Coração de Porcelana escrita por Monique Góes


Capítulo 48
Capítulo 47 - Entrada Triunfal


Notas iniciais do capítulo

E esse é o penúltimo capítulo!



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/625258/chapter/48

Capítulo 47 – Entrada Triunfal

Michael caiu sobre seus irmãos, ambos segurando-o ao mesmo tempo. Ele soltou um gemido que poderia ser de exaustão, fome ou cansaço, talvez tudo ao mesmo tempo. Vincent era bem consciente de sua força superior, mas o caçula lhe parecia tão leve.

Ele começou a tremer, o que fez Jim soltá-lo e ir atrás de sua capa de frio, o que era irônico, considerando que o mais novo era a fonte daquele frio.

— Onde... O que é isso? – ouviu a voz fraca dele enquanto era enrolado na grossa capa de lã.

— Estamos no túmulo da nossa família, como falei. – o mais velho respondeu. Acabou se abaixando e carregando Michael, que parecia deveras fraco. Ele não reclamou, parecendo se encolher em seu colo.

Olhou para o Pilar, que continuava com sua metamorfose contínua. Ele brilhou, e por um momento, pensou ter visto um rosto surgindo nele.

Depois disso, ouviu gritos.

— O que foi isso?! – Jim se sobressaltou.

Alguma coisa tinha que dar errado. Sempre. Sempre.

Não poderiam ter um momento de paz para pensarem no que fariam em seguida? Não? Teriam que ficar correndo de um lado para o outro, tentando não morrerem até terem um momento iluminado que os faria sair daquela situação?

— Temos que sair daqui.

Quase soltou um “não me diga”, mas não tinha muito o que dizer. Começaram a sair do local, passando pelo interior do palácio de pedra, mas não demorou muito para ver a confusão passando pela porta: Victoria e sua ursa, Ameen e René carregando Akinyi e Anyu, Anastasiya aparentemente arrastando Stephania e os dragões passaram voando para dentro.

O que havia atrás deles... Nem mesmo sabia como descrever aquilo. Eram brilhantes, emitindo todas as facetas de cores que o Pilar emitia, com patas articuladas como de aranhas, mas seus corpos eram diferentes. Brilhavam tanto que não conseguia vê-los com clareza.

Tinha quase certeza que aquilo deveria ser algum “dispositivo” de proteção do Pilar. E era óbvio que eram coisinhas mortíferas.

— Encima dos dragões, todo mundo! – Jim exclamou.

Foi como se por um milésimo de segundo, todos olhassem para ele descrentes, mas os sons das patas, que era como acrílico batendo em pedra, os fez reagir rapidamente.

O dragão de Michael era o maior, então era possível de ir quatro pessoas. Michael não estava em condições de se segurar sozinho, então praticamente o jogou sobre Freyr antes de escala-lo. Literalmente empurraram Stephania para subir atrás de si. Jim subiu em Morrígan, com Victoria e eles puxaram Anastasiya para cima. Os outros quatro teriam que se virar sobre o dragão branco, mas considerando seu pelo, provavelmente era mais fácil de segurar nele. Victoria ergueu sua mão, e os ramos que se encontravam envolta da ursa cresceram e a fizeram subir no dragão, também a deixando presa.

Freyr estava agitado. Ele estava assustado com aquelas coisas, e ele com certeza não queria ser pego por elas. Quando estavam se preparando para alçar voo, sentiu um repuxão na mente de seu dragão, que acabou se refletindo em sua mente.

Estava o atraindo para dentro.

— Freyr, não...

Tarde demais. O dragão correu a frente e começou a voar, os outros dois fazendo o mesmo. Deu para escutar – por cima de Stephania gritando – as exclamações de todos os outros e Jim mandando Morrígan voltar, mas não teve jeito. Como uma força magnética, eles estavam indo direto para a câmara do Pilar.

Entraram no lugar com uma velocidade alucinante, e houve um clarão de luz que fez Vincent pensar que ficaria permanentemente cego.

