Convergente II escrita por Juliane


Capítulo 39
Ela




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/544355/chapter/39

As palavras de Wes pairam no quarto, assim como o silêncio, que impera. Por alguns momentos não fomos capazes de encontrar as palavras certas para dizer. Desde a primeira vez que o vi, eu simplesmente o detestei, aquela auto confiança irritante, toda aquela empáfia, sem falar no sorriso exagerado, impertinente, que forçava uma intimidade que não existia. Definitivamente David Goldman era asqueroso, mas assassinatos ainda me chocam, independente de quem seja a vítima. Sei que parece um tanto ridículo, vindo de alguém que já disparou uma arma mais vezes do que possa contar, mas é assim como me sinto, não posso evitar.

_ Maldito seja David! Liso como sabão! Sempre consegue se safar!

_ Safar? Como você pode dizer uma coisa dessas Enrico? Ele está morto. - Eu o repreendo.

_ Desculpe, é só que agora, com ele morto voltamos a estaca zero. - Enrico justifica.

_Como foi que aconteceu? Você encontrou o corpo? - Dirijo a pergunta a Wes.

_ Na verdade eu o estava procurando pelo hospital, e então me deparei com uma cena atípica, Andy chorava convulsivamente nos braços da Gail. Eu as questionei sobre o que estava acontecendo, Andy não conseguia falar, mas Gail me disse que David estava morto. Tentar obter alguma informação racional com o estado em que Andy estava seria impossível, de modo que me dirigi diretamente ao a necrotério. O corpo tinha recém chegado o legista estava se preparando para iniciar a necrópsia. Apesar da minha insistência em participar, ele me dispensou com a promessa de me enviar os relatórios em primeira mão.

_ Você acha que ele é confiável. - Pergunto.

_ Com certeza não! Eu não o conheço muito bem, mas a sua reputação não é nada boa. Dizem que Eddy Mitchel é um maldito mercenário, viciado em tranquilizantes. - Wes responde, referindo-se ao homem com um desdém que não lhe é convencional.

_ E agora? David está morto, não pode responder nossas perguntas e o senhor nem ao menos poderá investigar o corpo, o que vamos fazer? Vamos nos sentar aqui e ficar parados, esperando um novo atendado como este, ou pior ainda, como a Tris mesmo disse, pode ser um novo soro... Capaz de controlá-la! O que vamos fazer Dr. Wes? - Enrico verbaliza as perguntas que estão martelando na minha cabeça com um grau de desespero quase tão grande quanto meu, enquanto anda de um lado para o outro, aumentando ainda mais a tensão no ambiente.

_ Vamos nos acalmar! Beatrice, quanto a sua tese do soro, podemos quase que descartá-la, pois na tomografia de contraste, normalmente seria acusado alguma substância estranha, ou até mesmo alguma atividade cerebral incomum e não havia nada. De qualquer forma, de hoje em diante você ficará comigo, então supervisionarei todas as suas reações. Não há com o que se preocupar, tenho certeza de que se trata apenas de dietilamida do ácido lisérgico, que está sendo excretado pelo seu organismo.

_ Certo, se você diz Wes, eu acredito - Eu falo resignada, tentando acalmar-me enquanto ele acena com a cabeça em concordância.

Enrico abre a boca para falar, mas Wes levanta o dedo indicador exigindo nossa atenção e então diz:

_ E quanto a David Goldman, eu tenho um plano! Vigiamos o necrotério, atraímos Eddye para fora, então eu entro e faço meu trabalho.

_ De que forma o atrairemos para fora? - Enrico quis saber.

_ Bem, Enrico, sabemos que o homem tem falhas de caráter, e dificilmente isso se resume a uma pequena parte sutil do comportamento humano, principalmente no caso dele... Então sugiro que exploremos essas tendências.

_ Dr. Wes, quer dizer que devemos atraí-lo com drogas, mulheres e álcool? - Enrico diz meio descrente e com num tom de escárnio.

_ Exatamente!

_ Não seria meio óbvio? Que tipo de idiota não perceberia que se trata de uma armadilha? - Enrico contrapõe.

_ Lex Parsimoniae, ou seja, a explicação mais simples será a mais eficaz, assim como a a solução mais trivial a mais acertada. Assim funciona a "Navalha de Occam, um princípio muito utilizado na medicina.

_ Navalha de Occam? O que isso tem haver com Eddy? - Enrico parece confuso.

_ Deixa pra lá, apenas tenha em mente que vai funcionar.

Enrico fecha o cenho obviamente incomodado pela resposta de Wes. Imagino que suas teorias e seu conhecimento o fazem parecer um tanto arrogante para Enrico, eu mesma já me senti assim quando o conheci.

_ Enrico, você acha que consegue alguma distração para atrair o Dr. Eddy para fora do necrotério?

_ Mas é claro que sim. - Ele diz mal humorado.

Wes o olha intrigado, creio que acaba de notar que talvez tenha soado rude e arrogante, ele me olha em busca de uma confirmação. Eu inclino levemente a cabeça indicando que ele está certo, Enrico se chateou, ficou curioso e não exigiu respostas por vergonha e receio de parecer ainda mais matuto do que está se sentindo.

_ Enrico, me desculpe se fui grosseiro com você, mas acho que não devemos nos ater a detalhes teóricos, já que não temos muito tempo para explicações. - Ele se desculpa, e fico comovida em ver como as suas relações com as pessoas a nosso redor tem se transformado.

