Vampire Dreams - A Maldição escrita por DennyS


Capítulo 1
I- Fascínio




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“Os sonhos são como vidas passadas, desejos ocultos, lembranças irracionais obscurecidas pela negritude da escuridão... É o inconsciente consciente. É o claro e o escuro. O subconsciente humano que dá vida a outro mundo e abre o portal de outras dimensões...”

~•*•~

Capítulo I

Fascínio

Cristine saiu do trem com os ombros encolhidos, os olhos amedrontados que ao mesmo tempo não disfarçavam a tristeza. Não desejava estar de volta à Dark Hollow. Uma sensação ruim deixava o seu corpo pesado como se estivesse carregando um baú nos ombros.

Dark Hollow era a cidadezinha natal de seu pai. A cidade que ele mesmo odiou quando estava vivo. Era morta e cheirava a morte. Desde que se lembrava, Dark Hollow não parecia ter mais que duas estações ao ano. Era sempre frio e escuro. Sempre outono e inverno. Na primavera as flores não se abrem e no verão nenhum sol escaldante aparece pelas nuvens.

Quando era criança ouvia histórias sobre a cidade ser amaldiçoada. Nunca acreditou nessas superstições, mas não havia outra explicação lógica para o estado fúnebre desse lugar. Porém se existisse ou não uma maldição, não queria estar ali de qualquer jeito.

Cristine olhou em volta percebendo que a velha estação construída praticamente na mesma época de fundação da cidade, meados do século XVIII, estava do mesmo jeito em que se lembrava. Mesmo depois de seis anos, o piso áspero de madeira não fora trocado. Os bancos estavam com a tinta descascando e as pilastras estavam esburacadas. A qualquer momento poderia ceder e não sustentar mais o telhado da velha estação.

Além da aparência morta, o cenário transpirava um clima fúnebre e vazio. O único som agora presente era o barulho dos vagões do velho correndo nos trilhos bem ao longe e se distanciando mais.

Cristine saiu da estação carregando duas malas pequenas. Não tinha esperança alguma de que alguém esperasse por ela do lado de fora, mas mesmo assim sentia-se ansiosa.

Do lado de fora, a rua estava vazia e escura sob o céu acinzentado. O vento fraco do outono soprava pelos galhos secos das árvores, levando ao ar o que sobrava das folhas mortas.

Enquanto caminhava pela rua estreita e deserta, Cristine concentrava o que dizer aos familiares que a esperavam. Como eles teriam reagido depois de ler a carta? Mesmo tendo explicado tudo num pedaço de papel, ela teria que dizer alguma coisa. Como bem conhecia a avó, ela não deixaria Cristine ficar em sua casa sem nada em troca.

Cristine passou seis anos em um internato na Suíça. Depois que os seus pais morreram num acidente quando ela tinha quatro anos de idade, passou a conviver com a avó paterna Charlotte Haymes, a tia Mary e os dois primos David e Jessica. Sua vida era um verdadeiro inferno. Para uma criança nada poderia ser mais terrível. Queria apagar da memória por completo os cinco anos que vivera ali.

Quando um advogado trouxe-lhe a notícia de que sua mãe deixara paga todas as mensalidades de um colégio interno na Suíça, até o colegial, Cristine pensou estar sonhando. Aquilo definitivamente fora sua salvação.

Porém agora que estava voltando, o pesadelo também retornava. Sua avó poderia estar diferente depois de seis anos, mas seus primos que não eram mais crianças, talvez estivessem piores. Cristine não tinha medo de ser humilhada novamente, entretanto, porque agora sabia que em um ano e meio estaria longe dali novamente. Não era o mesmo de quando era criança em que apenas sonhava com a liberdade, sonhava em sair daquele pesadelo chamado Dark Hollow, a cidade morta, e não tinha esperança de encontrar outro lugar para viver. Agora ela ficaria o tempo suficiente para terminar o colegial e fugir para longe, para uma universidade bem distante onde nunca mais imaginaria, muito menos sonharia com a cidade Dark Hollow e quem ali habitava.

Cristine virou à esquerda para dentro do bosque. Pegaria um atalho até a velha mansão dos Haymes, já que não queria ser encarada pelos habitantes curiosos da cidade.

