Goddess of Revenge escrita por Bárbara Brizola


Capítulo 9
Capítulo 9: Clausura


Notas iniciais do capítulo

Oi pessoas humanas e não humanas! Estamos de volta mais uma vez.

Como sempre devo satisfações. Minha ausência se deve a uma fator de extrema importância chamado pai. Para aqueles que não viram/estão no grupo do face, postei um aviso sobre isso. Meu pai tem problemas de saúde graves e quase o perdi tempos atras. A saúde dele é frágil e vai continuar inspirando cuidados pelo resto da vida. Ele foi internado recentemente e quase me matou do coração. Naturalmente ele é minha prioridade e espero que entendam isso. As coisas estão melhores e por isso aqui estou eu novamente.

Quanto aos reviews não respondidos e muito atrasados, farei o possível. Não gosto de deixar ninguém no vácuo, mas como disse precisei direcionar minha atenção para outra direção.

Agradeço aqueles que me esperaram. Agradeço aqueles que me deram força quando precisei. Novamente reforço a vocês: Não vou abandonar a historia. Mesmo que demore sempre vou voltar. Mesmo pq vocês sabem onde me achar :v


Dedico esse capitulo a todos vocês que tem uma paciência de deuses. Deixo um agradecimento especial as lindas Bells, Thaianegc, Clara Batista, Miss Queen e LokiWife que me deixaram recomendações lindíssimas que me ajudaram a animar e escrever. Obrigada de verdade a todas por fazerem parte disso.

Boa leitura!



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O cheiro de sangue era forte e acre, pontuado pelo de fumaça. Um menino agonizava pedindo pela minha mais cruel piedade. Os gritos de Loki ecoavam ao fundo. Eu estava coberta com sangue que não era meu, enquanto ouvia o som de uma corda rangendo sustentando algo pesado demais. Precisava ser feito. Precisava. Desejei sumir. Desejei que fugir fosse real, pela minha vontade. E então quando o som de tiros encheu meus ouvidos, me ouvi gritar.

Os braços dele ao redor de mim, uma mão pousada em minha nuca, tirando minha mente do sofrimento que se autoimpunha. Meu rosto suado contra o pescoço dele. Loki estava completamente vestido. Devia ter saído do quarto enquanto eu dormia. O que significava que eu devia estar gritando há algum tempo sem ele presente para me tirar do terror noturno e me acordar. Mas o deus estava ali agora. Minha respiração se normalizou lentamente. Sequei as lágrimas com as costas da mão, sem deixar que visse. Ele nunca dizia nada a respeito. Muitas vezes não fazia mais do que me ajudar a dormir novamente. Mas desta vez suas primeiras palavras me colocaram tão em alerta que não dormiria mais sob nenhuma hipótese.

– Thor voltou. – declarou num tom baixo. Isso justificava sua ausência do quarto.

– Onde ele está?

– Nos aguardando. – informou. Saí da cama num pulo e puxei um chambre preto que jazia sobre uma cômoda. O segui em silêncio pelos corredores. O chão gelado sob meus pés descalços que eu não me preocupara em proteger, o silêncio ao redor e a maneira como Loki me chamara em meio à madrugada, me fizeram ter certeza de que eu seria uma das primeiras a ouvir uma resposta de Midgard. E de que Loki queria que isso fosse feito longe das vistas dos outros. E isso era o que mais me angustiava. Ele não podia querer debater boas notícias. Não àquela hora.

Ao descermos as escadarias achei que iríamos à biblioteca ou a sala de artes. Mas seguimos adiante ignorando ambas. Eu me sentia envolta em uma das ilusões de Loki. Alguns nos cumprimentavam sem maior atenção. Ele assentia e eu fazia o mesmo. Vários guardas de plantão agiam naturalmente enquanto caminhávamos. Fosse conversando entre si ou cochilando brevemente antes de acordarem bruscamente para que não caíssem. Estávamos sob a ilusão de sermos guardas de baixa patente fazendo ronda. Ninguém importante o bastante para chamar a atenção.

