Jogos Vorazes (Hunger Games) - Recomeço escrita por MSBica


Capítulo 15
Escuridão,Cicatrizes e Revelações




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"Me solte Peeta!" grito ao sentir suas mãos agarrando meu pulso. Eu tento correr, perseguir meu carrasco, tentando descobrir sua verdadeira identidade. Mas Peeta continua extraordinariamente forte e consegue me puxar de volta. O que você viu? sussurra em meu ouvido. Eu olho para o fim da rua. Não há mais nada lá. Aceno negativamente e deixo que ele me leve de volta a cadeira.

Caesar olha para mim inquisidoramente. Um par de minutos silenciosos e constrangedores se passam.

"Caesar" pergunto baixinho e lentamente "Quem é o Gamemaker Chefe?"

"Ora, Katniss" responde ele, a voz pouco acima de um sussurro "Pensei que você, de todas as pessoas, soubesse."

Eu solto um pequeno soluço, inaudível para a audiência e Caesar continua.

"Eu...eu não queria ter que dar a notícia, mas..." ele pigarreia e fricciona as palmas das mãos "Mas...os Games começam amanhã, então...preciso dizer..."

Caesar faz uma pausa e olha para mim, compadecido.

"O Gamemaker Chefe é..."

Eu tenho vontade de gritar obscenidades. É a segunda vez que por muito pouco deixo de receber a informação. No exato instante em que Caesar ia falar um blecaute fez com que, de repente, a Cidade Circular ficasse às escuras.

O breu toma conta das minhas retinas e não consigo distinguir nada nem ninguém. Sinto a mão de Peeta apertar meus ombros e me guiar para fora do palco. Deixo que me leve através de algumas ruas de pedra, meio correndo meio andando.

Esbarramos nas pessoas constantemente. Não há necessidade de nos desculparmos.

Continuamos andando por uma quantia indeterminada de tempo com nada além do breu a nossa volta.

"Peeta" digo, arfando "Pare, por favor"

De súbito ele para.

"Não sou o Peeta" diz a voz que pertence ao homem que agarra meu ombro.

Eu congelo, por isso é uma surpresa que minha voz permaneça firme.

"Quem é você?" pergunto.

Há um silêncio, no qual imagino que a voz deva estar pensando no que responder.

"Não sou ninguém importante." rosna a voz, finalmente "Mas tenho um recado."

Eu pigarreio para firmar a voz.

"E qual é?" pergunto.

"Mire mais alto, se quiser acertar." rosna.

"O que quer dizer?"

"Convença-me, mas acerte o inimigo.O verdadeiro inimigo. Entendeu?"

Sinto o aperto no meu ombro se aliviar e um leve roçar de pêlos toca meu pescoço.

"Quem me mandou o recado?" pergunto

Não há resposta.

"Responda!" grito para o ar.

Todas as luzes se acendem de uma vez e fico parcialmente cega. Demoro um par de segundos para me acostumar novamente com as luzes ofuscantes ao meu redor. Quando meus olhos finalmente conseguem se ambientar percebo onde estou. Na frente da loja de Tigris.

Eu olho a minha volta, procurando a pessoa que me guiou até aqui. Não há ninguém por perto. Preciso ter um autocontrole imenso para não gritar por Peeta a plenos pulmões. Me pergunto, pela segunda vez em uma hora, se não foi Debra quem requisitou isso. O blecaute. O recado. Parece algo que ela faria.

Felizmente sei voltar para a Cidade Circular. Durante minha breve caminhada pequenos pedaços de lembranças vem à mim. Na última vez que andei por este lugar vi pods serem ativados, pessoas morrerem e Gale ser preso. Gale. Será que ele é mesmo o Gamemaker Chefe? Depois de uma vida lutando contra a barbárie? Não sei. Uma parte de mim, a que sente o coração apertar ao pensar em Gale, ainda não consegue acreditar.

Chego ao ponto em que vi Prim explodir. O Gamemaker Chefe esteve aqui há pouco. Será que ele sabia o que este lugar significa para mim? Sinto uma mão no meu ombro e pulo.

"Oh! Peeta" digo, respirando aliviada e o abraçando.

