Elemento escrita por Grind


Capítulo 8
Capítulo 8 - Hoje o circo pega fogo




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Elemento / Capítulo 8 – Hoje o circo pega fogo

– Não espera, quem?

– Lembra do Alessandro e do Gael na escola?

– O que tem?

– Eles estão aqui fora! – Disse aos sussurros em uma voz quase desesperada.

– E o que tem demais nisso? O que eles estão fazendo aqui?

– Eu não sei! – Resmungou exasperado.

– Você tem que atendê-los. - A solução pareceu brilhar na minha mente. Eu não poderia atende-los no estado em que eu estava vestida.

– Eu? Por que eu?- Franziu o cenho de forma perdida.

– Eu preciso me trocar – Eu corri até meu quarto as pressas, eu precisava ser mais do que rápida.

Não sei o que fizeram, mas pude ouvir do meu quarto a porta se abrindo, trocas calorosas de “que bom te ver de novo” e "não esperava de encontrar aqui".

Ok, talvez ter feito Elemento abrir a porta não tivesse sido a melhor das minhas ideias, eu ainda estava tentando processar a parte na qual ele tinha evoluído o suficiente pra aprender a dar desculpas até sermos interrompidos. Eu temia que especie de pensamentos A e Gordo teriam sobre nós dois por ele estar ali já que nunca fomos amigos.

Não fazia muito sentido exceto por Alessandro, porque Gael, segundo minha memória odiava os marmanjos da nossa antiga sala – no caso, Elemento e o A. Talvez não sejam tão rancorosos como eu.

Trajei vestes simples, uma camisa listrada e uma bermuda de náilon, bebi uns goles d’água, respirei fundo e rumei para a sala sem ao menos portar um sorriso Cheguei a sala, percebi que tinha acabado de interromper uma conversa entre eles, pois as risadas pararam assim que apareci, eu me senti deslocada, até lembrar que ali era a minha casa.

– Ai está você! – Disse Alessandro de forma empolgada com os braços abertos.

– O que faz aqui? E como me encontraram? – Respondi curta e grossa, não estava pra gracinhas. Quando eu dizia que queria me livrar das pessoas e lembranças do Ensino Médio eu falava mais do que sério.

Elemento, que até então se encolhera no canto cruzou os braços com um sorriso torto tentando ser disfarçado, mas ele não me escapou a visão.

– É bom saber que eu não sou o único a receber esse tipo de tratamento. - Resmungou

Alessandro tirou o sorriso do rosto.

–É, então... – Gael deu uma pausa e pigarreou, nervoso – Já conversamos com o-

–Se quiserem falar com o Elemento vão a casa dele. - O apelido me escapou inconscientemente, mas eles logo ligaram os pontos. Uma atmosfera densa atingiu o local. Gael, gordo e rechonchudo de bagunçados e negros cabelos era baixo, mas ainda assim era corpulento, largo e espaçoso. Muito constratante com Alessandro que era alto, magro como um bicho-pau, franzino e tronco desproporcional as pernas extremamente finas. Ambos usavam roupas sociais, tinham acabado de sair do trabalho, eu acho, já era quase oito da noite, também não me interessava.

– Afinal, como chegaram aqui?

– Eles me mandaram uma mensagem perguntando aonde eu estava, então eu dei seu endereço – Elemento respondeu a minha indignação.

–Não quero seus amiguinhos na minha casa. Quem disse que podia dizer a eles onde eu moro?

–Então tá – Gael se levantou com rapidez, quase derrubando a poltrona devido à intensidade, meu sangue parecia pegar fogo. Dirigi o olhar com rapidez na sua direção – Só queria dizer que-

Eu estava prestes a manda-lo calar a boca quando Alessandro nos interrompeu.

–Vamos fazer um reencontro no colégio, todos nós. – Disse sorrindo em minha direção.

Elemento se moveu incomodado, lançando olhares nem um pouco agradáveis em direção ao ‘amigo’, e eu tratei de fingir não notar nada.

