UM MOTIVO PARA SORRIR - Express Especial de Natal escrita por Serena Bin


Capítulo 2
Parte 2


Notas iniciais do capítulo

Olá tributos.
Aqui está a parte dois. Eu havia dito que seriam somente duas partes, mas o capitulo ficou muuuuuuuito grande e então resolvi dividi-lo e criar um bônus.
Desde já quero agradecer aos comentarios do primeiro capitulo. As gatézimas Stephanie e Rain e ao Amauri Filhos. Voces são demais :)
Esse capítulo é de voces! Espero que gostem.
Boa leitura.
p.s: O Bônus eu posto ainda hoje, bjinhus.



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Há uma única lembrança natalina boa de minha infância da qual me lembro.

Eu tinha por volta dos quatro ou cinco anos e Prim ainda era um bebê.

Me lembro de minha mãe preocupada com meu pai que ainda não voltara da rua. Recordo dessa mesma inquietação que me acomete agora no rosto dela.

Era época de inverno, onde naturalmente a produção de carvão se intensificava nas minas. Recordo de na noite anterior , meu pai dizendo que talvez não poderia estar conosco naquele natal. Então, minha mãe, mesmo triste pela falta de meu pai, ainda sim preparara para mim e para Prim uma sopa, que de alguma forma seria nossa ceia. Conformadas de que aquela seria apenas uma noite comum, nos deitamos e adormecemos.

Mas próximo à meia noite, ouvimos passos na neve fofa, e então um farfalhar nos sinos da porta. Era como se o rosto de minha mãe resplandecesse na escuridão. Um brilho diferente. Incompreensível para mim naquela época mas que hoje se encontra fazendo sentido.

Meu pai havia voltado para casa. Ele havia voltado a tempo.

Essa é a melhor lembrança que tenho do Natal. Meu pai aparecendo de surpresa, quando ninguém mais o esperava.

Essa memória, pequena e singela de alguma forma perpetuou-se em minha mente e mesmo depois de todos os sofrimentos que passei, ela ainda se mantem viva e agora retorna do mais profundo de meu ser para me lembrar que a mesma felicidade que senti naquela noite ainda pode ser sentida em meu coração, que embora quebrado ainda é capaz de se aquecer diante de um gesto simples, diante de uma presença singular, diante dele.

– Feliz Natal. - Peeta me encara com leveza, embora seu olhar ainda não seja capaz de mirar em mim.

Eu o respondo com a minha melhor voz de gentileza, porque estou realmente sentindo que essa noite está superando as minha expectativas, e como a visita de meu pai, Peeta está sendo um presente.

– Haymitch não vai entrar? - Sarah grita da cozinha mas então percebe o real convidado e disfarça um olhar maroto em minha direção. Como se quizesse dizer a mim que entende a expressão quase entusiasmada em meu rosto, o que faz com que minhas bochechas comecem a pegar fogo. Tenho certeza que estou corada - Peeta! Que surpresa, entre.

Adentramos pela casa e Greasy Sae o cumprimenta alegremente em seguida inicia uma conversa sobre suas sobremesas, que alias devem estar divinamente deliciosas. Torta de nozes e caramelo além de algo que combina suspiros aerados com frutas - uma sobremesa que agora olhando de perto reconheço.

Trata-se da Pavlov, um doce que Prim e eu vivíamos a salivar pelas vitrines da extinta padaria Mellark.

– Vamos nos sentar? - convida Greasy - Acho que agora não falta mais ninguém.

A ceia prossegue. Eu não estou comendo porque ainda estou sem fome, então detenho-me em prestar a atenção nas conversas ao redor da mesa. Assuntos sem nada especial. Temas como o frio e a belissima decoração da árvore de Sarah enchem a sala. Eventualmente capto um elogio dirigido a mim, mas não agradeço porque realmente não fiz nada para que essa ocasião fosse possível, alias não fosse Sarah e seu entusiasmo natalino, eu estaria dormindo ou gritando a uma hora dessas.

– Vamos fazer um brinde. - Sarah sugere levantando sua taça.

– Vamos brindar com suco de laranja? - replica Greasy Sae com uma voz de dúvida - Afinal, não seria mais apropriado brindar com vinho ou alguma coisa alcoolica?

– Sim, vovó - responde Sarah com paciência - Entretanto, Katniss não pode beber por causa dos remédios; a senhora, porque fica muito empolgada e eu, ainda não posso comprar vinho- pelo menos não de forma legalizada - sobra Peeta, que talvez queira brindar com algum licor restante do antigo estoque de Haymitch.

Todos caímos na risada então Peeta conclui.

– Não, tudo bem. De qualquer forma nenhum de nós pode beber mesmo. O que vale é a intensão.

