A Caminho escrita por Sra Scala


Capítulo 9
Capítulo 9




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Sempre soube que amaria meus gêmeos. No início da gestação fora bem difícil, mas minha resistência a eles ruiu logo nos primeiros meses. Agora, vendo-os dormir em seus bercinhos, era impossível para mim sentir outra coisa por eles além de amor.

É claro que seria fácil demais se eles passassem o dia inteiro quietinhos. Era só um deles ameaçar chorar para o outro seguir o exemplo, seja lá que horas do dia, ou da noite, fosse.

Para minha sorte, eles costumavam a dormir logo.

Minha mãe ajeitou Sean no berço e logo se despediu. Eu, por outro lado, estava desperta o suficiente para não conseguir dormir de imediato, e começava a conhecer meus filhos o suficiente para saber que eles despertariam em uma ou duas horas (se eu desse sorte, três) com fome ou, mais provavelmente, sujos.

Silenciosamente, liguei a babá eletrônica na sensibilidade máxima e rumei para a cozinha. O cômodo decorado com aço e madeira, me lembrava vagamente o conforto familiar da cozinha da fazenda.

Coloquei algumas coisas na bancada da ilha enquanto aquecia um pouco de achocolatado no micro-ondas.

Robbie apareceu enquanto eu comia uma fatia de pão caseiro com geleia e, só quando o vi dando um sorriso meio travesso e meio nostálgico é que percebi que havia saído do quarto com um pijama de flanela, vestindo apenas um hobby por cima da camisa de alça fina. Felizmente a peça cobria as alças do horroroso sutiã de amamentação. Só por garantia, ajeitei a parte de cima.

Vestindo calça e camisa de flanela, ele abriu a geladeira, colocou um copo de achocolatado para esquentar e, logo em seguida, sentou-se a meu lado.

Eu realmente queria saber por que me tenho ficado tão nervosa perto do Robbie.

–Falei com seu pai hoje pela manhã... Vou começar a faculdade de veterinária no próximo semestre... E vou poder morar aqui durante o curso...

Uau.

–Isso... Robbie isso é maravilhoso!

Ele sorriu e meu coração acelerou.

–E... Hm... Tem uma coisa que gostaria de conversar com você...

De repente o clima ameno que havia entre nós ficou tenso e percebi que ele parecia um pouco nervoso. Percebendo que eu o aguardava falar, ele suspirou.

–Quero que me deixe registrar Sean e Catherine como meus filhos.

O choque de ouvir aquele pedido absurdo me fez engasgar. Durante o acesso de tosse, e para piorar ainda mais o meu constrangimento, senti o algodão dos absorventes para seios ficarem úmidos.

Olhei para Robbie procurando algum indício de que ele falara aquilo de brincadeira. Mas o rosto dele estava sério.

–Você... Você ficou louco?

–Eu pareço estar louco?

Não. Não parecia. Mas aquilo era insano de qualquer maneira. Insano e muito confuso.

–Por que está me pedindo isso Robbie? Você não tem nada a ver com eles, e vai acabar se arrependendo por ter pedido isso.

–Está errada. Eles podem não ser meus filhos mas... Não sei explicar direito, só me sinto... Responsável por eles... E gostaria mesmo de estar com eles enquanto eles crescem.

–Você se sente responsável por que me ajudou no parto, deve ser adrenalina ou coisa do tipo... Você vai ver, vai dar semana que vem e você já vai ter esquecido.

Levantei-me da cadeira e rumei para fora da cozinha. Precisava me afastar daquela loucura e os absorventes molhados me incomodavam. Robbie me seguiu pela casa.

–Teimosa, é isso o que você é. Eu quero me casar com você Claire Mills, sempre quis. Quero cuidar de você e das suas crianças também... Isso está em minha cabeça desde que ajudei te a aliviar as dores das contrações, e segurar Catherine só reforçou essa vontade. Eu não vou mudar minha decisão Betsy.

–Seus pais nunca vão aceitar essa sua "decisão".

Ele inclinou a cabeça para o lado.

–Na verdade, não só aceitaram como também falaram que "sempre souberam que eu e você acabaríamos juntos". Até seu pai falou isso.

Ai meu Deus.

