O Meu Melhor Amigo escrita por MilaScorpions


Capítulo 4
É que eu me mordo de ciúmes.


Notas iniciais do capítulo

Os avisos são os de sempre: Capítulo não betado, a imagem não me pertence, agradecimentos e comentários no final...

Espero que gostem do POV de Aioria. Boa leitura.



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É que eu me mordo de ciúmes.



— Conta outra, Deba — Milo pediu, já totalmente bêbado. Sim, porque só uma criatura em estado total de alcoolismo poderia achar graça naquelas piadas grotescas que o tal namorado de Mu estava contando. O cara era um idiota. Somente Mu não percebia isso.

— Tá bom, tá bom... Só mais essa — com um sorriso enorme e se achando o tal, ele resolveu contar outra de suas horríveis pilhérias. — Dois amigos conversam sobre as maravilhas do Oriente. Um deles disse: Quando completei 25 anos de casado, levei minha mulher ao Japão. O segundo perguntou: Não diga? E o que pensa fazer quando completarem 50? O primeiro respondeu: Volto lá para buscá-la.¹

É sério que todo mundo estava dando gargalhadas disso? Inacreditável!

— Muito boa, Deba. Muito boa. — Shura, o noivo de Shina, fingiu ter gostado. É claro que devia estar fingindo.

Divertida era um adjetivo que estava longe de definir essa festa. Eu já pirava para ir embora, aquele cara já estava me dando nos nervos, e o Ouzo que eu bebia revirava o meu cérebro (e o meu estômago também). Mas ao invés de partir para casa, peguei mais uma bebida e fui para sacada.

O noivado era uma simples comemoração informal, com poucos convidados e sem aquelas festanças típicas dos gregos (provavelmente porque Shina e Shura eram estrangeiros), e a festa havia sido no apartamento deles mesmo.

O apartamento de Shura tinha uma varanda enorme de onde se podia ver o mar. O céu estava estrelado e a lua cheia clareava a noite. Fiquei lá, contemplando a paisagem enquanto tentava entender o que ainda me prendia ali.

Poderia ser por consideração a Shina, que era uma garota legal, além de ser minha colega de trabalho. Ademais, tinha o fato de Shura ser o melhor amigo do meu irmão Aioros que, inclusive, era padrinho do casamento e só não estava lá porque viajara para França, onde participava de uma congresso sobre medicina. Meu irmão era médico, um dos melhores da Grécia.

Sempre tive muito orgulho de Aioros. Meu pai morreu quando eu tinha apenas três anos de idade e o meu irmão foi o cara que me guiou. A figura paterna que eu tive. Minha mãe se casou novamente alguns anos depois; entretanto, eu odiava o meu padrasto. Aioros também não gostava dele. Arrogante, estava sempre tentando provar que era mais rico e melhor que todo mundo.

Mas voltando à festa... Quem sabe, eu estivesse mesmo era esperando o momento em que Mu iria acordar e impedir que aquele cara ficasse acarinhando seu cabelo.

Eu sei que se Aioros estivesse aqui, com certeza, diria que eu estava com dores-de-cotovelo porque Mu estava com mais zelo com o tal do seu namorado do que comigo. Segundo meu irmão, no dia em que nasci, chorei de ciúmes ao ver a enfermeira correr para dar atenção a um bebê que estava se engasgando com alguma coisa. “Ele é mais importante que eu?”, eu teria dito, se soubesse fazê-lo à época.

Eu discordava de Aioros. Eu não era assim tão ciumento. Acho que não muito. Ou talvez, também não pouco. Numa escala entre não ligar para minha namorada Marin ter um amigo gay e ficar tranquilo se aquele ex babaca dela a chamasse para sair “coincidentemente” quando a namorada dele estivesse fora da cidade, eu seria um meio termo.

Enfim, deu para perceber que meu ciúmes era normal e que era óbvio que qualquer pessoa em sã consciência concordaria comigo de que não era algo muito agradável de ser ver, o seu melhor amigo te abandonando e te ignorando completamente durante toda aquela fatídica festa para ficar de mãos dadas com um ser bizarro, sem graça e feio.

