Bichinhos .

Quando eu era pequena, eu tinha um cachorro. Era um dinamarquês marrom, grande e ele usava uma coleira azul com o telefone lá de casa e o nome dele. Como eu era muito neném pra dar o nome, meu irmão mais velho deu. O nome do meu cachorro então era Cliff.

Um dia, eu voltei da escola e Cliff estava morto. Eu não entendi nada daquilo, mas chorei por três dias seguidos. Então pensei comigo mesma, vale a pena ter um bichinho? Ele vai morrer e a gente vai sofrer. Depois dessa conclusão, decidi nunca mais ter um bichinho, mas sempre gostei deles e admirava quem tinha.

Semana passada, caminhava sozinha pela rua, caçando coco de totó no chão, pois não queria estragar meus lindos sapatos novos que me custaram uma fortuna. Brincadeira, comprei um Xanel lá na 25 de Março. Não sabia se iriam notar, mas com meu salário de Jornalista, mesmo que notassem, acho que não comentariam nada... Pelo menos não na minha frente.
Enfim, quando olhei pra cima, me distrai olhando alguém que parecia ter intenção de se matar do terceiro andar de um prédio. Enquanto me perguntava se alguém realmente conseguiria se matar apenas do terceiro andar ou se apenas quebraria três costelas e as pernas, tropecei numa caixa e cai estatelada no chão. Todos me olhavam com preocupação, mas a maioria apenas ria. Meu salto saiu voando pela rua e a minha bolsa foi na direção oposta.

Esbocei um sorriso para meus espectadores, indicando que estava tudo bem e que o sangue que escorria do meu braço era maquiagem. Bufando e xingando mentalmente, me estiquei para pegar minha bolsa no chão. Viva, ninguém roubou ela. Acho que até o pior ladrão teria pena de mim naquela situação. Olhei meu sapato e dei ele por morto, nem valia consertar. Aproveitando a chance, dei o dia por perdido. Me levantei e fiz questão de ver no que havia tropeçado.

Dentro da caixa, tinha um gatinho. Sim, um gatinho lindo e fofo. Um filhote de gato. Ninguém resistiria. Nem eu. Bati na porta da casa onde a caixa estava e recebi uma resposta mal encarada e direta. A dona me mandou passear e levar a "divida peluda comigo". Que escolha eu tinha, abandona-lo a morte? Olhei pra ele e disse que era arriscado, eu era solteira e morava sozinha, não queria virar uma dessas... Obcecadas... Tenho até nojo de pensar. Ele piscou os olhos pra mim e miou.

Ah, que se dane, pensei. Em seguida chamei um taxi, afinal, chegar em casa mancando iria me fazer ter dor na coluna pra sempre. Enfim, agora eu tinha um gatinho. Comprei uma coleira azul pra ele e lhe dei o nome Cliff. Lindo, já estava começando de forma sentimental. Cliff era independente e fofo. Minhas amigas gostavam dele, meus casos de uma noite não se incomodavam com ele. A comida dele e sua caixinha ficavam na área de serviço e ele dormia na sala. Ante-ontem, minha sobrinha me pediu Cliff de aniversario. Eu já havia me apegado, mas aceitei. Então lá fui eu, no aniversario temático das Super-Poderosas, com um gatinho no colo. Ele ficou feliz, minha sobrinha ficou feliz, meu irmão não ficou feliz e sua esposa ficou no meio termo. A única coisa ruim da festa foi o bolo. E as crianças. E o palhaço que flertava comigo. Ew. Mandei ele pra merda durante o parabéns.

Hoje, voltei do trabalho e me senti solitária. Sem meu gatinho pra me esperar. Esse pensamento me deixou apavorada então, decidi comprar um peixe. Ah, um peixe, isso sim. Ele fica nadando e me ignora, perfeio. Assim posso ignoralo também sem culpa.

Três dias depois, a pequenaa dona de Cliff o levou para um almoço na casa da Fernanda. Elas comeram peixe empanado. Cliff comeu sushi.