Gaia sabia antes mesmo de abrir os seus olhos que ela estava deitada sobre a cama do arcanjo que era responsável pela humanidade. E era ainda mais ciente de que o mesmo estava presente no quarto sem ao menos precisar vê-lo ou sentir sua alma agitada por causa das sombras negras que tentavam arrancá-lo do seu controle.

A imortal sabia que tudo isso aconteceria mesmo antes de chamá-lo para pedir ajuda e era obvio que ela não podia ficar deitada naquele chão até que se sentisse melhor para voltar pra mansão de Dimitrius desde que outro poderia tê-la encontrado e terminado o trabalho de Argent. Então Gaia compreendia muito bem que teria que lidar com um arcanjo muito furioso que teve a sua esposa agredida por um desconhecido.

Ela abriu seus olhos e procurou por Dimitrius pelo quarto até que o achou próximo de sua janela observando o dia que existia do lado de fora por um pequeno vão que tinha aberto nas suas cortinas escuras. Sua postura era calma apesar de existir certa tensão em seu corpo, mas nada a deixou mais surpeendida quando o anjo encontrou seu olhar e não viu as sombras que deveriam estar presentes em seus olhos.

Gaia tentou se mexer para se sentar na cama, mas no momento em que fez um leve movimento, todo o seu corpo protestou pela dor. A imortal decidiu que continuaria na mesma posição, pois não pretendia ter todo os seus hematomas doloridos apenas por um capricho.

Ela também tinha desejado se olhar em um espelho para ver a situação em que se encontrava, mas desistiu de todas as suas opções quando até mesmo o roçar de suas roupas contra os machucados lhe causavam dor.

A única coisa que a deixava conformada em relação à ser espancada era que já havia se encontrado em situações piores e sem ninguém para para ajudá-la.

Agora ela tinha Dimitrius.

O anjo em questão se aproximou da cama e se sentou em uma enorme poltrona que havia sido colocada ao lado da cama. Gaia acompanhou seus movimentos com seus olhos e se manteve calada, esperando que Dimitrius começasse todo o seu questionário para descobrir quem era o responsável por deixá-la naquele estado.

— Eu costumava pensar que Ellylan era uma esposa problemática,— Ele disse em um tom que possuía certa ironia.— Mas agora acredito que você consegue superá-la.—

Gaia teve vontade de rir por um momento e não tinha dúvidas que isso aconteceria se seus lábios não estivessem machucados. Essa, certamente, não era a primeira frases que damas espancadas costumavam ouvir quando despertavam. Contudo, era algo que combinava perfeitamente com Dimitrius e o seu humor negro.

Naquele momento a imortal sabia que o arcanjo estava a provocando para distraí-la dos seus medos.

— Ellylan e eu não fomos educadas para nos casar com arcanjos.— E isso era um fato que não podia ser negado, pois nenhuma das duas haviam crescido em meio desse mundo em que cada angelical era criada e educada para chamar a atenção dos imperadores para se casarem com eles.
— Meridius foi o único com sorte o suficiente, você não acha?— Ele perguntou

Que alguém conseguisse passar por todas as barreiras frias e se apaixonar pelo arcanjo do paraíso já era para ser considerado como muita sorte, mas Gaia não falaria em voz alta desde que não pretendia ofender o irmão mais velho dos arcanjos.

— Você esta livre para procurar outra mulher.— Ela murmuriou e não gostou muito da ideia de Dimitrius com outra mulher. No final de tudo, a imortal também parecia não gostar de traições.
— Eu acredito que você já me da problemas suficientes para me dar ao luxo de encontrar uma amante, Gaia.— O anjo disse com um riso amargo.— Muitos problemas.— Ele falou de forma séria suas ultimas palavras e ela sabia que aquele era o momento em que falariam sobre sua situação.

Gaia desviou seus olhos do arcanjo e encarou o teto para não ter que ver os seus olhos enquanto evitava as suas perguntas.

— Dimitrius, eu...—
— Pare.— Ele a cortou.— Não importa o quanto eu pergunte, você não irá revelar um nome, não é mesmo?—
— Não.— Ela foi sincera.
— Por que não?—

Por que a família estava a cima de tudo, sua mente gritou como resposta.

E todos sabiam que Argent e Dimitrius eram próximos.

A ideia de que o arcanjo da humanidade fizesse o mesmo que Phillip era algo que Gaia não estava pronta para lidar.

Gaia amou o antigo arcanjo e confiou nele com toda a sua vida, mesmo assim ele havia a traído e a entregue nas mãos de um crapúla. A imortal não amava Dimitrius e nem confiava nele, como poderia dizer tão fácilmente seus segredos?

