Secret Diaries escrita por Cat Cullenn


Capítulo 9
Capítulo IX - O Retorno




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 POV DE ISABELLA B. U.

Os dias passaram irritantemente lentos. Eu batia meu pé no chão, balançando todo o meu corpo em consequência, demonstrando sem querer toda a minha ansiedade.

 Havia sido extremamente complicado convencer Sean de que eu necessitava passar o fim de semana em La Push. Isso porque eu sempre fora independente e aventureira; todas as vezes que alguém insinuava que estava na hora de voltarmos, ainda que só para uma visita, eu usava todo o meu poder de persuasão para virar o jogo.

 E, mais complicado ainda, foi convencê-lo a permanecer em Londres sem mim.

 Sean era uma pessoa maravilhosa, um namorado carinhoso e apaixonado e um homem lindo. Mas eu tenho que admitir que, muitas vezes, o seu ciúme e proteção excessivos quase me sufocam.

 Eu não queria sair de lá brigada; até porque, a idéia era retornar na segunda-feira – era isso que eu havia informado no meu trabalho temporário – mas àquela altura do campeonato eu não fazia a menor ideia de como as coisas se desenrolariam.

 Eu olhava fixo para a esteira e só percebi que não piscava há alguns minutos quando minha córnea começou a arder. Pisquei, sacudindo a cabeça e retirando meu celular - que havia ligado assim que o avião pousara -  do bolso de trás dos meus jeans.

 Como por transmissão de pensamento, ele vibrou em minha mão.

“Já estou aqui.

E.C.”

 Mordi meu lábio inferior enquanto lia e relia aquela mínima mensagem repetidas vezes.

 Ok, Edward tinha vindo me buscar, como combinamos. Eu estava sozinha - Sean tinha ficado em Londres - então tudo seria mais fácil; eu teria pelo menos dois dias para entender o outro lado daquela história. E eu havia trazido os outros diários, conforme havíamos combinado em nossa última ligação.

 Mas a pergunta que não me saía da cabeça era: será que ele havia cumprido com sua parte no trato?

 Eu estava tão submersa em meus devaneios que por pouco a minha mala, que já havia percorrido toda a extensão de esteira e passado à minha frente, não sumia novamente no túnel do bagageiro.

 Corri e a alcancei, segurando desajeitadamente a alça e retirando a mala da esteira rolante. Amarrei o casaco que eu trazia na cintura – em Seattle definitivamente estava fazendo mais calor do que em Londres – suspirei fundo e atravessei as portas automáticas que se abriram silenciosamente.

 Não precisei procurar muito para encontrá-lo. Havia diversas pessoas ali – sexta à noite é um dia de aereoporto movimentado – mas Edward era alto e seus cabelos cor de bronze eram facilmente reconhecíveis.

 Eu parei antes que ele me avistasse. Olhei ao redor. Nada.

 Então as pessoas abriram caminho e eu consegui ver Edward por inteiro. Mas o que realmente me chamou a atenção foi que ele havia cumprido a sua parte.

 Alice estava parada ao seu lado. Os cabelos pretos e repicados refletiam a luz forte do saguão. Suas mãos estavam unidas em frente ao rosto, como se ela estivesse em uma prece silenciosa, e seus olhos percorriam aniosamente os rostos que passavam.

 Então eles pousaram em mim.

 Os olhos dela se arregalaram. Edward imediatamente acompanhou seus pensamentos e também me localizou, uma ruga profunda surgindo em sua testa.

 Eu respirei fundo, empertiguei os ombros, lançando meu peito para frente, e voltei a andar em sua direção, a mala de rodinhas ressoando pelo piso.

 Quando cheguei próximo e parei na frente deles, meus olhos percorriam de um para o outro. Alice se balançava, praticamente dando pulinhos no mesmo local, a expressão tensa, as mãos ainda em oração, o nariz no meio.

 - Isabella, essa é Alice. - Edward falou, apontando de mim para ela. - Como prometido.

 Eu encarei Edward e assenti com a cabeça. Depois de engolir em seco voltei a olhar para Alice e estendi a mão.

 -  Muito prazer, Alice.

 Ela estendeu a mão e segurou a minha. Assim como Edward, Alice tinha a pele fria e branca como mármore, com uma textura singular e única.

 - Muito, muito prazer, Isabella.

