My Songs, My Life escrita por Flame


Capítulo 1
My Life


Notas iniciais do capítulo

Depois de muito tempo sem escrever nada, venho postar algo que surgiu de um rascunho de fundo de caderno. Como adoro explorar os personagens de Vocaloid, espero que tenha ficado bom o suficiente.
Aproveitem.



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Calor...eu podia sentir meu corpo queimando, meu sangue fervendo, minha pele derretendo. Eu não conseguia deixar de corresponder aos seus estímulos. Ele chegava cada vez mais perto e, juntos conseguíamos ir mais longe. Afinal, o quão longe fomos em tão pouco tempo?

-Venha, não se contenha. –Minha voz escapa abafada- Sou sua...

E então ele se aproxima mais uma vez. Mais um beijo? Ou dessa vez seria algo mais? Quando finalmente volto a sentir sua temperatura, ouço um barulho longe...Meu maldito despertador.

Levanto-me correndo da cama, sinto minhas pernas trêmulas e bambas. Meu cabelo molhado de suor. Aquele sonho teve efeitos na vida real. Meu corpo reagiu demais ao meu psicológico.

Sou Kagamine Rin, tenho dezesseis anos e estou no segundo ano do ensino médio. Faço parte do clube de música da escola, toco guitarra e sou considerada por todo o clube, a pessoa mais criativa presente no grupo. Sou a única integrante que não se forma esse ano, ou seja, quando os veteranos se formarem em março e se não arrumarmos mais membros, o clube acabará.

Por enquanto estou trabalhando muito em conseguir novos membros, mas isso não quer dizer que eu seja cem por cento movida à música. Eu gosto de ler livros de ficção, mangás, sou apaixonada por filmes de terror e gosto de escrever. Sim, escrever. Poemas, pequenas histórias, até mesmo músicas. Componho de vez em quando colocando todos os meus sentimentos em minhas criações.

De volta ao dia de hoje, visto meu uniforme com a maior pressa do mundo, penteio meu cabelo de qualquer jeito pondo meu tradicional laço branco e umas presilhas para prender os fios rebeldes. Vejo se está tudo no lugar, pego a mochila, a guitarra e os fones. Escolho uma música aleatória, pego uma maçã e corro em direção à porta da frente me despedindo dos meus pais, que se arrumam para o trabalho.

Parte do meu trajeto é de trem, a outra parte, mais perto do colégio, faço a pé. Sou uma pessoa completamente estabanada e viajo para fora da minha realidade facilmente. Sigo o ritmo dançante e alegre da música que ouço durante o caminho andado até o colégio e tudo parece lindo. As pessoas subindo a ladeira, a temperatura morna de final de abril, o céu azul e os pássaros voando. Talvez fosse só a música, ou talvez eu estivesse apenas feliz mesmo.

Teria sido aquele sonho?

Tento afastar esses pensamentos lembrando que o sonho que tive pode ter sido prazeroso mas não deixou de ser constrangedor.

Sinto uma pequena batida no meu ombro. Uma mão feminina porém não tão leve assim. O cheiro de seus cabelos é inconfundível. Hatsune Miku, minha amiga me cumprimenta apenas pelo tato pois sabe que estou concentrada na música e que não vou dar ouvidos ao que ela disser, mesmo que seja um simples “bom dia”. Miku é minha amiga desde o fundamental. Um ano mais velha e está no terceiro ano, também faz parte do clube de música como primeira vocalista e segunda guitarrista. Por causa dela que estou no clube de música. Eu já sei tocar guitarra e violão a um bom tempo, mas eu tinha vergonha de tocar com outras pessoas. Apesar de ser comunicativa e me dar bem com todos, sou tímida em certas situações. Mas Miku me trouxe à esse mundo maravilhoso e agora o clube de música é parte de mim. É algo que eu não quero que morra.

Antigamente, no fundamental, eu costumava fazer parte do clube de literatura, como citei antes, assim como gosto de música, gosto de escrever. Líamos livros diferentes, analisávamos e a partir deles criávamos histórias inspiradas nos títulos lidos. Ao completar uma coletânea de histórias, fazíamos uma antologia.Quando escrevia e publicava antologias de variados temas no fundamental, era excelente. Eu podia expressar minhas ideias sem me expor completamente.

Com a música é diferente, mas amo ambas as artes. E tenho que dizer que há um momento que posso unir música à escrita. E isso é quase mágico.