–Meu pai? Você falou com meu pai sobre essa... Insanidade?

–Falei.

–Quando?

–De manhã. Foi uma das coisas sobre as quais conversamos. Além, é claro, da minha inscrição na faculdade.

Inacreditável.

–Posso saber sobre o que mais vocês conversaram?

–Propus ao seu pai transformarmos a fazenda em um haras depois que eu me formasse.

Aquilo me decepcionou um pouco, havia cantado a pedra de transformarmos parte do lugar em um hotel-fazenda e espaço para eventos. A reforma duraria tempo o suficiente para que meus bebês ficassem maiorzinhos e menos dependentes de mim. Com a proposta de Robbie e conhecendo meu pai como o conhecia, a decisão dele penderia para seus preciosos cavalos de raça.

O absurdo daquela conversa estava ficando cada vez maior.

Continuei meu caminho para meu quarto. E ele continuou me seguindo.

–Será que dá para você parar de fugir?

Não. Não dava. No fundo do meu coração eu queria aceitar aquela loucura. Sabia, desde o momento em que Robbie embalou minha menininha em seus braços, que meus filhos seriam protegidos e e estariam em boas mãos se ele estivesse comigo.

E a quem eu estava enganando? Eu queria Robbie comigo. Minhas melhores lembranças de infância eram com ele, e a única razão de eu não ter voltado para a fazenda antes era que eu estava ocupada demais garantindo que meu pai ficasse satisfeito com meu desempenho na Faculdade de Economia... Isso, é claro, até eu engravidar.

Mas eu vislumbrava um lado da moeda que Robbie ainda não conhecia. Um que estava abrindo um buraco doloroso em meu peito.

O segundo andar da casa estava pouco iluminado e silencioso. Todos estavam dormindo àquela hora da madrugada. A porta do meu quarto estava entreaberta e, de onde eu estava dava para sentir o ventinho fresco propiciado pelo aparelho de ar condicionado.

Queria entrar em meu quarto e tomar um banho. Chorar mais aquela ferida que ameaçava se abrir.

–Você não entenderia...

Ele impediu que eu abrisse mais a porta e ao se aproximar, senti o calor dele próximo a mim. Era como estar prestes a encontrar o lar que você sempre sonhou. Exceto pela dor.

–Então me explique Betsy...

A voz dele próxima ao meu ouvido me fez fraquejar e recuar, permitindo que ele me guiasse gentilmente para a parede do lado de fora do meu quarto. Os dedos dele capturaram algumas lágrimas que conseguiram sair apesar do meu esforço em contê-las.

–Você não conhece as coisas aqui na cidade... Não faz ideia de como é fazer uma faculdade... É um mundo totalmente diferente da fazenda Robbie... Você diz que quer se casar comigo, mas quando suas aulas começarem e você começar a se envolver com as atividades do campus... Você vai conhecer pessoas do mundo inteiro... Garotas do mundo inteiro, muito mais interessantes e mais bonitas que eu e que vão fazer de tudo para te conquistar... Garotas que não estarão com o corpo deformado e nem com dois recém-nascidos a tiracolo... Não vai ser difícil você se apaixonar por alguma delas...

Ele me soltou e o ventinho que vinha do meu quarto me pareceu frio demais.

–Você não tem obrigação nenhuma de se prender a mim e aos meus filhos preenchendo uma lacuna em um documento Robbie... Já me basta o remorso de ter estragado o que eu poderia ser ao ter engravidado... Não posso deixar que você sacrifique todo um mundo de possibilidade por tão pouco...

Robbie ficou em silêncio, me olhando, processando o que eu havia dito.

Aproveitei sua imobilidade para entrar em meu quarto. Catherine e Sean ainda dormiam, alheios ao que eu acabara de dizer. Sorri ao constatar isso. Eles não tinham culpa da mãe deles ter sido idiota o suficiente para ter se deixado embebedar pelo namorado.

Entrei no chuveiro da minha suíte. A água levemente quente me ajudou a relaxar e a diminuir a dor em meus seios. Saí do banho após conseguir controlar o resto do choro que havia ficado preso em minha garganta.