 Ela sorriu. Sua voz era fina e harmônica, como uma fada encantada e delicada, exatamente como eu imaginava. Impressionantemente eu me afeiçoei à ela, a quem minha avó tanto amou e homenageou colocando seu nome em minha mãe.

 Ficamos em silêncio. Alice continuava a me olhar, agora sua expressão tendo mudado de tensa para amorosa.

 -  Bem, vamos indo, então? - Edward disse enquanto se inclinou e segurou a alça de minha mala. - Jacob sabe que você está aqui, Isabe...?

 - Não. - Falei, interrompendo-o.

 Ele parou e me olhou.

 - Você não avisou ao seu avô que vinha? - Alice me perguntou, colocando a mão em meu ombro.

 Neguei com a cabeça e Edward me imitou, claramente desaprovando minha atitude.

 -  Não foi esse o combinado, Isabella. - Ele falou, entendendo minha estratégia e se adiantando a mim. - Eu vou deixá-la em La Push.

 -  Você não pode ir lá.– Eu disse e ele bufou baixo, fechando os olhos. -  E eu falo sério. Meu avô não vai ser condescendente novamente. Eu o conheço.

 Alice desviou sua atenção de mim e encarou Edward, que abriu os olhos.

 -  Alto, por favor? - Falei, sabendo que ela se comunicava com ele por pensamento.

 Ela voltou a me olhar.

 -  Eu “disse” que Esme está doida para te conhecer, assim como Carlisle. Aliás, assim como toda a família.

 Assenti em silêncio. Era bom saber disso. Bom saber que a recíproca era verdadeira.

 -  Esse. Não era. O. Combinado. - Edward falou baixo enquanto apertava com força o canto dos olhos.

 -  E também não era o combinado – falei essa expressão fazendo aspas com a ponta dos dedos – você ir até La Push atrás de minha avó.

Touché.

Ele abriu os olhos assim que acabei de enfrentá-lo.

 -  Não é só fisicamente que você se parece com ela, sabia?

 Cruzei os braços, sem responder.

 Edward se virou de costas e começou a andar. Olhei para Alice, que bateu palmas silenciosas e sorriu, piscando rapidamente em minha direção.

 Edward ia um pouco a frente, carregando minha mala, enquanto eu tinha Alice ao meu lado direito.

 -  Fez boa viagem? - Ela perguntou, visivelmente tentando puxar conversa comigo.

 -  Sim, foi tranquila. Já estou acostumada com aviões, apesar de não gostar muito.

 -  É mesmo? Por quê?

 Ela parecia sinceramente interessada no que eu dizia, mesmo que fosse algo banal como agonia com aviões.

 -   Não sei, me sinto... Presa. Apesar de gostar de altura, velocidade e afins, não gosto de saber que passarei horas trancafiada, minha vida a mercê de outra pessoa.

 Edward voltou a cabeça para trás, prestando atenção àquela minha observação.

 Pouco tempo depois estávamos dentro de um Audi preto e silencioso.

 Alice estava sentada no banco da frente, mas com o corpo completamente virado em minha direção, me fazendo perguntas e respondendo às minhas, também.

 -   E você gosta de Londres? - Ela perguntou, enquanto segurava o encosto com as mãos e apoiava o queixo, os olhos sedentos por informação.

 -  Sim... Na verdade, gostei mais de Paris. Mas isso não é novidade, acho que todos amam Par...

 -   Você trouxe o que combinamos? - Edward me interrompeu, os olhos me devorando pelo retrovisor.

 -  Edward! Que grosseria, nós estamos conversando! - Alice falou, visivelmente indignada com a interrupção.

 Mas eu sabia que ele estava ansioso, ao mesmo tempo em que estava desconfortável com aquela minha insistência, por isso não me importei.

 - Tudo bem, Alice... - Falei, mas ela não se convenceu, e com certeza o repreendia em pensamento. - Sim, eu trouxe. - Falei, olhando-o pelo espelho.

 Ele assentiu e tornou a olhar para frente. O acompanhei e vi que estávamos em uma trilha que adentrava o bosque de Forks. Pouquíssimo tempo depois, paramos em frente a uma casa linda, que visivelmente já havia tido tempos melhores.

 Descemos todos do carro em silêncio. Eles me esperaram e começamos a subir juntos o degrau que dava na porta.

 -  Você não precisa fazer isso, Isabella...

 -  Eu sei que não preciso... A questão é que eu quero, e acho que você me deve isso.