Sim, ele era feio, parecia um monte de músculos anabolizados. Até o nome dele era estranho. Aldebaran. Além de ser escandaloso. A risada dele dava para ouvir no quarteirão inteiro. E folgado também. Onde já se viu, um cara totalmente desconhecido da galera ficar de conversa com todo mundo, como se já fizesse parte do grupo? Não era o terreno dele. E o falso do Milo ainda ficava dando conversa só pra tentar enturmar o Camus. Com certeza era isso.

Estava evidente que Mu havia perdido o juízo para namorar esse cara.

Não. Isso era inadmissível.

E veja que não tinha preconceito por eles serem homens. Mas é que havia algo nele que me aborrecia mesmo. Eu não estava, por exemplo, incomodado com o namorado de Milo. Camus, ao menos, se mostrava mais discreto e não ficava tentando ser o centro das atenções, muito menos ficava agarrando Milo toda hora como esse Aldebaran ficava fazendo com Mu na frente de todo mundo.

Sem contar que era apalpável os super constrangimento de Mu com essa situação. Eu percebia, porque ele estava enrolando uma enorme mecha do seu cabelo entre os dedos. Sempre fazia isso quando ficava acanhado. Mu era muito tímido e discreto, vivia com o nariz enterrado em um livro, esperando que ninguém o notasse. Isso só confirmava a minha tese de que esse Aldebaran não combinava em nada com ele.

Faltava pouco, muito pouco, para eu socar a cara de Aldebaran. Tinha calafrios toda vez que ele abraçava Mu. E foi por não suportar mais presenciar essa cena que fui pra varanda.

— É uma linda vista! — Ouvi a voz suave de Mu atrás de mim e apenas confirmei, ainda emburrado. Sequer me virei em sua direção.

Eu estava enfurecido por ele ter ficado todo empolgado com esse namoro. Até mudou seu estilo de se vestir por causa desse babaca. Embora ele estivesse malditamente lindo com aquela calça jeans escura apertada e uma camiseta branca gola V justinha que marcava seu corpo perfeito (eu já havia reparado. Quem não repararia?). Só pra esse idiota ficar babando nele como um buldogue velho.

Mu se aproximou um pouco mais. Estávamos lado a lado, e pude sentir o perfume floral que emanava dele e que era muito bom. Muito bom mesmo.

— Foi por isso que eu quis vim morar na Grécia com Shion. Essas paisagens lindas me encantam — Ele comentou fechando os olhos. Inspirou fundo e expirou devagar, curtindo a brisa que vinha de fora invadir seu rosto sereno. Em seguida, virou-se para mim e sorriu.

Retribui o gesto. Não conseguia ficar muito tempo chateado com ele. Seu sorriso era tão sublime que tinha o poder de me acalmar nos momentos mais cruciais.

— Podemos passear amanhã pela orla, como a gente fazia — convidei. Costumávamos fazer isso muitas vezes; embora, desde que comecei namorar Marin, nossos passeios se tornaram esporádicos.

— Adoraria. — Ele suspirou e colocou uma mecha do cabelo atrás da orelha. Eu gostava da cor do cabelo de Mu. Sem contar que eu ficava impressionado em como ele conseguia mantê-lo tão bonito. Mu era bem esmerado. — Mas não posso...

— Por quê? — perguntei fazendo aquela fisionomia de cachorro sem dono que Mu nunca resistia. Já notei isso.

— Amanhã Aldebaran terá uma luta importante. E prometi assisti-la — explicou. Estreitei minhas sobrancelhas enquanto apertava meus punhos. Embora quisesse mesmo era apertar o pescoço desse Aldebaran. — Mas não fique chateado — ele continuou dizendo, olhando no fundo dos meus olhos. Percebendo minha chateação. — Prometo que fazemos isso outro dia. Tudo bem?

