Guardados A Sete Chaves escrita por Jiinga


Capítulo 2
Elite




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Lena observou o prédio da elite através do vidro fumê do carro. Tratava-se de um complexo branco com cinco andares e uma porta automática de vidro na entrada.

O carro parou, o que significava que ela teria que descer. Lena não queria descer. Sair daquele carro era como admitir que o ano letivo havia começado. Ela não queria estar ali. Fazer parte da LATT significava estudar o tempo todo. Infelizmente, sua mãe havia obrigado-a a se inscrever e é claro que ela havia passado. Maldita memória fotográfica.

– Se cuida, ok? – disse sua mãe.

Ela assentiu e desceu do carro, desequilibrando-se ao pousar no chão. Sua mãe tinha mania de flutuar o carro alto demais. Caminhou pela calçada perfeitamente lisa e, quando pisou na plataforma de metal na entrada do complexo branco, as portas se abriram.

O andar térreo era composto por uma simples recepção com quatro elevadores panorâmicos atrás de um balcão de metal. Sentada atrás do balcão estava uma mulher pálida de cabelo violeta, preso num coque alto.

– Boa tarde. – disse Lena, aproximando-se da recepcionista.

– Boa tarde. E você seria?

– Lena. Lena Mason.

– Ah, a garota da memória fotográfica! Número um da elite, que responsabilidade, hein?

Lena suspirou. Ótimo, era assim que ela passaria a ser conhecida de agora em diante. A secretária digitou alguma coisa em seu computador e entregou um cartão preso a uma correia roxa a Lena.

– Esse cartão te dá acesso ao elevador da esquerda. Ele vai até o primeiro andar, o andar do primeiro ano. – a secretária piscou sugestivamente.

– Valeu. – ela pegou o cartão e passou-o ao lado do elevador determinado. As portas se abriram automaticamente e ela entrou. Não havia botões, as portas simplesmente se fecharam e o elevador começou a subir. Através do vidro, podia-se ver o enorme campo verde que se estendia por quilômetros, mas que Lena sabia ser artificial. Nada tão seguro assim podia ser natural.

As portas se abriram novamente, dando lugar à sala de estar da elite do primeiro ano. Havia três sofás laranjas que pareciam muito confortáveis, um tapete de pele de urso polar e uma TV que ficava em cima da lareira de metal. Do outro lado, ficava uma porta para a sacada, coberta por persianas prateadas. Havia também uma cozinha americana em tons de branco e roxo, separada da sala por um balcão que podia servir de mesa. A porta da geladeira estava aberta e atrás dela havia uma garota loira de rabo de cavalo, que se inclinou para trás quando Lena saiu do elevador.

– Oi! – a garota exclamou.

– Oi... Er... Eu sou a Lena.

– Ah, você é a garota do quarto da frente! – a loira exclamou e Lena não entendeu o que ela quis dizer – Muito prazer. Meu nome é Astrid. Fique à vontade, aí!

– Alguém mais já chegou?

– Um garoto japonês, mas está trancado no quarto dele.

– Entendo. Bem, eu vou pro meu quarto, também.

– Tudo bem, a gente se vê mais tarde. – Astrid se curvou novamente para dentro da geladeira.

Lena caminhou pelo corredor à direita. Havia quatro portas automáticas de metal, cada uma com uma plaquinha com um nome escrito: Joana Fletcher, Clarisse Le Blanc, Astrid Coates e Lena Mason. Lena apertou o botão ao lado de sua porta e ela abriu automaticamente.

Havia uma cama de casal com cobertores roxos em uma das paredes, uma penteadeira eletrônica na outra, ao lado de uma TV na parede, levemente menor que a da sala. Havia também uma porta para um closet eletrônico, um banheiro particular e uma janela automática. As paredes eram completamente brancas, mas ela havia lido no manual de regras que podia decorá-las como bem quisesse. Lena suspirou. Teria tempo para decorar tudo mais tarde.