E sob esse disfarce caminhamos pelos jardins, sentindo o ar noturno que me grudava na pele e nos cabelos amassados. Não tinha a menor vontade de perguntar nada a ele e antecipar a conversa. Estava muito bem apenas o acompanhando pela noite escura. Loki caminhava de seu jeito enérgico e gingado a minha frente e eu o seguia. Era onde eu queria estar. Era um momento suave em que sentia minhas mãos segurando um presente frágil e quebradiço em meio aos dedos. Nossa paz comprada com sangue e mentiras duraria muito mais?

– Loki... – chamei num tom baixo, enquanto entravamos pela rua principal. Ele se virou para mim, me fitando pelo canto dos olhos. Franzi as sobrancelhas e ofereci a ele um sorriso amarelo que teria virado um esgar, caso meu autocontrole falhasse. O homem parou e virou-se completamente para mim. Seus olhos percorreram meu rosto num gesto breve, registrando minha expressão. Medo. Eu tinha medo.

Por um segundo achei que ele fosse dizer alguma palavra reconfortante. Algo que me desse certeza de que estávamos tão seguros quanto possível. Que me fizesse relaxar e acreditar que sair sob uma ilusão para encontrar o príncipe herdeiro durante a madrugada, antes que sequer o Conselho o fizesse, não era algo preocupante.

Ao invés disso, de todas as palavras que eu queria ouvir, Loki beijou meu rosto, segurando-me pelo queixo. Uma, duas vezes, se aproximando da boca, antes de a tomar demoradamente para si. Não com a urgência habitual, mas de um jeito gentil e seguro. Afastou-se de mim, os olhos verdes presos aos meus. Não me ofereceria palavras falsas. Tudo que me dava era a certeza de que eu não estava sozinha.

Ele ergueu as sobrancelhas num incentivo. Devíamos encontrar Thor. Assenti e tornamos a avançar pelas ruas. Eu não estava sozinha. As coisas ficariam bem de um jeito ou de outro. Se não houvesse um caminho, faríamos um. Eu confiava em Loki o bastante para acreditar nisso.

Continuamos seguindo pelas ruas desertas. Então o deus abriu a porta de uma taberna e a segurou para que eu passasse, no momento em que sua ilusão se desfazia e meu chambre dava lugar a um vestido de mangas longas verde musgo. Eu nunca tinha ido a nenhum lugar como aquele em toda Asgard. Na verdade em todos os Nove Reinos. A despeito do horário, o lugar estava abarrotado de gente, que cantava e ria. Alguns estavam mais do que embalados pelo efeito do hidromel barato. O cheiro de álcool e poeira me irritava, misturado à fuligem de uma lareira que permanecia acesa mesmo sem lenha, espalhando seu calor pelo ambiente. Agradeci silenciosamente por Loki ter materializado sandálias, ou eu teria me contaminado com pelo menos três tipos de tétano naquele chão imundo. Dois bardos tocavam flauta e bandolim numa melodia animada que mal se ouvia acima das vozes. Mulheres seminuas dançavam e trocavam de colo com a mesma facilidade com que eu trocaria de roupa.

Alguns homens olharam em minha direção com interesse e curiosidade até Loki tomar meu braço no seu e me conduzir por entre as mesas. Aquilo bastou para afastar os olhares vorazes. No entanto eu parecia não merecer o mesmo respeito das meretrizes que riam e acenavam para Loki como se eu não estivesse ao seu lado. Levantei uma sobrancelha a uma delas que alisou os próprios seios à nossa passagem. A garota passou a língua nos lábios. Finalmente me dei conta de que deduziam que Loki e eu estávamos em busca de diversão a mais. Reprimi uma careta.

– Ali. – Loki disse indicando uma mesa lascada no final da taberna. Thor estava sentado ao lado de Jane. Ele tinha uma caneca de madeira lascada diante de si. A garota tinha um pão pequeno e intocado num prato. Parecia murcha e constrangida, procurando manter os olhos fixos na comida. Ao seu lado Lady Sif amolava a lâmina dupla de sua espada como se não houvesse nada melhor para fazer, se comportando de maneira alheia ao ambiente. Um copo de hidromel pousava intocado a sua frente.

Nos sentamos diante deles e a deusa da guerra guardou a arma e todos se aprumaram, no momento em que uma garota de aparência mais jovem que eu, em trapos mal lavados se aproximou trazendo canecas de hidromel e chope. Loki recusou pedindo por um vinho, mas eu me apossei de uma das canecas com o líquido amargo. Assim que ela retornou trazendo a mesa o que ele pedira e se retirou novamente, senti o arrepio breve e suave que indicava que estávamos protegidos da curiosidade alheia dentro de uma ilusão.