Não. Não estava tudo bem. Mu estava me trocando por esse troglodita. Fiquei indignado. Até esse cara aparecer, Mu me adorava. E é por isso que eu sentia vontade de colocar meu punho em uma parede cada vez que ele preferia ficar ao lado desse cara. E no momento em que tentaria convencê-lo a mudar de ideia, o tal do Aldebaran nos interrompeu.

— Oh, encontrei você. Mu, está na nossa hora...

— Tenho que ir... — disse Mu. Seus olhos esverdeados ainda cravados nos meus.

— Aioria, foi um prazer conhecê-lo — o idiota do seu namorado falou e estendeu sua mão pra me cumprimentar. — Até mais.

Assenti com a cabeça e apertei sua mão, só pra não parecer mal-educado, e pensei: O prazer foi meu... meu e do meu soco inglês embebido em álcool bem no meio da sua testa, seu babaca.

Quando eles estavam saindo, chamei por Mu. Ele se virou.

— Vou cobrar... — Lembrei-o sobre o nosso passeio pela orla. Aldebaran me olhou enviesado e Mu gesticulou que sim com a cabeça. Saíram em seguida.

Fiquei pensando no quanto esse namoro de Mu estava me afetando, me deixando estressado e despertado o incrível Huck do meu ciúmes. Mas isso deve ser normal, eu acho. Sentir ciúmes do melhor amigo. É que eu nunca o havia visto com um namorado antes. Não era como se ele não tivesse pretendentes. Já presenciei vários caras farejando-o desde que nos conhecemos, há cinco anos, quando ele foi trabalhar na “Designer Saint”. Porém, ele sempre rejeitava todos.

Só que tinha algo a mais me incomodado. No entanto, eu ainda não conseguia compreender direito o que era. A verdade é que isso vinha acontecendo já há algum tempo. E tudo piorou naquela noite em que ele dormiu lá em casa.

Talvez não tenha sido uma boa ideia eu ter dormido ao lado de Mu e também tê-lo jogado no chuveiro e trocado sua roupa. Mas não tive alternativa, fui eu quem o incentivou a beber. Como ele não estava acostumado, acabou passando mal. Era minha obrigação cuidar do meu amigo.

Só que aquilo me causou sensações estranhas que eu evitava pensar. Não consegui, por exemplo, dormir direito na ocasião. Passei toda a noite revirando e tentando ficar confortável. E isso não foi só porque eu havia dormido na cama com outro homem. Afinal, eu já havia dividido o colchão com Aioros algumas vezes quando eu era criança e ficava doente. Mas é que, de uma forma muito estranha, eu fiquei aceso. E, assim que acordei, tive que tomar um banho bem gelado para acalmar a armação desconfortável em minhas calças e poder olhar pra Mu normalmente.

Eu sei que foi esquisito o jeito como eu o observava enquanto ele dormia feito um anjo. Não é que eu desejasse Mu. Eu não desejava. Ele era meu melhor amigo e eu não era gay. Tá certo que eu me sentia muito bem ao seu lado e amava conversar com ele. Ouvir sua voz doce me fazia um bem inefável. Mas isso não significava nada mais do que amizade. O problema era que Mu possuía traços bem delicados e, apesar disso sempre ter me chamado atenção, nunca tinha reparado tão detalhadamente como naquela noite.

Estava entretido nesses pensamentos quando senti um tabefe na orelha. Virei-me no impulso, já com os punhos no jeito pra espancar o engraçadinho.

— Merda! Perdeu o juízo, Milo? E quer perder também todos os dentes? — esbravejei irado enquanto o idiota continuava dando risadas.

— Até parece que numa luta entre nós dois, você ganharia — ele disse fazendo caso. — E já estava saindo fumaça dessa sua cabeça de tanto ficar aí pensando.

— É claro que eu o derrotaria num piscar de olhos — falei. Isso era óbvio!

— Não mesmo. Mas enfim, vai ficar aí a noite toda sozinho matutando? Vamos para mais uma rodada de bebidas e brindes. Não quer vim com a gente?

Segui com Milo de volta para sala, ainda tentado a surrá-lo.

— O que você achou do namorado de Mu? — indaguei. Ansiava saber se mais alguém havia tido as mesmas impressões que eu.

