Orgulho Ferido escrita por Mari May


Capítulo 3
Capítulo 3




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Quando amanheceu, Hashirama estava com a cabeça latejando.

Aos poucos, lembrou-se de sua última conversa com Tobirama, e torceu para que fosse um pesadelo.

Mas não era.

À sua mente, veio a imagem da folha esburacada que encontrara perto da janela.

"Merda! Ele deve ter ouvido a primeira parte da conversa", pensou. "E, agora... Preciso lhe contar o resto."

Tomou banho, arrumou-se e saiu sem comer nada, pois não teria fome tão cedo.

Dirigiu-se ao Distrito Uchiha, onde percebeu que tinha mais simpatizantes do que imaginava, e lembrou-se das palavras de Tobirama: nem os próprios Uchihas apoiavam Madara, de maneira geral. E não podia evitar se sentir culpado, mesmo que nunca tivesse a intenção de ser o "queridinho do povo".

Andou até a casa de Madara e bateu na porta, que logo se abriu.

– Esse chakra... Só podia ser você mesmo. - o rapaz disse, com um sorriso melancólico.

– Madara... Precisamos conversar.

– Claro. - ele fez um sinal para que o outro entrasse, e fechou a porta atrás de si - Mas seja rápido. Tenho algumas coisas para investigar.

– Investigar?

– Sim. Uma antiga profecia do templo dos Uchihas. Mas isso não vem ao caso. O que você quer?

– Você... Parece arredio.

O Uchiha suspira, impaciente.

– Digamos que ouvi coisas não muito agradáveis ontem à noite. – o Senju abaixa cabeça, e ele continua - Mas o problema não é você, Hashirama. É esse sistema ninja que nos foi imposto. Enquanto os Uchihas não lutarem para serem respeitados, nunca deixaremos de ser temidos. Porém, o que vejo são uns covardes que se entregam ao sistema e não fazem nada para melhorar a nossa reputação. Então, resolvi pesquisar para ver se é mesmo possível que tenhamos alguma trégua com os Senju. Porque, às vezes... - ele cruza os braços, desviando o olhar - Às vezes, estamos destinados a ser inimigos para sempre. E não há nada que possamos fazer para mudar isso.

– Madara... - Hashirama se aproxima, com o semblante abatido, colocando a mão em seu ombro.

– Eu só não entendo por que... - ele se interrompe, acariciando a mão que o tocava - Por que temos que sentirisso, se o nosso destino for a separação.

– É você quem está afirmando essas coisas! – o outro moreno exclamou.

– ...e você pode afirmar o contrário?

A expressão desolada de Madara fez o coração de Hashirama partir em pedaços.

Ele, então, capturou os lábios do amado para um beijo sôfrego, com sabor de despedida.

– Hashir...? - Madara tentou perguntar o que estava acontecendo, mas aquele rapaz o impedia, empurrando-o contra a parede mais próxima enquanto mantinha as bocas coladas uma na outra, as línguas se entrelaçando.

Pressionou o corpo contra o do Uchiha, as mãos sobre os braços fortes. Uma de suas pernas enroscou-se na dele.

Quando uma das mãos de Hashirama seguiu para a virilha de Madara, este o segurou pelos ombros, afastando-o.

– O que está... Fazendo?! - indagou, arfando - Você não... Costuma ser... Desesperado assim. Pelo menos... Não no começo.

– D-desculpa... Não sei o que... Deu em mim.

O Uchiha voltou a cruzar os braços.

– Sabe sim. E é um péssimo mentiroso.

O outro engoliu em seco.

– Madara... - o Senju estava prestes a chorar.

– O quê? - ele notou que o outro rapaz tremia e o encarou, preocupado - Hashirama?

Resolveu guiá-lo até o sofá, e ele se sentou.

– Vou trazer um copo d'água e...!

– NÃO! - ele gritou, segurando-o pelo pulso - Por favor... Fique.

Assustado, Madara se sentou ao lado dele, e seu olhar pedia explicações.