 Ele se calou e respirou profundamente antes de abrir a porta. Alice envolveu meus ombros com seu braço e eu fechei os olhos.

 Quando tornei a abrir, me deparei com uma sala normal – com móveis um pouco ultrapassados, mas ainda assim elegantes – e cinco vampiros sem jeito espalhados pelos cantos.

 Chegava a ser engraçado. Quem olhasse de fora chegaria a conclusão que eles estavam com medo de mim.

 Olhei ao redor. Vi o piano, que minha avó citou em suas anotações. Olhei o ambiente, em que tanto tempo atrás fora cenário de uma desastrosa festa que desencadeou a separação de Edward e de minha avó.

 Voltei a me concentrar nas pessoas – não conseguia pensar de outra forma – quando Carlisle se moveu e caminhou até mim, um sorriso acolhedor no rosto perfeito.

 -   Seja bem vinda a nossa casa, Isabella. É realmente um prazer e uma honra recebê-la.

 Sorri, timidamente, instintivamente colocando uma mecha de cabelo para trás da orelha.

 -  Faço de Carlisle minhas palavras, Isabella... - Esme havia se juntado a ele. - Estamos muito felizes em tê-la aqui.

 Eu anui, encolhendo os ombros ligeiramente. Voltei a olhar para os outros.

 Um loiro com cabelos bagunçados tinha os olhos um pouco arregalados, e logo identifiquei como sendo Jasper. Emmet também era facilmente reconhecível, com seus músculos exagerados e seu sorriso bobo. E Rosalie... Bem, sua cara de poucos amigos não negava sua fama, e eu realmente fiquei com um pouco de medo dela.

 Meu estômago formigava e eu sabia que aquele momento mudaria toda a minha vida. Porque simplesmente não dava para encarar uma família como aquela e fingir que tudo seria como antes.

 Algo nos Cullen impedia qualquer possibilidade de que isso ocorresse.

 -  Bem gente, deixa a Bella entrar!!! - Foi Emmet quem falou.

 Todos olharam para ele com ar repreendedor.  Ele olhou para Edward e encolheu os ombros.

 -  Malz, man... É que ela é idêntica, eu me empolguei.

 -   Não tem problema, Emmet. Pode me chamar de Bella... Muita gente me chama assim. - Falei, tentado amenizar a situação.

 Ele olhou para Edward, que não respondeu, e também não precisava. Seu olhar dizia tudo.

 -  Bem, por quê você não entra? - Esme abriu espaço, apontando para o interior da casa.

 Respirei fundo enquanto assentia. Entrei devagar, nenhum barulho na casa imensa. Era tão estranho... Imaginar que aquela mesma sala foi palco, há tantos anos atrás, de uma festa de aniversário para minha vó, e exatamente com as mesmas pessoas que estavam ao meu lado.

 Alice pegou minha mão – um arrepio percorrendo meu corpo à esse gesto – e me levou até o sofá o meio da sala. Em pouco tempo estava cercada por todos os Cullen.

 -   É uma honra saber que somos dignos de sua confiança, Isabella. - Carlisle falou, em pé à minha frente. - Saber que você veio até a nossa casa de livre e espontânea vontade, sem medo, mesmo após tudo o que aconteceu.

 -    Se você está se referindo à festa e... Bem, à Jasper... - Falei, olhando para ele, que levantou ligeiramente o queixo, aguardando meu comentário. - Sei que vocês não tiveram a oportunidade de conversar com minha avó depois do ocorrido... Mas ela também não passou a temer vocês, nem guardou qualquer tipo de mágoa... Ao contrário, ela sempre manteve a idéia de que vocês eram confiáveis e especiais, e ela amava todos vocês, como se fosse da família.

 Esme, que estava ao lado de Carlisle, se abaixou à minha frente e segurou minhas mãos entre as suas. Eu já estava começando a me acostumar com o toque frio e a textura única de suas peles.

 -  Oh, querida... Você não imagina o quanto eu fico feliz em ouvir isso... - Algo em sua fisionomia me dizia que ela estaria chorando, se fosse possível. - Nós também amamos Bella como se ela fosse da família.

 Não pude deixar de notar que Esme utilizara o verbo no presente. Amamos, em vez de amávamos.

 -   Enfim... Só resolvi falar isso porque sei que ela gostaria que fosse esclarecido. Minha vó tem diversas virtudes e não ser rancorosa é um deles.

 -  Ela teve quantos filhos?

