As árvores e coqueiros passavam rapidamente pelo vidro do carro. As casas eram simples, mas muito bonitas e cheias de cores. Os jardins floridos e bem cuidados, o que indicava o quanto a população local era ligada a natureza. Ate o momento Sakura não conseguira parar de olhar e admirar a paisagem que não via desde muito pequena. Seu sorriso estava enorme e os olhos brilhavam de ansiedade pelo que veria ao chegar a casa. Se é que poderia chamar a casa do pai de sua, após tantos anos e a distancia entre eles.
Suspirou ainda olhando pela janela. O pai havia a tratado com indiferença como se não tivesse sentido nada ao vê-la. Quando decidira ir ate a ilha pensara que conseguiria conversar com o pai e esclarecer tudo o que havia acontecido durante todos esses anos que não se falaram. Mas pelo jeito seria mais complicado do que previra. Agora não sabia se fizera o certo, mas não desistiria afinal estava ali e daria tudo de si para restaurar os sentimentos que um dia fora perdido e conseguir a confiança de seu pai.
O sorriso que havia sumido voltou a sua face ao ver a curva que o taxi fazia. Pode lembrar-se daquele caminho como se nunca tivesse saído da ilha. Os coqueiros grandes e a vegetação, as flores laranja e rosas espalhadas por todos os lados da rua. Pode perceber que os vizinhos continuavam sendo a família que morava a quase um quilometro da casa.
Realmente Yoko gostava de privacidade, pensou. O que fez seu coração dar um salto e a insegurança voltou a lhe assombrar.
- Você parece feliz. – Sasuke a olhava divertido.
Sakura apenas confirmou com a cabeça.
- Faz muitos anos que não venho aqui, mas me lembro de muitas coisas o que me faz sentir em casa novamente.
Observou Sasuke fechar a cara, bravo.
- Já estamos chegando.
- Oh. – Ela sorriu e olhou novamente pela janela ignorando a expressão do outro.
O carro estacionou ao lado de uma casa de madeira de dois andar. Sakura desceu sem esperar a ordem de Sasuke. Caminhou ate a frente e parou admirando o local. A casa estava pintada de branco e azul, diferente de anos atrás, mas na essência a casa continuava igual.
Parecia apenas que tinham mudado as antigas madeiras e construído sacadas pequenas e confortáveis para se sentar em noites quentes. Era o que podia observar ao olhar para ela de fora. Fechou os olhos lembrando-se de quando era criança e vivia feliz ali. Pode ver como se estivesse acontecendo naquele instante.
“Yoko corria pelo jardim atrás de uma menininha de cabelos curtos e rosas. Brincavam de pegar e a menina sorria para o pai em cumplicidade. O homem a pegou o que fez ambos caírem no gramado rindo.”
Escutou o barulho do motor do carro se distanciando. Abriu os olhos e deparou-se com Sasuke com expressão questionadora. Percebeu o rosto esquentar, sinal de que estava corando.
- Acho melhor você entrar.
- Sim, claro.
Sakura fez menção de seguir ate a casa, mas lembrou-se de não ter a chave.
- Não possuo a chave.
- Você não precisa da chave.
Sasuke percebeu a confusão da rosada e sorriu.
- Em primeiro lugar nós temos uma... Como vocês da Inglaterra chamam de governanta. Mas para nós Chyo é muito mais do que isso. Bem você entenderá quando conhecê-la. Em segundo lugar não há índice de roubos então quase toda a população local não tranca as portas.
Sasuke riu ainda mais ao ver a cara de apavorada de Sakura.
- Você não tem medo?
A resposta foi um sinal negativo de cabeça.
- Bem, melhor assim. Quero dizer, ninguém precisa se preocupar com essas coisas e podem viver mais tranqüilos.
- Verdade.
- Bom. – Sakura virou-se para Sasuke ao se dar conta de algo que ele falou anteriormente. – Você disse que “nós temos”? Quer dizer que você...
Ela perdeu a fala ao constatar o obvio.
- Oh sim. – Sasuke sorriu encarando-a. – Moro aqui com seu pai há anos.