Suspirando pesadamente, Hashirama revelou:

– Tobirama... Descobriu tudo.

Um sentimento de pavor tomou conta de Madara.

– O QUÊ?!

– Pois é. Não sei como. Fomos tão cuidadosos... Mas, agora, já era.

– ...o que quer dizer?

– Ele... - Hashirama apóia a cabeça entre as mãos, com os cotovelos sobre os joelhos - Ele quer que eu me case e continue a linhagem Senju, já que é estéril. E já me arrumou uma noiva. Ela chega depois de amanhã. Além, claro, de querer que EU seja Hokage, em vez de você...

– Aquele... - a respiração do Uchiha voltou a se alterar, mas, agora, pela mais profunda revolta - DESGRAÇADO!

Furioso, Madara levantou e chutou a mesinha que ficava em frente ao sofá, quebrando o prato de vidro que havia sobre ela.

– Madara...!

– POR QUE OS UCHIHAS SEMPRE SE FODEM?! POR QUÊ?! - ele começou a andar em círculos, sem conseguir parar - BEM QUE EU DESCONFIEI QUE TUDO ESTAVA BOM DEMAIS PARA SER VERDADE! QUALQUER CHANCE QUE EU TIVER DE SER FELIZ, VÃO ME TIRAR! NÃO CONHECI MINHA MÃE, DEPOIS PERDI MEUS IRMÃOS (ATÉ IZUNA, QUE JUREI PROTEGER PARA SEMPRE), PERDI MEU PAI, PERDI O RESPEITO ENTRE O MEU PRÓPRIO CLÃ, TAMBÉM NÃO POSSO SER O HOKAGE DA VILA QUE AJUDEI A FUNDAR E, PRA COMPLETAR... NÓS... ARGH!

– Madara, eu... - Hashirama estava perdendo a voz diante daquela explosão de fúria, as lágrimas brotando em seus olhos.

– ESSA MERDA DE VIDA INJUSTA! - de costas para o amante, ele socou a parede, deixando uma rachadura, e prosseguiu, amansando a voz de repente - Sabe o que eu queria, Hashirama? Um mundo ideal. É. Um mundo de sonhos, onde tudo o que eu amasse não fosse tirado de mim. - lentamente, o Senju começou a andar até ele, e Madara o fitou com seu Mangekyou Sharingan ativado, e ambos perceberam que choravam juntos - Será que isso é possível? Mesmo se for... Apenas um... Genjutsu? Hein?

Do nada, ele fixou o olhar no chão e soltou uma risada nervosa, balançando a cabeça negativamente, e Hashirama não sabia o que dizer.

Quando Madara deitou a cabeça em seu ombro, só pôde abraçá-lo.

Após alguns segundos, o Uchiha prosseguiu:

– Então... Só podemos... Ser inimigos, não é? - concluiu, risonho, como se acabasse de fazer uma descoberta óbvia - Somente isso...

– N-não, Madara! Nem tudo está perdido! Quando Tobirama se acalmar, vou conversar com ele! Ainda podemos trabalhar juntos e...!

– CALA A BOCA! - ele voltou a encará-lo, levantando-o pela gola da camisa - Cala... Essa... Boca! Será que nem em momentos como este você larga a sua maldita ingenuidade?!

– Mas...!

– CHEGA, Hashirama! Eu vou dar o meu jeito. Terei um novo propósito na vida.

– Madara, se dependesse só de mim, eu...!

– NÃO! Não quero ouvir mais nada. Esse lado da nossa história... Morre aqui.

Ele coloca Hashirama no chão, dando-lhe as costas.

– Você... Só pode estar brincando, né?!

– A partir de agora... - ele encara Hashirama com uma expressão séria - Seremos apenas rivais. Nada mais, nada menos.

O outro fica em choque diante daquelas palavras.

Madara abre a porta e desvia o olhar para não vê-lo passar.

