Um mês de desespero escrita por Leon Yorunaki


Capítulo 42
XLI: Shadow Sneak


Notas iniciais do capítulo

Só o que eu posso esperar é que não tenham me abandonado por conta da demora. Tive meus motivos, apesar de que preferia não ter que falar sobre isso.



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Os corredores estreitos lhe pareciam um labirinto. Eram várias as portas em ambos os lados, identificadas por letras e números, mas elas pouco interessavam à Himiko, seguindo sem muito pensar como se soubesse o caminho exato a tomar.

Dando de cara com as escadas após uma bifurcação, ameaçou sorrir. Galgando os degraus de dois em dois, preparava-se para o que iria encontrar quando chegasse ao piso superior. Uma pokébola ia à mão direita, por segurança; imaginava que poderia precisar de ajuda, sem ter certeza do que lhe esperaria quando chegasse.

E, por mais preparada que estivesse para aquele momento, surpreendeu-se com o que viu ao chegar ao piso superior. Nem tanto pela jovem de cabelos castanhos, aquela que teimava em aparecer em cada um de seus sonhos; desta vez sentada e amarrada em uma cadeira sem muito cuidado, impedida de se desvencilhar não pelas cordas, mas pelo pokémon metálico a lhe vigiar, parado ao lado dela, seu olhar azulado cheio de ferocidade, agora dividindo-se entre a prisioneira e a visitante.

A fonte da surpresa era o dono daquele pokémon, no momento ocupando-se com algumas caixas em cores vibrantes que recolhia de uma das salas.

Steven.

Himiko esfregou os olhos, sem crer no que via. Tinha razão desta vez, percebendo nada além do céu noturno em seu campo de visão. Estava deitada na grama, às proximidades de um lago, o mesmo que visitara mais cedo por conta de um teletransporte malsucedido de Futa.

O Gardevoir persistia por ali, sentado à uma curta distância dela, acompanhado por uma Lombre adormecida. Rejane, assim como Himiko, acabara desacordada pelo tédio.

— Melhor agora? — A pergunta de Futa continha um tom não-intencional de sarcasmo, o que não era em nada ideal para o início de uma conversa.

— Quem me dera… — a treinadora respondeu, sua voz lenta e rouca transmitindo mais do que apenas sonolência. — Talvez amanhã, se eu conseguir dormir de verdade…

Futa recebeu com alívio aquelas palavras, notando que o ataque de fúria da garota havia se dissipado. O pokémon permanecia preocupado, contudo, percebendo o incômodo a pairar sobre Himiko.

E não era para menos, tendo ela sido acometida por outro daqueles sonhos estranhos. Já não cometia o erro de tomá-los como verdades absolutas, apesar de alguns deles terem sido precisos; outros tantos lhe colocaram em apuros justamente por ela ter acreditado neles. Desta vez, não sabia nem mesmo o que pensar a respeito.

O quanto daquela última visão teria sido real? Seria mesmo April a ser feita refém? O que pensar de Steven como o sequestrador? Valeria a pena se deslocar até a ilha de Mossdeep, na qual o sonho se passara?

Eram perguntas demais para serem respondidas sem a devida calma. Tentaria pensar nelas na manhã seguinte; por aquela noite, contentar-se-ia em procurar abrigo.

Seria necessário ignorar sua frequente falta de sorte. Não duvidava que seria importunada por algum pokémon selvagem pelo caminho, ou talvez pelo clima imprevisível da região, o motivo principal pelo qual não era sensato dormir por ali mesmo.

Cinco minutos foram suficientes para mostrar que ela estava sendo pessimista. Uma iluminação se destacava a margem do caminho principal; fraca, mas suficiente para denunciar a existência de uma cabana ocupada nas redondezas. Uma chance de conseguir abrigo por aquela noite.

Apesar disso, Himiko continuava a duvidar de sua sorte. Ela se pegou imaginando o que de pior poderia lhe acontecer naquela situação. Um treinador pouco disposto a dividir o espaço, talvez? Alguém que a reconhecesse, como fora alertada por Steven?