–Vão embora daqui logo vai! Cansei dessa embolação – Gritei – Eu não estou com paciência para nada agora, desde quando se bate na porta de alguém a essa hora? Sejam mais prudentes e liguem durante o almoço marcando um horário.

–Ah pelo amor de Deus não Gabrielle? Você está sempre muito nervosinha, abaixa um pouco a bola que você não está podendo tudo isso não – Gael se exaltou.

Senti meu sangue ferver, correndo a mil por minhas veias, cerrei os punhos com força sentindo a fúria tomar conta de mim.

–Vai gritar na casa da sua mãe Gael! – Eu o empurrei com brutalidade e ele facilmente perdeu o equilíbrio – Você é um ninguém, e admira que ainda esteja vivo com a forma que come e a julgar como se comporta!

–Gabrielle – Elemento tentou intervir, colocando a mão em meu ombro, mas eu escancarei a porta.

–Eu quero os dois para for da minha casa agora, que eu preciso falar com o amiguinho de vocês sozinha. – Ouve um conflito de olhares entre A e Elemento.

Gordo saiu as pressas, e o A parou na minha frente, eu pude ver de canto de olho Elemento se mobilizar desconfortável alguns passos atrás.

–Eu ligo quando estiver mais calma – Ele sorriu e eu desviei o olhar para o chão.

–Ótimo. - Ligar pra onde? Me pergunte mentalmente, ele não tinha o meu número.

Ela saiu, eu bati a porta com força. Como era possível juntar tanto idiota em um lugar só de forma tão rápida?

–Eles vieram aqui de boa Gabrielle, não tinham nada a ver com a nossa briga anterior, poderia ter sido um pouco mais educada.

–Talvez, se eu soubesse que havia passado meu endereço para outras pessoas, eu estaria mais calma! Preparada! Meu histórico com Gael, são brigas atrás de brigas!

–Você também nunca foi com a minha cara.

–É diferente! – Eu enfim soltei a maçaneta e procurei me sentar. Elemento permaneceu de pé - Ele fazia parte da mesma rodinha de pessoas que eu e se você soubesse o sacrifício que era ter que me controlar! - Eu fechei os olhos com força, raiva só de lembrar –Já Alessandro – Passei a mão pela testa e suspirei.

Quando voltei a abri-los. Elemento havia mudado a postura completamente. Voltara a ficar de braços cruzados, sério com o cenho franzido, quase como se estivéssemos falando de negócios de uma empresa multimilionária, e a minha proposta tivesse soado agradável.

–O que tem ele?

– O que te importa?

Ele revirou os olhos bufando não contente.

– Você vai na reunião da escola?

– Eu não sei... Vou falar com Marco, ver se ele vai levar alguém. – Afundei o rosto por entre as mãos. - Se é que ele foi convidado, essa noite está agitada de mais pro meu gosto.

–Se ele for levar, vem comigo.

Levantei o rosto sem entender.

– O quê?

– Vem comigo - Deu de ombros.

(...)

– Você ficou louca?! –Marco berrou

Todos dentro do café que estávamos tiveram a atenção a nós dois. Recolhi um pouco minha cadeira, descendo um gole do meu café com leite para disfarçar a vergonha.

– Você tá querendo reencontrar aquela gente de novo? Eu dei graças a Deus quando nos formamos, assim não teríamos mais de ver eles, nem que fosse pra dar um “oi” rápido no shopping, ou mercado. Eu passo reto, e se vier falar comigo eu denuncio a pessoa pra policia, falando que quase fui roubado.

– Como você fala...

– E não é?! – Espalmou as mãos contra a mesa quase fazendo tudo sobre a mesa ir ao chão, escandaloso como sempre.

– O A e o Gordo apareceram lá em casa, convidando ao D e a mim.

– Na sua casa? D?! Como assim?! – Fui interrompida antes que pudesse terminar minha sentença.

– É complicado.

– Tenho o tempo todo.

– Tenho que trabalhar.

– Hoje é sábado.