— Tem o jeito de ser uma pessoa legal. Gostei dele. Você não?

— Sinto que tem alguma coisa de errado com esse cara.

— Ah, Aioria, deixa de ser implicante. O Muzinho estava mesmo precisando se divertir um pouco. Aposto que hoje ele tira o atraso. Por isso foi embora mais cedo. — Ele olhou no relógio. — Ainda é meia-noite.

— Como assim tira o atraso? — questionei.

— Como assim tira o atraso? — ele repetiu e deu uma risadinha sarcástica. — Ah, Aioria... Que pergunta!

E foi então que a ficha caiu. Essa informação foi a aranha radioativa que me transformou em um monstro. A situação era bem pior do que eu supunha.

Saí em disparada. Não aguentaria ouvir mais nada que me lembrasse Mu e o namorado dele, ou iria enlouquecer.

— Cuidado para não perder o sapatinho de cristal²... — ainda pude ouvir Milo gritar antes de eu atravessar a porta.

Entrei no meu carro. Respirei fundo. Dei a partida e pisei o pé no acelerador. Sabia que não deveria dirigir depois de beber, mas a culpa era de Mu. Eu não havia ido àquela festa com intenções de embriagar-me. Embora ainda não estivesse bêbado.

Onde estava Marin numa hora dessas? A culpa era dela também. Quem sabe se a minha namorada estivesse comigo, eu estaria entretido com outras coisas que não ficar imaginando o meu melhor amigo transando com o namorado dele. Só de pensar nisso eu tinha vontade de matar aquele cara. Talvez Milo tivesse razão, a falta de sexo estava me fazendo muito mal. Só podia ser isso. Quando Marin voltasse (o que iria acontecer na próxima semana), ela teria que pagar tudo com juros e correções.

Liguei o rádio pra tentar distrair minha mente e afastar esses pensamentos inoportunos. Tocava a música Lady Starlight da banda Scorpions, uma famosa banda de rock originária de Hanôver, Alemanha. Mu adorava essa música. Dizia que era uma elegia perfeita entre o amor e o cosmo.

Lembrei-me do dia em que o presenteei com o CD dessa banda. Passamos toda a tarde ouvindo as músicas, cantando e assassinando as letras. Mu até que cantava bem, mas eu sempre fui desafinado. Ouvir aquela música só me fazia lembrar ainda mais dele. A imagem do seu sorriso lindo e meigo se desenhava em minha mente, sua adorável animação enquanto ele cantava e eu fingia com os dedos que tocava um guitarra, seus cabelos longos esparramados naquela sua pele branquinha...

E se sua pele branquinha estiver agora sendo agarrada por aquela mão grosseira do seu namorado ao som de Scorpions?

Desliguei o rádio imediatamente.

Será que ele não vê que está fazendo a coisa errada?

Aquela sensação estranha invadia novamente meus pensamentos. Senti um troço esquisito no peito, uma espécie de angústia. Eu não conseguia compreender o porquê. Mas de uma coisa eu tinha certeza. Aquele cara não servia pra Mu. E eu precisava dizer isso a ele. Fui tomado por um desejo avassalador de ouvir sua voz... E foi com esses pensamentos que me deixei levar pelo impulso.

Estacionei o carro. Peguei o telefone e disquei o número de Mu. Ele não atendeu. Será que eles estão...? Tentei novamente aflito.

— Aioria, aconteceu alguma coisa? — ele atendeu depois do terceiro chamado, aparentemente muito surpreso.

E foi então que percebi que não fazia ideia do que eu diria a ele. Por que diabos, um amigo ligaria pra outro naquele horário, sabendo ainda que a pessoa estava acompanhada, sem ter acontecido nada de importante? Eu nunca penso antes de fazer.

— Oi, Mu... Ah... você já tá em casa? — indaguei, completamente aéreo e pude escutar a voz estrondosa do seu namorado perguntando o que era. Senti vontade de espancar o cara. — Desculpa por te ligado, eu... é que liguei errado. Estava tentando ligar para Milo. — Me estapeei em pensamento.