Virei-me e encontrei Rosalie parada atrás do sofá, ao pé da escada. Sua fisionomia era impassível, e parecia que estava me fazendo um imenso favor ao dirigir a palavra a mim.

 -   Dois. Minha mãe, Alice, e meu tio, Embry.

 Ela sorriu incrédula.

 - Sua mãe se chama Alice? - Eu assenti. - Isso sim é difícil de se entender...

 -  Não é não, Rose! - Alice levantou-se de seu lugar ao meu lado e no segundo seguinte estava em frente a Rosalie, que apenas cruzou os braços. - De repente seja difícil para você, uma pessoa sem sentimentos que não consegue se apegar a nada mais que a sua própria imagem refletida no espelho! Mas eu e Bella éramos mais que amigas, éramos quase irmãs!

 - Nossa... Quem tem amigos assim...

 - Ah, Rose...

 -  Por favor, será que pelo menos uma vez na vida vocês podem agir civilizadamente? É a primeira vez que Isabella nos visita, é essa a imagem que vocês querem que ela tenha de nossa família?

 Todos olharam para Esme, anuindo às suas palavras. Alice olhava diretamente para mim, esperando que eu me manifestasse com relação ao comentário de Rosalie.

 - Minha vó nunca sentiu raiva de vocês... Ela só ficou magoada, achando que ela os amou sem ter sido correspondida. E, mesmo assim, achava que a culpa era dela, alegando que era normal que pessoas como vocês, especiais, não conseguissem achá-la interessante e não a quisessem por perto.

 A fisionomia de Alice era de dor. Edward olhou na direção dela – e eu tenho que admitir, daria tudo para saber o que ela “dizia” para ele.

 -  Minha avó sempre pensou dessa forma... Mas eu... Bem, eu tenho que admitir que meu modo de pensar se parece mais com o de Rosalie.

 Ok, pela fisionomia de todos, eles ficaram chocados com meu comentário.

 -   Sabe, eu não sou uma pessoa de muuuitos amigos... Digo, amigos verdadeiros. Mas existem uns poucos por quem eu daria a minha própria vida, se fosse necessário. E, pelo que Alice disse, era assim entre ela e minha avó. Então, como ela pode ir embora sem se importar, sem olhar para trás? Ainda mais sabendo que minha avó literalmente idolatrava vocês, com todas as forças?

 Carlisle ocupou o lugar que Alice havia liberado, ao meu lado no sofá.

 -  Você está certíssima em pensar dessa forma, Isabella. Errada foi sua avó, ao achar que o problema estava nela, quando na verdade os errados fomos nós, do início ao fim.

 -\tNão. - Edward interrompeu, os olhos fechados. - O culpado fui eu. Somente. Todos os erros seguintes foram desencadeados por uma atitude infantil e impensada de minha parte, e eu assumo toda a responsabilidade por isso.

 -   A questão... - Esme falou, tentando manter a serenidade após minha afirmação. - É que nós sentimos demais por tudo isso. Por todo o sofrimento que Bella passou por nossa causa. E gostaríamos muito de poder pedir desculpas pessoalmente. Você acha que seria possível? Acha que ela aceitaria nos encontrar?

 Edward abriu os olhos e nitidamente esperava ansioso por minha resposta. Voltei a olhar para Esme.

 Ela tinha a face quase transtornada de nervoso; era incrível como era fácil gostar dela, afeiçoar-se ao seu jeito maternal. Eu queria muito lhe dar uma resposta positiva, acalmar seu coração.

 Mas infelizmente não poderia fazê-lo.

 -  Sinto muito, mas isso não será possível.

 Edward gemeu, um som grave escapando de seu peito.

 -  Ela já expressou que não quer nos ver? - Carlisle perguntou, ignorando Edward.

 -   Não extamente...

 -  Não exatamente...? - Esme insistiu.

 -  Bem, eu sei que o Talk Show está ótimo, mas Isabella acabou de chegar de viagem, e com certeza precisa descansar. - Alice interrompeu, claramente percebendo que eu estava incomodada com aquela pressão. - Venha Isabella, vou te levar lá pra cima um pouco.

 Eu a segui, deixando para trás perguntas não respondidas e um silêncio aterrador.

 Chegamos a um cômodo arejado, com uma parede de vidro que dava para a floresta. Havia um sofá de couro e uma estante com diversos cd´s. Em cima de uma mesa, o diário de minha avó descansava, a capa de couro preta fechada.