Nenhuma das hipóteses lhe convencia após uma rápida olhada pela janela, na qual notou o cômodo vazio apesar das luzes acesas. Procurou por quaisquer detalhes que lhe dessem alguma dica, esperando ver algo além da mobília, mas seu campo de visão era limitado demais para tirar alguma conclusão.

Não foi sem desconforto que decidiu adentrar através da porta destrancada; o ambiente lhe parecera mais convidativo visto por dentro, comparado à análise inicial. A decoração era talvez antiquada, consistindo em alguns armários com louça e uma mesa central com um pufe alaranjado a destoar ligeiramente dos tons amadeirados da sala. Uma peça de tapeçaria dividia o espaço entre aquele cômodo e o outro, ou assim podia supor. O pássaro na pintura situava-se pousado ao topo de uma montanha, suas asas abertas lhe dando um aspecto mais próximo de uma escultura do que um pokémon; apesar de posicionado de costas, o Xatu na tapeçaria tinha sua face virada de lado, o único olho visível como que fixo em Himiko, causando nela a sensação de estar sendo vigiada desde que entrara ali.

Todo esse peso na cabeça da treinadora a impedia de relaxar. Seus pensamentos se dividiam naquele momento: uma parte dela desejava sair dali quanto antes, imaginando ser uma espécie de armadilha a lhe colocar em sério perigo caso decidisse passar a noite ali; outra lhe convencia a ficar por ali, em alerta justamente para que pudesse descobrir do que se tratava, sentindo que valeria a pena no fim das contas.

E, ao observar com mais calma a mesa ao centro do cômodo, sobre a qual se encontravam folhas de jornal cuidadosamente dobradas, percebeu que ambas as sensações eram corretas.

Alcançou ao cinto a pokébola de Futa, o qual havia sido encapsulado poucos minutos antes. Não chegou a liberá-lo, entretanto, sendo interrompida por uma voz familiar:

— Guarde isso. — O tom rouco materializava-se diretamente em seus pensamentos, sem ser ouvido de fato. — Não vai precisar dele.

— Quem está aí? — A treinadora hesitou, segurando com mais força a esfera bicolor.

— Eu deveria imaginar que não me reconheceria… mas para ser sincero, demorei a perceber que era você, Himiko…

Quando ela se deu conta, percebeu um homem de certa idade, sentado no pufe alaranjado em sua frente. Ele a encarava com um olhar vago, desfocado, que pareceu a ela perdido entre a pena e a irritação.

E, ao vê-lo, a jovem finalmente pôde ligar os pontos. A cabana no meio do nada em um momento tão necessário; a tapeçaria na parede; a mesa de centro com um pufe colorido; o armário com louças ao canto do cômodo. Apenas ilusões, tal como fora da vez anterior em que se encontrara naquelas condições. Uma armadilha criada pelo pokémon ali presente, disfarçado na forma daquele idoso a se divertir prendendo viajantes indefesos dentro de suas próprias mentes. Tal como ela, que fora capaz de se libertar após ser vítima dos poderes por algumas horas.

De forma semelhante, via o ambiente a seu redor perdendo sua opacidade; as paredes dissolviam-se, revelando a vegetação externa. Era uma sensação diferente desta vez, contudo. Na ocasião anterior, ela descobriu que era vítima de uma ilusão ao conseguir enxergar a realidade por trás dela, agora, entretanto, ela via o mundo real porque sabia ser apenas um truque.

— Você mudou demais desde a última vez — rosnou outra vez a voz, rompendo o silêncio; a jovem percebia que esta não vinha diretamente do velho, sendo ele também uma ilusão translúcida —, mas não acho que tenha sido para melhor.

— O que disse? — Himiko controlou-se, quase perguntando “o que quis dizer”, não o fazendo em uma tentativa de esconder sua insegurança.