— Você não está na festa com ele?

— Estava. É que saí e acho que a bebida não me fez bem, estou um pouco tonto, queria que ele me ajudasse e...

— Está passando mal? — ele questionou. E foi aí que aquela ideia estúpida começou a tomar forma. E, naquele momento, eu não me importava se iria bancar o ridículo.

Foda-se.

Precisava fazer ao meu melhor amigo e colega de trabalho um favor. Iria livrá-lo desse cretino. Afinal, era minha obrigação.

E trabalharia nisso até que ele namorasse pessoas que eu aprovasse. E tinha que ser antes dele fazer uma besteira. Eu gostaria que Mu me livrasse de uma enrascada, caso eu estivesse, assim como ele, cego o suficiente para não perceber.

E aquele Aldebaran era um perdedor, não era digno de Mu.

— Acho que estou — menti descaradamente. — Minhas vistas estão muito embaralhadas e tenho a sensação de que vou desmaiar a qualquer momento. Tô me sentindo estranho e fraco.

— Onde você está? Eu vou aí... — Ele falou preocupado e eu sorri vitorioso.

Mu iria colocar o brutamonte pra ir embora. Quando chegasse aqui, eu falaria que já estava melhor, convencê-lo-ia a terminar com esse namoro estúpido e voltaríamos felizes pra casa.

— Estou perto de um posto de gasolina. A uns dois quarteirões da casa de Shura, eu acho, não tenho muito certeza...

— Em 15 minutos, no máximo, chego aí. Fica tranquilo.

— Estarei esperando. Não sei se aguento muito tempo — fiz drama.

Eu sei que o que fiz não foi legal. Mas os fins justificam os meios, não é o que dizem? Ou não? Enfim, foi pensando nisso que fechei os vidros do carro, encostei folgadamente no banco com os braços cruzados e cerrei os olhos enquanto, satisfeito, aguardava Mu chegar.

Dez minutos depois, assustei com ele batendo no vidro. E para minha surpresa, não veio sozinho.

Merda! O que esse mastodonte veio fazer aqui?

— Aioria, fiquei tão preocupado. Você está bem? — Mu parecia mesmo angustiado.

— Ele parece muito bem — comentou o babaca do Aldebaran e lancei lhe um olhar irritado.

— Eu tô me sentido mal, sim. Muito mal — grunhi. Deixando me levar completamente pela raiva.

— Então é melhor levá-lo a um hospital — Aldebaran disse lançando-me um olhar desconfiado.

— Não! — assustei-me. Era óbvio que se eu fosse ao um médico, ele saberia que eu estava muito bem de saúde. Mas eles ficaram espantados com minha reação e tive que disfarçar. — Quer dizer... acho que não é o caso.

— O que você sente? — Mu perguntou.

— Não sei, um mal estar, deve ser queda de pressão, hipoglicemia, vai saber — contei.

— E aparece assim, nos momentos mais inconvenientes. — Aldebaran se mostrou debochado.

— Aioria, talvez seja melhor mesmo irmos a um hospital. Estou muito preocupado com você — Mu falou. — Não parecia bêbado na festa agora a pouco. E você sempre teve uma saúde de ferro. É estranho isso.

— Se ele está com tanta resistência, Mu... é porque não é tão grave assim. Não é, Aioria? — O sorriso enviesado continuava estampado no rosto de Aldebaran.

Respirei fundo, vencido. Mas não iria deixar que Aldebaran saísse vitorioso. Se era guerra que ele queria. Guerra ele iria ter.

— Tem razão, Mu. Então, vamos ao hospital — concordei. — Estou mesmo muito mal. Até poderia muito bem morrer enquanto estamos falando — ressaltei. Ainda bem que Aioros estava viajando. Ele arrancaria meu couro e depois me daria um sermão. Seria humilhante.

— Eu irei com você ao hospital. Vai ficar tudo bem... — Mu proferiu e olhou para Aldebaran, como se dissesse “preciso ajudá-lo”.