 -  Desculpe a pressão.. - Alice falou, enquanto retirava um fone de ouvido que estava sobre o sofá. - É que nós estamos esperando por esse momento há muito tempo... Há tempo demais, na verdade.

 Eu ia responder, quando Alice continuou.

 -   Eu sei que a culpa foi nossa, e tudo... Mas todos tem o direito de reconhecer seus erros e se arrepender, não é mesmo? Nós sabemos que não há como reverter nossos atos, nem voltar no tempo... Mas sempre podemos pedir perdão e diluir a mágoa que existe em nosso coração.

 -  Eu...

 - Ninguém vai atrás de Bella. - Edward havia parado à porta, a cabeça baixa, os ombros caídos. - Isabella tem razão, o que nós fizemos é irremediável. Ela já sofreu demais e agora está tranquila, finalmente. Nós não temos o direito de bagunçar sua vida, mais uma vez.

 Eu respirei aliviada e assenti a cabeça uma única vez.

 Agradeci mentalmente. Edward chegou no exato momento em que eu iria ceder aos argumentos de Alice.

FIM DO POV DE ISABELLA B.U.

POV DE EDWARD

Edward, você pirou de vez?” - Alice me encarou, uma mistura de dúvida e raiva em seu olhar. - “Não era isso que você mais queria, encontrar Bella? Eu já estava quase conseguindo e...

- Eu não mereço, Alice.

Pode ser, e provavelmente eu também não mereça, mas eu estou aqui e quero vê-la, Edward!

 A mente de Alice literalmente gritava, sua voz ecoando em minha cabeça.

 - Em, voz alta, por favor?

Isabella falou nos encarando, aparentemente impaciente por ter que repetir aquela mesma frase pela segunda vez em um curto espaço de tempo, e nós dois suspiramos juntos, ao mesmo tempo.

 - Desculpe, Isabella... - Foi Alice quem respondeu, me lançando um olhar fulminante que tratei de ignorar. - Edward está confuso, é tudo muito difícil para ele... Para todos nós na verdade.

 - Nós vamos embora. - Falei secamente, atravessando o quarto e parando de frente para a parede de vidro, observando a floresta que se estendia, densa e sombria, quase intacta com o passar dos anos.

O QUÊ?” - Fechei os olhos ao pensamento quase histérico de Alice. - “Você não pode estar falando sério, depois de todos nós termos nos descolado pra cá e...

- É até engraçado, mas eu já esperava por isso.

Senti um vinco se formar entre meus olhos, enquanto instintivamente girava um pouco meu pescoço, voltando meu ouvido para o comentário de Isabella, que interrompera os pensamentos incrédulos de Alice. Ela não continuou a falar. Alice, surpreendentemente, também se “calou”. Inspirei o ar profundamente e me virei.

Isabella me encarava, os ombros caídos, as mãos ao lado do corpo. Alice havia cruzado os braços e estava de olhos fechados, a mente em branco.

- Você já esperava por isso?

Perguntei, realmente sem entender o que ela queria dizer com aquela afirmação inesperada. Não fora ela quem dissera para eu desistir? Não fora a própria Isabella quem mandara eu não ir até La Push, porque agora Bella estava finalmente feliz?

 - Sim... Esperava que você fosse embora, deixando os problemas e dificuldades para trás, mais uma vez. Só não esperava que fosse tão rápido.

 Mas o quê ela estava querendo dizer com tudo aquilo?

 - Você me mandou ir embora. - Falei, impassível, minha voz sem um pingo de emoção, completamente estarrecido. - Disse que Bella estava melhor sem mim, que era tarde demais, que nunca me ajudaria e que eu não teria a mínima chance se voltasse à La Push.

- Sim, eu disse. - Ela também não tinha qualquer emoção no olhar. Era frio, inexpressivo... Decepcionado. - E você, mais uma vez só para variar, acatou. Não lutou por ela.

 - Eu. Não. Quero. Trazer. Mais. Problemas. - Falei pausadamente enquanto apertava com força o canto dos olhos, lutando para manter a calma.

 “Calma, Edward...” - Alice falava suavemente agora, tentando me tranquilizar.

 - Existe uma grande diferença entre trazer problemas e enfrentar os problemas já existentes, que você mesmo criou. - Isabella continuou. - Mas, no fundo, eu até que estou feliz. Agi certo, e isso me deixa sossegada. Você é fraco, Edward... Melhor desistir agora, porque definitivamente não suportaria continuar vivendo se continuasse a ler os diários da minha avó.