Precisou de uns cinco minutos para se recuperar. E esse tempo o fez estranhar para onde Freyr estaria voando, se havia a coisa bem no meio do lugar. Tomando cuidado com Mike, para que ele não vergasse do lado que iria soltar, esfregou os olhos até a luz – não apenas pontos de luz dessa vez – desaparecessem.

Viu as nuvens escuras à sua frente.

— Onde estamos? – Stephania perguntou com um fio de voz atrás de si.

— Boa pergunta.

... Teletransportados para algum lugar. Esperava que as aranhas gigantes não caíssem do céu.

Olhou envolta, facilmente encontrando os outros dois dragões. A “tripulação” do dragão de Michael estava firmemente agarrada em seus pelos, e lhes deu um desconto pelo fato de que eles não eram tranquilizados pela mente do ser enquanto voava. Era o caso de Vincent. Era tão natural para Freyr que simplesmente não tinha medo de cair.

Viu os lampejos nas nuvens a sua frente e ficou nervoso. Ficaria tranquilo com raios, mas já bastava de anjos de luz, coisinhas brilhantes e qualquer outra coisa. Só queria paz.

Mesmo com a mudança repentina, logo percebeu que aquilo se tornara uma viagem estável. A distância e o vento o impediam de falar com os que montavam os outros dragões, então ficou quieto.

Transportados. Urgh.

Pegou-se pensando no que ia fazer em seguida. Quando Jim e Michael foram transportados para a mansão, aquilo já deixara claro que não havia mais como se esconder. Se envolvendo em Dhor Faldor, com Lorde Gregory e com o Túmulo agravara as coisas. As pessoas tinham visto Rockstones e iriam falar disso.

Olhou para Mike. Ele estava quieto, com a cabeça abaixada, não se pronunciando em nada quanto ao dragão, ao voo, à fuga repentina. Apenas quieto. Não queria pensar aquilo, mas já o fizera tantas e tantas e tantas vezes... Como as coisas seriam muito mais fáceis se não fossem Rockstones. Simplesmente, ao invés de se preocuparem com tentativas de assassinatos, anjos e ancestrais de outros mundos, simplesmente poderem se preocupar apenas com... Coisas normais do dia a dia.

Os dois mais novos permaneceram sem magia por mais tempo que ele; Vincent nem lembrava quando começara a usar magia. Mas ainda assim, depois que haviam sido pegos e com o assassinato da mãe adotiva, era óbvio que eles dois não tinham mais preocupações tão normais. Jim ao menos teorizara o que ele fazia para sustenta-los, aliás.

O que faria em seguida? O que fariam em seguida? Sabia que precisava saber o que exatamente transportara os meninos dos Estados Unidos para a Inglaterra. Se mexera com o apartamento em si, virando uma armadilha. Mas agora vinha as questões de família real. Não ia dar para fugir, o que era um tanto desesperador para si.

Simplesmente... Fora muita coisa acontecendo em muito pouco tempo. Tirou um pouco de sangue seco de seu rosto. Odiava o fato de que era tão covarde que preferia fugir das coisas, só que o que mais havia feito de sua vida? Fugira-a inteira, se escondera o tempo todo, e nos momentos em que tivera que se expor, sentia-se tão fora da sua zona de conforto. Dava até vergonha, considerando como Jim simplesmente sentara e aceitara o fato. Ele inclusive, se saíra muito bem até o momento.

Encarar aquilo era estranho. Agora, o que iriam fazer no momento? Os dragões foram atraídos por alguma coisa no Pilar, e no momento seguinte tinham saído do lugar. Onde estavam, e para onde estavam indo? Freyr estava meio grogue, tendo recuperado a autonomia que fora puxada de si em um segundo, mas ele também não fazia lá grande ideia. Só estava voando para frente porque todos estavam voando para frente além de parecer ser o certo a se fazer.

Mais um clarão nas nuvens. Mordeu os lábios. Não queria ver mais anjos, não queria. Quando olhou para o lado, teve que se segurar para não dar um chute ou coisa parecida.

Havia uma coisinha de luz voando do lado deles. Não parecia com as aranhas, mas depois de uma maratona de coisas tentando mata-los, não tinha como confiar. Era simplesmente uma esfera de luz do tamanho de uma bola de basquete, e estava apenas do lado deles. Os outros dragões nem ninguém pareceram notar.

