Quando acordou no dia seguinte, a cabeça de Lucas doía demais. Como já esperava, a noite não havia sido muito fácil, os pesadelos atormentaram seu sono, e pareciam bem mais assustadores, como se agora ele tivesse realmente algo a perder. Foi conseguir dormir já era 5h da manhã. Mesmo assim resolveu levantar cedo, já que faz muito tempo que não ficava até tarde na cama. Isso era uma tentativa de conseguir dormir uma noite inteira, o que não dava certo, mas ao menos tentava. Enquanto preparava algo pra comer, café, lembrou-se da noite passada e claro, de Rodrigo. Como gostaria que o loiro estivesse ali com ele. Tremia só de imaginar em como seria abraça-lo, beijar sua boca... Acabaria ficando doido!!

Tentando fugir destes pensamentos, pensava no eu faria naquele dia. Hoje não tinha compromisso com aulas na universidade, então pensava em aproveitar pra dar uma volta pela cidade. Desde que chegou ali não havia conseguido fotografar as paisagens, que eram uma mistura histórica com prédios atuais. Aproveitaria que o dia estava frio, porém, agradável, pra poder distrair um pouco.

***

Após o expediente naquele dia, Rodrigo saiu para almoçar com Clarissa. Não havia conseguido dormir direito e passou a manhã inteira um pouco em órbita. A amiga havia, diversas vezes, perguntado se havia alguma coisa errada, mas ele negou. Porém, imaginava que na hora do almoço não escaparia. E o fato se confirmou quando, após fazerem seus pedidos, a amiga iniciou novamente o assunto.

— Então loiro, vai me contar o que está acontecendo? – Clarissa sabia que Rodrigo não tinha amigos na cidade, ele parecia tão reservado.

—Não aconteceu nada, já te disse. – Rodrigo tentou, mais uma vez, desconversar

— E eu nasci ontem! Vamos, conta o que você tem. Isso vai te fazer bem. E outra, sabes que tenho meus métodos, vou te incomodar tanto que não vais me suportar.

Rodrigo acabou sorrindo ao ouvi-la, pensando que talvez ela tivesse razão. Faria bem falar com alguém. As pessoas mais próximas a ele era os pais, e não poderia falar com eles sobre aquilo. E como precisava falar...

— Ok, eu conto. Mas por favor, não me julgue. Eu já estou fazendo isto pela torcida do Internacional mais o mundo inteiro.

— Ai, como é exagerado! Prometo, agora conta logo! – Clarissa tentava ser o mais atenta possível ao amigo.

Após alguns segundos, que pareceram horas, Rodrigo tomou coragem.

— No fim do semestre passado, lembra, eu fui naquela festa que organizaram. Eu até te convidei e você não pode ir...

— Sim, eu lembro. Fiquei em exame e ainda não havia me livrado do semestre. Mas tá, pare de me enrolar.

— Então, eu conheci e acabei ficando com uma pessoa, na verdade...

— Ah, você conheceu uma guria na festa, se apaixonou e agora que voltou quer encontrar com ela, é isso, me conta tudo! – Clarissa era afobada, apesar de estar tentando ser o mais clama possível.

— Apaixonado? Não! – Nunca pensava Rodrigo. No mínimo isto vinha de estar muito tempo sem ficar com alguém. – É que tem um detalhe... Ele é um homem. E o pior de tudo, descobri que é meu professor.

Clarissa mudou de expressão. Não que tivesse algum preconceito, nada disto, mas ficou surpresa. Não imaginava que o loiro fosse gay, eles até haviam conversado já sobre a namorada dele de infância. Além do mais, o cara ainda era seu professor? Notando que Rodrigo sentia-se constrangido com seu silêncio, resolveu dizer alguma coisa antes que ele entendesse errado.

— Como assim, me fala sobre isto! Seu professor?

Rodrigo olhou a amiga, surpreso por ela não ter o atacado de primeira com perguntas sobre ser um outro homem em questão. Isso o fez se sentir mais calmo em continuar.

— Então, a gente acabou se beijando num momento de muita loucura nessa festa. Na verdade foi muito inesperado. Eu não esperava. E ontem quando eu cheguei na sala de aula dei de cara com ele, como meu professor. Imagina o meu susto, eu não sei o que eu faço...

Clarissa percebeu que o loiro estava totalmente perdido enquanto ele contava também o que havia acontecido na noite passada. Ela tinha amigos gays, mas eles sempre souberam que eram. Descobrir assim, no meio de uma festa, e ainda mais por ter beijado alguém que você terá que conviver deve ser bastante difícil. Se tivesse percebido que havia sido um caso isolado, ela diria para ele partir para outra, afinal, essa época da vida é normal experimentações. Mas sentia que o tal cara tinha mexido de um jeito diferente com ele. E romântica que era, não poderia desencorajá-lo.

—Rodrigo, escuta – puxou a cabeça dele para que olhasse em seus olhos – Primeiro eu quero dizer que estou aqui para aquilo que você precisar. Não precisa ficar constrangido assim, que bobagem! E segundo, eu acho que você está apaixonado sim! Você está diferente, percebi isto desde ontem quando nos vimos.

—Não Clarissa, isto foi um caso isolado, daqui a pouco eu conheço uma guria legal e isto passa.

— Querido, Tem certeza? – Clarissa sentia hesitação em sua fala – Olha, são tão raras às vezes que temos a chance de conhecer alguém que nos complete, que seja para nós o porto que precisamos. Não se deve desperdiçar as chances que o mundo nos dá... – Ela fez um carinho na mão dele, mostrando que estava ali para encorajá-lo – O Lucas, este o nome, né? – esperou até a confirmação – Então, ele parece estar de fato interessado em você, senão não te daria carona ontem como tu me contou agora pouco. E nem tentaria essa aproximação, e...