_ O Senhor insiste em usar toda a sorte de palavras que não compreendo, me sinto um ignorante completo, ainda mais diante de Tris. - Ele responde, agora a mágoa transmitida através das palavras.

_ Não foi minha intenção. São hábitos de uma vida, difíceis de serem mudados, mas com o tempo vou me corrigindo.

_ Tudo bem. - Enrico responde, aos poucos a carranca vai se desfazendo.

_ Agora, vamos continuar com o plano? - Encerro o assunto e empertigo-me na cama tentando imaginar os próximos passos.

_ Pensei em chamar umas amigas e José para encenarmos uma " brincadeirinha de médico e enfermeiras" com bebidas, risadas para que o Dr. Eddy sinta-se tentado a espiar o que está acontecendo. - Enrico diz utilizando os dedos médio e indicador de ambas as mãos para formar aspas aos referir-se a expressão "brincadeirinha de médico e enfermeiras."

_Ótimo! Beatrice, assim que ele sair da sala e eu entrar você monta guarda Okay? - Wes completa.

_ Devo reunir o pessoal? - Enrico pergunta.

_ Sim, mas tome o cuidado de não revelar nada a ninguém, faça com que acreditem de que se trata apenas de diversão adolescente. - Wes instrui e Enrico acena com a cabeça.

_ Esta chave é do depósito de suprimentos hospitalares, lá vocês encontrarão roupas, mascaras cirúrgicas e todo o tipo de adereço para tornar a sua brincadeira mais verídica... Assim que vocês estiverem prontos e entrando em cena, bipe para o meu pager que estaremos preparados - Wes entrega a chave a Enrico que a fecha na palma da mão e acena concordando com a cabeça.

Antes de sair porta a fora ele me dá uma rápida olhada e vejo uma pontada de tristeza em seus olhos... Até consigo entender o motivo...

Não reparei, mas Wes estava observando minha reação, pois quando Enrico sai da sala ele pergunta:

_ Ele sai para uma farra com outros adolescentes como se fosse para a forca e você parece de fato entender a frustração dele. Por quê?

Eu suspiro e solto o ar demoradamente, falar sobre isso faz com que eu me sinta culpada, mas ele está esperando por uma resposta...

_ É difícil para ele. A cada situação como esta, em que ele tem de se expor, seduzir, estar com uma garota contra a sua vontade, ele sente que se isso nos afastasse ainda mais. Eu sei, parece estanho, mas o fato de eu consentir ou até induzi-lo como no caso da Alejandra, o magoa profundamente.

_ Beatrice, eu disse para não alimentar as falsas expectativas dele.

_ Wes, antes mesmo de você chegar, falávamos sobre isso, e ele disse que não pode evitar, que é da sua natureza... Ele teve uma vida difícil, a esperança foi a única que coisa que o manteve vivo... E disso eu entendo.

*******

Nesse exato momento estamos escondidos atrás de uma estante de metal cheia de frascos de penicilina, soro fisiológico, ou seja lá o que for, por alguns instantes tudo que ouço é a nossa respiração, mas então Enrico e sua trupe rompem o silêncio e rizadinhas estridentes das suas acompanhantes tomam conta do ambiente, ouço também a risada de José e Enrico advertindo ambos para que façam silêncio, mas ao invés disso todos caem na gargalhada, como se de fato estivessem bêbados. Eu não resisto a uma espiadela, dou alguns passos na direção de onde vem o som, Wes solta um suspiro exasperado de reprovação, mas eu finjo nem notar.

Estou agachada e encolhida ao lado do batente da porta, arrisco-me pondo a cabeça para fora, então os vejo: Enrico está entre duas garotas que parecem estar usando apenas jalecos brancos,pois suas longas e delgadas pernas estão a mostra e José está abraçado em outra que se veste e se porta da mesma forma. Elas seguram estetoscópios, seringas como se estivessem prontas para examinar e medicar pacientes... Enquanto Enrico e José bebem um líquido de cor âmbar direto do gargalo da garrafa. O estardalhaço proposital que fazem é o suficiente para chamar a atenção de Eddy que abre a porta do necrotério e projeta parte do seu corpo rechonchudo para fora da sala. Por reflexo eu recuo com medo de ser percebida, mas então retomo minha posição e vejo Eddy examinado detidamente os cinco jovens animados que estão prestes a fazer uma "festinha". Seus olhos se demoram nas pernas descobertas das garotas e vejo um sorriso diabólico se desenhando nos seus lábios finos e asquerosos. Mordeu a isca!

_ Ei! O que pensam que estão fazendo aqui?! - Ele repreende.

_ Desculpe aí chefia! Achamos que a barra estava limpa por aqui... Afinal para estes lados só tem presunto! - Enrico fala de forma enrolada e arrastada como se estive sob efeito de álcool.

_ As garotas estavam entendiadas, então resolvemos fazer alguma coisa diferente. - José completa.

_ Estão numa área restrita, portando equipamentos de uso exclusivo dos médicos e enfermeiros desta base! Me deem um bom motivo para não ligar agora mesmo para o General Sparks e mandar preder todos vocês!

_ Calma aí Doutor... Doutor... - Enrico fala enrolado, enfatizando ainda mais sua falsa embriagues

_ Dr. Eddy Mitchel.

_ Desculpe, Dr. Eddy. Olha só, estou bêbado demais, não conseguirei dar atenção a Kim e a Kate ao mesmo tempo... Que tal me dar uma ajudinha aqui! - Ele diz insinuando ao médico que escolha uma das garotas, que por sua vez, fazem biquinho para Enrico.