O cenário seco e silencioso, cercado por carvalhos gigantescos sem folhas, seus galhos distorcidos e coberto de musgos era ainda mais assustador que a estação caindo aos pedaços. Havia alguns salgueiros pela trilha, as folhas secas pendendo para o chão. Cristine sentia seu estômago se contrair pelo medo que aquele lugar lhe causava. Cada passo que dava para a escuridão, era uma espécie de de-já-vú. As lembranças de sua infância traumática lhe cercavam como águas dominadoras, como se ela estivesse presa na correnteza de um rio apavorante.

Continuou andando pela trilha que estava coberta por folhas secas, sentindo-as se partirem como gravetos sob os seus pés. Seu corpo estava tenso pelo medo que lhe atingia. Seus olhos estavam firmes na trilha, mas não deixava de consultar os cantos.

Um barulho estridente ecoou por trás de um salgueiro ao lado da trilha, fazendo-a pular de susto. Parecia o rosnado de algum animal.

Cristine congelou no mesmo instante, sentindo uma presença perto dela. Seu coração estava palpitando acelerado machucando seu peito. Abriu os lábios e ofegou assustada.

Sim, havia alguém ali sob a penumbra. Ou alguma coisa. Sentiu uma respiração às suas costas, que eriçaram todos os pelos do seu pescoço.

Virou-se bruscamente e não viu ninguém. Percebeu que o bosque ficava mais escuro. Com certeza foi uma má ideia cortar caminho por ali.

O rosnado voltou um pouco mais fraco, só que agora vinha de cima do salgueiro.

Cristine levantou a cabeça e olhou para os galhos da enorme árvore.

~•*•~

Frio, vazio, escuro, fúnebre... Por que esse é o lugar certo para alguém como ele?

O vento soprou cauteloso para o norte, levando o cheiro de musgos e folhas secas.

Poderia dizer que estava satisfeito, mas para sua espécie isso era uma coisa quase impossível. Por mais que se alimentasse, um pouco mais sempre era bem vindo.

Deixou de lado o corpo sem vida do pobre cervo, e se retirou dali rapidamente.

O vento ficou mais forte à medida que ele aumentava a velocidade.

“Demetri! Volte!”

Ouviu tia Adele chamá-lo na sua cabeça.

“Não foi culpa sua, querido...”

Não foi minha culpa...

Por mais que repetisse isso, ele não se sentia melhor. Não podia se convencer de nada.

Continuou correndo sem rumo pelo bosque, fazendo sua própria trilha. Suas presas estavam sobressaindo os lábios, seus olhos ainda estavam vermelhos, ofuscando como uma luz escarlate pela penumbra do bosque. Mesmo depois de se alimentar, cedia ao seu instinto de predador, seu instinto violento de caçador. Afinal ele existia para isso, não é? Um monstro sem alma, alguém que vivia para matar. Então seria assim.

Demetri parou num galho alto de um carvalho. Seus olhos continuavam vermelho-sangue, fitando o vão escuro da floresta.

Estava descontrolado. Um momento de deslize e ele era atacado pela insanidade. Sentia-se mal por ter mordido a pobre criança. Será que ela estava bem?

Adele disse-lhe que ela estava no hospital fora de perigo, mas isso não o tranquilizava. Atacou uma criança inocente porque não pôde controlar sua sede e aquilo era imperdoável.

Desceu do carvalho desfazendo sua expressão insana de predador. Seus olhos voltaram à cor normal, um tom de azul claro como um céu límpido; seus caninos se ocultaram dentro dos lábios e depois secou o sangue que manchava a pele pálida do seu rosto. Poderia ser confundido com um humano agora facilmente. Um humano um tanto diferente, mas humano.

Sentiu o vento soprar contra as árvores secas do bosque, levando um cheiro bem diferente às suas narinas.

Sangue humano, constatou. Era doce e tinha um cheiro tão forte como um vinho de safra perfeita.

Demetri lambeu os caninos e rosnou. Num piscar de olhos, suas íris ficaram escarlates e ameaçadoras. Não iria atacar o humano que estava perambulando pelo bosque, mas queria deliciar-se pelo cheiro maravilhoso que o vento lhe presenteava.

Acabara de se alimentar de um animal, mas como sempre seu instinto nunca estava satisfeito.

Ficou parado inspirando o odor de sangue, sentindo uma curiosidade enorme. Queria se aproximar da presa.