– Estamos seguros. – Loki informou aos menos atentos.

– Não podíamos conversar em outro lugar? – Jane protestou finalmente esboçando seu desconforto com o ambiente.

– Não. – O moreno respondeu ácido, a olhando daquele jeito entre o escárnio e a curiosidade que costumava reservar a ela. – Não existe nenhum lugar melhor que esse. Somos vistos, mas não notados.

– Ninguém falaria que nos viu aqui. – Sif afirmou. – Dizer isso seria confessar que também frequenta o lugar. – explicou. Simples e inteligente. Para qualquer membro da elite asgardiana seria uma situação no mínimo constrangedora, desonrosa e difícil de explicar em casa. E qualquer um que não pertencesse à elite não era dono de uma palavra confiável. Sem contar o agravante de que estariam colocando a dignidade da família real em cheque. O silêncio era preferível. Apesar disso, Loki nos mantinha naquela ilusão.

– O que eles veem? – questionei, no momento em que Thor parecia que iria começar a falar, o interrompendo.

– Que estamos agindo naturalmente para o ambiente. – o deus esclareceu como se comentasse o tempo, tomando um gole da taça. Eu e as outras mulheres na mesa trocamos um olhar breve sem falar nada. Preferia não imaginar o que agir naturalmente num lugar daquele significava. – Thor, quais são as notícias? – atalhou nos impedindo de contestar.

O loiro começou a nos explicar em detalhes do que se passara nas últimas semanas. Havia encontrado uma S.H.I.E.L.D. muito mais desestruturada do que eu esperava. Sabia que estavam se reerguendo lentamente, mas a H.Y.D.R.A. tinha crescido como um câncer no coração da organização. Difícil de ser combatido. Talvez nunca fosse curado plenamente. E por isso não estava claro quem liderava a agência.

Haviam agentes leais atuando em pequenas missões, liderados por ordens vindas de células remanescentes maiores e mais organizadas. Essas por sua vez, eram orientadas por lideres de diferentes patentes. Aparentemente havia certa ordem em meio ao caos. Desde que pudessem arrancar a maior parte daquele câncer, o resto seria resolvido aos poucos e naturalmente. Vi Loki apertar a ponte do nariz com as pontas dos dedos num gesto de frustração. Era óbvio que até que isso acontecesse não havia um líder claro e absoluto a quem seguir.

Maria Hill foi o mais próximo de gerência que Thor foi capaz de localizar. Ela era o braço direito de Fury. Me lembrava de tê-la visto duas, talvez três vezes. Nenhum encontro particularmente agradável. Pouco depois de um deles eu explodira a parede de casa e me jogara no penhasco sobre o mar. Me perguntei que impressão ela teria de mim.

A mulher dissera ao deus que entendia a gravidade que um ataque daqueles significava e sabia que isso poderia abalar as relações entre os dois reinos. E que apesar de não saber dizer de onde havia partido e nem como, destacaria agentes para investigarem e assim poderiam iniciar medidas paliativas. Sif fez uma careta ao ouvir a explicação. A S.H.I.E.L.D. não se comprometia a impedir que novos ataques ocorressem, embora fosse agir para evitá-los. Tinham seus próprios problemas internos para darem conta do que acontecia na outra ponta do universo.

Era natural que a agência considerasse o interesse repentino da H.Y.D.R.A. em incursões a Asgard como uma ameaça. Não sabíamos com precisão quais intenções esse ataque revelava e nem o que esperar. Eles desejavam impedir que sua própria situação se tornasse ainda pior. Asgard tinha armas poderosas além de espadas e lanças. Mas como um paciente, o domínio não estava em suas mãos. Não podíamos contar com a S.H.I.E.L.D. agora. Senti meu estômago afundar. Nunca achei que fosse desejar ver a organização agir.

– E que posição Asgard vai tomar? – Jane quis saber.

– Aguardar. – Loki falou seguro. – Que os soldados abandonem os exercícios e treinos de praxe e pratiquem formações de ataque e defesa enquanto isso. Iniciar um contra ataque seria precipitado, mas ficar parados seria descuido. Deixemos que a S.H.I.E.L.D. faça o melhor que puder. – concluiu olhando para Sif.