"Onde você estava? " pergunta ele, assim que o liberto do abraço

"Me perdi" digo "mas, está tudo bem, agora."

Sei, no momento em que vejo os olhos de Peeta que ele não acredita em mim, mas não questiona. Sabe que estamos sendo claramente observados.

Ele me arrasta até uma cadeira na segunda fila, com os demais mentores. Me sento entre ele e Joahnna e aguardo, impaciente.

"Então, desmiolada" diz Joahnna, cutucando minha cicatriz no antebraço "Pensei que isso já tivesse sumido."

"Oh, não" respondo "o seu presentinho nunca saiu de mim. Mas, não se preocupe...sei que fez isso para salvar a minha vida. E não me importo com cicatrizes."

Joahnna olha para mim com uma expressão que mescla nojo e pena. Finjo não notar. Peeta abre a boca, provavelmente para contestar Joahnna e me defender, mas não é possível. Uma campainha toca e um letreiro acima do palco se ilumina em verde, pedindo silêncio. O efeito sobre a multidão é imediato. Um par de fileiras de cada vez o silêncio vai tomando conta do espaço. Todos estão ansiosos pelo show. De repente me sinto enjoada. Então é assim. A animação e o clima leve antes das entrevistas, afinal não são crianças indo para a morte. É apenas um grande e divertidíssimo show. Nada mais.

Começo a querer ar, o ambiente me sufocando, mas sei que não posso sair. Preciso ficar. Preciso aguentar. Preciso fazer isso pelos meus filhos.

Caesar chega ao palco, faz algumas piadas sobre a falta de luz e parte para os negócios chamando a garota do Distrito Um para sua entrevista. Registro que seu nome é Liatris -credo ainda acho os nomes do Distrito Um ridículos - de qualquer modo Liatris está vestida em um vestido longo esverdeado. Tento prestar atenção em sua entrevista, descobrir seu ângulo, mas não consigo. Acho que é carismática, mas não tenho certeza. Empatia não é uma das minhas melhores características.

Eu cruzo as pernas e espero, roendo as unhas, os tributos passarem. Dois, Três, Quatro, Cinco.
O menino do Dois é calado. A menina do Três é inteligente. A menina do Quatro é delicada e gentil. O casal do Cinco é do mesmo ângulo, mas não identifico qual. Não me lembro do nome e nem do ângulo de ninguém do Seis.

Sete, Oito, Nove, Dez. A menina do Sete está vestindo marrom e parece revoltada. O menino do Oito é bruto. O menino do Nove é astuto. A menina do Dez é humilde.

Onze. Ixia chega vestindo um adorável vestido amarelo, parece estar calma e responde as perguntas com uma voz tranquila. Ela é charmosa e cativante.

Quando Caesar chama Lira percebo que chegou a hora do Show. Os outros Tributos eram só uma distração das verdadeiras estrelas da noite. Meus filhos.

Lira entra, sorrindo e acenando. Ela veste um vestido que mistura dourado e prateado. Sua maquiagem a deixa viva, alegre e desafiadora.

"Ela sabe fingir bem, não é?" digo para Peeta " Para entrar sorrindo e acenando. Nem parece que seu treinamento foi um desastre."

"Ela me lembra alguém, sabe?" diz Peeta, rindo "Você"

Eu rio e volto minha atenção para a entrevista.

"Então, Lira...Seja bem vinda." diz Caesar "Devo dizer, ao conhecê-la pessoalmente que você é igualzinha à sua mãe, exceto os olhos, você tem os olhos ..."

"Os olhos do meu pai" completa Lira, cansada "Eu sei."

E sabe mesmo, desde muito pequena Lira convive com comentários como este.

"E posso supor que herdou as habilidades do seus pais em combate, não?" pergunta Caesar "Considerando sua nota do Treinamento. O que aconteceu lá?"

"Eu sei que não posso falar sobre isso" diz Lira "E mesmo que pudesse eu acharia melhor manter segredo."

"Você está nos matando " diz Caesar, com sua já conhecida habilidade de fingir uma dor real "Detalhes. Detalhes."

"Pergunte ao meu irmão" diz Lira "Ele também tirou Doze"

A audiência solta gargalhadas.