Deitou-se em sua cama, sem a menor vontade de desfazer as malas que haviam sido entregues na noite anterior, e não demorou a pegar no sono.

***

A primeira vez em que Bree havia sentido aquela pontada no peito havia sido há três meses. Na época, ela estava jogando baseball na aula de educação física. Seus amigos e a professora levaram-na à enfermaria, mas ninguém descobriu o que ela tinha. A dor havia passado e ela quase havia esquecido esse episódio.

Porém, ali estava ela agora, curvando-se sobre sua nova cama, apertando o cobertor com toda a força que tinha, acabando com as unhas recém-pintadas. A dor era tanta que Bree mal conseguia respirar.

“Não”, pensou. Ela não ia deixar isso acabar com seu primeiro dia na LATT. Ela havia lutado muito para chegar ali.

Bree fechou os olhos e se concentrou. Ela respirou de pouco em pouco, tentando não levantar e abaixar muito o peito. Aos poucos, a dor foi passando, e Bree se recompôs bem no momento em que bateram em sua porta.

– Pode entrar.

A porta abriu, revelando uma garota pálida, de cabelos pretos e lisos na altura do ombro.

– Oi, eu sou a Meg, sua vizinha de quarto.

– Ah, oi, meu nome é Bree.

– Eu sei. – ela sorriu – Estamos fazendo uma reuniãozinha na sala de estar. Se quiser, pode ir lá.

– Ah, valeu! Pode deixar, vou.

Meg assentiu e se retirou.

Bree apertou o botão verde que fechava a porta e em seguida, o vermelho que a trancava. Foi até o banheiro e olhou-se no espelho. Ela estava exatamente igual, não havia nenhum sinal do que havia acabado de acontecer. Respirou fundo, lavou o rosto e foi para a reunião.

Já havia anoitecido, então as luzes da sala estavam acesas. Em um dos sofás laranjas estavam sentadas duas garotas morenas, uma mais alta que a outra. Meg estava sentada em um outro sofá com uma garota loira e havia um garoto japonês sentado no chão.

– Boa noite. – disse Bree e todos se viraram para ela – Eu sou a Bree.

– É a última. – disse Meg, virando-se para a garota loira.

– Ótimo. Prazer, Bree. Bom, pessoal, meu nome é Astrid e eu vim pra cá por minhas habilidades médicas. Eu resolvi fazer essa reunião pra nos conhecermos logo, sabe? Vamos passar os próximos quatro anos juntos. Então acho que todo mundo devia se apresentar.

– Meu nome é Meg. – Meg apressou-se em dizer – Vim pra cá por minhas habilidades de dança.

– Clarisse. – disse a garota morena mais baixa – Vim pra cá por minhas habilidades esportivas.

– Lena. – disse a outra garota morena – Memória fotográfica e notas boas.

– Eu desenho bem, acho – disse o garoto – Ah, e meu nome é Giichi.

– Como? – perguntou Bree.

– Gii-chi. G-i-i-c-h-i. – ele soletrou.

– É complicado demais. Voto por chamarmos você de G. – sugeriu Bree, divertindo-se. “G.” revirou os olhos e as garotas riram – Deixe-me adivinhar. Um, quatro, cinco, seis e sete. – ela disse, apontando respectivamente para Lena, Clarisse, Meg, Astrid e G. – E eu fiquei em segundo.

Todos a encararam, pasmos. G. foi o primeiro a falar:

– Como você sabe?

Bree apontou para si mesma.

– Incrível habilidade de raciocínio lógico e investigação.

– Onde está a pessoa que ficou em terceiro? – foi Lena quem perguntou. Por algum motivo todos olharam para Astrid. Ela parecia saber de tudo que acontecia ali.

– Não sei. – Astrid respondeu – Ela deve ter se atrasado ou algo assim.