- Entendo. – Ela baixou a cabeça antes de se virar a caminho da entrada da casa.
Finalmente podia entender a ligação que sentiu entre os dois no escritório. Eles eram mais do que colegas de trabalho. Agora só faltava entender realmente o que eram um para o outro.
Passaram pela porta de entrada e ela pode visualizar a sala grande e aconchegante. Havia um sofá de três lugares e duas poltronas, ambas cobertas com tecidos coloridos típicos do Havaí. A televisão era grande e se encontrava sobre uma estante de madeira caprichosamente encerada. O pequeno bar ficava a um canto e podia ser vista algumas garrafas e copos. Não havia nada de feminino no ambiente muito pelo contrario era um local típico masculino.
Girou a cabeça e olhou ao redor identificando cada parte da casa e tentando se sentir como quando era criança.
Sasuke estava segurando a sua mala na porta que dava a um corredor olhando-a.
- Por aqui Sakura.
Ela apenas seguiu-o com passos rápidos pelo corredor enquanto escutava-o falar.
- Atrás desta porta fica o banheiro do andar inferior.
Estavam parados diante de uma porta de madeira que ficava ao meio do corredor.
Sakura apenas acenou com a cabeça já que se lembrava daquele local de quando morava ali.
Seguiram pelo corredor ate que ele ficou mais amplo e deu para visualizar a escada também em madeira polida. Mas pararam antes de chegar a ela. Sasuke entrou por uma abertura a esquerda que levou ate a enorme cozinha. Sakura ficou impressionada com a quantidade de eletrodomésticos e a organização. Deu para perceber que aquele local era dominado por uma mulher.
- A cozinha também foi reformada. – Sasuke falou ao perceber a expressão da rosada.
- Percebi. – Foi a única coisa que conseguiu dizer.
Sasuke virou-se e voltou pelo caminho passado anteriormente e Sakura o seguiu. Desta vez entraram pela porta a direita que levava em uma sala que pelo que pode perceber era a biblioteca e escritório. Tinha a um canto uma escrivaninha antiga de madeira e uma cadeira estofada em vinho. Do outro lado da sala haviam estantes enfileiradas cheias de livros, o que encantou a garota.
- Vejo que gostou da nossa humilde biblioteca. – Sasuke falou irônico.
- Amei. – Sakura não entendeu a ironia e respondeu a pergunta sincera.
O moreno caminhou ate a escrivaninha e largou a mala no chão encaminhando-se a porta de vidro que ficava atrás desta.
- Venha vou lhe mostrar o jardim.
A garota o seguiu passando pela porta que foi aberta por ele. Sakura sorriu gentilmente em forma agradecida antes de parar admirada pela belela do vasto jardim.
- É mais bonito que o da frente. – Ela falou sorrindo.
- Sim, Chyo é uma ótima jardineira alem de cozinhar muito bem.
- Oh. -Sakura correu ate uma pequena plantação de hortaliças. – Isso é maravilhoso sempre quis poder plantar, mas infelizmente onde moro não posso.
Olhou ao redor as flores coloridas só então percebeu um pequeno caminho ao meio das plantas típicas da ilha.
- Para onde leva este caminho? – Falou a Sasuke.
- A praia. – Respondeu olhando-a serio.
- Hum.
- Venha vamos voltar. Lhe mostrarei seu quarto no andar superior.
- Sim.
Retornaram a casa subindo a escada que levava ao andar superior.
- O primeiro quarto é de Yoko. – Sasuke mostrava a porta de madeira. – Ele prefere já que acorda muito cedo todos os dias.
Continuaram caminhando pelo corredor.
- Aqui é o banheiro principal. – Virou-se para a garota em frente à porta de madeira. – O único quarto que possui banheiro é o do Yoko, então dividiremos este banheiro. Espero não ter problema.
Sakura ficou olhando-o perdida em lembranças antes de responder.
Lembrou-se da escola e de que tinha que dividir tudo com outras pessoas inclusive o banheiro que era comunitário. Não seria problema para ela dividir com uma única pessoa.
- Não terá problema nenhum. – Enfim respondeu.
- Ótimo. – Virou-se de costas para ela. – Seguindo.
