Sensorial escrita por StrawK


Capítulo 3
Visão


Notas iniciais do capítulo

Estou me fazendo de desentendida e voltando aqui sem maiores explicações.

Se ainda houver alguém aí, tenha uma boa leitura. rs



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Sob o sol escaldante, a pequena caravana atravessava o deserto em direção à Suna.

Kakashi havia concordado em liberar Sakura e uma pequena equipe para compartilhar seus conhecimentos médicos com a Vila aliada de Konoha e acabou enviando Ino, Shikamaru e Chouji como escolta, mesmo que aparentemente vivessem em tempos pacíficos.

Não estavam longe do destino ― no horizonte, conseguiam enxergar o topo das construções mais altas da Vila ―, mas a água de seus cantis já havia acabado, o que aumentou consideravelmente o mau humor de Shikamaru, que algumas horas atrás havia desistido de prestar atenção às conversas de seus companheiros de viagem.

Há semanas ele não tinha uma noite de sono proveitosa; os sonhos perturbadores que Temari protagonizava estavam cada vez mais frequentes, e sempre acordava suado e ofegante, quase convencido de que ela realmente esteve ali, o inebriando com seu perfume e sussurrando em seu ouvido algo sobre tipos diferentes de beijos.

O problema maior era que seus delírios acabavam o acompanhando durante o dia, então se forçava a direcionar seus pensamentos à coisas  aleatórias sobre si mesmo ― como a unha do dedinho do pé ou sua orelha que inflamou por causa do brinco ―, porém naquele momento, a boca seca e o calor excessivo do deserto não o estavam ajudando; quanto mais seu organismo clamava por água, mais se lembrava de que estava naquela situação por viajar como escolta para Suna, cujo kazekage era Gaara, que por acaso era irmão da garota que o estava levando à loucura, deixando sua mente em um loop de frustração.

Passou então a divagar sobre os supostos oásis que as pessoas visualizam no deserto, os quais, erroneamente, costumavam atribuir o nome de miragem. Miragem é um tipo de ilusão ótica causada pela luz solar, portanto algo teoricamente real. O que as pessoas imaginam ver, trata-se de alucinação, claramente algo relacionado à confusão mental do indivíduo.

E foi por isso que, devido ao próprio estado de sua mente, não se assustou quando começou a alucinar e ver Temari caminhando de encontro ao grupo, carregando um enorme cantil.

Era uma visão e tanto. Os quadris balançavam, sedutores, conforme ela andava e o braço livre acenou e apontou o objeto preso junto ao corpo.

Ao inferno que fosse apenas uma visão. Sentiu vontade de correr até ela e beijar-lhe em agradecimento, tanto pela água imaginária quanto por sua figura, e foi o que acabou fazendo, afinal.

“Se for para enlouquecer, melhor aproveitar o devaneio.”

Primeiro, um pé após o outro, receoso e incerto, e em seguida a fluidez da corrida, cada vez mais confiante à medida em que a figura de Temari ficava mais próxima e um sorriso estimulante podia ser distinguido em seus lábios.

O sol refletia em seus cabelos dando-lhes a aparência de ouro; os olhos verdes, mesmo a distância, reluziam como jade, o chamando para perto, o desafiando a beijá-la, pedindo para aumentar o ritmo da corrida e diminuir o espaço entre eles.

As curvas suaves destacavam-se contra a luz e puderam ser melhor apreciadas quando ela parou, colocando as mãos na cintura e moveu os lábios, sem emitir som algum:

Lerdo”.

Shikamaru sorriu e aumentou a velocidade.

Há menos de um metro de distância, era só esticar o braço e puxá-la para si.

A mão direita encontrou a pele quente e macia da lateral do pescoço e enquanto sua Temari imaginária corava— pelo calor ou por ele —, aproximou os lábios dos dela.

— Você está me deixando louco — ele disse, debilmente.

— Shikamaru! O que está acontecendo aí? — A voz de Ino, um pouco distante, foi a pedra que estilhaçou o vidro que envolvia suas fantasias.

Até perceber que não havia fantasia alguma. Não havia miragem ou alucinação e a Temari que ele segurava era bem real.

Pouco a pouco, o mundo a seu redor tornou-se cada vez mais nítido e a consciência do que havia acabado de acontecer desceu sobre ele como uma bigorna.

Não houve muito tempo para conseguir se situar, pois logo em seguida, ao seu lado, apareceu o kazekage, com expressão carrancuda.

— O que está fazendo com a minha irmã?

 

•∞••∞••∞•

 

— Ele não está muito feliz — Chouji informou após retornar do escritório de Gaara. — Achou que você estava se estranhando com a Temari e que a encarou para brigar com ela. Sabe, pelo histórico de vocês.

Shikamaru não poderia dizer que estava preocupado com isso; decidiu que era muito melhor ter o kazekage nervoso por achar que tinha alguma rixa com sua irmã do que se ele tivesse a certeza de que a verdade era totalmente oposta.