— Está certo, então — Aldebaran falou azedo, com os lábios torcidos — Mu, você sabe, eu preciso ir. Hospitais são sempre desgastantes e tenho que acordar cedo, estar bem disposto para a luta amanhã... Mas se você quiser que eu fique, eu...

— Não precisa se preocupar. Vai pra casa e descanse.

— Qualquer coisa você me liga. Deixarei o celular do meu lado.

— Está tudo bem. E obrigado por entender — Mu falou verdadeiramente agradecido.

— Nos vemos amanhã, então. — O Troglodita agarrou Mu, que ficou mais vermelho que o esmalte escarlate que fiz Milo usar quando ele perdeu uma aposta que inventamos certa vez, pra ver quem pegava a morena mais bonita da balada. O sangue ferveu em minhas veias e virei o rosto, emburrado, para não ver a cena ou não saberia o que seria capaz de fazer.

Odeio esse filho da puta!

Durante o trajeto que fazíamos para o hospital, um silêncio enorme se instaurou entre nós. Eu estava preocupado em como faria para convencer um médico de que não estava bem. Olhei para Mu e ele parecia preso em seus pensamentos, como se estivesse tentando entender uma expressão matemática complicada. Será que ele estava chateado por eu ter atrapalhado o romance dele?

E se Mu estivesse mesmo deslumbrado por Aldebaran? Essa ideia me irritou mais do que eu queria admitir. Mas a última coisa que eu queria no mundo, era vê-lo triste.

Tudo bem. Talvez eu não estivesse 100 por cento certo. Sim, eu tinha consciência de que estava sendo infantil, irracional e de que aquilo estava errado, mas é que...

É que eu me mordo de ciúmes.

E só quem estivesse sentindo o que eu estava sentindo é que iria saber como é que é.

— Mu, você está apaixonado por esse cara? — perguntei e ele tossiu como se tivesse se assustado com minha pergunta.

— Erm... A gente está se conhecendo, Aioria — ele respondeu vermelho. — Não é como você e Marin.

A verdade é que meu namoro com Marin estava um pouco desgastado. No início era uma maravilha. Fiquei todo empolgado quando vi aquela ruiva gostosa e não sosseguei até ficar com ela. Mas como o passar do tempo, as coisas foram ficando um pouco cansativas e complicadas. Marin tinha uma personalidade tão forte quanto a minha, o que acabava gerando muitas brigas. Nossas ideias nunca se cruzavam. Além disso, ela era um pouco desligada e cheia de mistérios. Isso para um homem como eu significava nitroglicerina pura. Ultimamente, só nos entendíamos bem na cama, quanto a isso nunca tive do que reclamar.

— Chegamos — Mu pronunciou. Estávamos em frente ao hospital da Fundação Graad. O maior hospital de Atenas. Era também onde meu irmão trabalhava. Mais uma vez, fiquei aliviado por Aioros não estar lá. Respirei fundo e já ia abrindo a porta para sair do carro quando ele continuou. — Vai mesmo continuar com isso?

— Hum?!

— Você não acha que acreditei que está mesmo passando mal, não é?

— Mas eu estava, é que melhorei um pouco — tentei argumentar envergonhado por ter sido descoberto, esperando que a terra se abrisse debaixo de mim e me arrastasse. Roguei por algo parecido com isso. É claro que eu não conseguiria enganá-lo com aquele teatrinho de quinta. Mu sempre foi muito inteligente e esperto. Fechei novamente a porta do carro. Suas orbes verdes me observavam atentamente. — Desculpe-me se atrapalhei sua noite. Eu lamento muito. — Lamentava nada. — Está chateado comigo?

— Não. Chateado não. Estou curioso.

— Curioso?!

— Gostaria de saber porque você fez isso.

Encolhi os ombros. Passei as mãos em meus cabelos. O que eu diria a ele? “Olha, Mu. Eu fiz isso porque não quero que você namore esse cara, já que estou mordido de ciúmes. Quero você só pra mim”. Ele iria achar que eu estava ficando louco. Embora eu estivesse acreditando nessa hipótese também.