Não vou atacá-la, disse para si mesmo. Já que havia se alimentado poucos minutos atrás, seu autocontrole estava quase indestrutível.

Correu na direção do perfume que cantava para ele, seus pés mal tocavam o chão pela velocidade. Em poucos segundos avistou uma silhueta frágil caminhando por uma trilha entre os salgueiros.

Aspirou o cheiro mais uma vez e então não segurou o rosnado que passou por seus dentes famintos.

Percebeu que o humano parou de andar deixando o medo lhe invadir.

Demetri se aproximou cauteloso, por trás dos salgueiros. Queria olhar mais de perto, ver quem era o dono desse sangue maravilhoso.

Demetri colocou-se bem atrás do pequeno corpo trêmulo. Estava perto o suficiente para tocar em seus cabelos encaracolados. Aspirou o perfume que emanava deles, sentindo sua garganta queimar.

A jovem virou-se bruscamente para trás, os olhos verdes atordoados procurando pela eminente ameaça.

Demetri estava no galho alto do salgueiro à beira da trilha, fitando a jovem assustada. O vento jogou outra remessa de seu perfume doce, fazendo-o rosnar mais uma vez. Ele fechou os olhos e tentou assumir o controle de si mesmo.

Além do cheiro de sangue delicioso, ele podia sentir o gosto do medo daquela criança frágil. Sentir as emoções de suas presas ao mesmo tempo era uma terrível maldição e uma benção. Às vezes gostava de sentir certas emoções dos humanos, porque como alguém para sua espécie, emoções eram deleitosas. Elas traziam lembranças de quando ainda podia sonhar. Mas sentir o medo e o pavor que provocava nos humanos, era assombroso. A dor de culpa era inevitável depois.

A jovem fitava o salgueiro sob a penumbra, olhando diretamente para o galho onde Demetri estava. Ele devolveu o olhar, dessa vez usando seus olhos azuis, tateou o belo rosto da jovem assustada. Ela sabia que havia alguma coisa ali. Ela estava forçando-se para ver sobre a escuridão.

Demetri permaneceu parado, os olhos penetrantes no rosto dela. Agora estava fascinado. A sede estava pequena ao lado do que sentia. O belo rosto da jovem se contraiu, seus belos olhos verdes se estreitaram, depois seu rosto pequeno e delicado voltou a encarar a trilha de folhas secas.

–Não seja boba, Cristine! – disse ela, depois riu para a penumbra. Um riso sem humor, porém forte o bastante para espantar o medo.

Demetri sentiu um arrepio estranho na sua pele fria quando ouviu a voz dela. O sorriso era ainda mais encantador que o seu sangue.

Observou a jovem continuar caminhando pela trilha, ouvindo ela murmurar algo só para ela mesma, mas que Demetri podia muito bem ouvir. Ela disse alguma coisa sobre “vovó Charlotte deva estar tomando chá”.

Demetri permaneceu no galho alto do salgueiro, querendo muito segui-la. Queria ver o sorriso daquela estranha novamente.

Estreitou os olhos. Queria muito mais. Queria saber quem era essa criaturinha frágil que caminhava no meio do bosque escuro, como se não existisse perigo suficiente para ameaçá-la.

Como num lampejo, todas as preocupações da sua mente se dissiparam. O que estava o incomodando mais cedo que o fez se isolar no meio da floresta estava esquecido naquele momento.

Não entendia o motivo da jovem estranha ter chamado tanto a sua atenção, mas não iria se precipitar com isso. Percebeu as malas que ela carregava. Outra humana mudou-se para Dark Hollow, embora isso não era muito comum naquela cidade. Teria tempo para saber mais sobre ela.

Tempo era uma palavra que não o incomodava naquele instante. Afinal para ele existia a eternidade.

Desceu do salgueiro, parando no meio da trilha onde a jovem passara deixando o seu rastro. Aspirou o cheiro que estava um pouco mais fraco, porém o suficiente para deixar sua garganta em brasa viva, depois suspirou aliviado. Sentia-se melhor agora.

Tudo por causa daquela humana estranha, daquela...

Cristine...

~•*•~


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Notas finais do capítulo

Não consegui dormir com essa história na cabeça, daí veio o título. Sonhei com algumas maluquices, e não pude deixar passar.

Quem chegou até aqui, espero que tenha gostado e deixe um review!

Té mais!o/o/