— Clá, não é bem assim, dá pra parar de romantizar tudo?! Aposto que ele quer apenas me levar para cama – Rodrigo tremia só de pensar, não sabia por qual motivo, preferia pensar que era repulsa.

—Deixa de ser cabeça dura, Rodrigo! Olha, faz o seguinte, amanhã vocês se verão novamente, não é? Então, quem sabe ele te convide pra fazer alguma coisa? Ele é mais velho, acho que te convida pra fazer alguma coisa caso estiver interessado. E assim você vai poder perceber quais as reais intenções dele, não acha?

 –Não sei não...

— Sim, você sabe! Agora vamos comer, estou com fome depois deste papo. E como não sou a sortuda apaixonada aqui, este buraco no estômago não pode ser outra coisa do que a falta de comida aqui dentro.

Após mais um tempo pensando, Rodrigo não conseguiu resistir e acabou relaxando e sorrindo das bobagens que a amiga falou durante o almoço, esquecendo um pouco a tensão. Sabia que ela fazia isto para que conseguisse ficar mais clamo. Pensaria um pouco sobre o que ela havia dito mais tarde, agora queria apenas sair dali com Clarissa e ir ao cinema. Estava passando um filme que ambos queriam assistir e precisava se distrair. Depois iriam para a aula à noite direto.

***

Lucas fotografou vários pontos no centro da cidade, que era realmente linda e tinha ainda muitos pontos a serem explorados. Porém, por volta da hora do almoço, começou uma neblina bem fina, típico por ali pelo que disseram, e acabou se rendendo pelo cheiro das comidas nos restaurantes. Foi quando estava sentado em uma doceria tradicional da cidade, que servia lanches bem bacanas, que enxergou Rodrigo caminhando ao lado de uma linda morena. E na hora um sentimento estranho o envolveu ao pensar que talvez Rodrigo tinha uma namorada. Ambos estavam bem agarrados embaixo do guarda-chuva, parecendo ser bastante íntimos e fazerem bem um pro outro. No mesmo momento o moreno acabou perdendo o apetite, mas terminou de comer. Não era muito de cuidar da saúde, na verdade, era bem negligente. Normalmente comia apenas besteiras, era difícil sair pra jantar algo saudável, na maioria das vezes pedia pizzas e lanches. Ao acabar, resolveu deixar pra fotografar outro dia e ir pra casa, não sentia mais nenhuma vontade de continuar. Antes estava cheio de planos, queria conhecer muitos lugares que havia passado, quem sabe até convidar Rodrigo pra ir junto, mas perdeu a vontade.

Voltando pra casa, pensava no quanto sua vida era vazia. E que não adiantava, estava inconscientemente tentando fugir, mas claro que o Universo deu um jeito de avisá-lo que nunca seria feliz. Os próximos dias seriam tão tristes quanto nos anos passados. Os últimos dias do mês de julho eram cheios de datas que o faziam lembrar das coisas que ele tentava esquecer, e pelo jeito, seriam igualmente difíceis este ano.

***

Quarta-feira cehgou, dia que Lucas lecionava aula para a turma de Rodrigo. Mas por conta de um destes eventos de início de semestre, com a apresentação de currículos e tudo mais, acabou que as turmas não tiveram aula. Mas professores e alunos foram convidados a estarem presentes no evento. Rodrigo estava no campus, e enxergou Lucas pelos corredores, percebendo que ele ainda estava bravo com ele. Seu olhar ela uma mistura de ressentimentos e mais algum sentimento, como se ele estivesse realmente triste por algo.  Perceber isto fez o mais novo sentir-se estranhamente mal e decidir que falaria com ele, assim como a amiga o aconselhou.

Ao fim do evento, Rodrigo continuou sentado, enquanto todos estavam levantando de seus lugares. Quando restavam poucas pessoas, percebeu que Lucas olhou para ele automaticamente, como se tivesse consciência de cada passo que dava, o que fez o loiro perceber que o moreno não era tão indiferente assim a ele, por mais que estivesse tentando parecer que sim. Andou até o mais velho, que parecia estar com seu costumeiro ar de superioridade, postura que ele assumia quando parecia estar acuado.

— Oi, podemos conversar? – Assim que chegou perto de Lucas, Rodrigo resolveu perguntar antes que perdesse a coragem.

Percebeu o mais velho parecer relutar em olhá-lo, mas voltando seus olhos para si antes de responder.

— Agora? Acho que daqui a pouco o último ônibus vai sair. Se eu fosse você saia logo – Lucas gracejou.

Rodrigo pensou em desistir ao ouvir essa resposta. Mas lembrando do que disse Clarissa, e que precisava tirar essa angústia que estava sentindo desde segunda-feira, resolveu ignorar a ironia.

— Caso eu perca o ônibus você pode me levar até em casa, não é?

Lucas ficou surpreso com a resposta do mais novo, e acabou sorrindo. O moreno estava disposto a ignorá-lo no campus, mas não estava esperando por esta atitude. Eles acabaram marcando de se encontrar no estacionamento do campus, sugestão de Rodrigo, para que ninguém os visse saindo juntos. O loiro esperava apenas que, conhecendo mais o outro, tirasse da cabeça todas aquelas sensações que estava sentindo desde que o vira e foi beijado na festa. Pelo menos tentava acreditar nisto.