– Vou sair.

– Vou junt-

– Tá!

– Me explica isso direito.

– Eu não sei! – Falei um tanto quando alto e novamente olharam em nossa direção em sinal de desaprovação – Ele estava lá pra se desculpar.

– E ele sabe fazer isso?

Eu o ignorei, só a minha implicância já parecia mais do que o suficiente.

– Ai o A e o Gordo apareceram pra me convidar, juntamente com o D.

– E você fez o quê? – Marco estava ansioso para a resposta, seus olhos brilhavam.

– Coloquei todos para fora – Cruzei as pernas e os braços, ele adorava quando eu fazia pouco caso de alguém que ele também não gostava.

– É isso ai! – Fez um sinal de joia com o dedão, empurrando a cadeira para trás com força. De novo ele atraiu todos os olhares para nós

– Mas o D ficou.

O semblante animado na cara de Marco sumira, dando espaço a um feitio irritado. Ele era muito expressivo.

– Você só pode estar me zoando. Porque o-

– Shh! – Impedi que ele finalizasse a frase – Alguém que ele conhece pode estar por aqui!

– Você continua com essa neura? – Riu – E outra, quantos Elementos existem no mundo?

– Não interessa melhor prevenir do que remediar.

– Se você diz... Mas então vamos nesse coiso ai?

– O D vai.

– Perguntei de você – Disse devidamente irritado.

– Marco e suas caras e bocas, se você for eu vou.

Marco coçou a nuca e curvou o pescoço enquanto mordia o lábio inferior

– Tá... – Respirou fundo e voltou a me olhar – Você tem sorte de ter um amigo igual a mim, que aceita tudo.

– Elemento me convidou para ir com ele.

Marco parou tudo o que estava fazendo, mobilizou-se, seus olhos pareiam presos aos meus.

– O quê? - Ele realmente não tinha entendido o que eu havia falado.

Eu segurei um sorriso, por algum motivo até então desconhecido, eu me sentia subitamente feliz por isso.

– Ele me convidou para ir com ele, com toda gentileza que eu nem sabia que tinha.

– Eu vou te matar! Você está cedendo aos encantos dele?! – Gritou como um louco. - Você o odiava lembra? Está soltando as rédeas!

– Não é bem assim - Cocei a nuca enquanto batucava a mesa com os dedos.

– Então como é?! Vai com ele ao invés de mim?! Seu amigo? – Fez toda uma encenação dramática. Pressionando o peito às lamúrias forçadas.

– Agora você vai? Não tava falando que não queria ver “aquele” pessoal? – Perguntei apoiando o peso do rosto nas mãos.

– Hum? – Deu uma bebericada numa xícara de café – Do que estávamos falando? - Fez se de desentendido por não ter conseguido levar o argumento adiante.

Suspirei e bati a mão em minha testa, sem que eu percebesse, Marco pegou meu copo e bebeu.

– Filho da-

– Controle-se, quem está nervoso aqui sou eu.

– Seu eu quiser ir com o Elemento eu vou, você já disse que não queria ir. -Revirei os olhos, eu não tinha reais intenções de ir com o Elemento, algo batucando em minha cabeça dizia que não era a melhor opção, não eramos se quer colegas.

– Gabrielle – Marco suspirou enfiando o rosto por entre as mãos. – Você não está me entendendo. Já se esqueceu de que odiamos aquelas pessoas? O A, o Gordo, o Elemento, e toda a gentalha que fazia parte das nossas salas? Não tem sentido você querer ir.

– Tá, mas pode ser que encontremos alguém do nosso antigo grupinho.

– Pouco provável, é capaz deles também não quererem ir devido a esse mesmo motivo.

– Que seja então Marco! – Esbravejei batendo ambas as mãos na mesa sem paciência alguma – Você não quer ir, eu vou com o Elemento então!

– Tá bom! –Gritou mais alto do que eu – Já entendi, você quer que eu vá, eu vou.

Aquilo me fez sorrir, era sempre fácil persuadir Marco.

