era provavelmente o mais velho dos irmãos de Ayume: Santhiago.

 —Eu ia...! Como você soube?! — mas de repente ela girou a cabeça em direção a Adam — Seu traidor!

Adam deu de ombros.

—Se está tentando se esconder de sua família, não venha ao local de trabalho do primo de seu pai. A tia Glória sempre me delatava para mamãe quando eu aprontava. Agora entendo o porquê:  a sensação é ótima!

Disse tudo isso sem desviar os olhos do monitor ou mudar sua expressão uma vez sequer.

—Seu...! — Ayume irritou-se.

Mas Santhiago a pegou pela mão e a puxou para que se levantasse de uma vez.

—E você já devia ter voltado para casa! — afirmou irritado, logo antes de puxar com a mão livre um lenço de papel do bolso para assuar o nariz.

Ayume tentou, em vão, se soltar.

—Eu não posso ir ainda, eu...! — de repente algo lhe ocorreu — Eu ainda tenho que pegar minhas coisas antes!

Santhiago fungou assuando o nariz uma última vez e deu uma olhada na mochila em suas costas.

—Você já está com suas coisas da escola aí, pode pegar o resto outro dia.

—Mas...! — Ayume ainda tentou argumentar.

—Vamos logo! — o irmão a levou, sem querer ouvir mais nada. — E que tipo de abajur estranho foi aquele que o correio entregou lá em casa?

—Ah, minha luminária chegou?! — a garota animou-se de uma hora para outra.

—Ela tem o formato de um tentáculo de kraken segurando uma lamparina antiga!

—Legal, não é?

E a porta se fechou atrás dos irmãos asiáticos, enquanto que, ainda parados onde estavam, os gêmeos haviam passado despercebidos e sido completamente esquecidos.

—Não se preocupem. — Disse Adam, ainda digitando — Eu não falei sobre vocês.

Os gêmeos piscaram.

—Hã... Obrigado?

 


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Digam-me, o que acharam da aparição desses dois irmãos de Ayume? ;)



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Gêmeos no Divã" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.