Sigo meu caminho rumo à escola e meus sentidos ficam em alerta. Já que minha audição está ocupada, meus outros sentidos tendem a ficarem mais apurados. Meu olfato me avisa sobre um cheiro que gosto muito. É colônia masculina, muito forte, misturada a feromônios naturais. Isso talvez denuncie o quanto ele está perto.

Tiro um dos fones e meu coração acelera um pouco. Respiro fundo rápido porém não me viro, espero ele vir e tocar meu ombro como faz todas as manhãs.

-Bom dia Rin !- ele diz todo sorridente como sempre ao tocar meu ombro e alcançar meu passo.

-Bom dia Len !- respondo sorrindo na mesma proporção que ele.

O garoto loiro que acelera meus batimentos cardíacos é meu colega de classe Len. Olhos azuis, estatura mediana (acredito que algo por volta de um metro e setenta e cinco), seu corpo não é nem magro, nem forte, nem gordo. Na minha concepção suas medidas estão satisfatórias. Os fios dourados sempre presos num rabo de cavalo pequeno e frouxo, mas pelo que já vi, seu cabelo solto fica apenas alguns centímetros abaixo do pescoço.

Fiquei muito próxima dele. Digamos que desde o momento em que descobrimos que estávamos na mesma sala. Eu estava com meus fones no maior volume e havia chegado atrasada para a cerimônia de abertura. Por coincidência, ele também estava atrasado e fomos correndo olhar os murais. Segundo ano turma dois. Estávamos olhando o mesmo papel e ele estava perto o bastante para ouvir a minha música e reconhecer a banda.

Fomos para sala conversando naquele primeiro dia de aula. Na hora da apresentação de classe, eu disse que tocava guitarra e ele declarou que tocava baixo. A partir daí começamos a conversar mais. Até no sorteio de lugar da sala ficamos um do lado do outro. Mas eu nunca imaginei que fosse me apaixonar por Len.

Éramos apenas amigos que gostavam da mesma coisa. Até um dia em que ele dividiu o fone comigo pela primeira vez. Eu estava sentada no chão completamente perto dele, a música era muito sentimental e ele começou a falar da música como se fosse um poeta. Depois começou a cantarolar baixinho. Vi seu rosto corar e percebi o quanto ele é fofo.

Ele é um garoto estranho de uma certa forma. Nos primeiros dia ele não conversava com ninguém além de mim, Neru e Rinto. Esses dois são primos de Len. Neru está na mesma sala que eu desde o ano passado e nos tornamos amigas. Rinto estudou na nossa sala ano passado também, mas está na sala um esse ano. Nas primeiras semanas, Len parecia alguém isolado, mas aos poucos foi se enturmando com todos. Ele tagarela a depender do assunto, e muito calado se algo falado não lhes agrada. Apesar de ser inteligente, ele evita esforços, não gosta muito de estudar e fazer coisas que ele julgue desnecessário.

Às vezes me pergunto o porquê de eu ter me apaixonado por ele. Quero dizer, eu não sou facilmente atraída por um rostinho bonito. Ele é diferente de todos os rapazes por quem despertei o interesse anteriormente. Ele está sempre distraído, não gosta de estudar e perde o foco facilmente. Apesar de ser inteligente, faz parecer que sua inteligência é em vão. É talentoso em várias áreas, Rinto me falou que no fundamental, Len costumava jogar no clube de basquete da escola junto ao primo, mas largou o clube na nona série. Além de tocar baixo, percebi que sabe cantar. Parece ter um talento nato para desenhar além de ser bom em localização, o que significa que ele não se perde com frequência, mesmo que conheça pouco o lugar.

Quero trazer Len para o clube de música enquanto há tempo. Pelo fato de não gostar de estudar, suas notas vão muito ruins e sei que é por simples falta de interesse. Percebo que coisas que ele gosta como música aumentam seu foco, ou seja, ele se dedica ao que ele considera importante. Se eu o fizesse entrar para o clube, além de termos mais um membro do segundo ano e um bom baixista, talvez ele fosse capaz de crescer um pouco e se dedicar mais aos estudos.

Ou talvez essa seja mais uma desculpa minha para ficar mais próxima dele. Afinal por quê estou tão preocupada com suas notas? Eu deveria me preocupar com as minhas!

-Ei Rin, está ouvindo? – escuto a voz de Len um pouco longe.

-Ah, oi, desculpe acho que me perdi um pouco em pensamentos.

-Você tem andado assim ultimamente, está bem?

Ele está preocupado comigo?