Um rosnado baixo emergiu do fundo do meu peito. Isabella cerrou os punhos caídos ao lado do corpo e pude perceber que ela fincou os pés no chão para simplesmente lutar contra o ímpeto de fugir. Lutar contra o seu instinto de defesa. O que, claro, era desnecessário. Eu jamais lhe faria mal algum.

- Você estava me testando? Se certificando de que eu não iria embora novamente, fortalecendo a certeza de que eu não agiria da mesma forma que cinquenta anos atrás?

Ela sorriu ironica e pesarosamente.

 - Pode-se dizer que eu havia apostado comigo mesma. Pago para ver. E quer saber? Eu venci. E antes mesmo do prazo que eu havia estabelecido. Antes de você saber de tudo.

Alice veio até mim e colocou a mão em meu ombro, pensamentos serenos invadindo minha mente, desejando que Jasper estivesse ali. Mas ele não estava e, bem... A verdade é que eu estava fervendo.

- E posso saber o que você faria se tivesse perdido?

Isabella arqueou levemente o queixo, os olhos abrindo-se ligeiramente, as pupilas se dilatando, perceptíveis aos meus olhos precisos.

- Você iria continuar a me enrolar até quando? Até quando você ia esconder a verdade de mim, me deixar sem notícias reais, sem saber como Bella está agora? Quando você iria me deixar à par de tudo que está acontecendo de verdade?

 - Já que estamos sendo sinceros um com o outro... Eu nem havia pensado nisso. Tinha certo dentro de mim que você desistiria antes de terminar os diários. Levantaria a bandeira branca, sabe como é...

 Movimentei meu ombro e tirei a mão de Alice de cima de mim com esse gesto. Aproximei-me de Isabella, que engoliu em seco, a saliva percorrendo o trajeto de sua garganta, completamente audível para mim. Estendi a mão em sua direção. Ela permaneceu imóvel, apenas seu olhar pairando sobre minha palma aberta.

- O quê? - Isabella perguntou, dando de ombros.

- Eu fiz o que prometi. Você está aqui. Conheceu Alice, conheceu a todos. Trato é trato.

 Ela expirou o ar enquanto sorria, a expressão incrédula.

- Eu não vou deixar os diários de minha avó com você. Eles são importantes para mim, você não vai embora com eles e...

- Eu não vou embora.

Isabella parou de falar e cruzou os braços, uma ruga profunda vincando sua testa. Umedeceu os lábios com a língua e abriu a boca, aparentemente criando coragem para falar, mas desistiu, fechando-a em seguida.

 - Você vai perder a aposta. - Falei. - Eu vou ler todos os diários, conhecer todos os infortúnios pelos quais Bella passou, muitos deles – senão todos – por minha causa. Vou ter minha penitência, tão merecida e tão desejada por você, aparentemente.

 Isabella permaneceu todo o tempo com os olhos fixos em minha mão. Somente quando acabei de falar ela me encarou, os olhos castanhos cheios de dúvida e receio. Meu Deus, ela era igual a Bella.

 - E? - Ela perguntou, visivelmente temerosa com o que eu iria responder, ao mesmo tempo em que já imaginava o que lhe esperava por ter iniciado aquele “jogo”.

 - E então você vai me levar até sua avó. Não importa como, se vai ter que tirá-la de La Push, se vai ter que amarrar seus avôs dentro de casa ou se terei eu mesmo que cuidar deles... Mas eu irei encontrar com Bella.

“Edward...”

Levantei a mão e interrompi Alice, sem sequer me virar para olhá-la, que ficou “muda” no mesmo instante. Os meus olhos e os de Isabella não se desviavam um único momento, e eu senti que quem perdesse naquele mínimo gesto teria cedido um terreno precioso.

 -  Eu irei aceitar esse desafio... Mas o fator principal é que, primeiro, eu não acredito que você aguente ler os diários até o final. E, segundo, porque se você realmente aguentar... Ficará tão arrasado, que só vai querer desaparecer.

 Voltei a estender a mão para Isabella, que dessa vez tirou a mochila que carregava nas costas, mexeu em seu interior por algum tempo e retirou dois diários, idênticos ao primeiro, me entregando em seguida.

