Vida em Erebor escrita por Vindalf


Capítulo 48
Questão de esclarecimento


Notas iniciais do capítulo

Hora de uma conversa franca



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Questão de esclarecimento

Hora de uma conversa franca

Um nicho numa colina foi o local escolhido para passarem a noite. Não era tão bom quanto uma caverna, mas já servia para abrigar do vento.

Os três conseguiram alguma lenha para uma fogueira capaz de esquentar uma refeição magra. O líquido quente animou os espíritos. Kíli comentou:

— Não é incrível que tantos povos tenham todo esse apreço por minha tia? Eles nos ajudaram muito por causa dela.

Dwalin comentou:

— Nossa rainha é muito admirada. Todos reconhecem seu valor.

Thorin lembrou:

— Dwalin, não precisa chamá-la de rainha. Não sou mais o rei.

— Ela sempre será rainha para mim — resmungou Dwalin. — Pelo menos até Fíli se casar.

Kíli lembrou:

— Ninguém vai acreditar que tivemos tamanha ajuda das águias! Elas são muito orgulhosas, e nunca se deixam ser montadas. Foi incrível!

Thorin parou um momento para observar os companheiros. Ele se deu conta que os dois não conheciam a verdadeira identidade de Anna - ou sua natureza. Quando chegassem a Rivendell, esses segredos ficariam ainda mais difíceis de esconder. Thorin decidiu que era melhor seus parentes saberem a verdade por ele do que por elfos.

— Há coisas que não sabem sobre Anna — começou ele. — Segredos que nem mesmo meu próprio kin sabe. Eu e Anna decidimos esconder alguns desses fatos - pelo bem de Erebor.

Kíli quis saber:

— Segredo? Que segredo?

Thorin repetiu:

— São segredos, Kíli, vários deles. Anna me pediu que guardasse alguns, eu pedi a ela que não revelasse outros. Achamos que, se revelados, o povo de Erebor poderia se rebelar contra ela. No final das contas, nem foi preciso tanto. Eles a atacaram sem sequer saber quem era. Jamais saberão o que perderam.

— Thorin — chamou Dwalin, apreensivo. — O que é tudo isso?

— Reis e rainhas veneram Anna porque ela é um presente para esse mundo. O mago Gandalf me explicou o pouco que sabe. — Thorin suspirou. — Anna é de uma raça de seres já extintos em nosso mundo: ninfas. São seres tão puros e delicados que deixaram essa terra há muitas eras, incapazes de lidar com a maldade que aqui se instalou. Mas Anna não sabia disso quando a encontramos. Não tem memória de seu povo. E não há outros deles para explicar a ela. Anna é única de sua raça, mas não sabia disso naquela época.

Dwalin lembrou:

— Ela era uma coisinha confusa e medrosa.

Kíli sorriu:

— É mesmo. Ela realmente se assustava com qualquer coisa.

Thorin assentiu:

— A princípio nem os elfos a reconheceram pelo que ela era. Mas a raça de Anna e a raça deles são mesmo parentes. Só que Anna é um parente superior, digamos.

— Por quê?

— Ela tem poderes que lentamente vêm desabrochando. Por exemplo, ela entende línguas e criaturas, e também é capaz de se transformar em animais de qualquer tamanho.

— Transformar?

— Como Beorn. Troca-peles — esclareceu Thorin. — Exceto que ela não é como Beorn. Ela pode virar qualquer animal.

Os dois estavam boquiabertos. Dwalin indagou:

— Qualquer um?

Thorin confirmou:

— Literalmente qualquer um. Lembram-se do dragão meio azul que nos ajudou na batalha pela reconquista de Erebor?

Kíli arregalou os olhos:

— Ela podia entender aquele dragão? Por isso ele nos ajudou?

Thorin o encarou e respondeu:

— Bem, isso é verdade, mas talvez não como você está pensando.

Dwalin compreendeu mais rapidamente:

— Não...! Diga que não é verdade...!

O ex-rei de Erebor assentiu:

— É verdade.

— Pela minha barba!... — exclamou Dwalin. — A pequena...

Thorin completou a frase:

— ...era o dragão azul-esverdeado chamado Safira.

Dwalin soltou um som chocado, mas Kíli se recusava a acreditar.

O quê? Não, não! Eu quase cravei uma flecha naquele dragão. Lembram-se? Eu mirava Smaug, e esse dragão lutava com... Smaug! Thorin, como... como isso é possível?

Ele deu de ombros:

— Não sei como. Ela parou de fazer isso quando soube que estava grávida. Ela não sabia quais seriam as consequências para o bebê. E depois que Darin nasceu... Bem, não houve mais necessidade. Ela não queria que ninguém soubesse.

— Eu ainda não acredito. — Kíli continuava abismado. — Mas por que ela não fez isso antes? Digo, virando dragão, ela se livraria de muitas encrencas.

— Esses poderes parecem ter que se desenvolver aos poucos — explicou Thorin. — E ela nunca quis que ninguém soubesse. Tinha medo que a obrigassem a usar isso para o mal, ou que ameaçassem outros.

Kíli estava admirado:

— Nunca poderia imaginar...!

— Quando ela esteve em Erebor, eu a vi como uma águia, uma dessas grandes, igual a essas que acabaram de nos trazer — disse Thorin.

Dwalin indagou:

— Águia também?

— Acho que vou ter que repetir — falou o líder. — Anna pode se transformar em qualquer animal. Ela testou suas habilidades.

— Como assim?

— Anna me contou que chegou a Laketown na forma de um falcão. Mas ela foi um camundongo, um esquilo... Nem sei em mais o que ela se transformou.

Kíli comentou:

— Isso ajuda a explicar como sobreviveu àquela queda no rio.