- Esta porta é um quarto de hospedes, mas esta em reformas.
Falou gesticulando enquanto passavam por uma porta.
- Finalmente o seu quarto.
Pararam e Sasuke abriu a porta de madeira entrando no quarto seguido de Sakura.
Ela viu o moreno largar a mala em cima da cama e olhá-la.
- Então este aposento esta aprovado? – Sorria de modo cínico para a rosada.
Olhou a cama de casal com uma colcha bem colocada e lisa em branco. Ao lado da cabeceira um pequeno criado-mudo com um abajur laranja enfeitado, típico do Havaí. O guarda-roupa ficava na parede direita, enquanto o penteador com um grande espelho ficava na parede esquerda. O quarto era pintado em amarelo claro, mas as janelas e a porta de vidro que levava a sacada eram em branco. Todo aquele aposento esbanjava feminilidade apesar das cores neutras, o que a fez deduzir que aquele quarto era para hóspedes femininas.
- É muito bonito. – Respondeu fingindo não reparar no sorriso debochado dele.
- Ótimo, ainda bem que gostou por que não temos quartos chiques como esta acostumada.
Sakura olhou-o sentindo-se julgada e reparou no olhar frio que ele lhe lançava junto ao sorriso sarcástico.
- O próximo quarto é o meu. -O moreno não tirava os olhos da garota enquanto falava. – O que é ótimo já que pretendo ficar de olho em você.
- Como é? – Sakura olhava-o confusa.
- É isso mesmo. Você apareceu aqui depois de todos esses anos por algum motivo, certo?
- Está certo. Estou aqui por que quero conhecer meu pai.
- Ah sim, claro. Vou fingir que acredito em você. Esta aqui por que ficou sabendo que Yoko esta prosperando nos negócios e você quer mais dinheiro?
- Como? – Sakura não estava entendendo o que Sasuke estava insinuando.
- Não dá para você ao menos disfarçar? Dá para ver no seu olhar o quanto é fingida. – Sasuke caminhou ate a rosada baixando a cabeça ate ficarem com o olhar próximo. – Não deixarei você e nem ninguém magoar Yoko novamente, esta entendendo?
A garota olhava-o atônica. A respiração de ambos estava descompassada devido à discussão. Sakura ergueu o queixo e o olhou fixamente perdendo-se momentaneamente nos olhos negros dele.
- Você não tem o direito de interferir em nada. – A rosada falou quando conseguiu se recuperar.
Sasuke segurou os braços claros dela apertando-os.
- Você me entendeu Sakura?
A garota tentava se livrar das mãos fortes do moreno, mas este a puxava e apertava ainda mais.
- Você esta me machucando!
Puxou-a para mais perto dele fazendo com que os corpos colidissem enquanto apertava os braços já vermelhos da rosada.
- Vou ter que repetir a pergunta?
Os olhos negros estavam gélidos de raiva quando Sakura encarou-o. Pequenas lágrimas se formavam em torno dos olhos verdes dela e podia sentir que a qualquer momento choraria.
- Está certo Sasuke, agora me largue por que esta me machucando.
Enfim o garoto percebeu os olhos verdes embaçados e o rosto pálido de Sakura. Sentiu-se mal ao ver as marcas vermelhas nos braços brancos da menina. Soltou-a rapidamente como se o contato o queimasse e virou-se de costas para ela.
- Desculpe, não queria lhe machucar, mas você me fez ficar irritado.
Sakura esfregou os braços doloridos e vermelhos escutando o pedido angustiado de Sasuke, mas sem coragem de responder. Viu quando ele virou-se e tentou se aproximar o que a fez dar um passo para trás e apertar ainda mais os braços para se proteger.
- Esta tudo bem Sasuke, eu entendi o seu recado. Agora pode me deixar sozinha, pois não irei sair do quarto pode ter certeza disto.
Encarou-o com os olhos em fúria pelo ato selvagem de Sasuke e pode observar os olhos negros de angustia se tornar frios como anteriormente.
- Estarei na casa e não esqueça que estou de olho em você.
- Não machucarei Yoko. – Disse a garota com firmeza.