— Você convive com o perigo. — A voz exclamou, mantendo o tom monótono desde o início. — Eu sei que você está cansada de ouvir isso, mas eles estão errados em uma coisa. Seu maior inimigo não está lá fora, mas sim aí dentro.

— E você é como os outros — vociferou ela em resposta —, fala que quer me ajudar, mas não explica nada do que diz e fica contornando a verdade, usando um monte de palavras bonitas, mas que não chegam em lugar nenhum!

— Não posso falar pelos outros, mas você não vai gostar de ouvir nada do que eu tenho a dizer.

— Então vá em frente! — Himiko atreveu-se a pronunciar a frase em voz alta, dando um passo à frente. — Meu dia já foi uma merda, nada do que você disser vai piorar as coisas…

— Cale a boca, Himiko! Não está vendo que é uma armadilha?

O Gardevoir, escapando da pokébola ao ouvir os lamentos da treinadora, posicionou-se ao lado dela, colocando um dos braços sobre seu ombro. O olhar do pokémon estava fixo não no homem sentado, mas em um ponto da parede próximo ao armário de louça.

— Futakosei, presumo? — A voz retrucou, menos áspera no tom, mas carregada de sarcasmo. — Vejo que faz um bom trabalho em proteger a garota.

— E farei isso pelo resto de minha vida!

— Muito nobre de sua parte, mas não pensa que está pagando caro demais por isso?

— E desde quando isso é da sua conta?

— Situações assim são sempre da minha conta…

Himiko piscou, tentando se situar na confusão se que formara. Tomou um susto ao dar de cara com uma criatura flutuando em frente a Futa; o pokémon púrpura encarava a ambos, alternadamente, seus olhos avermelhados semicerrados medindo a dupla, a ameaça do olhar sendo quebrada por um largo sorriso em sua face.

— Então fique despreocupado — Futa retrucou, apertando o ombro da treinadora em um sinal de que deveriam sair dali —, porque da Himiko cuido eu!

— Por que tanta pressa, Futakosei? Medo?

— Ela precisa dormir, temos que procurar um lugar seguro…

— Porque não disse antes? Quatro mil e trezentos metros de distância, ângulo de vinte e seis graus e meio, dezesseis metros e meio acima. Terão um centro pokémon em seu campo de visão.

Futa olhou então para Himiko, imaginando o quão confusa ela estava com a instrução. Apesar disso, ela compreendera que se tratavam de coordenadas para um teletransporte, assentindo com a ideia de segui-las. Se entendiam apenas com a troca de olhares e, em um curto gesto do Gardevoir, desmaterializaram-se da floresta; o Gengar desaparecendo diante deles como um borrão, a cidade de Lilycove tomando seu lugar quase que de imediato.

Seria burrice de qualquer um deles achar que seria o suficiente para se livrarem do pokémon fantasma. Não podiam vê-lo, mas mesmo Himiko era capaz de sentir que o outro havia pego carona naquele teletransporte. Uma impressão forte demais para que qualquer dos dois pudesse ignorar.

— Vai à frente! — A ordem de Futa não precisava de qualquer complemento, era óbvio o bastante que ele tentaria resolver as coisas diretamente com o Gengar. E, por mais que fosse ela a maior interessada no resultado daquela discussão, pesava o fato do centro pokémon estar prestes a fechar suas portas por aquela noite. Até porque não seria apenas ela a se beneficiar daquela visita.

Cobrindo os poucos metros que faltavam até o prédio, manteve-se alerta mesmo depois de deixar suas pokébolas na enfermaria, pensando em como as coisas estavam se desenrolando do lado de fora até ser surpreendida.

— Eu já estava achando que você iria fugir de mim outra vez…

— Ah! Oi, Tyler!

A distração de Himiko a impedira de ver não apenas o jornalista, como também a colega dele, Gabrielle, sentados nas poltronas próximas ao corredor que dava para os alojamentos. Bastou um gesto do rapaz para que a treinadora se sentasse ao lado deles.