– Então, o que faremos pra passar o tempo? – perguntou Meg.

– Não é óbvio? – perguntou G. e todas olharam para ele. G. se levantou, tocou a porta automática de um armário, que se abriu, e tirou seis óculos de realidade virtual de lá.

Eles jogaram Warriors of Uranus até muito tarde. Em algum momento entre uma fase e outra, G. resolveu fazer o jantar e acabou sendo muito melhor do que qualquer comida automática que conseguiriam por ali. Eles comeram sentados nos bancos ao redor do balcão, ignorando o banco vazio ao lado de Clarisse.

Já haviam passado várias horas do dia seguinte quando todos resolveram ir dormir.

***

Lena olhou através da janela o topo dos prédios passando conforme o carro descia a rua elevada. Eles estavam dando a volta em um prédio com o nome em neon no topo, que ela não conseguia ver e, conforme desciam, Lena deduziu que era pra lá que estavam indo.

Ela olhou para o lado e se deparou com uma garota morena. A garota estava chorando e tentou disfarçar quando percebeu que Lena estava olhando.

– Você tá bem? – Lena perguntou e só então percebeu que também estava chorando, talvez mais que a outra garota.

– Quando foi que as coisas chegaram a esse ponto, Lena? Eu só... Queria que todos estivessem aqui. – Lena sentiu seu estômago se revirar quando a garota disse isso e chegou a cogitar abrir a janela do carro e vomitar para fora – Aliás, sinto muito pela sua mãe.

O coração de Lena deu um salto dolorido e, por algum motivo, ela olhou para suas mãos. Elas estavam sujas com um líquido vermelho que já estava secando e, na palma de uma delas, estava o moleskine de sua mãe. O moleskine que sua mãe nunca largava.

Lena acordou num salto e suprimiu um grito. Ela estava suando, tremendo e arfando. Lágrimas escorriam de seus olhos e sua cabeça doía mais do que nunca.

Ela jogou os cobertores para o lado e correu até a porta, apertando freneticamente o botão verde até que essa se abrisse. Depois, saiu correndo pelo corredor, visando a sacada. Ela precisava de ar e abrir a janela não seria o suficiente. Estava quase chegando na sala quando trombou com alguém.

Lena e a pessoa caíram no chão. O gemido foi feminino.

– O que aconteceu? – perguntou a voz da garota desconhecida. Lena não respondeu. Ela estava sentada no chão, as mãos segurando a cabeça que parecia prestes a explodir, as lágrimas escorrendo. Aquele sonho havia sido real demais. A menina chorando, o hotel, o sangue em suas mãos, o moleskine... Ela só queria ir pra casa e ter certeza de que sua mãe estava bem. Queria abraçá-la e não soltá-la nunca mais. Escola idiota para talentos idiotas. A garota se aproximou, preocupada – Você tá bem?

Lena ergueu o olhar e seu coração deu um salto.

– Você! – ela exclamou, largando a cabeça e segurando a garota pelos ombros – É você!

– O que tem eu? Olha, você precisa se acalmar. Quer um copo de água com açúcar?

– Quem é você? – Lena perguntou, ainda alarmada.

– Eu... Eu sou a Joana. Cheguei agora por que meu vôo de Portugal pra cá atrasou.

– Joana... Joana... Entendi – ela soltou a garota, começando a se recompor. Então, uma forte dor atingiu seu peito, deixando-a sem ar. Ela arfou e desmaiou imediatamente.

Joana observou a garota desmaiada em sua frente e revirou os olhos. A garota devia estar bêbada, era a única explicação. Ela tinha aprendido a lidar com esse tipo de pessoa e, infelizmente, havia sido do pior jeito possível. Descontente, ergueu a garota, passando o braço frouxo em volta de seu pescoço, e carregou-a até o único quarto do corredor com uma porta aberta.

Soltou-a na cama bagunçada e suspirou. Péssimo começo na LATT.


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