Eddy abre um sorriso malicioso enquanto avalia as garotas e então confere as horas no seu relógio de pulso e por fim diz:

_ Acho que posso reservar um tempo para as garotas. O que é que vocês estão bebendo.

_ Whisky... Quantos anos mesmo José?

_ Ah não sei uns 6 meses! - Ele responde rindo, entre soluços.

_ Como vocês conseguiram bebida alcoólica? - Ele se aproxima interceptando a garrafa da mão de José, então ele aproxima as narinas do gargalo e suga o ar como se pudesse aspirar seu conteúdo, esfrega a manga do jaleco no gargalo e toma um grande gole da bebida.

_ O pai do José tem uma destilaria clandestina. - Enrico diz.

_ Não é do meu pai, é do meu tio! - José o corrige.

_ Até que não é tão ruim. Já volto, não saiam daqui! - Ele diz enquanto dá meia volta e desaparece da sala de onde veio...

Enrico e José se olham confiantes, o plano está correndo a contento. Por um instante Enrico olha na minha direção e nossos olhos se encontram, instintivamente ele empertiga o corpo e tira os braços da cintura das garotas. Seu gesto faz com que eu eu recue de modo que fique longe do seu campo de visão.

_ O que foi? - Wes sussurra para mim

_ Nada, ele mordeu a isca.

_ Eu ouvi. Eles viram você?

_ Só o Enrico. - Eu sussurro de volta.

Retomo a minha posição e vejo Eddy saindo do necrotério ele vai em direção as garotas abraça a morena voluptuosa e sai gargalhando e falando o que imagino ser toda ordem de besteiras e sacanagem no ouvido dela.

Não perdemos tempo, assim que eles se afastam e desaparecem no corredor nos dirigimos ao necrotério.

_ E então? Entro com você ou monto guarda do lado de fora da porta?

_ Acho que você vai chamar mais atenção aí fora... Pode entrar, se você não se importa. De todo modo, Enrico vai nos bipar se Eddy resolver voltar, o que acho muito pouco provável,

_ Okay.

Entramos na sala estéril completamente branca, muito bem iluminada pelas luzes fluorescentes que parecem ainda mais potentes quando refletidas no enorme refrigerador de metal, No centro da sala há um suporte de mesa ou cama, uma cadeira e uma pequena mesinha de metal com com instrumentos cirúrgicos. Dr. Eddy deixou o seu rádio ligado de modo que ouvimos uma melodia agradável enchendo o ambiente.

_ Jazz... Até que ele tem bom gosto, em se tratando de música...

Wes confere os prontuários no arquivo suspenso e então tira uma pasta do local, abre, folheia os documentos e dirige-se à uma das gavetas do refrigerador. Esquivo-me esperando o que está por vir, já tive muito mais contato com a morte, do que eu esperaria ter em uma vida inteira, mas nunca vi um cadáver em um refrigerador num necrotério. O click da alavanca da gaveta faz meu coração dar um pulo, viro o rosto para o lado enquanto ouço o som dos rodízios da gaveta deslizarem.

_ O que foi Beatrice? Você está bem? - Wes chama a minha atenção então eu acabo por voltar os olhos em sua direção e vejo o corpo.

Aceno com a cabeça em afirmativa.

_ Porque se você não lidar bem com isso pode se esconder na outra sala enquanto eu examino o corpo.

_ Está tudo bem, é só que nunca tinha estado num lugar assim...

Ele vai até o centro da sala, e empurra o suporte até a gaveta, encaixando-o no metal sob o corpo de David. Então ele conduz o caixote até o centro da sala, tira os pinos dos quatro cantos e abaixa as paredes de metal da caixa, transformando-a em uma mesa de necrópsia. Tudo aqui, pelo que posso ver, é extremamente funcional.

Por um instante permito-me examinar mais detidamente o corpo inerte, que jaz na mesa de metal. É estranho vê-lo sem aquele sorriso irritante que era sua marca registrada... É como fosse outra pessoa, e não o David Goldman que eu conheci. Tão inexpressivo, com uma coloração estranha que o faz parecer mais um boneco de cera do que um espécime humano.

Wes senta na cadeira e se posiciona diante da cabeça de David, veste um par de luvas de borracha e um óculos de proteção transparente, enquanto eu permaneço escorada na parede, o mais distante possível do corpo. Ele pega um objeto estranho que se assemelha a uma pistola de metal, mas na ponta há um pequeno disco dentado. Quando ele aciona o que só posso descrever como sendo um gatilho, o disco começa a girar emitindo um som aterrorizante. Então ele pressiona o que concluo ser uma serra, contra o crânio de David e o barulho da serra em contato com o osso se torna ainda mais macabro e nem som da música ambiente consegue amenizar. Quando Wes retira a tampa da cabeça de David sinto minhas entranhas revirarem. A cena é chocante demais para mim, eu deixo a sala aos tropeções vagueando pelos corredores a procura de um banheiro... Preciso lavar o rosto... Molhar os pulsos, a nuca, talvez a minha pressão tenha baixado.

_ Beatrice! - Ouço a voz de Wes ao longe, penso na minha imprudência em sair porta a fora, andando pelos corredores. E se alguém nos vir? Paro por um instante com a mão cobrindo a boca, como se de fato pudesse manter minha bile dentro dela, só para o caso dela resolver escapulir.