 - Vamos para o meu quarto, você precisa descansar um pouco. Já está tarde, amanhã eu te levo até La Push.

 Alice foi em direção a porta e Isabella a seguiu. Eu não concordava com a idéia de Isabella passar a noite conosco, mas não estava me sentindo nem um pouco confortável para discutir essa decisão, com a qual ela aparentemente concordava piamente.

“Vê se você se acalma... “ - Foi a última coisa que ouvi Alice pensar antes de sair do quarto.

 Me joguei sobre o sofá de couro preto. Se me concentrasse bem, poderia ouvir perfeitamente a conversa de Isabella com Alice, ou então as conversas  entusiasmadas e pensamentos alvoraçados do resto da família, no primeiro andar. Mas nada disso me apetecia.

 Olhei para os diários em minha mão e eles praticamente queimavam minha pele. Abri ligeiramente a capa de um deles. Fechei levemente os olhos, a fim de me certificar que o que eu lia estava certo.

 Abri o outro. A mesma coisa.

 Sim. Os diários que Isabella me entregou pulavam muitos anos do último que eu lera.

 Me levaram de volta a 2016.

“Março de 2016.

Está aí uma coisa que todos nós temos quase certeza que acontecerá um dia. Mas que ninguém nunca está preparado quando realmente esse dia chega.

Eu estava em casa, com Alice e Embry. Jacob havia saído para trabalhar, era uma manhã de sábado normal como qualquer outra, a tirar apenas que o sol brilhava a pino em La Push.

Estava preparando a lasanha, o forno já estava quase aquecido. Alice fazia o dever de casa sobre a mesa da cozinha, ao meu lado, enquanto Embry xingava o computador, provavelmente enquanto perdia em  algum jogo.

Então o telefone tocou.

Coloquei no ouvido e berrei para Embry falar mais baixo, antes mesmo de dizer “alô”.

Era Sue. Me dizendo que Charlie havia tido um infarto fulminante.

Eu nunca tinha imaginado que algo assim pudesse acontecer novamente. Senti o chaõ sumir sob meus pés. O ar parou de entrar em meus pulmões, como se meu cérebro tivesse esquecido de ordenar que eu inspirasse.

O telefone escapou de minha mão e caiu no chão. Lembro-me de Alice vir em minha direção e começar a gritar, preocupada, quando eu não a respondia.

Então ela pegou o aparelho do assoalho e recebeu a notícia da mulher a quem sempre conhecera como avó.

Alice foi forte. Segurou as lágrimas o máximo que pôde. Desligou a ligação, me sentou à mesa e desligou o forno, ligando para Jake em seguida.

Minutos depois ele entrava pela porta, e seu corpo imenso me abrigava e me confortava, minhas próprias lágrimas finalmente desabando contra seu peito acolhedor.

Foi Jacob quem cuidou de todos os preparativos. Foi ele, inclusive, que ligou para Renée, e que ficou horas com ela ao telefone, lhe passando relatórios sobre meu estado quase catatônico.

Lembro-me muito mal de ter me vestido... De Renée chegando com Phil... De ter seguido com eles para o cemitério.

Só saí de meu estado letárgico quando a sepultura finalmente foi abaixada, selando de vez e deixando para trás mais uma etapa boa de minha vida.

Isso é um absurdo. A morte é um absurdo.

Nada do que é bom, do que nos faz feliz, deveria partir.

Porque o buraco que permanece no lugar é insuportavelmente dolorido.

A gente pensa que nunca vai se recuperar. Escutas todos se lamentarem, dizerem que sentem muito, e que o tempo amenizará a dor. É mentira.

A dor não passa nunca. Ela só se transforma. Vira saudade, uma saudade imensa que permanece eternamente dentro do peito, e que por vezes parece esquecida, mas que volta com força total ante qualquer lembrança, mesmo que longínqua.

Eu sei porque tenho um outro buraco, parecido com esse.

E agora eles se juntaram, tomando quase todo o espaço existente em meu corpo, e está quase impossível sobreviver.

Hoje foi a missa de sétimo dia. Sim, já se passou uma semana. O tempo é infalível, não para, não espera que a gente se recupere.

 Todos continuam vivendo suas vidas, a rotina volta ao trilhos, a vida segue. Aos poucos, as pessoas mais distantes e menos chegadas descartam o acontecimento da memória – o ser humano tem o dom de tentar armazenar apenas o que lhe faz bem, e isso é um meio de defesa.

