That Shark Boy escrita por Kou


Capítulo 1
Livre por mim


Notas iniciais do capítulo

Boa leitura, gente linda o/

[Qualquer imperfeição na escrita, por favor me avise. Não foi betada.]



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Raia 1.

Dizem que os inimigos naturais dos tubarões são os golfinhos. Que em bandos, eles sabem se defender. Não competem por alimento, parceiro ou território. Mas pela água. Em um desafio singelo e silencioso, com direito a sangue. Porém, apenas um golfinho não é capaz de tanto.

E os tubarões, daqueles velozes e assustadores, são seres solitários, vagando cheios de dentes, com princípios próprios e instintivos. Mas este era diferente, mesmo sem se admitir assim. Este, nas pontas de seu âmago, ansiava por companhia. Por compreensão, em uma necessidade arrebatadora e contraditória, que fazia inflar as guelras, em um sentimento mal digerido de indignação. De rejeição.

Uma rejeição que ele mesmo forjara.

E que rendera uma dolorosa mordida na cauda do golfinho.

Haruka nunca compreendeu de fato o que tinha acontecido. Ele só queria nadar. Era apenas uma corrida em estilo livre. Não era para ganhar, não era para machucar. Não era para valer. Era só para nadar. Para sentir a água contra o corpo, enquanto ele se empurrava por ela, entre ela, dentro dela, junto dela. Para frente.

Para a prisão de toda a sua liberdade. Sua obsessão.

Sua obsessão que fora manchada pela culpa.

Makoto também não tinha entendido essa parte. Deixar um clube de natação quando tudo o que vale na sua vida é nadar? Não havia resposta positiva para isso. Era sem sentido. Mas ainda assim, Haruka a respondera com um sim. Sem mais competições. Sem mais repetições de que só nadava estilo livre, e que não queria saber de melhorar seu tempo. Que ganhar não era a mesma coisa que nadar.

Era um amor admirável, o de Haruka pela água. Podia parecer que não, mas Makoto sabia que a melhor das melhores iscas para o amigo era uma piscina. E era deprimente ver aquela situação. Haruka era seu amigo desde quando gostava de lembrar, e não havia mudado tanto desde então. Nadar era tudo. Tudo para nadar. E encarar uma rejeição dessas sem poder fazer nada...

Era uma visão que fazia falta, a de Haru mostrando seu potencial com a maior naturalidade de quem nasceu para aquilo. Ele gostaria de ver de novo. De compartilhar o momento, de fazer parte do grupo.

Mas, faltava algo. Algo que ele não conseguia discernir pela expressão entediada de Haru.

Algo que levara muito tempo para se recuperar – e ainda não se recuperara totalmente. Uma culpa que demorara bastante para sumir.

E sumiu. Sumiu justo quando aquela boa e velha sensação estava de volta. Haru soube que, de fato, não havia como negar. A água sempre teria um efeito surpreendente sobre ele. Assim como quem trouxe aquela sensação. Uma riqueza de alívio.

Raia 2.

Podia ser água, mas não era com toda a água que Haru gostava realmente de ter contato. Quer dizer... Não aquele tipo de contato, de dentro para fora.

Eram lágrimas. Lágrimas as que ele via nos olhos rubros de Rin. Lágrimas carregadas de insatisfação, que por muito tempo arderiam nas memórias de Haru. Porque ele se sentia culpado.

E do outro lado, Rin sentia-se humilhado, mas a partir daquela derrota encontrou-se com seus sonhos. Encontrou-se de volta com o desejo de nadar. O que, inevitavelmente, o colocaria em um caminho perpendicular ao de Haru. Não importava o quanto ele não se entendesse, queria se vingar. E depois, na inefetiva ação de sua vingança – em uma nova disputa contra Nanase Haruka, saindo-se assim vitorioso em matéria de tempo... Ele sentia que aquela água estava lá. Salgando-se de saudade.

Porque não importava o quão teimoso fosse consigo mesmo. O quão teimoso fosse com a inabalável fé de Haru pela água, pela liberdade. Ele sentia falta.

Mesmo na tentativa de fazê-lo nadar pelo tempo, pelos segundos, para ganhar... ele ainda não tinha notado o que realmente fazia-o ganhar. E qual era assim a principal vitória de Haru sobre suas mágoas.

Era frustrante ver seu principal adversário desinteressado pelos seus maiores objetivos contra ele. Era como se, na realidade, não houvesse adversário. Não houvesse um inimigo a quem precisava combater.