Perdeu as contas de quantas vezes se esmurrou mentalmente quando percebeu que de fato ele estava prestes a beijar a Temari real, e não a alucinação que ele estava imaginando ter. Ultimamente, nem para ter delírios verdadeiros ele estava prestando, tamanho o turbilhão em sua cabeça. E obviamente, em seus hormônios também.

Uma voz tímida em sua consciência sussurrava de tempos em tempos que toda essa confusão que ele mesmo criou era uma autossabotagem. Por mais que o perfume, a voz ou a visão dela bagunçassem seus sentidos, o levando a confundir realidade e fantasia, era inegável que ele próprio procurava por isso.

Gostava e queria mais. Pensar nela tornou-se seu vício agridoce e nem tentava mais mentir para si mesmo; as meras lembranças que bagunçavam seus sentidos ainda eram melhores do que não ter nada. Agora, ele precisava desesperadamente, presa em sua retina, qualquer perspectiva de Temari.

O que o deixava mais inquieto era que, tinha certeza de que se não houvesse interrupção, a kunoichi teria fechado os olhos e retribuído o beijo. Em vez disso, ao perceber o irmão ao seu lado, levantou a mão e empurrou o ombro de Shikamaru, para logo depois depositar o enorme cantil aos pés  de Gaara e se retirar rapidamente em direção aos portões de Suna, os deixando para trás, resmungando algo sobre falta de educação e que ele não  precisava ser um esganado, pois havia água  suficiente para todos.

O pensamento rápido foi eficaz, pois Gaara realmente acreditou que eles brigaram por divergência a respeito da água do cantil que ela trazia.

E horas depois, ele estava lá, em um dos apartamentos que dividia com Chouji, disponibilizados para a pequena comissão de Konoha durante o período de treinamento que Sakura promoveria, tendo que ouvir gracejos a respeito do seu momento de insanidade.

— Os conselheiros daqui acharam melhor você nem comparecer ao jantar de boas-vindas, devido ao suposto desentendimento de hoje — o amigo falava enquanto abria um pacote de batatas chips e ria. — Eles disseram que a Temari é muito esquentada e que preferem evitar qualquer mal-estar no recinto, já que poderia gerar algum problema diplomático entre Konoha e Suna. Você sabe... ela interpretou bem, fingindo brigar com você.

— Não tem problema. Vou aproveitar para dormir — Shikamaru finalmente falou, sem se importar se agora estava tudo tão escancarado para Chouji.— Só deixe alguma comida para mim antes de sair.

Algumas horas depois, sozinho no quarto, enquanto os shinobis de Konoha estavam no jantar da cerimônia de boas-vindas, ele rolava na cama, inutilmente tentando dormir.

Se perguntou se era isso que era se apaixonar. Sempre ouviu que a paixão deixava as pessoas burras, mas não imaginou que ele próprio, tão centrado e lógico, um dia se deixaria dominar por esse sentimento insuportável. E somente insuportável, porque descobriu não ter coragem de abrir o jogo com Temari. Ou apenas não sabia como, exatamente, fazer isso.

O que ele diria? “Temari, eu fico fingindo sentir seu perfume para poder me acostumar com ele, ouço sua voz todo dia pela manhã, me mandando acordar e agora não estou sabendo diferenciar se sua presença é real ou imaginária, do tanto que penso em você, e acho que isso significa que deveríamos nos beijar agora mesmo”.

Fora de cogitação. Ela provavelmente lhe responderia batendo com o leque gigante em sua cabeça, porque soaria psicótico demais.

Encarou o teto, suspirando, mentalmente cansado e morrendo de vontade de ao menos vê-la. Fechou os olhos, e quando os abriu novamente, sua visão periférica captou uma figura no quarto, em pé ao lado da cama.

Virou o rosto lentamente e percebeu que sua mente havia projetado Temari ali novamente. Já estava ficando chato e cansativo. Quando iria acabar?

 Mas ela estava lá, com uma mão na cintura e o quadril pronunciado, colocando o peso do corpo na perna esquerda. Dessa vez, a concebeu em sua fantasia com um vestido de festa preto e longo. O modelo do decote ombro a ombro expunha o colo, que reparou ter algumas sardas e o cabelo estava preso em um penteado elaborado, onde mechas douradas soltavam-se aqui e ali, emoldurando o rosto belo e atrevido.

A fenda no vestido ia até a coxa e mostrava partes da pele lisa e firme. Ela não deixava de exalar aquele ar de lutadora vigorosa, porém antagônica e terrivelmente feminina, e ele percebeu que nunca havia pensado nela nesses termos.

Os olhos verdes estavam obscurecidos e uma das sobrancelhas estava levantada, no que ele imaginou ser deboche. A boca rosada e bem desenhada encontrava-se imperceptivelmente aberta, como se preparando para soltar algum comentário irônico.