_Beatrice, me desculpe... Eu devia imaginar... Esses anos todos estudando a anatomia humana, as vezes sou insensível... Vem, vou encontrar um lugar confortável para que você possa me aguardar... - Wes fala enquanto me abraça e me conduz na direção da qual viemos... Ao fazer a constatação de que estamos voltado para a sala dos horrores, travo os pés no chão.

_ Não se preocupe, não vou levá-la de volta a sala de necrópsia. Aqui, bem aqui tem uma saleta usada para descanso dos médicos, está vazia, não temos muita circulação de pessoas por aqui, por tanto você pode se deitar um pouco e descansar e assim que tudo estiver acabado eu vou para encontrá-la. - Ele me tranquiliza, indicando uma porta há alguns metros da sala de necrópsia e assinto com a cabeça, deixando que ele me conduza até lá.

Ele me ajuda a deitar na cama que ocupa praticamente toda a sala, que não deve ter mais do 2x2, sem janelas, apenas com um exaustor que é acionado toda vez que o interruptor de luz é ligado. Me pergunto porque será que não viram necessidade de criar um sistema de ventilação que funcionasse com a luz apagada... Então me ocorre que ninguém que tenha presenciado uma necrópsia, consiga permanecer num ambiente tão claustrofóbico, ainda mais no escuro. Wes me cobre delicadamente e sai, deixando-me sozinha, no minúsculo quarto, enquanto se encaminha para sala ao lado, para terminar de dissecar o cadáver de David, que o aguarda na fria mesa de metal. Esse pensamento provoca calafrios no meu corpo e quase posso sentir o metal frio contra as minhas costas. Permito-me odiar-me por ser tão covarde, por não estar naquela sala com Wes tentando descobrir o que matou David, tentando colher pistas de quem o fez, mas a raiva e a autocomiseração duram poucos instantes, apenas tempo suficiente para que minha mente me pregue uma peça e eu tenha a impressão de estar ouvindo o barulho da serra bem ao meu lado...

Afasto a sessação concentrando-me em Tobias, imagino-o vindo em minha direção e penso nas palavras de Enrico, "De onde eu vim esperança é a única herança que recebemos de família e ainda não aprendi a abrir mão dela." É, eu também não.

********

_ Beatrice? Tudo bem? - Wes me arranca da letargia em que me encontro.

Sento na cama e respondo:

_ Sim, você demorou. Nem sinal do Eddy?

_ Acho que hoje ele não volta mais lá.

_ E então? Descobriu alguma coisa?

_ David Goldman morreu de um infarte fulminante do miocárdio, embora ele fosse jovem, atlético e tivesse hábitos saudáveis, aparentemente seu coração sofreu um colapso e ele não resistiu.

_ Muito conveniente, principalmente depois de me drogar... Afinal, os mortos não falam, então onde obteríamos as respostas?!

_ Exatamente! O bloqueio das coronárias, as veias do coração, eram bastante irregulares eu diria até improváveis para terem ocorrido de forma natural, então colhi algumas amostras de tecido do coração para submeter a análise. Meu palpite é que o infarte tenha sido induzido,

_ Para você é um palpite? Eu tenho certeza, David foi assassinado. E aposto que ele tinha muito mais a revelar do que se quer podemos supor... Foi queima de arquivo!

_ Vamos precisar investigar o local onde o corpo foi encontrado, só causa da morte não esclarece nosso mistério.

_ O que você vai fazer? Quero dizer, quando Eddy chegar, ele verá que a necrópsia foi feita.

_ O Preguiço nem sequer havia drenado o corpo, no fim das contas vai ficar aliviado. E de mais, a mais, ele não vai arriscar a sua própria pele e dizer por aí que descuidou do cadáver e alguém veio e fez o serviço sujo por ele. Fiz o favor de deixar os relatórios prontos, inclusive com um espaço para ele carimbar e assinar..

_ Okay, então vamos sair daqui, temos muito o que fazer. - Eu digo, ansiosa por sair desse lugar.

Ele estende a mão, convidando-me a levantar-me. Enquanto caminhamos pelos corredores eu retomo outro assunto que não consigo tirar da minha cabeça.

_Wes, será que podemos ver se há novidades em relação ao desaparecimento de Tobias.

_ Claro, vamos falar com o Josh, ele ficou de supervisionar as buscas pelos seus amigos através dos monitores da sala de controle.

_ Ótimo. Você avisou Enrico de que já estamos indo?

_ Sim, mandei uma mensagem no pager. Agora a cena do crime é por nossa conta.

_ Okay.

Nos dirigimos até hospital, Wes sugeriu que descobríssemos onde podemos encontrar Andy, pois a julgar pelo grau de histeria, ele acredita que ela tenha encontrado o corpo, embora eu desconfie que ela realmente gostava dele.

Ao chegarmos no hospital descobrimos que ela foi sedada pela Dr. Gail, já que estava histérica demais para lidar com a situação de forma racional e tranquila... Afinal, quem estaria?Ninguém soube nos dar informações precisas a cerca de onde ele havia sido encontrado morto, de modo que resolvemos falar com Dr. Gail. Procuramos por ela em todo o complexo da base e a encontramos no local mais improvável, o Alojamento dos recrutas procurando pelo Tenente Keaton.

_ Gail, procuramos por você por todos os lugares, confesso que me surpreende encontrá-la aqui. - Wes diz quando a interceptamos a caminho da sala de Keaton.