A mulher encarava o próprio copo e permaneceu calada por um longo minuto. A deusa da guerra devia ter sua própria opinião sobre aquilo e era por isso que estava ali. Era dona de um cargo alto no exército asgardiano e liderara decisivamente grandes tropas em guerras e batalhas muito antes que eu soubesse pronunciar meu próprio nome. Sua palavra era importante naquele momento. A morena ergueu os olhos.

– Concordo, mas precisamos destacar soldados e, ao menos tentar, recuperar os reféns. Se isso não for feito, logo a população vai clamar para levantar armas. – alertou. Os irmãos assentiram em concordância. Como eles fariam aquilo, eu não sabia.

– Thor pode enviar tropas à Midgard, assim que amanhecer. – Loki afirmou. Não era uma sugestão. Então entendi o objetivo daquela reunião. Aquilo era um preparatório pré-Conselho. – Os envie para ajudar nas buscas.

O príncipe herdeiro os enfrentaria sozinho e deveria ser preciso naquilo que diria. Precisava passar a sensação de que tudo estava sobre controle, mesmo quando não poderia estar mais distante disso. No fundo eu sabia que todos contavam que a H.Y.D.R.A. não daria as caras novamente e tudo aquilo seria uma preparação desnecessária.

O tempo prosseguiu enquanto Loki fazia centenas de perguntas ao irmão e ele e Sif corrigiam suas respostas. Mesmo eu e Jane às vezes nos manifestávamos. Ele afirmaria que sua demora em retornar tinha sido necessária para supervisionar as iniciativas da S.H.I.E.L.D. para garantir a paz. Aquela era uma ideia do trapaceiro, que havia sido endossada por Lady Sif. De acordo com ela, passaria ao Conselho a sensação de que Asgard estava no comando.

Já eu e a cientista fomos orientadas a nos mantermos caladas e ocultarmos o que sabíamos. Devíamos evitar ir a lugares aos quais normalmente não íamos e qualquer outro comportamento que pudesse chamar a atenção. Manter a rotina e sermos vistas onde se esperava era essencial. Éramos as humanas que conheciam a estrutura de Asgard. Não poderíamos levantar suspeitas ou isso pesaria contra nós. Estávamos ali para aprender o que falar e o que calar. Não sermos notadas além do necessário, garantiria nossa segurança até que tivéssemos certeza de que um novo ataque não aconteceria.

Não importava. Quanto mais falavam mais sentia o medo me dominar. Dependíamos que a H.Y.D.R.A. se silenciasse após esse primeiro ataque. Precisávamos que os reféns fossem recuperados. Eram tantos requisitos fora do nosso controle e estávamos ali sentados, com prostitutas dançando de maneira absurdamente constrangedora ao lado de Jane, tentando fazer com que as coisas parecessem bem para um bando de velhos fechados em seu palácio. Eu não via como aquilo pudesse dar certo. Estava me tornando pessimista. E tinha razão.

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A reunião do Conselho foi uma das mais longas de que me lembrava nos poucos anos em que morava em Asgard. Assim que Thor pisou no palácio os velhos praticamente despencaram sobre a cabeça dele. O almoço veio e se foi e a reunião prosseguia. Enquanto isso, eu era uma ave agitada em uma gaiola dourada.

Estava empoleirada na janela do enorme quarto, folheando uma revista qualquer que Pepper tinha enviado, Loki seguia sentado em uma escrivaninha rabiscando documentos, aparentando estar muito concentrado. Ainda cuidava dos reparos da cidade e começava a convocar soldados novos. Muitas famílias tinham perdido seus provedores em batalha ou em meio ao caos e empregar os mais jovens era ao mesmo tempo reorganizar o exército e um trabalho social. Ergui os olhos para ele demoradamente. As sobrancelhas grossas e expressivas franzidas enquanto a pena negra corria sobre as folhas de pergaminho registrando nomes dos rapazes em idade de servir que ele copiava de uma tabela projetada a sua frente. Normalmente eles se voluntariavam, mas na atual situação seriam convocados.