Levantamos nossas taças para o alto então Greasy pergunta:

– A que exatamente vamos brindar?
Alguns instantes se passam ate que uma resposta se forme.

– À vida - Sarah levanta a voz.

Parece cômico e até um tanto idiota. A apenas algumas horas atras eu estava imersa em minha dor, sendo engolida pela tristeza e então algumas luzes nas janelas, um pinheiro na sala, uma mesa farta, algumas pessoas boas e aqui estou eu. Brindando.

Não só brindando, mas celebrando a vida. Algo tão escasso em minha existencia, sim porque, eu existo, mas não vivo. A meses não sei o que é viver e hoje no entanto tenho em algum lugar do meu ser, pela primeira vez, uma pontinha de simpatia por esse bem tão precioso e tão frágil que é o motivo desse brinde.

– À vida! - um coro de vozes se levanta.

Uma família ou pelo menos algo próximo a isso. Estão todos rindo e falando alto, a velha alegria da noite de Natal. Uma alegria da qual eu sempre ouvira falar mas jamais imaginava que poderia de fato de real. Aliás, eu vi resquícios dessa animação só em um lugar, um lugar na qual ironicamente só trouxe dor e angustia para todos aqui presentes: a Capital.

Então eu me pergunto como podem se reerguer tão rápido, uma vez que eu mesma depois de remedios e longas sessões de análise continuo presa ao fundo do poço?

É inevitável pensar nisso. Talvez nem Sarah nem Greasy Sae tenham tido uma grande quantidade de sofrimento afinal de contas, então em dado momento eu olho para Peeta- o único que sofreu a guerra até as piores consequências - e observo o modo como ele ri timidamente. Apesar de toda sua situação - tratamento pelo telesequestro, a falta da família, os pesadelos que eu sei que ele tem, as eventuais crises - ainda sim ele é capaz de sustentar um riso solto. Uma expressão calma e acolhedora, traços marcantes de uma pessoa insubstituível.

É como se todos aqui fossem uma fênix, algo que renasce mesmo depois da morte. Peeta é claramente superior quando se trata de lidar com as perdas. É então que percebo como eles conseguem; relembro o monólogo de Sarah dizendo que eu deveria sair desse luto, que eu deveria reagir. Eles, apesar das perdas estão vivendo.

Nós brindamos e quando terminamos o ato há risadas, todos olham para todos, o que faz com que por uma fração de segundo eu perceba Peeta me olhando pelo canto do olho. Não um olhar raivoso ou de dúvida, mas um olhar comum.

– Vamos para a sobremesa? - Peeta sugere depois de algum tempo e todos concordam.

Eu me levanto e vou em direção à cozinha, sento-me em um banco e fico ali. Quieta em meio a penumbra.

Não sei explicar, mas a estranha sensação de felicidade está sumindo. É como se eu estivesse sonhando e agora tivesse despertado. Sinto o frio que vem por entre a abertura na porta por onde Buttercup escapa. Eu debruço sobre a mesa na tentativa de me acalmar.

De repente sou surpreendida por mãos em meu ombro. Um toque tão leve e gentil.

– Sarah - digo - Eu não estou com fome agora.

– Pavlov é seu doce favorito. Real ou não real?

Real.

A pergunta me faz voltar ao dia em que eu estava estava com o pé quebrado e Peeta levara essa mesma sobremesa para mim. Lembro-me do gosto suave e aveludado do crocante branco combinado ao adocicado das frutas da estação.

É como se eu estive de volta àquela ocasião, onde Peeta me oferecia o doce, e eu admitia ser a coisa mais maravilhosa da terra.De alguma forma ele se lembrou disso. Desse pequeno fragmento e o trouxe a tona. Levanto o olhar e o percebo ao meu lado. Com o olhar fixo na mesa e com um prato de sobremesa na mão. É quase imediato quando respondo.

– Real.

Ele sorri levemente e se senta ao meu lado na mesa. É estranho estar tão perto dele depois que toda a história de guerra e amantes desafortunados acabou.
Sentir sua presença é sempre uma forma confortante para mim, de modo que me sinto melhor quando o sinto perto.

Peeta estende a sobremesa para mim e eu a aceito, demoro um pouco até dar a primeira colherada porque eu realmente estou sem fome, mas eu não quero que ele pense que estou fazendo desfeita, então eu como um pedaço do doce e quando ele volta a se juntar com os outros na sala enfio toda a porção na boca.
São quase duas da manhã quando sou convidada a me juntar com os outros na sala.

– Hora dos presentes! - Sarah diz entusiasmada.

– Presentes? - Greasy questiona arregalando os olhos - Eu não trouxe nenhum presente!

– Não se preocupe - responde Sarah - Eu dei um jeitinho e comprei presentes para todos.

Os olhos de Sarah brilham ao entregar cada pacote. Um suéter de lã verdadeira para Greasy e até mesmo Buttercup é agraciado com uma bela bola macia.

