-Nina, tem certeza que tem que embarcar hoje?

Afastei meu ouvido do celular. Minha mãe tinha a agradável mania de berrar ao telefone, deixando a pessoa do outro lado parcialmente surda por alguns segundos e totalmente irritada por um tempinho maior.

Suspirei, repetindo pelo o que parecia ser a décima vez:

-Eu só preciso de um tempo para mim, mãe - expliquei apertando o celular com força até sentir que os nós de meus dedos começavam a perder a cor. - Além disso, voltarei antes que perceba.

Ela bufou ruidosamente do outro lado da linha.

-Promete que estará aqui para o casamento?

Reprimi minha vontade de gritar. Era a terceira vez que minha mãe se casaria. E, por alguma maldição, nos outros casamentos eu havia ido sem acompanhante, para sádico prazer de minhas tias que me rodeavam como um enxame de abelhas querendo saber como eu ainda estava solteira.

-Prometo - respondi, tentando soar animada. - Hum, tenho que ir, está quase na hora do embarque.

Não esperei sua despedida. Estava começando a me sentir sufocada com a ideia de me ver cercada de parentes que não me viam há anos, mas de algum modo, se sentiriam no direito de julgar meu novo corte de cabelo, minha profissão - ou a falta dela - e minhas roupas. Elas conseguiriam falar de maneira sutil que esses eram os motivos de não ter namorado.

Mas, é claro, isso era mentira.

Eu não tinha namorado, porque eu não queria e ponto final.

A aeromoça começou a anunciar o número de meu voo e me juntei à fila de passageiros ansiosos. Quando entrei na aeronave, me vi sentada no inevitável lugar para aqueles que compram passagem em cima da hora, o meio indesejado. Nem a janela com a visão do céu, nem a liberdade do corredor. E eu sempre fui fã de liberdade.

Não ia me importar com detalhes, estava a caminho de San Andres, uma exótica ilha da América Central, apenas seis horas de Chicago, onde eu morava. Aquele era meu momento de relaxar.

Dane-se que meu cabelo estava na altura do ombro, fazendo com que em dias de cabelo ruim, eu ficasse com a aparência de um picapau. Um picapau charmoso, eu espero. Dane-se que eu ainda era assistente numa multinacional que nunca daria valor às minhas ideias artísticas. Dane-se que eu não me encaixava em lugar nenhum.

Aquela era minha viagem. E eu estava prestes a alçar voo.