Na realidade, Stephania estava quieta demais, e algo lhe dizia que ela não estava vendo aquilo também. Ótimo, aquilo era maravilhoso para os seus nervos paranoicos.

Sentiu a dúvida na mente do seu dragão. Ele não via aquela coisa, mas conseguia enxerga-la vendo por sua mente.

A coisa pulsou. Uma, duas, três vezes. E então, como acontecera antes, ela brilhou num clarão que desorientou.

E para o seu azar, aquilo passou para Freyr.

Ele vergou de um lado para o outro, e Vincent sentiu Stephania se agarrando nele com tanta força que quase jurou que ela queria fazer a manobra de Heimlich nele.

— Freyr?!

O dragão estava agindo como se fosse um avião no meio de uma turbulência tremenda, só que não era muito tranquilizante quando se estava nas costas dele – não que nos aviões fossem tranquilizantes também. -, e estava ficando difícil de segurar.

Escutou os outros gritando alguma coisa quando eles começaram a perder altitude. Como aquilo afetara tanto Freyr se fora Vincent que vira aquela coisa? Michael acabou ficando ereto tão rápido que sua cabeça quase bateu no rosto do seu irmão mais velho, mas estava preocupado com o modo inconstante do dragão.

— Freyr, o que aconteceu?! Freyr?!

Tentou se tranquilizar pelo fato de que eles não estavam em uma espécie de espiral flamejante da morte, mas de qualquer jeito, estavam no início de uma queda da morte que ele sinceramente não queria fazer parte. O dragão estava confuso como se fosse um gato dentro de uma caixa – como Vincent se transformava em um gato, ele sabia que os seus sentidos ficavam loucos -, e aquilo não estava os ajudando muito. Eles estavam no nível das nuvens, então se caíssem virariam apenas uma mancha vermelha no chão de onde cairiam.

As nuvens ficaram para trás, desesperando Vincent, que viu uma cidade abaixo deles. Havia um prédio grande, que provavelmente deveria ser o principal setor administrativo do lugar, e uma praça em frente a ele.

Eles iam cair num dragão no meio de uma cidade.

— É Southcrown! – Stephania gritou.

A capital?! Vincent já tivera entradas triunfais o suficiente para uma vida!

— FREYR! – berrou, fazendo Michael se encolher.

O dragão pareceu levar um tapa. Ele abriu suas asas como se fosse um paraquedas. Foram ligeiramente lançados para trás, mas conseguiu ver com antecedência o impacto que iriam sofrer.

As pessoas que estavam na rua começaram a correr, gritando. Tinha gente apontando, tinha gente saindo dos prédios para ver o que estava acontecendo. Com um estrondo, Freyr bateu numa estátua da praça – parecia ser o seu avô -, antes com um tranco, suas patas baterem no chão, afundando no concreto. Ele viera numa velocidade que deslizaram por mais uns vinte metros antes de finalmente pararem, formando uma bagunça de concreto, grama, pedaços de bancos e ainda alguns pedaços da dita estátua. Havia as pessoas que não tinham tido tempo de correr antes, que correram à toda velocidade enquanto o dragão ia deslizando no chão, e Vincent quase teve certeza de que iriam cair de cima dele quando ele flexionou as patas traseiras, tentando frear.

Quando ele finalmente conseguiu parar, estavam literalmente, bem de frente para o prédio que provavelmente deveria ser a sede do Conselho. Tinham soldados ali na frente, encarando a cena com olhos arregalados, a descrença marcada ali. Havia também uns homens de terno e capa, um tinha apertado com força seu café, espirrando todo o líquido em suas roupas.

Merda.

Não melhorou muito o fato que Morrígan pousou - bem mais suavemente - ao lado deles.

Vincent sentia como se suas pernas houvessem virado gelatina. Bom, não só suas pernas, mas aquele não era o caso. As pessoas estavam se reunindo ao redor do lugar, vendo, apontando, e houve mais gritos quando o dragão de Michael pousou, o mais leve dos três, apesar de ser maior e carregar mais coisa do que os outros dois.  