_ Já você, não me surpreende nem um pouco Wes. Beatrice, olá.

_ Olá. - Retribuo o cumprimento sucintamente.

_ Na verdade Wes, vim conversar com o Tenente Keaton sobre a morte de David.

_ Por que? Você suspeita que tenha sido assassinato?

_ Não ponha palavras na minha boca Wes! Eu vi o corpo, ele estava numa tonalidade arroxeada, minha suspeita é que tenha infartado. Mas de qualquer forma, as circunstâncias foram escusas mesmo, de modo que o protocolo diz que devemos informar as autoridades competentes para abrir investigação. E como Keaton é especialista em medicina legal e perito, vim comunicá-lo.

_ Isso quer dizer que você sabe onde e quem encontrou o corpo?

_ Foi Andy, Ele estava caído no chão do depósito da enfermaria. Estou me perguntando até agora como é que ela foi parar lá....

_ Eles tinham um caso. - Eu intrometo-me no assunto sem ser convidada. Ela desvia os olhos de Wes para mim e então com um sorrisinho de escárnio diz.

_ Bem informada Beatrice. Fico feliz que esteja fazendo amizades.

_ É, em algum momento eu teria que me enturmar.

Ela sorri para mim, põe as mãos nos bolsos do jaleco e olha para Wes.

_ Por que tanto interesse em torno da morte de David?

_ Bem, ele era um de nossos enfermeiros, gostaria de saber o que de fato ocorreu.

_ Acho que genes ruins, alguns hábitos ruins, resultaram no infarte fulminante que ceifou sua vida tão cedo.

_ David era saudável, atlético, não conheço sua árvore genealógica, mas tive acesso ao seu prontuário e e pelo que vi estava com todos os exames em dia e com as taxas dentro da normalidade.

_ O que você está insinuando Wes? Que David foi assassinado? - Ela sussurra a última frase e lança um olhar conspiratório na direção de Wes.

Por um instante sinto meus ossos gelarem com a ideia de que talvez ela consiga persuadi-lo a contar-lhe as nossas suspeitas, mas ele não o faz, apenas conclui:

_ Não diria assassinato Gail, e sim falta de sorte ou desígnios de Deus.

_ Deus? Desde quando você é religioso?

_ Entre o céu e o inferno há mais mistérios do que nossa vã compreensão pode assimilar... Acho que eu li isso em algum lugar. - Ele responde em tom brincalhão.

_ É acho que você tem razão, essa sua frase de para-choque de caminhão até que faz sentido. Mas eu acho que você deveria deixar Beatrice seguir daqui, se não Keaton poderá ficar chateado, afinal agora ela é paciente dele.

_ Na verdade, conversei com o Capitão Finth, ela está sendo promovida a soldado, então viemos buscar os pertences dela, vamos nos alojar na Vila.

_ Vocês vão se alojar na vila? Juntos? - Ela ela diz, aparentemente incomodada com a palavra "juntos".

_ Não da forma como você está pensando! Beatrice e eu temos uma relação fraternal.

_ Ah, sim, claro. De qualquer forma, o que você faz da sua vida, não é da minha conta. - Ela diz amargamente e nesse momento entendo que ela queria algo mais com Wes e pelo visto ele nunca deve ter lhe dado abertura para tal.

_ Nossa Gail, nunca quis ser hostil com você.

_ Desculpe Wes, você nunca foi hostil, pelo contrário, sempre me tratou com respeito e cortesia, eu é que estou exaltada pelo ocorrido. Agora, se me dão licença, vou falar com o Tenente Keaton.

_ Claro, até mais. - Wes responde enquanto coloca a mão nas minhas costas e me conduz para que continuemos andando na direção dos armários.

_ Boa sorte para vocês... Na casa nova. - Ela diz sorrindo e eu retribuo o sorriso da melhor forma que consigo, só espero que não tenha parecido uma careta.

_ Obrigada Gail! Você é bem vinda quando quiser aparecer. - Wes responde educadamente e ela sorri, acena levemente inclinando a cabeça para o lado e desaparece na direção da sala de Keaton.

Assim que ela está fora do nosso campo de visão, corremos em direção ao depósito da enfermaria. Precisamos examinar o local antes de Keaton.

Chegando lá, encontramos a porta fechada e lacrada com fitas adesivas e um cartaz na porta diz: " Acesso restrito a perícia. Não se aproxime. Eu pucho a minha faca do cinturão e passo entre a porta e o batente para cortar a fita adesiva e antes que eu possa tocar na maçaneta Wes contem meu movimento e me passa um par de luvas de borracha.

_ Você precisa tomar cuidado para não macular a cena do crime. - Ele adverte.

_ Okay.

_ Fique de olhos bem abertos e procure registar tudo o que você vê. - Ele instrui eu apenas aceno a cabeça em concordância.

Visto as luvas de borracha e giro a maçaneta e a porta se abre sem dificuldade alguma. aciono o interruptor e abro caminho para que Wes siga na minha frente, já que muito provavelmente ele deva conhecer o local e assim sendo, possa reconhecer os objetos que estão fora do lugar com muito mais facilidade do que eu. A sala não é muito grande, mas todas as paredes são forradas de armários e cada por e gaveta tem uma etiqueta de identificação dos materiais que neles são guardados, aparentemente tudo parece estar em perfeita ordem como se ninguém estivesse estado aqui.

Então Wes chama minha atenção para uma lixeira que está tombada e alguns pacotes de gases, faixas e esparadrapos estão no chão próximo da lixeira.