Thorin confirmou:

— Ela se jogou no precipício, transformou-se em águia e conseguiu salvar Darin antes que ele caísse no rio. Foi assim que se salvaram.

— Mas então — quis saber Dwalin — como aquela mantinha azul apareceu no rio? Aquela, de meu primo feita por minha mãe?

— Deve ter caído — sugeriu Thorin. — Não sei bem.

Os três ficaram calados uns minutos, encarando o fogo. Kíli quebrou o silêncio:

— Quem mais sabe disso?

— Ela contou a Bilbo — respondeu o antigo rei. — Mas Gandalf deve saber. E eu duvido que os elfos de Rivendell agora não saibam.

— Elfos podem fazer isso também?

— Não. Mas Anna me disse que eles ajudaram a desenvolver uma outra habilidade.

— Mais uma?

— Qual?

— Aparentemente, Anna também possui o dom da cura.

— Isso ela aprendeu com Óin — disse Dwalin. — Não foi elfo nenhum.

Thorin observou:

— Lembram-se do incêndio na mina? A caldeira que explodiu? — Eles assentiram. — Anna disse que uma coisa estranha acontecera na enfermaria, uma coisa que ela nunca vira antes.

— O quê?

— Ela achava que tinha curado Dwalin.

— Não pode ser verdade — disse Dwalin, resoluto. — Fiquei dias na enfermaria. Óin cuidou de mim.

— Mas quando chegou à enfermaria, todos diziam que você morreria em minutos — lembrou Thorin. — Dís viu tudo. Ela jurava que você morreria. Anna gritava, em desespero. Ela me disse que estava apavorada, que tentava estancar o sangue, e que você ia morrer, mas então ela sentiu uma energia nela, e você começou a melhorar.

Dwalin ficou calado uns instantes. De repente, ele disse, em voz baixa:

— Eu me lembro. Thorin, eu estava certo de que veria Mandos naquele dia. Por Mahal, eu fiz minhas despedidas!...

Thorin completou:

— Como Anna estava muito abalada por ver você às portas da morte, ela não tinha certeza. Mas Gandalf já tinha dito que ela poderia desenvolver isso, e que Darin compartilhava as mesmas habilidades.

Kíli não tinha como se admirar ainda mais:

— Meu primo? Ele é um bebezinho!...

Thorin respirou fundo e disse:

— Kíli, seu primo não tinha duas horas de vida quando salvou a vida da mãe. Ninguém me contou, eu vi. Meu filho é outro presente dos deuses.

— Mas ele era uma coisinha tão pequena... — comentou Kíli.

— Você também era, e seu irmão antes de você — lembrou Thorin. — Hoje, vão governar Erebor. Não julgue a árvore fraca por sua semente.

Nova pausa. Dwalin quis saber:

— Thorin, por que está nos contando tudo isso? Depois de tanto tempo, de tanto segredo, qual o motivo de revelar isso agora?

Ele foi sincero:

— Vocês merecem saber. Na verdade, eu gostaria de dizer a toda companhia, mas Anna me pediu segredo. Também há uma chance que os malditos elfos mencionem algo, e não quero que saibam de outras pessoas que não eu - especialmente elfos. Mas o que eu preciso realmente dizer... — Suspirou. — Não é fácil.

— O que foi?

Thorin trincou os dentes:

— Os elfos ajudaram a salvar minha família. Eles são a família de minha mulher. Tenho uma dívida imensa com eles. Não posso tratá-los como inimigos. Mas agora não sou mais seu rei, não posso obrigar vocês a tratar os elfos como amigos.

Kíli e Dwalin se entreolharam. Pareciam confusos.

— Não entendo o que diz.

— Vamos visitá-los, e eles vão nos hospedar em deferência a Anna. Não podemos hostilizá-los. Somos amigos agora. É apenas justo.

Dwalin rosnou:

— Quer dizer que agora somos... amigos? De elfos?

Constrangido, Thorin assentiu, dizendo:

— Bem... Sim.

Dwalin parecia inconformado:

— O quê?!

— Depois de tudo que fizeram a nós? — indagou Kíli, boquiaberto. — Ao meu avô? Ao seu avô?

Thorin lembrou:

— Eu não sou meu avô, e Lord Elrond não é Thranduil. Estes elfos de Rivendell são mais família para Anna do que os de Mirkwood. Não podemos esquecer que eles são a família de Anna. Eles e Bilbo. E você, Kíli, deveria aceitar isso mais que todos.

Os dois estavam constrangidos, mas recalcitrantes. Thorin insistiu:

— Ela queria isso. Anna sempre quis isso, mas cada vez que ela me pedia, eu descartava, é claro. Contudo, agora vejo que ela tem razão. Infelizmente, os elfos vizinhos de Erebor são os elfos silvestres de Mirkwood. A montanha precisa ter boas relações com eles.

— Menos sábios e mais perigosos que os de Rivendell — repetiu Dwalin. — Foi o que Beorn disse.

— E ele tem razão — concordou Thorin. — Por isso é que decidi falar com vocês antes de chegarmos a Rivendell. Não quero que me entendam mal, ou que me chamem de louco porque eu os tratarei bem. Vocês não sabiam das circunstâncias de Anna.

Mais uma vez os três ficaram em silêncio uns minutos, cada qual com seus pensamentos na noite gelada. Kíli quebrou o silêncio e disse:

— Melhor dormirmos um pouco, então. Mas preciso perguntar uma coisa, Thorin.

— Sim, o que é?

O rapaz quis confirmar:

— Você sabia disso tudo sobre Anna antes de se casar, não sabia?

A gargalhada de Thorin foi tão alta que chegou a fazer eco na noite escura e gelada.


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