Era uma visão tão harmoniosa, com a luz amarela do quarto incidindo sobre ela, criando uma atmosfera quente e confortável, como se ela mesma fosse feita de lusco-fusco e suas cores irradiassem através  da janela do quarto, iluminando até  mesmo o lado de fora, que ele poderia ficar ali para sempre, apreciando essa pintura mental.

— Eu estou mesmo enlouquecendo — reclamou para si mesmo, antes de sentar-se na cama e passar a mão pelos cabelos, exasperado.

— Sempre te achei meio perturbado, mesmo — foi somente quando ela falou que se deu conta do que havia feito novamente. — Essa coisa de observar nuvens não é muito normal.

— C-como entrou aqui? — Levantou-se da cama, desnorteado, mais consciente do que nunca que estava sozinho em um quarto com Temari e que não era delírio nem imaginação.

— Pela janela. Sou uma ninja, esqueceu? Eu subo pelas paredes — ela riu e sentou- se na cama, cruzando as pernas.

Não era possível que ela estivesse sendo apenas displicente, porque ele tinha certeza de que Temari calculava cada movimento para deixá-lo subindo pelas paredes.

Embora fosse uns bons centímetros mais baixa que ele, Shikamaru tinha a impressão de que a presença dela naquele quarto a deixava maior que o mundo, preenchendo cada fragmento de sua visão.

— Não deveria estar no jantar? — Enfim perguntou, tentando disfarçar o nervosismo.

— Aquilo estava muito chato — ela comentou casualmente, para depois emendar com um sorriso brincalhão. —  Não tinha alguém interessante o suficiente com quem eu pudesse implicar.

 Ele coçou a nuca, pensando em pelo menos setes maneiras de agarrá-la ali mesmo e beijá-la, mas sabia que se desse o primeiro passo não seria capaz de se controlar. Poderia se orgulhar de saber administrar os sentimentos durante uma batalha, só que não poderia falar a mesma coisa sobre seus hormônios de rapaz de dezenove anos.

Temari suspirou ao perceber que ele se perdia em conjecturas e interrogou com voz curiosa e levemente tímida:

— O que você ia fazer hoje à tarde? Quer dizer... eu poderia jurar que estava prestes a ser beijada.

Shikamaru quase engasgou com a saliva. O coração pulsou mais forte e percebeu o sangue correr rápido por suas veias, espalhando uma queimação por seu rosto. Praguejou baixinho por sentir-se corar e encarou a parede a sua frente; não queria olhar para Temari ao mentir. Mas precisava mentir, do contrário só Kami sabia o que poderia acontecer naquele quarto.

Uma corrente de irritação percorreu seu corpo enquanto caminhava com passos pesados até a janela, onde se apoiou para poder respirar um ar que não  estivesse impregnado  com o aroma feminino.

Fechou os olhos também, para não correr o risco de visualizar o belo reflexo no vidro, e começou a travar uma luta interna, agressiva e atrapalhada:

“Você não é um animal. Você pode se controlar. Você a respeita.”

“Mas o que ela veio fazer aqui, sozinha no meu quarto, porra? Ela quer me torturar. Mulher cruel. Não vê o quanto eu a quero?”

“Ela ainda está esperando por uma resposta. Diga! Diga que realmente iria beijá-la! Beije-a! Agarre aquele corpo como você sabe que precisa! Você não é tão forte assim!”

“Pobre rapaz virgem... Mande-a embora antes que faça algo precipitado. Você quer, mas não assim. Não aqui. Não agora”.

“Frouxo. Vá lá! Faça logo o correto e passe o resto da noite se arrependendo debaixo do chuveiro”.

— Acho... acho melhor... você sair daqui — finalmente disse, ainda de costas para ela, ao mesmo tempo frustrado e orgulhoso por fazer a coisa certa.

Uma parte de Shikamaru torcia para que Temari protestasse e tomasse a iniciativa, munida da coragem que ele não possuía, mas suspirou aliviado quando virou-se e não  a viu mais no quarto.

Ela saiu, tão silenciosa quanto entrou, provavelmente pela janela lateral, e sem dúvida, com o orgulho ferido e um espírito assassino; e ele, enfrentaria as consequências outro dia, torcendo para a situação não ser tão ruim.

O ambiente nunca pareceu tão vazio e as cores tão desbotadas. Agora tudo era vácuo; dava para ver os quatro cantos do cômodo, a mancha no carpete marrom e até mesmo uma minúscula aranha balançando próximo ao basculante.

Atravessou o quarto arrastando os pés, com os ombros caídos em derrota, e se dirigiu ao banheiro.

Precisava de um banho gelado.


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Notas finais do capítulo

• Não foi betada. Se achar algum erro, avisa aqui para eu corrigir, pls.

• Próximo capítulo já está em andamento. Comente se gostou. Se não gostou, também.

• Fato aleatório: o corretor do Word trocava kazekage para gazela. rs

ATÉ A PRÓXIMA.



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