— Abram a porta!
Castiel acordou com o susto. Ele levantou-se, sem saber o que fazer. A droga da sala não tinha nenhuma outra saída e, agora, ele não tinha mais como fugir. Seus olhos negros percorreram o local em busca de uma solução, mas foram distraídos por algo repentino. Uma figura de cabelos negros estava deitada no chão, com a jaqueta dele cobrindo as suas pernas finas. Castiel sentiu os lábios abrirem em um sorriso torto.
Ela era bonita. Ele tinha que admitir.
Involuntariamente, ele abaixou-se ao lado da garota. Ela tinha uma respiração brusca e, ao mesmo tempo calma. Suas sobrancelhas inclinaram-se para frente na direção do nariz enquanto dormia, como se ela estivesse zangada com alguma coisa, ou triste. Seus lábios rosados formaram um biquinho.
Castiel sorriu. Ela estava com a cara de uma garotinha mimada.
Nesse momento, ele acabou se dando conta de que, na verdade, ele não sabia nada sobre ela. Era uma novata, é claro. Cantava, era teimosa, às vezes era um pouco ingênua, mas, ao mesmo tempo, madura. E escondia um segredo. Algo que ele não pretendia descobrir, afinal, não era da sua conta.
— Abram a porta! — a voz persistiu. Castiel tirou vagarosamente a sua jaqueta preta das pernas da novata, Natsumin, e em seguida vestiu-a.
— Abram a porta! — parecia ser a voz máscula de Taylor, a fiscal de corredor. Ele jurava que ela— ou ele era um homem, mas a diretora insistia em chama-la de “moça”. Ele sorriu. Se aquilo era uma moça, imagina o que seria um homem para diretora.
— Como você quer que eu abra a porta se me trancaram aqui? — Castiel tinha a voz calma e baixa.
— Não importa! — Taylor gritava do outro lado. — Não acredito no que você diz.
— Tudo bem então. — Castiel procurava ser o mais calmo possível, mas confessava que já estava perdendo a paciência com aquela coisa sem sexo definido. — Você continua gritando e eu continuo trancado aqui. — ele olhou o corpo de Natsumin deitado. Ela dormia como uma pedra. — Estou sozinho. — afirmou. Não podia incriminá-la, afinal, ela não tinha culpa. Era apenas uma novata idiota que fazia coisas estúpidas. — Não me importo em perder todas as aulas do dia.
— Castiel... — A voz de Taylor representava uma ameaça.
— Olhe você mesmo. — ele deu um leve soco na porta. — Se fosse inteligente o suficiente perceberia que há uma trinca bem abaixo da fechadura. Aposto que alguém a fechou.
Taylor abaixou a cabeça, do outro lado da porta.
— Está trancada. — Taylor puxou o trinco com força, quebrando-o.
— Genial garota. — “ou garoto”, falou mais baixo. — Se tivesse me escutado desde o começo, não me faria perder meu tempo.
— A diretora quer vê-la, Castiel. — Taylor levantou umas das sobrancelhas, encarando o sorriso sarcástico no rosto do ruivo. — Tem mais alguém com você?
— Já falei que estou sozinho. — Castiel puxou a porta às suas costas, fechando-a levemente.
Taylor, apesar de desconfiada, não olhou o que havia por trás da porta.

***
Natsumin acordou com o coração disparado. Tinha levado um susto grande. Ela nunca havia dormido tanto. O sonho a havia prendido, sem deixa-la saber o que fazer. Ela havia sonhado com seus pais. Ela estava no avião junto com eles quando ele... Caiu.
Ela olhou ao redor da sala vazia e percebeu que não havia mais ninguém ali. Apenas ela.
— Castiel? — ela falou baixo. Não era possível, ele não podia tê-la abandonado. Depois de tudo...
Ela passou a mão pelos cabelos, tentando se concentrar. Ela tinha que parar de criar expectativas. Castiel era só mais um. Não podia esperar mais dele, assim como também não podia acusa-lo sem provas. Nem mesmo em pensamento. Nãos seria justo.
Uma camisa vermelha, que estava praticamente enrolada em seu pescoço por conta das reviravoltas que seu corpo dava durante o sonho, caiu em seu colo. Tinha o cheiro de um perfume maravilhoso, mas cujo nome ela não sabia. Era o cheiro de Castiel.
Natsumin dobrou a blusa e observou a porta da sala. Estava um pouco entreaberta. Ela colocou a blusa dentro da mochila e recolheu seus pertences, colocando-os também na mochila. Em seguida, passou pela porta, evitando fazer qualquer ruído.
Os corredores de Sweet Amoris estavam vazios, provavelmente porque ainda não havia iniciado o horário das aulas. Ela podia ouvir uns ruídos estranhos enquanto caminhava pelo corredor, mas preferia acreditar que era apenas coisa da sua mente. Ela foi se aproximando aos poucos da sala dos professores e percebeu que os ruídos vinham de lá. À medida que se aproximava, Natsumin podia perceber que os ruídos se transformavam em vozes enfurecidas.
— Eu sinceramente não acredito, senhor Castiel! — a voz da diretora estava alta e completamente alterada. — Agora você conseguiu passar dos limites!
Natsumin ouviu a risada baixa de Castiel.
— Eu vou pedir pela última vez. — a diretora parecia estar começando a se acalmar, visto que sua voz parecia um pouco mais serena. — O que você estava fazendo na sala proibida?
— Eu uso a sala de vez em quando. — Castiel confessou. — Festinhas. Não sei porque vocês a escondem. Só há velharias e poeira.