"Mas...agora falando sério" diz Caesar tomando o controle da entrevista de volta "Você vai competir com seu irmão. Fale sobre isso."

"Oh! É horrível" responde Lira "Minha mãe se sacrificou pela irmã. Lutou no lugar dela nos Jogos, mas para nós esta opção nem sequer foi dada. Saber que vamos juntos, lutar um com o outro até a morte com nossos pais como mentores é uma situação muito pior do que qualquer outro tributo pode imaginar. Ser tributo, lutar para meu Distrito é uma honra, mas quando as coisas ficam pessoais se torna um fardo."

Você poderia escutar um alfinete cair na Cidade Circular agora. Tamanho o silêncio que reina. As pessoas parecem ter parado de respirar, se agarrando a cada palavra da minha filha.

"A sorte realmente não está a favor da minha família." diz Lira, por fim

"Realmente" diz Caesar "Mas de qualquer modo a Capital é uma mudança e tanto do Distrito Doze não é?"

"Na verdade não" diz Lira, e a audiência ri gostosamente.

"Como assim não?" pergunta Caesar, perplexo.

"Ora, Caesar..." responde Lira "Me enganaram."

"Enganaram? Você não sabe o porquê de estar aqui?" Caesar lança um olhar assustado para o público.

"Onde ela acha que vai com isso?" sussurro para Peeta

"Não sei, mas vamos ouvir" ele responde.

"Não... Não é isso..." diz Lira, rindo "É que eu ouvi falar muito deste cozido de cordeiro com ameixas secas. Disseram que é delicioso, mas eu provei...É horroroso!"

A multidão ri, divertindo-se como nunca. Provavelmente pensando que a coisa toda é uma piada planejada. Que minha filha finge odiar meu prato favorito da Capital. Mas não é. Ela realmente odeia aquele cozido. Talvez porque associe isto com minha participação nos Jogos.

"E tem mais..." continua Lira "Eu vim aqui para morrer e me colocam em quartos estranhos com chuveiros que eu nem sei mexer! Poxa! A comida e os banheiros de casa são bem melhores. O Distrito Doze é muito melhor que a Capital!"

O público continua rindo, distraídos demais para perceber a revolta real contida naquelas palavras. Minha filha está indo melhor do que eu podia imaginar.

"Bom " diz Caesar "Mas você está estonteante esta noite, apesar dos chuveiros não serem de seu agrado"

A multidão ri. Caesar levanta minha filha e a gira entre seus dedos.

O vestido de Lira começa a fumegar e avermelhar. As chamas sobem, dançam entre seus cabelos e continuam queimando quando ela para. Minha filha virou uma tocha humana.

"Minha nossa!" diz Caesar "Isso é incrível!"

A campainha sinalizando o fim dos três minutos toca.

"Acho que falo por toda Panem quando digo que nossos corações vão com você e seu irmão para aquela arena" diz Caesar "Boa Sorte!"

Lira sufoca um "Obrigado" e volta para sua cadeira.

Klaus conquista a audiência de cara. Faz piadas com seu apelido de torradas, dizendo que o terno creme que veste o deixa parecendo com uma. Os chuveiros e a cena de cheiradas que Peeta fez em sua primeira entrevista são repaginados em piadas e trocadilhos inteligentes.

Volto a prestar atenção quando Caesar pergunta qual a estratégia de Klaus na arena.
Meu filho não responde.

"Qual vai ser sua estratégia na arena?" repete Caesar

"Prefiro não responder isso, Caesar, desculpe" diz Klaus, educadamente

"Oh, entendo... " diz Caesar "quer manter segredo até a arena, não é?"

"Não, Caesar" diz Klaus "é que..."

"É que ..." estimula Caesar, gentilmente.

"É que não vamos para a arena, Caesar" responde Klaus, como se a informação o estivesse sufocando.

"Como assim? Vocês são tributos, é claro que irão para a arena!" diz Caesar,perplexo.

"Não Caesar..." diz Klaus "Não vamos para arena porque..."

"Porque ..." estimula Caesar, novamente.

Klaus cora em tom de beterraba e gagueja

"Porque...porque nossos pais decidiram nos substituir como tributos"


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