Hashirama dá alguns passos lentos, parando ao seu lado, e diz:

– Eu... Sempre vou te amar. - o Uchiha estremece, e ele prossegue - Não importa com quem eu me case... Ninguém nunca vai te substituir, Madara. Mesmo que... Para você... Só tenha sido uma avent...!

Antes que pudesse terminar, Madara fecha a porta, prende-o entre os braços e rouba seus lábios para um beijo rápido, porém intenso.

– Já mandei calar a porra dessa boca e parar de falar por mim! - Hashirama apenas o fitou, ruborizado, e ele continuou - Agora, vá embora. Não piore as coisas.

Então, o Senju sorriu, abraçando-o fortemente.

– Entendi... Me perdoe por duvidar de você.

O Uchiha retribuiu o abraço, pois seria o último, já que voltariam a viver como inimigos mortais.

– Não é a primeira vez que você fala asneiras... - afirmou, corado.

O outro moreno riu baixinho.

– Tem razão...

Segundos depois, ele abriu a porta, deu alguns passos à frente e, virando-se, disse:

– Adeus, Madara. E... Obrigado por tudo.

O Uchiha apenas assentiu com a cabeça.

Assim que Hashirama foi embora, Madara recostou na porta fechada atrás de si, agachando até sentar no chão.

Ali, abraçando as pernas dobradas na altura do peito, permitiu-se chorar.

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O Primeiro Hokage voltou para casa após mais uma luta contra o Uchiha nukenin, que cada vez mais mostrava-se sedento por batalhas.

Sua esposa, com quem casara há poucos meses, começou a tratar de seus ferimentos. Estavam sentados na cama do casal.

– Obrigado, Mito.

– De nada. Mas, sinceramente... Cada vez que você sai para lutar contra esse homem, temo que não volte. - desabafou - Vai ser assim para sempre?

– Acredito que sim. Ele... É muito teimoso.

– Você disse, uma vez, que se conheceram na infância.

– Mais ou menos. Tínhamos doze anos. Foi no começo da adolescência. O mundo desmoronando à nossa volta e nós ali, conseguindo nos divertir em meio ao caos. - ele sorriu, nostálgico.

– Hum... - a saudade por trás daquelas palavras não lhe passou despercebida - Eram amigos?

– Sim. Mas "não devíamos". Passamos um bom tempo sem saber o sobrenome um do outro. Era um recurso de segurança na época. A guerra não cessava.

– Entendo... - a ruiva o fitou, pensativa, ao colocar a última atadura - Er... Hashirama...

– O quê?

– Eu tinha preparado a banheira para mim, mas... - ela pôs uma mecha de cabelo atrás da orelha - Podemos dividir, se quiser.

O Senju ruborizou.

– Er... Eu estou meio sujo de terra e...

– Você pode se limpar antes de entrar.

– É... Posso... - ele parecia inseguro.

Então, Mito suspirou.

– Esquece.

– Hã?

– Desde que nos vimos pela primeira vez, por mais que você fosse simpático e gentil comigo, percebi que era contra o nosso casamento. E não te culpo por isso. Mas eu realmente gostei de você e... Queria fazer isso dar certo. - ela sorri, tentando disfarçar a frustração - Bom, voltarei aos meus estudos sobre técnicas de selamento. Pode ir primeiro.

– Mito... - ele queria confortá-la de alguma forma, mas nada lhe ocorria.

Ela deixou o aposento, e Hashirama foi tomado pelo remorso.

Se havia acatado as condições de Tobirama e concordou em casar, não deveria fazer sua esposa se sentir mal ou rejeitada, mesmo que não pudesse amá-la como amava Madara; então, tentaria fazer aquele casamento arranjado ir para a frente.

Foi até a biblioteca da casa e, estendendo a mão para Mito, pediu-lhe que o acompanhasse no banho.

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A chuva caía sobre o corpo moribundo de Madara, formando uma poça de água e sangue à sua volta.