-Estou bem, aliás, você fica viajando mais que eu! Então, sobre o que falava? –pergunto sentando-me em minha carteira à frente da sua.

-Perguntava qual era a primeira aula.

-Física cara, física. Dois meses de aulas e você não decorou os horários?

-Sério mesmo? Física? Que saco! Teve algum dever de casa para entregar? – ele pergunta assustado.

-Sim, você não fez?

-Claro que não! Eu fiquei jogando a noite toda esqueceu? Eu lhe falei. Mas você fez?

-Fiz. Não acredito que você não. – digo retirando meus cadernos da bolsa.

-Por favor Rin me empresta para copiar, só faltam dez minutos! – ele pede se curvando na mesa.

-Tudo bem. Mas não vai sair de graça! – pisco entregando-lhe os cadernos.

-Espera. – ele tira umas balas do bolso e coloca na minha mão. – Meu pagamento!

Idiota! Não era desse tipo de pagamento que eu estava falando!

Mesmo insatisfeita com as balas, sorrio. Não é que eu esteja realmente muito insatisfeita, eu amo doces e ele sabe disso. Eu vivo roubando as balas que ele compra na cantina. Mas eu queria algo além de balas.

O professor chega e eu simplesmente congelo. Sua pasta está transbordando de papéis. Eu sei o que tem ali e talvez essa seja a razão da rigidez de todos os meus ossos agora.

-Ei Len. – chamo o garoto que está com o tronco completamente abaixado atrás de mim, escondendo-se do professor enquanto termina de copiar minhas anotações.

- O que?

-Você acha que ele trouxe as provas do bimestre?

- Droga... – ele diz suspendendo a cabeça – Essas provas não. – e então abaixa a cabeça em posição de redenção.

O começo da aula é natural. Levantamos, saudamos o professor, sentamos e ele segue o discurso:

-Bom dia a todos. Eu estou com os resultados das últimas provas e devo dizer que fiquei um pouco decepcionado. Poucos atingiram a média de sessenta pontos e muitos não conseguiram passar da média. Eu sugiro que estudem mais esse bimestre.

Minhas mãos transformam-se em cachoeiras. As pernas tremem, estou nervosa assim como estava no dia da prova. Não é como se eu não tivesse estudado, na verdade, eu tinha domínio de quase toda a matéria. Eu estudo todos os dias e não só na véspera dos testes. Mas naquele dia...era como se alguém tivesse apagado minha memória. Eu estava tão nervosa, com tanto medo de errar que acabei esquecendo tudo.

Isso é um vício meu. Fico sempre tão preocupada em fazer tudo certo, que acabo fazendo tudo errado.

A questão não é ter a nota baixa. Na maioria das vezes, notas não provam nossos conhecimentos. O nervosismo é a prova disso. Podemos estar tão eufóricos que acaba abalando o nosso psicológico. Só que isso parece irrelevante para meus pais. Não estou dizendo que meus pais são exigentes, na verdade, a única coisa que exigem é que eu tire boas notas, se caso eu não consiga ao menos a média, adeus clube de música, adeus livros, adeus tudo o que eu amo.

O desespero aumenta, sinto meu corpo a suar frio. Todos ao meu redor recebendo suas notas. Os bons em exatas falando o quanto a prova estava fácil, as pessoas que não conseguiram suas médias se lastimando, os que ficaram na média aliviados. Eu apenas tremo e sinto minha garganta estrangulada, como se estivesse engolindo ar o tempo inteiro.

Por que não me chama logo?

-Kagamine Rin. – a voz do professor ecoa pela sala.

Minha curiosidade chega ao fim. Caminho até a mesa do professor em passos médios, nem rápidos e nem lentos. Eu quero saber minha nota e ao mesmo tempo não quero. Minha mão fria e suada pega a prova virada para baixo. Dobro o papel e caminho para minha carteira ignorando as perguntas dos meus colegas. Ao sentar, abro a prova evitando ao máximo olhar e quando finalmente tenho coragem de ver, meu corpo derrete.

-Quanto foi Rin? – Len pergunta.

-Sessenta e um. – minha voz sai estrangulada.

-Parabéns. - o loiro diz batendo de leve em meu ombro.

Não era uma nota boa. Não era uma nota que merecia um “parabéns”. Nem oitenta ou noventa. Muito menos a um setenta. Mas era o suficiente. O suficiente para não levar reclamações ou perder algo que amo. Meus pais não me dariam o parabéns que Len me deu. Mas eles não viram o nervosismo que eu passei durante a prova e recebendo. Ele viu.