E ao mesmo tempo... era uma delícia de desafio. Como Rin poderia atingi-lo? O quanto estava disposto a entregar por isso? O que fazer para sua mordida ser sentida? Qual o valor dessa disputa?

Uau. Até onde iria a sua determinação?

Porém, Rin era teimoso. Não iria perder tão fácil, não para si mesmo. Não parecia ser capaz de assumir que aquele que o fizera chorar um dia, quando menor, era o alvo de sua busca. Era confuso. Rin se afastou, para quem sabe, longe deles, poder afastar não só seu passado, mas seu instinto de tubarão recém aceso.

Mas quem disse que ele resistia a desafios. Sentia que precisava vencer este, a todo custo, para poder encarar enfim seu presente. E por essa mescla de sentimentos que se permitiu chamar Haruka para uma conversa.

E quando estava lá, prestes a encurralar a sua presa, segurando-o bravamente pela gola do moletom, encarando-o fixamente nos surpresos olhos azuis, que não se debatia, não se movia... apenas...

“Rin.” Ouviu ele.

“Rin!” As mãos de Haru seguraram em seus antebraços, ainda na gola do golfinho.

Rin não ouvia seu nome com súplica, como talvez quisesse. Ou talvez nem isso quisesse, porque, aparentemente, o golfinho estava bem com sua vida aquática para ter alguma súplica arrancada nessa relação. O que Rin ouviu foi...

“Eu vou nadar, Rin. Amanhã. E não vou perder para você.”

Alívio. Foi carinho. Aceitação.

“Não precisa chorar.”

“Não vou chorar se eu perder.” Idiota. Retrucou Rin. Não sou mais uma criança. Não vou chorar de novo.

“Você já está chorando.” As mãos perderam as forças quando a realidade dessas gotas se fez ver pelo rosto de Rin, e ainda mais quando este se sentiu abraçado pelo pescoço, por Haru. Um abraço tão distante do semblante normalmente sério de Nanase. Um abraço tão reconfortante. Tão amigo.

Tão seguro.

Raia 3.

“Eu vou nadar, Rin. Amanhã. E não vou perder para você.”

Alívio. Carinho. Aceitação. Ou apenas o que precisava ser dito para trazer o outro ao seu nível de liberdade. Ao seu melhor estilo. Mesmo que um tubarão não se curve a um golfinho, ou vice-versa.

De certa forma... de certa forma era como se fosse seu dever atuar nessa libertação. Nessa reconstrução, para que não se perdesse o que tinham de melhor.

Um som de passos veio romper a quietude do abraço, fazendo Rin erguer o rosto e se afastar, dando margem para água e fogo se confrontarem, passivos, em calma. Rin coçou o nariz com a mão, fungando e limpando as lágrimas. Deu as costas e foi para longe. Haruka olhou para o lado, e sem querer, entendeu de onde vieram os passos.

Gou-chan não pudera evitar. Não falava direito com o irmão para saber o que fazer para ajudar, e todas as suas tentativas até então se mostraram inúteis... Era impensável não se descontrolar e perder um passo quando viu o irmão e Haruka se abraçando. Era como se o melhor dos sinais estivesse premeditando o melhor do que o tempo poderia lhe trazer! Era feliz! Mas não podia ser vista, tinha que sair de fininho. E o fez.

Ou achou que o fez.

Nanase deu de ombros e foi em outra direção. As lágrimas de Rin eram desconcertantes o suficiente.

Principalmente porque não lavavam a mesma derrota de outrora. Era uma outra derrota. Com nada de frustrante ou vergonhoso. A mesma que se abatera sobre Haru quando este se assumiu atado, e não livre como costumava se achar. A mesma que o fazia querer ficar na raia lado a lado com Rin, numa próxima disputa.

Rin podia ser insuportável, às vezes, com suas manias. Com suas necessidades. E isso não fazia dele menos sensível, como pode perceber, inesperadamente.

Vai ver o Matsuoka só queria uma vitória “justa”, na sua concepção. Uma vitória que valesse a justiça do seu esforço para ter Haru no mesmo nível. Porque a separação deles não mudara essa visão, aparentemente. A de que Rin queria se igualar a ele.

Mas para o golfinho pouco havia no que se igualar. Eles sentiam diferente. Pronto. Ou não.

Chegando à piscina da academia, Rin o esperava apoiado na porta, com o casaco jogado sobre o ombro.

Oi, Haru.”

“Rin.”