_ Beatrice, veja: O corpo deve ter sido encontrado caído aqui. Supõe-se que na queda ele tenha derrubado a lixeira e deixado cair o que quer que tenha vindo buscar.

_ Sim, as evidências levam a crer que ele veio buscar suprimentos, passou mal, caiu e infartou... Mas as coisas tem estado calmas no hospital, por que ele precisaria reabastecer gases, faixas e esparadrapos.

_ Nada de mais tem acontecido, mas diariamente fazemos atendimento de pessoas com escoriações por tombo, entre outras demandas que utilizam esse tipo de material... Então é de praxe o abastecimento.

_ Tudo muito óbvio, simples até demais. Vou investigar o lixo. - Digo dirigindo-me para as lixeiras de metal etiquetadas Infectante, Sépticos e Plásticos, respectivamente, há ainda uma caixa de papelão onde podemos ler: Cuidado ao Manusear, Infectante, nela, pelo que vejo são descartados agulhas. Não vejo nada de suspeito, as lixeiras estão relativamente cheias dos objetos aos quais são destinadas.

_ Tudo parece absolutamente normal. Você acha que deveríamos levar essa caixa de seringas para descobrir se alguma delas foi usada em David? - Pergunto, poque essa parece ser a melhor alternativa, dado o cenário que encontramos aqui.

Ao invés de responder, Wes se deita no chão simulando a posição que David deve ter caído levando em conta a lixeira tombada e os suprimentos espalhados.

_ Veja, faz sentido para você? - Ele pergunta, indicando a posição em relação aos objetos.

_ É parece que sim.

_ Mas acontece que mesmo num enfarte fulminante o sintomas aparecem por pelo menos 5 ou 10 minutos e o principal deles é um dor lancinante no peito... Se eu estivesse sentindo tanta dor assim eu teria me arrastado para fora da sala... Talvez encontrando tanta dificuldade na movimentação que acabaria por mover e derrubar mais coisas por onde passei. Olhe Beatrice, veja aquela estante de metal com os frascos de remédio... Está na metade do caminho... Meu peito dói, sei que estou infartando, preciso buscar ajuda, tento buscar sustentação na estante de metal e acabo derrubando boa parte de seu conteúdo...

Enquanto ele fala, começo a acompanhar o seu raciocínio e os defeitos da cena começam a ficar evidentes na minha cabeça.

_ Pelo local onde o corpo veio parar, é como se ele tivesse feito o caminho oposto de onde encontraria ajuda... É como se ele estivesse caminhado para morte certa e premeditada... Aqui nessa altura o coração já estaria em processo de fibrilação ventricular...

_ Isso reforça a tese de que ele foi assassinado. Vamos recolher as seringas e agulhas. O veneno por ter sido injetado. - Eu digo.

_ Não encontrei nenhum sinal no corpo que tivesse sido injetado. - Ele diz.

Deito-me no chão ao lado de Wes e observo a cena ao meu redor, me perguntando que especie de idiota sou eu, e qual o meu propósito em me deitar aqui se Wes já tirou todas as conclusões que deveria naquela posição... Frustrada rolo para esquerda fico deitada de lado observando o chão poeirento, os pés dos armários, velhos e gastos, alguns tem um apoio de papelão para mantê-los no nível... Então vejo algo reluzir embaixo de um dos balcões. Rastejo em sua direção, com parte do corpo debaixo do armário estico meu braço e rolo o objeto para fora...

Uma seringa com uma agulha comprida, mais do que as que eu já tenha visto e muito fina.

_ É, acho que não precisaremos levar a caixa inteira para análise, você encontrou o que pode ser uma das provas. - Wes diz, recolhendo o objeto do chão com todo o cuidado e o envolvendo numa quantidade considerável de gaze e colocando no bolso do seu jaleco.

Me permito sentir um breve contentamento já que não fui de todo inútil na cena do crime, como fui durante a necrópsia.

Ouço o bipe do pager de Wes.

_ Quem é? - Pergunto, quase que por reflexo... E repreendo-me intimamente pela minha falta de educação,

Wes pega o aparelho e dá uma olhada rápida no visor.

_Josh tem notícias. Vamos vê-lo.

Saímos da sala com uma seringa camuflada no bolso e com a certeza de que estamos mais próximos de desvendar esse crime, do que estivemos há algumas horas...

*******

A sala de controle não me trás boas recordações, quando nos aproximamos eu sinto meu coração sendo comprimido no peito a medida que a cena de Tobias sentado ao pé da roda gigante, chorando convulsivamente, me vem a memória... Recordo que desejei com todas as minhas força estar morta só para não vê-lo sofrer daquele jeito por minha causa. Mas hoje tudo que eu quero é estar viva para abraçá-lo novamente...

Quando paramos em frente a porta, Wes pressiona levemente meu ombro, confortando-me, enquanto dá três batidas de leve na porta da sala de controle. Um rapaz alto de cabelos ruivos e com sardas no rosto atende a porta.

_ Dr. Wes. Estávamos esperando pelo senhor. - O rapaz diz abrindo caminho para que nós.

_ Josh viemos o mais depressa possível. O que você descobriu?

_ Bom, não tivemos mais sinal de Tobias Eaton e conforme instruções pesquisamos em todas as câmeras de Chicago as pessoas de sua relação e descobrimos que alguns outros também sumiram, inclusive Caleb Prior... - Ele diz olhando para mim.