Graças ao Izanagi, que lhe custou o olho direito, conseguiu voltar no tempo e mudar o desfecho daquela árdua batalha contra Hashirama no Vale do Fim, fazendo-o pensar que conseguiu matá-lo. Guardou um pedaço de sua carne para transplantar em suas feridas, pois poderia aprimorar seus poderes com as células de um Senju.

Não imaginava, porém, que seu ex-amante realmente teria coragem de transpassar uma espada em suas costas. Mesmo sendo um nukenin da vila que ajudara a fundar, sabia que tal atitude apenas fomentaria o ciclo de ódio que dominava o mundo ninja.

Será que, um dia, alguém seria capaz de proteger Konoha sem precisar matar alguém querido no processo?

Não. Era utopia demais. E, por isso mesmo, através de um grande genjutsu, criaria um mundo à parte, onde até a mais louca das ideias seria possível.

Ainda assim, lutar contra Hashirama foi bom enquanto durou. Era uma das poucas coisas que ainda lhe davam prazer após tanta decepção com as pessoas, a sociedade, o mundo.

E Hashirama era o único que conseguia lutar de igual para igual contra ele.

O único que não lhe entediava.

O único que ainda trazia cor à sua vida cinzenta.

Deixando um bunshin no lugar de seu corpo verdadeiro, vagou em busca de um lugar seco para descansar e, ao acordar, seguiria com seu plano, um plano que ia muito além do que ele e aquele Senju idiota haviam sonhado quando crianças.

– Nesse mundo... - murmurou para si mesmo, com a voz fraca - Os Uchihas serão respeitados. EU serei respeitado. Não haverá mais guerras. Meus pais estarão vivos, assim como meus irmãos. E, também... Eu e Hashirama poderemos nos amar para sempre.

:::::::::: EPÍLOGO ::::::::::

A Quarta Guerra Ninja finalmente chegara ao fim.

Ironicamente, graças a um jutsu proibido de Tobirama, seu irmão e Madara puderam ressuscitar e se reencontrar.

Entretanto, desta vez, ambos estavam partindo ao mesmo tempo.

Hashirama, de novo, observava seu grande amor prestes a dar seu último suspiro. Só que, agora, não precisaria carregar a culpa de tê-lo matado. E ambos puderam presenciar o efeito dos erros cometidos pelos Senjus e Uchihas ao longo das gerações, assim como a liderança de Naruto Uzumaki, um aspirante a Hokage, cujas ações incentivaram o trabalho em equipe entre todas as vilas e simbolizaram o recomeço no mundo ninja.

O sonho que ele e Madara tiveram na infância foi adaptado à realidade, e isso não era, necessariamente, ruim: mesmo que nada fosse perfeito, era possível alcançar um nível maior de paz.

Pesaroso, Hashirama presenciou Madara fechando os olhos para sempre. Mas haviam, enfim, se entendido. E o Uchiha, após carregar tanta angústia ao longo do tempo, parecia partir em paz. Talvez, assim como o Senju, tenha constatado que fundar a Vila Oculta da Folha foi mais um acerto do que um erro, afinal.

O corpo de Hashirama começou a se desintegrar e, novamente, ele encarou Madara estirado no chão.

Seria sua última visão antes de deixar este mundo pela segunda vez.

Assim como, para Madara, ele foi a última visão.

Jamais se arrependeram do que viveram juntos, amando-se silenciosamente até o fim.

Compartilhavam memórias preciosas, regadas por uma felicidade, apesar de efêmera...

Inegavelmente genuína.


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Notas finais do capítulo

Passei dias refazendo o último capítulo até chegar a um resultado minimamente satisfatório para alguém que exige demais do que escreve, hahahaha, porque tipo: mesmo sendo angst, eu não queria que o final fosse triste demais. Minha ideia era mostrar que, mesmo que um romance não possa continuar, aquilo que foi vivido não perde a beleza nem a intensidade, assim como há sentimentos que nunca serão substituídos ou apagados, por mais que as circunstâncias externas tentem reprimi-los.

Espero ter conseguido passar a mensagem. E obrigada a todos que acompanharam! S2