“Está pronto?” Haruka virou o rosto, ficando de perfil para o outro ao ouvir isso.

“Para fazer nado livre, sim.”

OI!” Rin segurou o braço dele, quase num grunhido feroz, a voz se irritando. “Não confunda as coisas, Haru.”

“Não estou confundido.” Estou me enganando enquanto posso, seria um bom pensamento para continuar.

“Você vai nadar por mim.” Insistiu ele, da conversa do dia anterior, puxando seu braço para que voltasse a cabeça para si, para olhar nos olhos de Haru.

Nadar por você, nada para você, não vai ser além de nadar com você. “Eu vou nadar, Rin.”

“Não é a mesma coisa.” Murmurou ele entredentes, estreitando a expressão, recebendo como resposta o olhar intacto do Haruka, simples e intenso. O golfinho se libertou do aperto que era a mão de Rin e tomou a frente na direção da piscina.

“Vamos logo.”

Raia 4.

Qualquer que fosse o adjetivo sobre a personalidade de Rin (um saco), já estaria mais do que fora de alcance quando largasse o momento do primeiro contato de seus dedos com a superfície da água; o primeiro mergulho. Porque era quando a verdade desses dois se desfazia em beleza: tubarão e golfinho lado a lado, nado a nado, sem riscos, cada um apreciando seu próprio objetivo e sentimento.

Mas juntos, dividindo a mesma água, limitados por traços invisíveis e superficiais, livres em cada braçada, em cada impulso, pulsante em cada respiração, até que a mesma borda de partida fosse alcançada pela mão de um dos nadadores, por milésimos de segundo antes da de seu oponente: onde se tinha o fim da disputa.

Onde as toucas e os óculos eram arrancados e os cabelos ficavam então livres, respingando, desarrumados.

A comemoração veio em ofegos, rápidos e fortes perante o esforço, e então o sério olhar com que se encaravam, o semblante de Rin vivamente feliz, eletrizado pela energia e pela sensação de compartilhar tal disputa com Haru, de nadar livremente – ou não tanto assim – ao lado dele.

O golfinho revivia o seu maior prazer, o de sempre, de poder estar e ter estado em contato com a água... Mas seu olhar captava algo mais na resposta que via em Rin pela recém-vitória. Algo que ainda parecia disforme como a água, e consistente como ela. Engoliu em seco. Algo que parecia lhe trazer de volta o mesmo lugar para uma mesma sensação, há muito não encontrada.

E estava ali. Aquela sensação estava ali, palpável e molhada, dentro deles. De volta.

“Nada mal, Haru.” Contentou-se o tubarão em sua alegria, apoiando-se na raia entre eles. “Foi como nos velhos tempos, mas-”

“Você ganhou.” Anunciou Haru. Rin passou a mão nos cabelos, atirando alguns respingos na água.

“Você ainda não está em plena forma.” Bufou. Hmm... Rin ainda não podia se aceitar realmente melhor ou superior a Haruka? Era isso? Ainda não era esse então o tipo de vitória almejada pelo feroz peixinho? Ele queria continuar eternamente com a perseguição pelo golfinho, tendo-o sempre como um objetivo, e não como um antigo marco de limitação, um obstáculo já superado.

Obstáculo. Que nome mais impreciso para um golfinho desses.

Os olhos de Haru brilhavam em pensamentos, fitando Rin, mas sem dar a intenção de que qualquer coisa fosse sair voz a fora. Com óculos e touca na mão, largou-se num mergulho, dando uma segunda volta, calma e livre, procurando-se na proteção aconchegante que a água lhe proporcionava. Enquanto Rin o olhava e retirava-se da piscina.

“Haru.” Ouviu ele quando emergiu, terminado seu passeio aquático. Olhou-o, com a mão estendida para ajudá-lo a sair, exatamente como Makoto... em uma cumplicidade roubada.

Aceitou-a.

E foi quase como um choque, pelas diferenças contidas naquela semelhança. Um pequeno comichão, uma coceirinha provinda daquele contato, que acabou por fazer cócegas em sua percepção, por reavivar as memórias de bons sentimentos. A picada que recebeu ao trocarem um olhar.

Não podia ser coisa da sua imaginação. Não só.

Raia 5.

Era uma admiração mútua, tão silenciosa e indiscreta. Tão presente e insistente, que já ganhara um lugar de natural em suas personalidades. Eles precisavam do nado do outro. Ambos precisavam de um puro apoio e preocupação, mesmo que não se assumissem assim tão carentes de tal atenção.