_ Você tem os nomes? - Wes percebe a minha aflição e se encarrega das perguntas.

_ Investigamos os nomes que o senhor tinha me passado. Christina, Ezekiel, Cara, Caleb, Joahnna, Evelyn... Destes apenas Evelyn e Joahnna foram vistas na cidade, os demais, sumiram assim como o Tobias.

_ Eles estão vindo para cá! - Digo quase que num sussurro.

_ Ótimo Josh, bom trabalho! E como estão as pessoas no hospital?

_ Nesse caso doutor, a notícia não é nada boa... Eles estão definhando... Não encontraram antídoto. Não sou especialista, mas a julgar pelo que vi através dos monitores... Diria que não tem mais do dois ou três dias de vida.

_ Wes, A Dr. Gail terá que curá-los! Não podemos deixá-los morrer assim.

_ Não é assim que as coisas funcionam Beatrice, mesmo que a obriguemos a nos fornecer o antídoto o processo de deterioração é irreversível, de fato pouparíamos as suas vidas, mas seu corpo permaneceria no atual estagio que se encontra...

Maldita seja Gail! Maldito seja todos aqueles que matam covardemente os seus semelhantes!

_ Josh, qualquer novidade, não exite em me chamar. Muito obrigado por tudo e esperamos poder continuar contando com a sua discrição.

_ Claro, doutor. Vamos ficar de olhos bem abertos.

_ Josh, você sabe dizer há quanto tempo exatamente Tobias está desaparecido?

_ Quatro ou Cinco dias. - Ele responde.

_ E se ele estivesse vindo direto para cá, quantos dias de viagem? Supondo que estivesses de carro?

_ Se eles soubessem para onde vir... Seria uns e dias de viagem, mas eles teriam que ter reserva de combustível... E conhecer os atalhos... _ Ele diz, acrescentando a última frase mais para me tranquilizar, pois creio que até mesmo ele deva ter percebido o quanto fiquei apavorada quando me descobri que ele está desaparecido há mais tempo do que gastaria para chegar até aqui.

_ Beatrice, é como Josh falou, eles ainda não sabem da existência da base, não conhecem os atalhos, então obviamente vão demorar mais a encontrar as respostas de que procuram e consequentemente o caminho até aqui. - Wes completa e Josh sacode a cabeça em concordância.

Preciso facilitar as coisas para ele, preciso conduzi-lo até aqui em segurança. Mas como? O Jato! Vou sobrevoar o perímetro! Enrico! Preciso da ajuda de Enrico!

_ Obrigada Josh! - Agradeço.

_ Às ordens soldado! - Ele responde batendo continência para mim e eu retribuo o gesto.

Wes despede-se também e saímos da sala.

_ Beatrice, você está com cara de quem pretende aprontar alguma coisa... Mas eu peço agora não é o momento, e vou dizer-lhe o porque: Você ainda está com a droga em seu organismo. Não acho prudente que ande sozinha por aí. E se você tiver outra crise, quem sabe o que pode acontecer.

_ Não estarei sozinha, vou pedir ao Enrico que me acompanhe.

_ Viu?! Eu estava certo? O que você pretende fazer?

_ Vamos sobrevoar o perímetro para ver se consigo localizá-los.

_ Eu entendo a sua aflição, mas eu acho que você deveria esperar pelo menos 24 horas.

_ Em 24 horas, muita coisa pode acontecer...

Ele saca o pager o bolso e manda uma mensagem para Enrico.

_ Pedi que ele nos encontre no laboratório. Vou deixar que você vá, mas não sem antes lhe dar algumas recomendações.

_ Okay

******

Estamos no laboratório há pelo menos uma hora, conferi meu relógio de pulso pelo menos umas dez vezes, como se o simples os ponteiros do relógio tivessem o poder de apressar Enrico do que quer que esteja fazendo...

_ Calma Beatrice, ele disse que viria.

_ Estou calma, só acho que ele já deveria ter chegado.

_ Bem, não vamos esquecer que ele anda muito ocupado ultimamente. A distração de Eddy, Alejandra, o trabalho, você... Dê um desconto ao garoto.

_ Okay. - Solto um suspiro exasperado...

_ Hum... Interessante!

_ O quê?

_ Isoproterenol... Encontrei na corrente sanguínea de David e também na amostra de tecido do coração.

_ E daí? O que isso quer dizer?

_ Que ele recebeu altas doses dessa substância que na verdade é utilizada para tratar bronquites e asmas... Mas nessa dosagem... Provocaria falência em urso pardo...

_ Tris! Dr. Wes. - Enrico irrompe pela porta ofegante.

_ Já não era sem tempo! - Digo num tom reprovativo.

Ele respira fundo, põe a mão no peito e aos poucos vai recuperando o fôlego.

_ Desculpe, foi difícil me desvencilhar do Eddy... E Alejandra estava me procurando desesperada pela Base... E o fato de ter ouvido boatos de que eu estava com Kim e Kate não ajudou muito.

_ Eu disse... Ele anda muito ocupado. - Wes disse para mim num sarcástico que Enrico ignorou completamente. Eu apenas o fuzilei com o olhar e ele por sua vez sorriu.

_ Mas o que está acontecendo? Descobriram alguma coisa? - Enrico quis saber.

_ Na verdade sim... Mas preciso que você acompanhe num voo pelo perímetro.

_ Por quê?

_ Porque quero ver se consigo localizar Tobias e os outros.