— Não sei. Tive um mal pressentimento — proferi. Ele me olhou intrigado. Ok! Nunca fui um homem de temer dizer o que pensa. Então eu mandei: — Tudo bem... É só que acho que você não deveria namorar esse cara.

— Você diz isso porque somos homens? Aioria, você sabe que eu...

— Não! Não é nada disso — exclamei. — É só que... não sei. Não gostei do jeito dele. E acho que você deveria ficar esperto...

— Ele é uma boa pessoa, Aioria. E parece mesmo gostar de mim — Sua voz soou baixa.

— Como não gostaria, Mu?! Você é gentil, inteligente, engraçado, tem o coração maior que qualquer um que eu já conheci. Você é doce e... — De repente, minha respiração ficou pesada e meu coração se acelerou de uma forma esquisita. O que estava acontecendo? Não conseguia tirar os olhos dele. — Pelos deuses! Você é lindo!

Seus lábios se abriram como se estivesse tomando um influxo forte de ar, e ele piscava várias vezes seguidas. E, por uma fração de segundo, parecia perdido de alguma maneira. Ficamos parados ali, em silêncio por algum tempo.

— Aioria, eu... eu preciso te dizer que... — Tive a impressão de que ele estava tomando coragem para me contar alguma coisa muito importante.

— Que...? — incentivei a continuar.

— Que eu... — Foi interrompido pelo barulho do seu celular tocando insistentemente. Suspirou, baixou o olhar e atendeu. — Oi, Aldebaran... Já está tudo bem. Não precisa se preocupar... Sim. Já estamos indo... Ok! Até amanhã, então... Outro. — Desligou e se virou para mim. — Acho melhor irmos para casa.

Encostei, apoquentado, minha cabeça no banco. Tudo bem, eu ainda não havia conseguido convencer Mu de que esse namoro era uma loucura. Mas não iria desistir. Já estava decidido. Faria tudo que fosse preciso. Esse Aldebaran já era.

***


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Notas finais do capítulo

Oie,

Primeiramente, não poderia deixar de agradecer a todos que deixaram um comentário no capítulo anterior: Myrho, TitiaKinast, delencei, Musha, Jenffer, Kiba-Ino, nane yagami, Italo calixto e Amore. Muito obrigada mesmo pelo incentivo, dicas, opiniões e tudo mais.
Agradeço tbm àqueles que favoritaram, acompanham, leem ou mandam boas vibrações.

Desculpem-me o atraso na postagem. Estive muito ocupada nos últimos dias. Fiquei uma semana doente, outra viajando, outra escrevendo o capítulo de “O Plano Perfeito”, fora a correria do trabalho... Somente essa semana consegui um tempinho para terminar esse capítulo (já estava com sds).

Estou um pouco insegura com ele. Espero que não tenha ficado confuso e repetitivo. Meu objetivo foi mostrar que Aioria está confuso com seus sentimentos. Está mordido de ciúmes pelo melhor amigo, e ainda não se deu conta de que está, na verdade, é apaixonado por ele. Ao menos, ainda não conseguiu admitir para si mesmo. Mas isso não irá demorar muito.

Mu, por outro lado, quase se declara, mas sua insegurança o trouxe de volta a realidade. O amigo protetor... mas que ele acredita ser hetero, além de ter uma namorada. Não era mesmo o momento. Próximo capítulo voltamos para os pensamentos dele.

Mas enfim, estou MUuuITO ansiosa para saber o que vocês acharam, se gostaram, se não gostaram, o que precisa ser melhorado, se ficou confuso... Espero desejosa pelos comentários de vcs.

Beijos e até o próximo.

***

Observações:

¹ - Piada encontrada na internet. Eu sei, eu sei, Aioria tinha razão, totalmente sem graça. Mas foi a menorzinha que encontrei.
² - Tbm sei que não teve graça Milo comparar a saída de Aioria a fuga da Cinderela do baile. Mas é que eu não resisto uma oportunidade de uma Intertextualização. Pensei eu tirar, mas deixei pra lá.

Vídeo da música Lady Starlight: https://www.youtube.com/watch?v=wawqyudnRZ8



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