– Esse é seu Peeta. - Sarah diz entregando-lhe um embrulho. Peeta recusa num primeiro momento dizendo que não trouxe nenhum presente para retribuir, mas acaba aceitando diante da insistencia da neta de Greasy Sae.

– Oh! - diz Peeta surpreso diante do presente. Trata-se de um jogo de pincéis com cerdas de crina de cavalo. Algo que julgo ter custado uma pequena fortuna - São maravilhosos, obrigado Sarah.

– E esse é seu, Katniss - As mãos de Sarah estendem uma caixa pequena com um enorme laço brilhante em minha direção - Espero que goste, nem pense em dizer que não aceita.

Eu aceito, é claro que sim.

Com minhas mãos hesitantes desfaço o laço e rasgo o papel de presente. Imagino o que possa estar em um embrulho tão pequeno. Sarah nunca me presenteou antes, talvez seja uma peça de roupa sofisticada que nunca usarei, ou talvez uma pulseira chamativa, as possibilidades são muitas. Mas em vez disso sou surpreendida ao abrir a pequena caixinha e encontrar dentro dela, aquilo que tenho tentado evitar a todo custo. Lembranças.

É um porta retrato. Dourado com detalhes brilhantes mas é a fotografia presa a ele que me encanta.

É impressionante como tal fotografia me reporta à muitas lembranças, mas essas são boas. Um dos raros momentos em que estou sorrindo depois que voltei ao distrito.

Me lembro muito bem de Prim, minha mãe,Gale e até mesmo Sarah e Greasy na estação de trem no dia em que Peeta e eu voltamos da Turnê da Vitória.

Prim estava tão alegre em me ver, e eu também estava aliviada por finalmente estar de volta. Haviam fotógrafos por todos os lados, era impossivel escapar dos flashs. Mas foi Leevy e sua pequena câmera quem fez a única foto desejada daquele dia.

Foi ali, em frente a estação.

Effie com seus cabelos dourados, Haymitch um pouco sóbrio, Cinna, Portia, Peeta e eu lado a lado - não como um casal como era de costume ser-mos fotografados, mas como amigos que estávamos tentando ser na época - Prim ao meu lado, minha mãe ao lado de Prim e então Gale. Uma recordação de um dia que fora realmente feliz.

É inevitável conter a lágrima que se forma em meu olho. Imediatamente pingos cobrem o vidro do porta-retrato. É como se eu pudesse reviver aquele dia. Sentir o cheiro doce dos cabelos de Prim, o abraço apertado de minha mãe, o sorriso despretensioso de Cinna.

É como se fosse-mos uma enorme família.

– Katniss, - inicia Sarah me amparando - Está chorando? Não era pra chorar, desculpe, eu não queria deixa-la mais triste...
Antes que Sarah termine a frase eu a interrompo, porque não posso deixar passar.

– Obrigada - sussurro entre o choro, eu olho para Sarah e acompanho seus olhos castanhos marejarem pelas lágrimas - Muito obrigada.

– Essa fotografia... - Peeta entra na conversa - Foi tirada no dia em que voltamos ao 12. Real ou não real?

– Real - respondo agora olhando em seus olhos - Voce se lembra?

– Sim, embora vagamente.

Eu volto a agradecer a Sarah por sua imensa gentileza e delicadeza.

Encontrou em algum lugar inóspito um resquício de um dia em que eu estava feliz, e fez nascer em meu coração, pela primeira vez em meses um sintoma de alegria.

Já passa das quatro da manhã quando Sarah e Greasy Sae se recolhem. Eu ofereço-lhes minha casa para passarem a noite porque é perigoso duas mulheres andando pelo distrito a essa hora e porque está nevando muito. Elas aceitam sem mais.

Peeta também se levanta para ir para casa. Mais uma vez a vontade imensa de lhe dizer algo me domina.

– Obrigada por vir - digo em pé ao lado da porta. Eu olho para ele tentando captar algo de seu olhar, mas Peeta parece não conseguir fixar os olhos em mim e entendo que isso seja um dos efeitos colaterais do telesequestro. Talvez tenha substituído o ódio mortal por indiferença. Já é um progresso, doloroso, mas ainda promissor.

Demora algum tempo até ele falar.

– De nada. Foi legal estar aqui.

A conversa morre ali e eu não forço nada, porque eu não sei o que dizer e porque estou me sentindo cansada. Nos despedimos da forma mais cordial possível. Quando a porta se fecha isolando-me dele, eu sinto que hoje foi um dia bom.


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Notas finais do capítulo

Obrigada por ler. Que tal deixar um comentario? Seria mega ultra super legal saber que voce achou do capítulo. Vai lá é de graça e nem machuca a mão. :)