_ Como assim? Localizar? Que história é essa?

_ Eles saíram da cidade há 4 ou 5 dias e já deveriam ter chegado aqui... Quero ver onde estão.

_ Você acha que consegue ficar de olho nela Enrico? Só para o caso de haver algum efeito retroativo da droga?

_ Tudo bem... - Ele confere o relógio.

_ Agora o turno é do Carter, já está escurecendo... Seria mais prudente deixar para amanhã... - Ele completa.

_ Mas os jatos são equipados com visão noturna... - Rebato

_ Okay, mas nunca testei se de fato funciona...

_ Então vamos testar agora.

_ E tem como dizer não pra você? - Ele diz brincalhão, abrindo a porta para que eu possa passar

_ Tome conta dela Enrico.

_ Sim senhor, pode deixar.

*****

Estamos a postos dentro do jato, Enrico liga o motor e sinto a vibração da turbina reverberando nos meus ossos. O Jato ganha velocidade na pista e em poucos minutos estamos subindo em direção a imensidão que ainda não está completamente negra... Uma lua cheia enorme e presunçosa está despontando no céu e exigindo as atenções, mas ainda é cedo para que seu brilho prateado reine sobre o luminosidade do dia que se esvai em lindos tons púrpura que riscam o céu transformando-o numa obra de arte efêmera. Como me sinto livre aqui em em cima... Uma sensação tão boa que só poderia descrevê-la como paz...

_ Tris estamos alto o suficiente, vamos contornar o perímetro, mas sem nos aproximarmos muito de Chicago, não podemos chamar atenção. Fique com os olhos bem atentos.

_ Okay.

Enrico inclina o manche para esquerda e o jato inclina acompanhando o movimento, abaixo tudo o que vemos na precária luminosidade, são as estradas, o pavilhão do Complexo de Auxílio ao Dano Genético, os barracos e as ruínas da Margem, mas sinal algum de Tobias...

_ Você acha que eles possam ter ido ao Complexo? - Pergunto

_ É provável. Mas se eles foram até lá, eles nunca o deixarão chegar na Base.

_ Vamos sobrevoar o Complexo.

_ Certo. - Ele diz enquanto rumamos para lá.

Sobrevoamos o local por 15 minutos, examinando tudo a sua volta e até mesmo a atividade interna... Então a torre de controle faz contato.

_ Atenção, Torre de Comando chamando.

_ Vermelho M USA 6745 respondendo.

_ Vermelho M USA tem autorização de voo noturno no perímetro do Complexo.

_ Obrigado, se trata de um voo de reconhecimento, estamos retornando para base.

_ Positivo. - A torre responde.

_ Câmbio desligo. - Enrico finaliza o contato.

_ É fomos detectados... Precisamos voltar, eles vão repassar a informação para o General Sparks, aí estamos fritos...

_ Okay. - Digo frustrada e preocupada por termos encontrado nada.

Estamos voltando quando vemos os portões do Complexo se abrindo e dois jipes seguem caminho em direção a Chicago.

_ Enrico! Veja, estão indo na direção de Chicago.

_ Ou para Margem... Já que fica bem no meio do caminho. - Ele contrapõe.

_ Vamos segui-los!

_ Desculpe Tris, mas se fizermos isso corremos o risco de sermos interceptados pelos nossos próprios colegas... A Torre já deve ter feito contato com a Base, Carter deve estar tentando segurar as pontas, mas se demorarmos, já era.

_ E se forem eles? E se tiverem sendo levados de volta? - Digo aflita por perder a oportunidade de vê-los.

_ Então poderemos vê-los através dos monitores. - Enrico diz, já no caminho contrário dos jipes que agora não são nada além de um pequeno borrão escuro camuflado pela noite.

_ Enrico! Amanhã nós vamos atrás deles de moto! - Eu sentencio.

_ Okay Tris, vamos de moto. Mas por favor não se esqueça de agir naturalmente.

_ Enrico! - A voz de Carter chama pelo rádio.

_ Sim!

_ Preciso que voltem mediatamente!

_ A torre fez contato?

_ Sim. Por sorte chegaram até o Capitão Finth.

_ Gracias a Dios!

_ O quê? - Carter quis saber.

_ Nada! Estamos pousando em 5 minutos.

_ Okay. Depois vão direto para pala do Capitão Finth. Ele espera por vocês.

_ Obrigado Carter. Sei que você deve ter levado um bronca também.

_ É levei, espero que tenha valido a pena.

_ Te devemos essa!

_ Pode deixar que vou cobrar! Câmbio desligo.

_ É Tris, a gente tem mais sorte do que juízo.

_ Eu sei, obrigada Enrico.

_ Não foi nada... Voar com você é sempre um prazer.

_ Não me refiro ao voo, aliás não só ao voo, mas por tudo. Você tem sido incrível... Eu tenho te pedido toda a sorte de absurdos e você nunca me diz não. Nem um irmão faria isso por mim... - Digo lembrando amargamente de Caleb.

_ Eu faço qualquer coisa por você Tris... Basta me pedir.

Eu não respondo e ele não cobra respostas. O jato desliza na negritude cravada de brilhantes e me permito saborear um pouco mais desse raro momento de paz, esquecendo o que me aguarda em solo. Contemplo a lua, as estrelas e me pergunto quando é que isso tudo vai acabar e como vai acabar... E me dou conta de que independente da resposta para essas perguntas, espero que o fim seja na companhia de Tobias....


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Convergente II" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.