Com a nota eu estava apenas satisfeita. Mas com suas palavras eu estava feliz.

Todos estavam em pé comparando suas provas, afinal, a maioria da turma já havia recebido suas notas. Apenas Len e outras três pessoas faltavam receber. Não demorou muito até ele ser chamado e ele trouxe a prova como eu, dobrada. Ele parecia mais nervoso.

Eu não posso entende-lo de verdade. Ele não se preocupa com os estudos maior parte do tempo e agora está com medo de uma nota baixa? Mas sei o que ele vai responder se perder. Ele vai dizer que é só mais uma nota ruim. Se passar, dirá que é só uma nota boa no meio de treze ruins.

Não quero pensar muito no que ele dirá. Apenas levanto-me num impulso. Estou apreensiva com a nota dele. Quero dizer, eu não tenho que me preocupar com ele, mas ele foi legal comigo quando disse aquilo. Se eu puder fazer o mesmo por ele...

-E aí Len? Quanto? – pergunto com um sorriso forçado.

Ele abre a prova lentamente e engole seco. Depois diz meio engasgado:

-S-sessenta.

Abrimos um sorriso na mesma proporção. Estou feliz com ele. Ele não é de alcançar a média na maioria das matérias, principalmente numa matéria que exige um pouco mais de esforço.

Posso me aproveitar disso. Todos estão distraídos, é agora!

Apesar de estar gostando de Len, nunca passei do ponto de “estar por perto”. Nunca cheguei a abraça-lo ou algo do tipo. Parece coisa boba, coisa que eu deveria ter feito antes, já que abraço qualquer amigo sem pensar duas vezes, mas tenho tanta vergonha. Mas agora...agora eu posso...

-Parabéns Len!- digo pulando e entrelaçando meus braços em seu pescoço.

-Opa!- ele diz meio surpreso com o abraço e o retribui colocando as mãos em minha cintura. – Parabéns para nós!

Abraça-lo é tão...bom... O cheiro do seu perfume. A textura do seu casaco. Seus ombros largos. Seu pescoço. O fato de ter, pela primeira vez, seu corpo tão perto ao meu. Eu não quero parar com isso. É constrangedor, e, para dizer a verdade, sinto meu corpo trêmulo e arrepiado. Porém é confortável e gostoso.

-Eu pensei que eu fosse perder a batalha.- ele diz ao nos separarmos.

-Mas venceu a guerra. –digo ainda sorridente.

-Isso foi um milagre, eu nem estudei.

-Se conseguiu sessenta sem estudar, imagina estudando? Se quiser estudar comigo...bem, eu não sou boa em matérias de exatas como física, mas outras matérias tudo bem...

-Não perca seu tempo comigo Rin. Eu sou um caso perdido.

-Nada está perdido!

Eu pensei que tivesse tirado uma nota menor, não tirei.

Não está perdido.

Eu pensei que ele não fosse capaz de chegar na média.

Não está perdido.

Eu nunca imaginei que poderia abraça-lo.

Não está perdido.

...Mas...

-Len, caso você seja mesmo um caso perdido...

Se está perdido, precisa ser encontrado, certo?

-Caso você seja mesmo um caso perdido, eu vou te encontrar, certo?

-Você tem mesmo jeito com palavras. Não é a toa que é letrista no clube de música. – ele diz com uma feição que mistura surpresa à um sorriso agradável.

Eu não sei se “letrista” é a palavra certa. Sempre achei que esse fosse o termo designado para alguém que cursa Letras na universidade, ou alguém que trabalhava entalhando moldes de letras na época em que não havia máquinas de escrever e o jornal era quase todo “carimbado”. Mas por incrível que pareça, esse é o nome dado pelos meus companheiros de clube à pessoa encarregada de fazer as letras das músicas.

Eu não trabalho nas letras sozinhas, mas faço a maioria delas. Além do Clube de Música Popular que participo, nossa escola tem outros três clubes relacionados à música. A banda do colégio, que funciona como uma orquestra, o clube de coral, que consiste apenas em vozes e o clube de jazz, que como o próprio nome já diz, cuida de apenas um estilo de música.

Não gosto de me gabar, e aprecio completamente os estilos de música dos outros clubes, mas o nosso é o único que engloba todos os estilos que os outros trabalham. Trabalhamos com melodias, partituras, harmonias que a banda trabalha. Usamos e estudamos nossas vozes para chegarmos a um tom correto como o clube de coral e podemos tocar Jazz como o clube de Jazz faz.