Jinggles se esfregava nas pernas do deus requerendo sua atenção, mas era sumariamente ignorado. Até começar a miar alto em protesto. Era muita ousadia o ignorarem assim. Suspirei. Tudo parecia tão normal lá fora que eu não entendia como era possível. O deus finalmente pousou a pena e ergueu o gato do chão, o colocando sobre as próprias pernas. Os lábios finos se inclinaram de um jeito debochado quando o animal se aninhou, deixando claro que o satisfazer era simples. E então os olhos verdes de ambos pousaram fixamente em mim.

– Ainda demora muito? – questionei pela milionésima vez. No que Loki fez menção de abrir a boca para me responder, batidas a porta nos interromperam. Dei um pulo do meu lugar e corri abri-la.

Frigga estava parada exatamente a minha frente. Ainda usava a roupa do jantar da noite anterior, o que me indicou que não dormira. Apesar disso os cabelos caiam em cachos loiros escuros modelados à perfeição. Eu esperava que ela sorrisse. Seus lábios permaneceram crispados, antes que ela finalmente falasse.

– O Conselho quer falar com você e com Jane. – esclareceu. Havia um fundo discreto de irritação na voz. Soube imediatamente que a rainha tentara impossibilitar aquela conversa.

Loki colocou o gato novamente no chão e atravessou o quarto, parando ao meu lado. Ele a mãe trocaram um olhar breve, mas quando o moreno se preparou para protestar, foi interrompido por ela.

– Não fizeram objeção de que você fosse junto.

– Ótimo. – rebateu num tom desafiador. Não era a ela que aquilo se dirigia e sim aos membros do Conselho.

Seguimos a rainha pelos corredores. Eu esperava que ela me dissesse algo, que me preparasse para o que eles tinham a falar, mas Frigga permaneceu calada. Tinha uma expressão dura no rosto, mas forçou um sorriso ao ver que eu a olhava de maneira pouco disfarçada. Desviei o olhar imediatamente para o homem que caminhava firme ao meu lado. Tinha os olhos de um predador, enquanto avançava pelo corredor. Os lábios finos crispados de maneira pouco satisfeita. Se Loki fosse um vulcão estaria à beira de uma erupção.

Ao nos aproximarmos da porta da sala do trono, os guardas a abriram para que passássemos. Jane já estava lá, diante de Odin, ao lado do noivo. Estava séria, mas parecia calma. Tentei imitar a segurança que ela transmitia, mas temi estar parecendo uma criança pequena numa apresentação de escola. Meu nervosismo era justificado. Todo o Conselho estava ali, assim como Lady Sif e Lady Sigyn. O que a segunda fazia ali eu não tinha ideia.

O rei se pôs de pé pretendendo tomar a fala para si, no entanto, Loki que avançara ao meu lado até agora, alargou os passos e caminhou a nossa frente.

– Loki... – Frigga tentou chamá-lo antes que falasse, mas foi interrompida pela voz do filho que soava rascante.

– O que tem de tão importante a dizer que precise do Conselho o escoltando? – o príncipe rosnou num tom de desagrado. Odin ergueu a cabeça o olhando de cima. Alguns dos velhos se afastaram de maneira que pretendiam ser discreta. Um sorriso torto surgiu em meus lábios ao ver aquilo. Existem apenas duas maneiras de ser respeitado: ser muito amado ou ser muito temido.

– O Conselho permanece onde eu achar ser adequado e quando eu achar que o é. – o velho retrucou num tom paciente, mas gélido. – Sua opinião a esse respeito é irrelevante. Guarde-a para você.

– Irmão, a reunião foi concluída, por isso estamos aqui. – Thor atalhou antes que a discussão se estendesse.

– Você concluiu isso sozinho, Thor? Brilhante! – o moreno devolveu retórico e debochado. Reprimi uma risadinha. – E o que foi decidido?

– Asgard vai manter-se pacífica a menos que novos ataques ocorram. – Odin afirmou.

Senti como se uma tonelada deixasse meus ombros. Talvez os ataques nunca mais ocorressem. Talvez a S.H.I.E.L.D. realmente conseguisse fazer o que se propunha. As palavras dele eram como um sopro de esperança em meio ao nada. Mas ele ainda tinha mais a dizer.

– Mas por hora, algumas medidas se fazem necessárias. Por isso as trouxe aqui. A partir de hoje Jane e Liana não devem deixar os limites do palácio. Estão restri...