— Eu te odeio. – falou alto para ter certeza que Freyr ouviria. Ele o olhou chateado, soltando um resmungo, antes de sair de cima da pilha de entulho onde estavam e ir para um lugar mais limpo para desmontarem. Sentia-se tremendo, assim como Michael estava e Stephania estavam – que ainda estava agarrada em sua cintura.

As pessoas gritaram e apontaram para ele quando desmontou. Provavelmente elas já tinham visto alguma foto de seu pai – dã – e estavam os reconhecendo, ou se apenas era o fato de um cara de armadura todo sujo de sangue saindo de cima de um dragão.

Ajudou os outros dois a saírem de cima do dragão, que depois se sacudiu como se fosse um cachorro tentando tirar água do pelo.

Quase sentia vontade de beijar o chão, mas o seu orgulho já estava em frangalhos depois daquele pouso. Decidiu manter um pouco da sua dignidade ali.

Stephania foi procurar um lugar pra sentar enquanto Michael só ficou ao seu lado, tremendo, ainda enrolado na capa de Jim. O garoto era alto para a idade, no máximo uns dez centímetros mais baixo que Vincent, portanto não ficava muito comprida. Ele parecia pronto para cair no chão e desmaiar.

— O que foi isso?! – Jim exclamou, pulando por cima do entulho para chegar até ele. Dava para ouvir Morrígan bufando como se risse do outro dragão, o som saindo do fundo do seu peito.

Pareceu que quando o do meio parou em frente aos outros dois, foi quando as pessoas perceberam quem eles eram. Os gritos aumentaram, havia mais gente apontando, tinha mais gente chegando e tentando ver. Ninguém chegava perto por causa dos dragões, mas a comoção estava aumentando.

Vincent sentiu a náusea crescendo em seu estômago.

— Os príncipes! Com certeza são eles!

Puxou Michael pelos ombros, trazendo-o mais para perto. Viu um grupo de soldados aparecendo do nada, controlando a multidão, e outros rodeando-os. Eles tinham lanças, e estavam com uma expressão de quem não sabia o que deveria fazer, e quem não sabia no que acreditar. Eles estavam em dúvida se eles eram ou não os príncipes, embora o mais velho soubesse que, se ele estivesse no mesmo estado que Jim, a coroa dourada estaria praticamente berrando “Me vejam!” em seus olhos.

Quando eles apontaram as lanças para o grupo, os três dragões rosnaram para eles. Vincent poderia ter rido quando alguns soldados literalmente jogaram as armas no chão e se escafederam, com a multidão gritando coisas para eles.

Eles abriram o caminho para quando alguns membros do conselho desceram diretamente da sede. Na frente vinha um homem morcegando com a sua capa, magro com um bigode partido ao meio, curvado para cima. Ele andava como um pavão e Vincent o reconheceu de fotos como sendo Valerio Primavera. Depois da morte de seu pai, ele se tornara um dos membros mais influentes do lugar.

Vendo ao vivo ele parecia... Quase patético.

— Qual o significado disso?!

Um homem gordo de rosto avermelhado e aspecto suíno, também com a capa do conselho, bateu no ombro dele e apontou para os três.

Valerio pareceu murchar.

— Maravilha. – Jim murmurou ao seu lado.

Logo também saiu da multidão um homem alto e loiro que pela descrição que Jim dera, era o tio deles, Seth. Ele parou ao lado de Valerio e apenas disse:

— Ministro, me parece errado apontar armas para os filhos do rei Angus.

Acabou havendo uma comoção na multidão, que imediatamente começou a gritar um monte de coisa ao mesmo tempo. Sinceramente, a cabeça de Vincent não estava pronta para aquilo, principalmente quando as pessoas começaram a pegar câmeras e celulares do nada.

“Respire fundo, vai dar tudo bem”.

Os soldados abaixaram as lanças, muitos parecendo encabulados. Seth só se aproximou deles e disse:

— Vocês estão enrascados.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Coração de Porcelana" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.