Nós usamos mais de três ritmos específicos em nosso clube: o pop, o rock e o dance, que pode misturar os dois. Antigamente em nosso colégio, os clubes de música costumavam ter uma certa rivalidade, mas isso foi sendo superado com o tempo.

De volta à sala de aula, o fluxo da classe segue naturalmente depois das entregas das notas. Quando finalmente acaba o período de física, tento esticar minhas pernas e tirar o sorriso ridículo do meu rosto. Eu não queria que as pessoas soubessem que estava feliz por abraçar meu colega de classe. Apenas duas pessoas sabem que gosto de Len e não pretendo deixar isso escapar até que eu possa dizer a verdade à ele.

As aulas se arrastam para inglês, matemática, literatura, história... Recosto meu rosto em minha mão direita numa tentativa de manter-me acordada durante a aula mais chata do dia, mas é inevitável. Momentos depois, mesmo estando de olhos abertos, sinto a saliva descendo pelo meu braço e ouço alguém gritando ao meu lado.

Quando finalmente volto a realidade, a aula de história acaba. Já é hora do almoço e quem grita comigo é minha colega de classe Neru. De baixa estatura e longos cabelos loiros, Neru tem uma personalidade forte, e, ao contrário de seu primo Len, é bem esforçada nos estudos.

Apesar de ser um estorvo como amiga.

Quando me inscrevi nesse colégio, a única pessoa que veio comigo da minha turma do fundamental foi minha amiga Teto. Ela é minha amiga de infância e está na mesma sala que eu desde que a conheço. É uma garota tímida, quieta, que não tem nenhuma maldade no coração. Sempre da mesma altura que eu e de cabelos rosados, é a menina mais doce e medrosa que já conheci. Eu já conhecia Miku , Kaito e Gakupo do tempo do fundamental. Mesmo sendo mais velhos, eram meus amigos na antiga escola e claro que eu ia passar um tempo com eles de vez em quando. Mas sempre tive medo de deixar Teto sozinha. Ela era muito dependente de mim e não conseguia fazer amizades.

Foi aí que Neru e Haku apareceram. Elas estavam na nossa sala ano passado e logo fizeram amizade conosco. Neru muito explosiva e Haku mais calma foram o equilíbrio perfeito que encontramos. Elas reviveram o clube de literatura dessa escola e Teto se inscreveu nele. Sem mim é claro. Eu disse que queria tentar algo novo agora e com as meninas ela estava segura. Assim, Teto está com suas antologias e seus romances enquanto eu estou feliz da vida no clube de música.

Olho para a direita e vejo minhas três amigas me encarando.

-Vocês não têm jeito não é? – Neru grita.

-O que eu fiz? - pergunto ainda cansada.

-Dormindo no meio da aula sua tonta! Você e esse idiota aí atrás!

-Ah Neru, bom dia. - Len diz sonolento atrás de mim.

-Bom dia uma ova! Sai daqui! - ela ordena ao primo indicando a porta com os dedos.

-Ah, a aula já acabou? - ele pergunta.

-Sim, pelo que eu vi já faz um tempo. – respondo.

-Ah então beleza, vou ali comprar algo para comer. –ele se retira correndo, sem parecer que estava cochilando poucos segundos atrás.

É sempre assim na hora do almoço. Ele sai da sala como se lá fosse um inferno e ele tivesse que escapar de lá de qualquer jeito.

Junto-me às garotas e almoçamos na sala. Para falar a verdade, elas são as amigas perfeitas para mim. Somos diferentes em vários pontos, mas parecidas em muito mais. Não sou do tipo de garota que se preocupa com “coisas de garota”. Não gosto de andar como se fosse uma boneca, falo muitas gírias e muitas pessoas dizem que meu jeito de falar é muito masculino. Mas esse é meu jeito. Neru, Teto e Haku não são muito diferentes.

Neru gosta de videogames e tem muitas amizades masculinas, além de estar cercada de primos e ser a única garota da sua idade em sua família. Haku é a menos feminina do nosso grupo. Ano passado, no início do ano, ela vinha para escola com o uniforme masculino, pois se sentia muito desconfortável com saias. Aos poucos fomos acostumando-a com as vestimentas que cabiam nas normas da escola e sua saia é quase no tornozelo. Ela sofria muito preconceito, muitos até a chamavam de travesti. Mas ela deu uma bela de uma surra nos garotos que a intimidavam.