– Como é?! – me ouvi gritar num tom indizível. Jane tinha as sobrancelhas franzidas e se voltou para Thor que pediu calma com um gesto da mão. Loki deu um passo em diagonal, avançando e bloqueando meu caminho até o rei. Um movimento muito calculado. Tinha ambas as mãos para trás e o encarava de cabeça erguida, o olhar era um convite de desafio.

– Finalmente perdeu a cabeça? Nós temos um acordo. Elas são cidadãs asgardianas. Tem o direito de circularem livremente. – afirmou num tom perigoso estreitando os olhos e assumindo uma expressão que indicava seu desprezo por Odin não perceber algo tão óbvio. O velho não lhe deu maior atenção e tampouco lhe dirigiu a palavra. Ao invés disso tornou a olhar para mim e Jane.

– Estão restritas aos jardins, onde devem permanecer acompanhadas. Lady Sif ficará responsável por Jane Foster e Lady Sigyn por Liana Schroeder. – declarou como se comentasse o tempo. Meu estômago afundou. Eu era um animal encurralado. Senti uma vontade doentia de correr. De gritar. Aquilo era errado de tantas formas que eu não conseguia definir. Sigyn sorriu com doçura para mim, como se esperasse que eu sorrisse de volta. Como se aquela fosse a melhor notícia que eu poderia receber. Escárnio. A raiva corria em mim como veneno.

– Se chegar perto de mim, vou arrancar seus olhos! – ameacei num tom alto e pausado, encarando a deusa. Minha voz soava ameaçadora e incisiva. Sigyn abriu a boca parecendo indignada e ofendida, mas não falou nada em resposta.

– Vamos manter os olhos das pessoas em seus devidos lugares. – Davlan pediu, tentando apaziguar a conversa. Por mais que simpatizasse com o conselheiro, naquele momento eu estava surda a qualquer coisa. Estava sendo feita prisioneira em Asgard. Era prisioneira do rei. Não entendia como Frigga podia ter permitido aquilo. Como Thor podia concordar. Eu derrubaria um exército em sua cabeça até a manhã seguinte. – Não foi uma decisão injustificada.

– Eu adoraria saber com base em quê isso foi decidido. – Loki afirmou ferino.

– Eu me ofereci quando soube. – Sigyn explicou, não dando a nenhum dos conselheiros a chance de falar. – Achei que fosse ser bom ter uma amiga por perto.

–Não tinha notado que eram amigas. – O moreno devolveu depressa e debochado, antes que eu mesma pudesse fazê-lo. A deusa era no máximo uma conhecida. Alguém com quem eu tinha que conviver.

– De qualquer forma a questão não é essa. Por que diabos vamos ficar presas aqui dentro? – interpelei. Loki ergueu ambas as mãos apontando em minha a direção, os lábios finos contraídos numa expressão que indicava que concordava comigo.

Odin se pôs de pé e desceu as escadas lentamente em minha direção. Loki manteve-se parado, bloqueando o caminho. O rei o encarou com superioridade indicando apenas com um olhar que ele deveria se afastar. O moreno o fez lentamente, ainda o olhando com uma ameaça velada. O homem parou a minha frente.

Minha expressão dura deixava claro que não havia boas intenções em mim. O velho parecia calmo. Não se deixaria intimidar por uma menina que ainda cheirava a leite. Era isso que eu era. Uma criança birrenta. Mesmo que fosse um palmo mais alta que ele e o encarasse de cima.

– Vou te explicar de um jeito que você entenda. Pode se vestir como uma deusa, morar entre os deuses, dormir com um deles, mas nunca será uma. Não se esqueça disso. – Suas palavras me atingiram como um tapa. Olhei para o chão piscando um pouco desnorteada, com aquele lembrete óbvio. – Fomos atacados por mortais. Temos crianças desaparecidas. Você é mortal. O povo não vai se esquecer disso. Já que tem como natureza a vingança, deveria saber que ela é impulsiva e poucas vezes diferencia inocentes de culpados. Estamos fazendo isso para garantir a segurança de vocês. - concluiu, sustentando meu olhar com segurança. Desviei-o para Loki, incerta. Ele assentiu de maneira ínfima após um breve segundo. Se ele achava que a explicação era justa, eu concordava. Repeti seu gesto abertamente. Odin tornou a subir as escadas e sentar-se no trono.