A liberdade de um era a força da braçada do outro. O fôlego de outro era a certeza da próxima virada de um.

E, sem saber, era assim que eles se orbitavam. Separados por uma raia, divididos pela incompreensão de seus sentimentos. E ligados pelo mesmo desejo. Nadar. Por si. Pois era consigo que atingiria o outro.

E não foi bem dessa forma, talvez nem nessa ordem, que as ideias se sucederam.

O que importa é que a superfície chegou até elas, e as verdades puxaram o ar, como se tivessem tido anos de apneia.

E Haru e Rin estavam na água de novo. Tirando o cloro nos chuveiros do vestiário. Sem aquela divisão de equipe de torneios, de escolas, sem rivalidades desnecessárias. A temperatura estava quase mais baixa que a da piscina, mas um deles não parecia estar com pressa. Um registro se fechou, e as gotas no piso molhado se tornaram escassas, ocasionais. Os passos seguiram, pararam, e voltaram.

“Rin?” Indagou ele, rente a divisória, sem invadir o espaço da ducha de ninguém.

A única resposta que ouviu foi uma respiração curta, rasgada, que não refletia nenhuma animação de uma vitória. Estava chorando de novo?!

“Rin!” Deu dois passos, encarando as costas do ruivo, a cabeça curvada sob o jato d’água. “O que foi?!”

A mão dele se mexeu até o rosto, para tirar o sal dos olhos, e com estes só entreabertos, um pouco avermelhados, foi que Rin se virou para Haru. A careta de choro já se desfazendo, ele se aproximou e deixou a testa cair de encontro ao ombro do moreno.

“Haru...” Ouviu este, alarmado. E imóvel, sem saber o que fazer. Algumas lágrimas quentes se juntaram às gotas que permaneciam em seu peito, aguardando pela toalha. Rin fungou.

E então as palavras começaram, trêmulas e lentas.

“Eu senti medo. Senti medo de não ter por que nadar. De perder.”

“Quando você saiu da escola?” Perguntou quase sem voz.

“Quando eu voltei também. Até agora... eu estava nervoso. E você permanecia em silêncio. Eu não tinha como saber se você lembrava. Se você pensava, e continuava a nadar, com ou sem isso. Se... você ainda nadava igual, se se importava.”

Haru não tinha muita certeza do que estava ouvindo.

Rin é que parecia não ter se importado muito, quando voltou. Não pareciam a mesma pessoa, aquele de antes e aquele na sua frente. Os dois faziam algo em Haru acender e o impeliam para a piscina, fosse num mergulho sem pressa ou em uma disputa sem prêmio. Talvez algo tivesse acontecido para desencadear tudo o que Rin botava para fora, sem nem berrar, como antes. Talvez ele também tivesse percebido...

Haruka abriu a boca, ainda sem saber se ia falar algo, se ia conseguir.

“Eu senti falta.”

As costelas de Haru foram levemente pressionadas pelo abraço que Rin lhe dava, enquanto cedia ao peso das palavras que pronunciara, na exalação de um suspiro.

Agora que o outro não conseguia se mexer, nem falar, nem pensar. Aquele sussurro abafado lhe dava a certeza que precisava. E ele só fazia olhar para os azulejos na parede, sem realmente enxergá-los.

Prendeu o ar.

Tubarões não deviam ser românticos. Mas ninguém nunca disse que não eram sensíveis.

Raia 6.

Haru expirou, quase com medo. Ele não tinha como virar a cara para se esconder (mesmo que sua expressão não fosse mudar muito). Ele sentiu falta.

Piscou, duas vezes. Em câmera lenta, sua mão se ergueu até o braço do tubarão, tocando-o sutilmente no ombro.

“Rin.” Este levantou a cabeça devagar, em sincronia, com os olhos molhados, meio fechados. Sem culpa. Haru engoliu a saliva. “Eu também senti sua falta.” Completou, baixinho.

E reconheceu. Reconheceu a verdade em suas próprias palavras. Reconheceu o arrepio que lhe subiu pelo tronco, até a nuca, no contraste da sua pele nua com os lugares onde a de Rin a cobria, ardendo. E reconheceu, enfim, no brilho rubro dos olhos do peixinho, a sensação que estava de volta. E o motivo óbvio da sua volta.

A sensibilidade daquele tubarão era tão intensa... Tão envolvente. E a estática do golfinho era quase comovente... Mas perdoável.

Os dedos de Rin se moveram nas costas de Haru, se apertando, tensionando.