— Eu não consigo.— Sussurrou por fim.
— Por hora eu não a obrigarei a dizer nada.— Ele disse em um tom que continha a sua ira em controle.— Mas eu irei descobrir quem foi o responsável e o matarei lentamente, Gaia.—
— Não mate ninguém por minha causa, Dimitrius.—
— Então não deixe que ninguém a machuque.— Ele rebateu.— Peça por minha ajuda antes de ser espancada ou use seus poderes mesmo que o inferno se abra a baixo dos nossos pés por causa das malditas consequências da natureza, mas não deixe que a maltratem como se fosse inferior.—

Dimitrius tinha inclinado seu corpo para frente com a intenção de ficar mais próximo enquanto falava e foi impossivel para Gaia manter seus olhos presos no teto.

— Não me deixe desesperado novamente, Gaia.—
— Me desculpe.— Ela disse enquanto mantinha seus olhos fixos nos de Dimitrius.— Eu não queria incomodá-lo.—

O rosto do imperador se suavizou depois das suas palavras sinceras.

— Ah, gatinha, por que você se despreza tanto?— Ele sussurrou e levou uma das suas mãos até o rosto da imortal para acariciar a sua bochecha com o dorso dos seus dedos. Ele tomou cuidado para não esbarrar em nenhum dos machucados que estava próximo e Gaia apreciou seu cuidado.— Você não é mais um problema. Nunca duvide em que me chamar todas as vezes precisar de ajuda.—

Ela desviou seus olhos quando não conseguiu mais suportar manter o olhar fixo com os do arcanjo sentado ao seu lado. Gaia olhou em direção da lareira e sua atenção foi completamente presa à xícara que estava cheia de margaridas em cima da pedra escura que a cortanava em um detalhe refinado.

E para a surpresa da imortal, as margaridas continuavam vivas e lindas.

A filha dos elementos não sabia ao certo o que Dimitrius faria com o seu presente, mas também não imaginava que encontraria as flores em seu quarto em um bom estado.

— Deixe-me adivinhar.— O anjo voltou a falar e retirou sua mão do rosto dela.— Você não esperava que eu tivesse guardado o seu presente.—
— Não esperava.— Ela concordou.
— Gatinha.— Dimitrius a chamou por aquele apelido irritante para que a imortal voltasse a olhá-lo e ela encontrou aqueles olhos escuros como o arcanjo desejava.— Vamos nos conhecer.—

Essa era uma proposta perigosa e que devia ser negada para o seu próprio bem.

Mas ela não tinha opções.

O futuro estava mais próximo do que todos imaginavam e a imortal já não podia mais se manter afastada dele.

— Eu vi o futuro, Dimitrius.— Ela foi sincera com o arcanjo desde que não tinha outra saída.— Se nós não produzirmos um herdeiro logo... Tudo será destruído. A filha de Maximus não sera o suficiente para controlar tudo o que está destinado a acontecer.—

Seja qual fosse suas razões para não querer se aproximar de Dimitrius, elas tinham que ser esquecidas. Fosse seu medo de se apaixonar, como o futuro dizia, ou para não despertar os seus piores pesadelos por causa de Gregory, Gaia teria que superar tudo.

— Não se preocupe com o futuro agora, Gaia.— Ele disse.— Você não está em disposição para lidar com isso no momento.—

Ele tinha razão. Gaia não estava pronta para lidar com o que os anciões desejavam, mas o futuro era muito assustador para que suas prioridades estivessem em primeiro lugar.

Naquele momento ela não insistiria sobre o assunto com Dimitrius, pois dúvidava que resolveria algo quando Argent quase havia a matado, se fosse possível, com os seus golpes.

— Dimitrius,— A imortal chamou por seu nome para captar sua atenção quando o arcanjo ameaçou se mover. Por mais estranho que fosse, ela não queria que ele a deixasse sozinha naquele quarto tão grande e escuro. E para mantê-lo onde estava, Gaia não se importava em perguntar sobre as suas dúvidas da relação deles.— Quando o momento chegar... Vai me machucar?—

Gregory havia a machucado de maneira quase mortal quando abusou do seu corpo inocente e como Gaia não tinha tido outras experiencias, ela não fazia ideia se sentiria o mesmo quando Dimitrius a tocasse. A imortal sabia que as pessoas desfrutavam do ato, mas... Talvez Gregory tivesse a danificado.

A ideia de ter que passar pelo mesmo novamente era algo que a assustava.

Os lábios do arcanjo ao seu lado se curvaram em um pequeno sorriso e seus olhos escuros se tornaram calmos como o mar durante uma noite de verão.

— Não.— Ele respondeu sua pergunta como se tivesse certeza.— Eu me certificarei de que você não sinta nenhuma dor, Gaia.—

A imortal esperava gostar do ato íntimo da mesma maneira que havia gostado de beijá-lo. Se tudo fosse tão simples como ter beijado Dimitrius, ela estaria agradecida e menos assustada quando o momento chegasse.

E esse momento tinha que acontecer logo, pois o tempo não existia mais para ninguém.

No futuro, a magia do demônio se tornaria maior do que o poder dos arcanjos e apenas os futuros herdeiros, com genes misturados com os de outras criaturas imortais, podiam parar com a destruição que abalaria todo o mundo.