— Gabby — disse ele para a companheira, a qual tentava camuflar sua expressão endurecida —, veja com o pessoal da redação se conseguimos mais uma vaga para amanhã.

— Eu não esperava ver vocês por aqui — comentou Himiko assim que teve de volta a atenção —, digo, não no centro pokémon…

— Tecnicamente nós também somos treinadores, por mais que nossos pokémon não sejam preparados para batalhas eles precisam de cuidados como todos os outros…

— Faz sentido…

— Eu é que não imaginava lhe encontrar assim, para ser sincero. Pelo estado em que você estava, pensei que ficaria um dia ou dois no hospital…

— Ainda bem que não… tive sorte em não ter quebrado nada…

Os dois conversaram por um breve instante, a treinadora narrando como as coisas se desenrolaram no hospital, logo interrompida por uma resposta positiva por parte de Gabby, o que foi o suficiente para que Tyler mudasse de assunto.

— Espero que não tenha nenhum compromisso marcado para amanhã, porque acabei de arrumar aquela nossa entrevista que você prometeu!

— Bem… — Himiko gaguejou — você podia ao menos ter perguntado antes, não?

— Achei que já tivéssemos acertado isso hoje de manhã, não?

— É o mínimo que pode fazer pela gente, né? — Gabrielle interviu. — Não é como se a gente tivesse salvo sua vida…

— Não precisava jogar na cara… — a treinadora bufou. — Que horas?

— Seis e meia da manhã vamos sair daqui para Mossdeep, podemos gravar em uma cabine no navio. Esteja pronta às seis no saguão!

Eles sabem ser incisivos, pensou Himiko, assentindo. Sabia que não tinha nenhum direito de escolha.

— Tudo bem. Mas, se me permite, eu preferia dormir um pouco até lá…

— Se você não acordar eu mando meu Loudred pro seu quarto… — ameaçou Gabby, tentando colocar um tom de brincadeira na fala.

— Boa noite então. — Himiko respondeu no tom mais seco que conseguiu colocar na voz, imediatamente se levantando e deixando-os para trás. Ao contrário de Tyler, Gabrielle não passava nem um pouco de confiança para a garota.

E, seguindo para o alojamento, ficou com aquilo na cabeça durante todo o merecido banho, mais desejado do que as poucas horas de sono a que tinha direito.

Mossdeep…

Himiko não havia se esquecido do sonho que tivera mais cedo. Talvez fosse apenas uma coincidência, mas nada lhe convenceria disso. Sua vida já tinha problemas demais sem que ela procurasse por eles, o que não impedia que estes acabassem caindo em seu colo cedo ou tarde.

Mas, considerando o longo dia que teria a sua frente, tratou de não pensar demais nisso. Precisava tentar dormir, uma tarefa já dificultada por um dia tão problemático, coroado pela presença não apenas do Gardevoir como também do Gengar em seus aposentos, ambos adormecidos.

Um sinal claro o bastante para eliminar a palavra “sossego” de seu vocabulário.


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Notas finais do capítulo

Posso lhes garantir que no próximo capítulo teremos a viagem de navio mais longa que vocês poderão imaginar. Não longa em tempo, mas em acontecimentos mesmo.

Notas do in-game:

Provei para vocês que planejamento é a alma de toda história. Sim, eu dei a pista desse encontro, que foi o do Mt. Pyre, pelo menos uns 20 capítulos atrás. No jogo ele foi apenas um Gastly que eu capturei e coloquei no time para fechar o espaço vazio. Não prometo que ele vá ser parte do time na fanfic também...

Status do time:
Pokémon: 6
Futakosei (Gardevoir) Lv. 62; Bold, Synchronize.
Ikazuchi (Manectric), Lv.62, Serious, Lightning Rod
Nagrev (Charizard), Lv.62, Naive, Blaze
Rejane (Lombre), Lv.63, Bold, Swift Swim
? (Swampert), Lv.50, Relaxed, Torrent
? (Gengar), Lv.40, Docile, Levitate

Mortes: 9 +0 = 9



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