- Isso é o que nós iremos ver.
Saiu batendo a porta com força.
Sakura deitou-se de costas na cama olhando para o teto. Não conseguia entender o que fez para o moreno a odiar tanto. Ele referia-se a ela como alguém egoísta e sem escrúpulos. Em muitos momentos viu ódio e rancor nos olhos negros de Sasuke e em outros confusão. O que estava acontecendo afinal? O que este garoto sabia de sua vida? Será que Yoko havia contado toda a historia de sua família a um completo estranho? Não, seu pai sempre fora um homem justo e honesto. Se havia contado algo a Sasuke era por que confiava nele, então teria que estar preparada para coisas horríveis vindas do moreno. Ele a avisara que estava observando-a em cada ato, mas felizmente não tinha o que temer. Fora jogada pela mãe em um colégio interno assim que chegaram à Inglaterra e só a via em feriados, tendo que competir com vários homens e mulheres que sempre estavam no enorme apartamento. Com o passar dos anos raramente era aceita em casa o que não conseguia entender ate o dia em que conheceu o namorado de Dara. Naquela época já não era mais uma criança e sim uma adolescente de dezesseis anos com o corpo praticamente formado. Foi a primeira e única vez que um homem a tocou, e também foi a ultima vez que esteve no apartamento da mãe.
Sentou-se na cama vendo o seu reflexo no grande espelho. Viu as lagrimas escorrendo pelo rosto ainda pálido e passou os dedos trêmulos para limpa-las. Prometera não chorar mais por aqueles que não mereciam, mas era quase impossível. Levantou-se e desfez as malas guardando as poucas peças no guarda roupa. Colocou os itens de toalete sobre a penteadeira junto ao seu perfume e creme corporal. Pegou o que era necessário para um banho e dirigiu-se ao banheiro do corredor, pois precisava lavar seu corpo do cansaço e a mente das lembranças.




Sasuke entrou em seu quarto batendo a porta com força devido à raiva. A garota tinha algo que o irritava e confundia. Às vezes ela parecia uma mulher inglesa pronta para dar o golpe e em outras parecia uma menina ingênua e solitária. Na verdade desde que a vira percebera o quanto os olhos verdes e profundos eram tristes. Não conseguia compreende-la, afinal o que a trazia até ali era o dinheiro que Yoko possuía. Será que ela não compreendia o quanto isso machucava e entristecia o homem? Yoko não era mais um garoto já estava ficando velho e a visita da garota só trazia mais confusão e tormento à mente dele.
Lembrava-se muito bem o dia em que entrou na casa e viu a foto de Dara e Sakura em uma moldura na parede. A rosada era apenas uma criança pequena e a mulher ao seu lado era maravilhosamente linda. Demorou longos anos para que conseguisse fazer que o outro tirasse a moldura e a jogasse no lixo, afinal o que aquelas duas mulheres trouxeram de bom a vida dele? Nada. Essa era a resposta. Dara o abandonara para viver uma vida de riquezas com outros homens que podiam a sustentar e Sakura só usara e esbanjara o dinheiro de Yoko sem nunca lhe agradecer por nada. As duas eram mulheres egoístas e fingidas que podiam enganar facilmente os homens, mas a ele Sakura não enganaria. Ficaria entre pai e filha se fosse necessário para defender e ajudar Yoko que para ele era como um pai.
Escutou a porta do quarto de Sakura bater e lentamente abriu a sua porta espiando-a entrar no banheiro. Ainda podia ver as manchas vermelhas nos braços dela o que fez seu coração retrair-se. Nunca machucara uma mulher, muito pelo contrario, geralmente as fazia sentir prazer com seus toques. Mas Sakura o enlouquecera de uma forma que o fez perder a razão. Teria que controlar-se melhor ou então não conseguiria ficar de olho nela.
Fechou a porta do quarto e foi trocar de roupa. Colocou uma camisa regata branca e uma bermuda preta ficando com os pés descalços. Saiu do quarto e desceu ate a cozinha esperando encontrar Chyo, já que Sakura e ele precisavam de um lanche, mas principalmente precisava urgentemente de uma distração.