Por sermos um grupo incomum de garotas, nossas conversas não são nem um pouco comuns. Falamos de tudo, mas o tópico principal sempre é comida. Fico feliz de elas não serem o tipo de garotas que falam de rapazes o tempo inteiro como outras meninas. Isso seria um problema para mim agora.

Termino o almoço, ponho meus fones e ando pelo colégio, já que ainda temos meia hora livres. Eu simplesmente amo andar sem rumo ouvindo música. Às vezes, quando o ritmo da acelera eu começo a correr pelos corredores sem destino algum, como se estivesse em um videoclipe.

Mas agora eu tenho um rumo. Coloco meu celular no bolso do blazer do uniforme e ando compassadamente até as escadas que levam ao terraço. Abro a porta e recebo o vento em minha direção. Realmente, quanto mais alto, mais forte o vento.

Com uma das mãos seguro a minha saia, com a outra coloco meus cabelos atrás da orelha. Receber o vento no rosto enquanto escuto música também é muito bom. Fecho a porta e encosto-me nela. Os ventos parecem mais fracos agora. Creio que estou sozinha. Não acho solitário, apenas confortável e inspirador.

Abraço a mim mesma num ato ridículo. Depois cruzo as duas mãos sobre meu peito e sinto meu coração palpitar. O abraço de antes...era como se eu estivesse amando pela primeira vez. Começo a sentir-me tão idiota...mas é um sentimento tão agradável...

-Len-kun...- seu nome escapa dos meus lábios.

-Alguém me chamou? – sua voz sai de trás da parede.

Assusto-me de imediato. Eu jurava estar sozinha, quando viro meu corpo para o lado direito, vejo Len sentado e recostado na parede ao lado da porta, completamente camuflado com um pão de feijão e sem fones de ouvido.

Droga! Será que pensei algo mais alto? É meu fim!

-Ah Len-kun, estava lhe procurando. – digo nervosa.

-Você não costuma me chamar assim. – ele diz olhando de baixo.

-Estou só brincando com você. Mas estava realmente lhe procurando. O que está fazendo aqui?

-Esperando você.

Ele disse isso mesmo? Esperando-me? Será que ele...

-Alguma razão? – pergunto nervosa.

-Ficar lá com a Neru por perto pedindo para eu falar minha nota ia ser problemático. E eu tenho algo para lhe mostrar. Como eu sei que você sempre vem para cá, eu meio que estava lhe esperando.

-Ah então é isso? Mas a sua nota não foi ruim. – digo sentando-me ao seu lado.

-É, mas a dela com certeza foi maior e ela ia ficar se gabando.

-Ora se não quer que ela reclame estude! – digo dando-lhe um peteleco na testa.

-Está parecendo ela. Enfim, deixa pra lá. Você gosta de bandas europeias?

-Gosto, por quê?

-Coloca os fones e escuta essa música.

Coloco os fones. Fico com o esquerdo e entrego-lhe o direito. É assim desde que começamos a ficar amigos. Costumamos ficar muito assim na sala, um ao lado do outro ouvindo músicas ou vendo videoclipes e comentando sobre eles. Eu realmente gosto disso. Eu fico tão perto dele. É ótimo.

Ele vai comentando sobre a música e eu fico dividida em escutá-lo ou escutar a própria melodia. Até que o som desacelera e o movimento parece mais lento. Sinto que está perto de acabar. Quando finalmente termina, ele muda para outra, dessa vez algo parecido com R&B.

-Você muda de Heavy Metal para R&B. O quão eclético você consegue ser?

-Mas você também é assim Rin, gosta dos dois ritmos, não gosta?

-Gosto. Acho que se eu ficar escutando apenas um estilo, vou acabar enjoando. Mas muita gente pensa o contrário.

-Eu penso da mesma forma que você.

Não é a primeira vez que me apaixono, mas me sinto tão boba com isso que é como se fosse. Em resposta ao que Len me diz, encosto minha cabeça em seu ombro e digo:

-Ainda bem que pensa...

Talvez ele tenha achado estranho o abraço e esse gesto agora, mas eu realmente quero que ele pense isso e acabe descobrindo. Assim eu não preciso contar. Eu realmente tenho muita vergonha para contar.

Quando meus batimentos finalmente se normalizam, ele quebra o silêncio declarado por nós para apreciarmos a música.

-Ei Rin, posso te perguntar uma coisa?

...

Continua.


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