Eu entendia ou pelo menos tentava. Não era uma punição. Aquilo deveria ser temporário. Assim eu esperava. Odiava admitir, mas o Conselho estava certo. Dentro do palácio estávamos seguras. Nos jardins alguma vigilância era necessária. Deuses eram donos de grande força física. Um ataque direto, se bem sucedido, nos deixaria no mínimo muito machucadas. Não era uma prisão, era proteção. E nos jardins havia uma maior chance de existirem pessoas circulando, era preciso uma maior precaução e por isso as mulheres foram designadas a nos acompanhar. Os príncipes não poderiam dedicar seu tempo a isso, pelo menos não integralmente, já que teoricamente tinham outras coisas para fazerem.

Meus olhos procuraram por Sigyn. Ela sussurrava algo com o pai, Fisir. Eu não a queria me seguindo pelos jardins. Não queria precisar avisar a cada vez que decidisse por meus pés fora dos portões. Não a queria como minha sombra. Me parecia tão delicada que eu considerava improvável que em caso de ataque me fosse útil de alguma maneira. Os olhos verdes da garota pousaram em Loki, quando ela terminou de falar. Se desviaram após alguns segundos e encontram os meus. Ela os abaixou rapidamente, fingindo mexer em um dos anéis que usava. Meu maxilar se apertou.

O homem devia ter dito a ela quais as possibilidades de ação existentes de acordo com as notícias que Thor trouxesse. Ela sabia que aquilo poderia acontecer e havia pedido ao pai pelo cargo, ele sugerira e o Conselho acatara com a aprovação de Odin. Não queria me seguir. Queria uma desculpa para se manter próxima a Loki. Fatalmente isso aconteceria. Aquela mulher era realmente um abutre me rondando. Havia uma trama sendo tecida a minha volta e eu pouco via e podia fazer. Uma flecha prateada combinaria com as joias dela?

– Quero Vidar como acompanhante. – pedi num tom alto e claro. Aquele era meu contragolpe. Frigga parecia saber que aquilo aconteceria. O que era provável na verdade. Loki também não pareceu se impressionar. Odin me olhou levemente surpreso, mas não tanto quanto a garota.

– Por quê? – perguntou abertamente. Era a primeira vez que eu a via questionar algo. – Achei que fosse ficar feliz.

– Super feliz em ter um cão de guarda. – rebati irônica. – Se vou ter uma sombra quero uma em que eu confie meu pescoço.

– Liana, achamos que seria mais conveniente que fossem mulheres a acompanha-las. Não queremos dar abertura a boatos. – Bragi explicou. Lógico. A honra da família real não podia ser posta em jogo. Eles tinham uma imagem a zelar. Mesmo que fosse a de Loki.

– E qual o motivo para priva-las de escolher? – Loki interpelou num tom mordaz. Frigga encarou o marido, com uma expressão serena, mas lábios apertados. Era a isso que se opusera. – Decidir o que seria melhor a fazer é prerrogativa do Conselho, mas indicar nomes deveria ser delas.

– Como eu disse, deixou de ser um assunto do governo e se tornou assunto de família. – a rainha afirmou por fim. O mais feio dos conselheiros não foi capaz de manter-se calado.

– Nesse caso entendo que a opinião de Jane Foster seja importante por ser a noiva de Thor, mas ela não demonstrou nenhum descontentamento, então não entendo o porquê dessa discussão. – alegou. Fiquei estática com tudo aquilo que ele deixava implícito naquela frase. Eu não era da família. Lembrei-me de Vidar dizendo algo sobre sermos consideradas apenas concubinas. Era um bibelô enfeitando a cama do príncipe. Minha opinião não era nada. Eu não era nada. Apenas um problema que o tempo eliminaria. – E acredito que a proximidade entre nossas famílias deveria contar como algum crédito. Deveriam ter mais consideração. Sigyn é...

– Eu não terminaria a frase se fosse você. – ouvi Loki alertar.

– ...praticamente noiva de Loki! – o homem concluiu. O príncipe fez uma careta com um gemido baixo soando.