Eles estavam tão próximos. Tão perto. Com tanto se sufocando no peito.

Que acabou. Acabou a distância. Acalmou o silêncio, desfez a pressão.

Haruka se inclinou contra Rin, com a beleza do golfinho que se entrega ao mergulho, na onda mais esperada de emoções. E suas bocas se roubaram, sem fúria, num carinho inesperado, úmido e sincero.

Por um instante pararam, as pálpebras semicerradas, o tempo estagnado em torno deles, sem dó. Só para se puxarem de volta, para se entregarem, para Haru se perder no impulso do ataque. Pois foi assim que Rin se portou, autêntico, como se o mais forte e mais desejado dos oponentes estivesse em suas mãos, em seu controle, por fim.

Sem resistência. Apenas dois nadadores se afogando em um sentimento, dois inimigos no fervor da melhor batalha, sem mais armas, perdidos em um abraço tão certeiro, por um beijo.

Tubarão e golfinho em sintonia mesmo fora d’água.

Ou não tão assim, pois estavam tão envolvidos que dois passos em busca de um apoio os botaram de baixo da ducha de novo, separando-os num rompante, com baixos ofegos. Parecia que o trio era impossível de se desgrudar.

Haru não fugiu, nem desviou o olhar quando se afastaram. Nem mesmo a sua natureza poderia ter desencadeado isso. Nem quando Rin escondeu a boca com as costas da mão, a pura timidez no olhar, e as bochechas rosadas.

Algo nele refletia aquela cor. Algo quente e pulsante, que inflava e inflamava por dentro do peito. Mas tudo o que Haruka conseguia discernir era carinho. Só carinho.

E admiração. Com recheio de carinho.

Raia 7.

Para onde quer que olhassem, veriam a mesma cena, sentiriam a mesma coisa, ardente, a mesma água gelada caindo sobre eles e os interrompendo de chofre, in ou oportunamente.

Pois nem o vento que balançava os cabelos de Matsuoka Rin e Nanase Haruka estava conseguindo levar embora o rosa das bochechas do tubarão. E daí a coisa ficava engraçada, já que eles não exatamente se olhavam, mas também não estavam propriamente se evitando. O primeiro se fixava na latinha de refrigerante na sua mão, enquanto o segundo tinha as suas no bolso, o rosto virado para o nada.

Cada um arrumando as coisas do seu jeito. Um mandando a culpa embora, e o outro assentando a vitória bem fundo no peito, que não queria saber de parar de pular. A sensação ainda ali, ao redor deles. Os dedos quase fugindo para contornar os próprios lábios, numa confirmação da intimidade que se sucedera.

E tudo o que borbulhava dentro de Rin acabava achando a saída sempre da mesma forma... sempre nas mesmas gotas, limpando os mesmos olhos. Fungou, tentando ser discreto.

Mas Haruka o olhou.

E da curta surpresa em seu rosto, surgiu uma última cobrança.

“Rin.” O tubarão virou ainda mais para o lado oposto ao dele. Não adiantou de nada. “Você disse que não iria chorar.”

E daquele olhar marejado veio, lentamente, um sorriso alegre e sincero, cheio de dentes pontudos.

“Eu não perdi.”

E era verdade. Nenhum deles tinha perdido nada. Pelo contrário. Algo no nado deles estava completo. Algo naquela inimizade toda fora vencida. Algo não estava mais em falta. A liberdade estava assinada, junto da chave das algemas que se fecharam em torno de seus tornozelos, pulsos ou desejos.

O sorriso bobo ainda preenchia a face de Rin, que largou a latinha no banco e deu um pulinho para o lado, se aproximando de Haru. Ele desconfiou. Só não se preveniu. Não teve nem tempo para reagir. Os dedinhos gelados do refrigerante chegaram por seu pescoço enquanto o tubarão se inclinava para ele, de olhos fechados, lábio tocando lábio. Querendo, quem sabe, dar uma mordida diferente. De amor.

Não era justo! Mas... talvez esse fosse o verdadeiro valor da vitória.

Não adianta combater o que não é para ser vencido.

Raia 8.

Dizem que os amigos devem ser mantidos por perto. Mas ele era um tubarão, supostamente solitário. E dizem que os inimigos, os golfinhos então, devem ser mantidos mais perto ainda. Quer eles saibam se defender sozinhos ou não.


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Notas finais do capítulo

Fim ~~~ !
Espero que tenham gostado ;3
Obrigada por ler!

Até a próxima ;*
M ^^



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