Particularmente, em meu modo pouco crente de ser, eu não queria ter ido a missa. Porque não creio que isso seja necessário, acho que a fé está dentro de cada um de nós, independente de credo ou do local aonde estejamos.

Mas Jacob tenta ensinar as crianças o valor da religião, e nós evitamos contrariar as decisões um do outro.

Para mim, não passou de uma hora em que as lembranças jorraram como em uma torneira aberta, me acertando diretamente nos pontos mais doloridos.

Foi difícil... Receber os cumprimentos todos, mais uma vez, foi pior ainda. Fizemos uma reunião na casa de Charlie, minha antiga casa, em Forks. Sue estava completamente abatida, e a atenção sobre ela foi redobrada, Jacob ajudando Leah e Seth nesse serviço.

Já eu, me apeguei a servir a todos e preparar petiscos, uma forma meio ineficaz de preencher minha mente.

Então, mais um baque. Porque tudo sempre pode piorar, principalmente quando trata-se da minha vida, da minha história.

Todos já haviam ido embora, só permanecíamos eu, Jake, Alice e Embry. Jacob havia subido, eu havia solicitado a ele que separasse as roupas de Charlie para doarmos, enquanto eu lavava a louça da reunião.

E então uma melodia ecoou pela casa, preenchendo cada espaço vazio existente, e nocauteando minha alma com uma violência quase mortífera.

http://www.youtube.com/watch?v=EgH5MV-NWhA&feature=player_embedded

O prato que eu secava escorregou por minhas mãos trêmulas e espatifou-se no chão, sem conseguir abafar o som que penetrava em meu organismo, corroendo meu ser.

 Apoiei-me na bancada da pia. Tudo a minha volta girava, minha visão estava turva, o ar saía em rajadas cortadas de minha boca e meu coração pulsava frenetica e descompassadamente.

Aquela música.

A minha música. A canção que ele... Que Edward... Fizera para mim.

Antes que eu conseguisse raciocinar, minhas pernas se colocaram em movimento. Eu ultrapassei toda a distância da cozinha amarela em menos de um segundo e alcancei as escadas, tropeçando nos degraus, meu corpo há muito tempo menos ágil e ainda mais desastrado do que nunca.

O estrondo de meu tombo chamou a atenção de Jake, que apareceu no alto da escada, mas antes que ele falasse qualquer coisa eu já havia levantado e passado por ele como uma flecha.

O meu quarto estava exatamente como eu havia deixado, antes de casar-me com Jacob e sair de casa. Alice estava sentada em minha cama, ao lado de um velho aparelho de CD. Tinha nas mãos uma caixa, e o assoalho perto da janela estava levantado, um fundo falso a mostra, agora vazio.

Em cima da cama, espalhadas, três fotos à mostra.

Ângela, Jéssica e Mike, numa época muito distante, onde os sonhos ainda existiam, onde a felicidade ainda era algo em que eu acreditava. Charlie e eu, sentados no sofá, eu sorrindo sem jeito, ele totalmente deslocado com a situação. E Edward, na cozinha daquela mesma casa, sorrindo ao me ouvir dizer que queria ver se ele apareceria na foto.

Lembro de tentar me apoiar, no nada, o ar passando rápido pelo meu corpo, que encontrou o chão sem nenhuma piedade.

E então acordei, já em casa. Sei que eles estão na sala, um andar abaixo de mim, mas não tenho ânimo ou coragem de ir até lá.

Não tenho coragem de encontrar Jacob, quando me lembro de ter gritado o nome de Edward desesperadamente antes de apagar totalmente.”

Como se imitasse as palavras que eu acabara de ler, o diário escorreu por entre meus dedos e desabou no chão. Sem pensar, agarrei um travesseiro e berrei contra suas plumas, extravasando toda a raiva, a mágoa e o ódio que eu sentia de mim mesmo.

“Edward, pelo amor de deus, o que houve...?”

“Filho, calma, fale conosco, nós estamos aqui...” - Carlisle tentava me acalmar também com suas mãos, que seguravam meus braços, tentando fazer com que eu me erguesse e parasse de gritar.

 Podia sentir Jasper tentando me acalmar, em vão. Nem o dom mais poderoso do universo conseguiria amenizar toda a dor que meu peito armazenava.

 Isabella tinha razão. Só havia uma maneira daquela dor passar.

 Eu precisava desaparecer.


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