Fui do banheiro ao closet por uma porta conjugada. Voltei ao quarto após ajeitar novos absorventes em outro daqueles sutiãs horrorosos. A camisa do pijama tinha um decote em v que facilitava a tirar todos aqueles panos na hora de amamentar.

Comecei a ouvir os chorinhos aumentando enquanto secava meu cabelo. Apressei-me em estender a toalha e ir atender ao chamado já munida com um potinho com água morna. Tanto Catherine quando Sean estavam chorando, incomodados com a fralda suja.

Usando uma estratégia que estava dando certo nos últimos dias, peguei Catherine primeiro. Além de ser mais fácil acalmá-la ela costumava colaborar e ficar quietinha durante a troca. Com alguma sorte, ela estaria dormindo como um anjinho antes que Sean acordasse metade da casa.

Coloquei-a gentilmente no colchãozinho forrado e comecei a abrir os botões da camisolinha. Minha consciência pesava. Me doía por dentro deixar Sean chorando, mas ele não era de colaborar muito com a troca de fralda, e menos ainda para voltar a dormir. Deixaria Catherine toda assada antes de eu conseguir colocá-lo para dormir de novo.

Virei meu rosto rapidamente para olhá-lo e, para meu total choque, Robbie estava praticamente ao lado do berço de Sean, inclinando-se e posicionando as mãos nas costinhas e no pescoçinho do meu filho. Aquilo meu deu pânico.

–O que... O que está fazendo Robbie?

–Te ajudando... A não ser que queira que ele acorde metade da casa... Se é que já não fez isso é claro.

–Vai me dizer que já trocou fraudas?

–Na verdade não... Mas também nunca havia feito um parto antes e bem... Até fui elogiado pelo meu bom trabalho.

Ele começou a erguer Sean lentamente, um pouco inseguro no começo, mas logo que constatou que o bebê não estava sendo machucado e estava em segurança, ele abriu um sorrisinho confiante.

Como se não bastasse a surpresa de ver Robbie pegando meu filho, Sean diminuiu o volume do choro depois de poucos segundos nos braços dele. Mas que diabos! Nem minha mãe conseguia fazê-lo se acalmar tão rápido daquele jeito. Catherine me olhava como se estivesse se divertindo com tudo aquilo, me dando uma risadinha sonolenta e travessa.

Inacreditável. Quinze minutos atrás tentava fazer Robbie cair na real em relação àquela loucura de deixá-lo registrar meus bebês como filhos dele, agora eu ditava a ele instruções sobre como trocar a fralda de uma criança.

Robbie copiava meus movimentos atento a todos os detalhes e cheio de cuidados.

O mais surpreendente de tudo aquilo, era que Sean estava colaborando, coisa que raramente acontecia (ou ele se mexia demais e dificultava a coisa toda ou simplesmente se mijava todo e nos obrigava a limpar e recomeçar tudo de novo enquanto ele se desmanchava em risinhos travessos).

Havíamos acabado de prender as fitas adesivas das fraldas quando escutei um leve risinho vindo da porta do meu quarto. Minha mãe estava encostada no batente da porta envolta ao seu hobby de seda cinza.

–Ouvi Sean chorando e imaginei que talvez precisasse de uma mãozinha, mas pelo que posso ver, vocês lidaram muito bem com eles.

Fiquei um pouco vermelha. A situação estava um tanto estranha: Catherine, ajeitadinha em meus braços, começava a dar apertõesinhos inofensivos em meu peito. Sean olhava Robbie meio curioso, meio esperançoso. Robbie parecia completamente a vontade com aquilo e tudo e eu... Bem... Eu estava confusa e muito receosa.

Foi minha mãe quem me salvou:

–Robbie, se importa de levar a sacola de lixo lá para baixo antes que o cheiro se espalhe?

Não importava sobre o que fosse, minha mãe sempre falava com uma elegância e com uma gentileza de dar inveja.

–Claro que não Sra. Mills.

Ele pegou o saquinho com as fraldas e sujas e saiu, não antes de dar um sorrisinho e uma piscadela para mim.

–Robbie, Robbie, já disse para me chamar de Sophia.


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Notas finais do capítulo

Estamos chegando na reta final da história de Robbie e Claire. O que estão achando?



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