Senti todos os olhos no salão voltarem-se para mim sem exceção. Aquilo era uma afronta direta e nada velada. Ele me atacava sem o menor pudor. Não era digna sequer de respeito. Minha expressão deve ter sido um grande espetáculo, enquanto passava do choque absoluto, para a descrença e por fim chegava à pura ira. Um urro grave me escapou por entre os lábios, enquanto eu completamente fora de mim tentava diminuir a distância e matar aquele homem com as minhas próprias mãos. Estava farta de tudo aquilo. Farta do desrespeito, das provocações, das ironias. De me sentir acuada. De suportar calada e fazer o que se esperava que eu fizesse. Farta da vantagem dela sobre mim.

Mas minha tentativa falha foi interceptada por Loki que me aparou com facilidade pela cintura, deixando que eu me chocasse contra seu corpo. Pulava nos braços dele que me continham enquanto tentava avançar, atirando todos os palavrões que eu conhecia contra aquela família.

– Liana... – ele me chamava, baixo sem se preocupar em sobrepujar meus gritos. Calei-me após alguns segundos, os olhos de todos ainda pousavam em mim alguns surpresos, outros asquerosamente satisfeitos que aquilo me afetasse. Voltei-me para o deus. Minha expressão era dura e a dele afiada como uma de suas adagas. – Quer casar comigo?

– Que? – balbuciei em choque, trazendo a conversa para meu idioma sem perceber, encarando o homem e paralisando por um segundo. Aquela pergunta me pegou tão desprevenida que não fui capaz de notar de imediato Odin se colocando de pé novamente e Sigyn arfando e cobrindo a boca com as mãos.

– Eu não vou repetir. – alertou. Ergueu as sobrancelhas num incentivo. – Não me faça passar vergonha na frente de todo mundo. Preciso de uma resposta. – ironizou. Fiquei sem reação alguma por longos segundos, apenas olhando para ele. Nunca tinha realmente me preocupado com aquilo. Não éramos dados a convenções de forma que eu realmente não esperava que acontecesse.

– Sim – disse séria finalmente quebrando o silêncio, sustentando o olhar dele, antes de encarar pai e filha. – Eu quero.

– Problema resolvido. Próximo tópico? - o moreno afirmou, virando-se novamente para os outros.

Sigyn olhava de nós para o pai e dele para o rei. Um pedido silencioso de que alguém fizesse algo. Odin lentamente tornou a se sentar nos olhando com interesse. Não havia o que dizer. Não estávamos infringindo nenhuma lei. Os outros pareciam constrangidos, com o atrevimento de Loki. Ele golpeara o ego do conselheiro com tanta força que eu me perguntava se o homem dormiria essa noite. O príncipe preferia sua concubina humana à deusa pareada, afinal.

– Humm.... Então nesse caso...? – Bragi se arriscou a quebrar o silêncio em dúvida. Fisir o fuzilou com o olhar.

–Bom, se vocês dizem que Sigyn seria uma boa companhia, eu estou de acordo. – atalhei mais que depressa. Minha boca se crispou maldosamente, quando a vi desviar o olhar para o chão. Ela não recuaria. Era orgulhosa demais para isso. Aquilo não me satisfazia. Queria vê-la correr para longe. Tirar-lhe o sono. Fazer com que se sentisse impotente como eu me sentia. A faria amargar o atrevimento de existir. Era minha vingança infantil e muito particular. – Mais alguma coisa, além disso? – questionei numa voz cantarolada. Odin ergueu uma das mãos num gesto frustrado indicando que a conversa estava encerrada e poderíamos sair. Sorri para ela.

Loki ofereceu o braço a mim, que o segurei enquanto ele me guiava para fora do salão. Ao contrário dos outros que se preocuparam em reverenciar o rei, saímos sem os olhar novamente ou nos curvarmos. Quando a porta se fechava atrás de nós fui capaz de ouvir os brados de Fisir iniciando uma discussão que não daria em nada. Ri baixinho. Meu noivo me olhou pelo canto dos olhos, um sorriso de escárnio preso nos lábios. Meu noivo. Sorri amplamente com aquele pensamento, sentindo o olhar dele preso a mim.

Beijei-o em meio ao corredor sem o menor pudor. Pouco importava se os guardas estavam vendo. Ele calara Asgard em meu nome. Me pusera acima de qualquer deusa. Estava gravando meu nome a fogo na árvore da família real. Isso seria permanente. Eu seria permanente.


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Notas finais do capítulo

Titia ama ocêis!