— Então está querendo dizer que a culpa foi inteiramente sua? — Taylor perguntou.
— Sim. — Castiel parecia estar ficando impaciente.
— Castiel. — a voz da diretora estava um pouco mais alterada, mas, visto por sua respiração ofegante, ela devia estar se acalmando. — Infelizmente, tenho que tomar as medidas necessárias.
As medidas necessárias? Ela iria expulsá-lo? Natsumin não podia deixar que isso acontecesse. O que ele estava pensando? Ela não precisava de ninguém para defendê-la, fazia isso por si mesma. Além do mais, se havia alguém que tinha culpa ali, esse alguém era ela.
E se tinha algo que ela não suportava, era injustiça.
— A culpa não foi dele. — os olhos de Taylor e da diretora a estudaram, assim que a garota entrou na sala. A diretora parecia espantada, já Taylor tinha a mesma expressão de sempre.
O que chamou a atenção de Natsumin foi o olhar de um garoto de cabelos rubros, cujo rosto não tinha expressão. Entretanto, seus olhos não mentiam. Eles a encaravam com uma fúria iminente, um sentimento de culpa, mas que no fundo, expressavam agradecimento.
Natsumin desviou o olhar dele, mantendo a expressão rígida para a diretora e Taylor.
— Senhorita Natsumin. — a diretora pareceu surpresa. — Sinceramente, eu não esperava que...
— A culpa foi minha — Natsumin se entregou. Não que ela sentisse algo por Castiel, mas porque ela não admitia injustiças. — Toda minha. Eu sinto muito. Eu...
— Quanta mentira, novata. — Castiel satirizou. Não ia admitir mesmo que uma garotinha o defendesse. — Deveria ser punida apenas por isso.
— Não é mentira. — Natsumin retrucou— Eu estava...
— Não precisa terminar. — Castiel interrompeu-a.
— Deixe-a terminar, senhor Castiel. — a diretora o interrompeu.
— Isso é impossível! — Castiel falava calma, mas o tom de sua voz era preocupante. Instigava a fúria ainda mais iminente. — A garota precisa ser muito idiota para fazer algo assim... — Castiel descruzou os braços e abriu um sorriso de raposa, pousando os olhos em Natsumin de forma totalmente indiscreta. — A não ser que novata estivesse com interesse em mim...
— Diretora. — Natsumin começou, sem hesitar, evitando o olhar rígido de Castiel. — Eu decidi ficar aqui até mais tarde para pegar a matéria que eu perdi durante as primeiras semanas de aula. Eu não queria ficar sozinha em casa, então decidi continuar aqui. Eu sinto muito. — Natsumin agora virou o olhar para Castiel, que a acompanhava com a expressão um pouco mais branda. — O senhor Castiel apenas entrou na sala para me alertar que eu não deveria ficar ali, mas havia mais alguém na escola e nos trancaram por fora. Por isso tivemos que passar a noite aqui. Sinto muito.
— Isso é verdade, senhor Castiel? — a diretora tinha a voz bem mais calma.
Castiel cruzou os braços sobre o peito nu, abaixo da jaqueta. Natsumin pedia baixinho para que ele concordasse.
— É. — respondeu relutante.
— E por que escondeu isso? — Taylor perguntou.
— Não é da sua conta, garotão. — Castiel não conteve a raiva.
Taylor ameaçou bater nele, mas com o olhar da diretora. Conteve-se.
— Tudo bem. — as diretora juntou as duas mãos, esfregando-as em seguida, em um gesto que significava término de assunto. — Estão liberados senhor Castiel e senhorita Natsumin.
— Obrigada. — Natsumin agradeceu. — Isso não acontecerá novamente.
— Não faça promessas que não pode cumprir. — Castiel sussurrou no ouvido da garota antes de atravessar a porta com os braços cruzados.
— Espere! — Natsumin gritou pelo corredor, correndo atrás de Castiel, que já se encontrava próximo ao pátio. Eram sete horas da manhã e o sol iluminava o gramado do pátio de Sweet Amoris. — Castiel!
Castiel parou de andar no meio do pátio, de costas para ela.
— Acho que... Isto é seu. — Natsumin abriu a mochila e retirou a camisa vermelha. — Obrigada.
Castiel apenas pegou a blusa de sua mão.
— Espero que esteja satisfeito com a sua boa ação. — Natsumin brincou.
Castiel manteve a expressão séria. — Que boa ação?
— Tentou me proteger, não foi? — Natsumin abriu um sorriso inocente. — Obrigada.
Finalmente Castiel sorriu.
— Tenho o papel de proteger donzelas indefesas. — ele encarou o rosto de Natsumin. O sol batia em seus olhos azuis e ela estava ainda mais bonita. — Mas ODEIO quando elas tentam me defender.
Natsumin notou a grosseria em sua voz. Principalmente quando disse “odeio”.
— Eu não defendi você, Castiel. — Natsumin foi sincera. — Eu apenas disse a verdade. Seria injusto deixa-lo ser punido sozinho e... Eu detesto injustiças.
Castiel sorriu e deu de ombros. Não falou mais nada. Apenas seguiu caminho para o portão de saída.
— Não vai ficar para as aulas? — Natsumin perguntou.
Castiel abriu um sorriso de raposa, oculto, mas não se virou para ela. Continuou andando.
— Vou recuperar minha noite perdida. — ele respondeu, atravessando o portão e dirigindo-se para um caminho indefinível.