(...)

Era de noite, hoje era o dia. Marco e eu fomos juntos para o nosso antigo colégio. Pisar naquela calçada nos causou um baque de nostalgia nos refazendo recordar os momentos agradáveis e outros que gostaríamos de esquecer. Não sabia ao certo se realmente queria estar ali, talvez eu não deveria ser tão rancorosa, todavia, o ensino médio era uma página, que mesmo já virada, me fez passar muito estresse e existem coisas que, no final das contas, não tem necessidade de serem lembradas, nem por mim, nem por Marco.

– Olha só, costumávamos ficar nesse canto durante o intervalo! – Marco apontou um canto entra as paredes a lado de uma porta. Havia um tom de entusiasmo em sua voz.

– Eu me lembro. Onde será que o pessoal está reunido? - Eu não tinha vontade em reviver momentos quanto aquele lugar, mesmo que fossem até boas memórias parecia algo tão longe que não teria graça se fosse pra lembrar só eu e Marco, muito mais emocionante seria se fossemos a mesma grande roda de amizade de antes.

– Provavelmente na quadra, as coisas sempre aconteciam lá. - Deu um passo a frente.

Marco e eu cruzamos o pátio até alcançarmos a quadra, um lugar não tão grande, com várias linhas coloridas cortando o piso, dois gols e duas cestas de casquete, e alguns bancos dispostos nas extremidades.

Havia mais pessoas do que eu imaginava, felizmente pra mim, não estavam todos juntos como se deixassem os problemas antigos pra trás, mas sim em suas tão típicas panelinhas.

Precisávamos descer uma arquibancada antes de realmente cumprimentar as pessoas. Por algum motivo, comecei a procurar Elemento com os olhos, eu vi o grupo da ‘favela’ – eu e Marco havíamos a denominado assim – que aparentemente não haviam mudado muito estavam no entro da quadra, rindo de forma exagerada loucos por atenção e preparados para um barraco, debatiam sobre alguma coisa. As garotas mais a esquerda, todas devidamente acompanhadas de caras desconhecidos, outras pessoas que não consegui identificar espalhadas mais a frente. Até que eu avistei o grupo dos ‘descolados’, era engraçado julga-los assim, apesar de nunca terem destratado ninguém.

O A e Elemento estavam entre eles, A ria de algo enquanto Elemento gesticulava de forma animada, a me ver, sorriu, acenou e voltou ao que estava fazendo. Estávamos todos vestidos formalmente, talvez em uma tentativa estúpida de dizer que estávamos bem de vida, querendo impressionar os outros. Marco não se dera muito ao luxo, estava com sapatos e calça social, a camisa branca estava com os punhos enrolados até os cotovelos de forma charmosa, mas o que chamava realmente atenção era sua gravata vermelha.

– Ele sorriu pra você? – Marco franziu o cenho do meu lado me trazendo de volta a realidade.

– Acho que sim. - Eu pisquei meio perdida, ele tinha lidado bem com o meu 'não'.

Marco passou a mão pela gravata com um sorriso convencido no rosto.

–Estou bem melhor do que a quadrilha. - Puxou um sorriso de lado enquanto indicava os mesmo na quadra.

– Não se vanglorie tanto, fui eu quem escolhi a cor. - Suspirei

– Gabrielle! Marco! – Uma voz feminina gritou de forma exagerada mais ao fundo.

Uma garota surgiu esbarrando entre a favela e as garotas de forma animada acenando em nossa direção recebendo olhares nada agradáveis. Ela vinha acompanha, outras três ou quatro pessoas.

E para meu desgosto, Gordo vinha com eles.

Tenho certeza de que devo ter ficado séria na hora, pois a animação contagiante do grupo foi diminuindo conforme viam meu olhar na direção de Gael.

– Ah meu Deus, acho que vou vomitar - Resmunguei entre dentes quando meus olhos pularam de Gordo para Marco.

Marco ficou de costas para eles falando baixo o suficiente para que apenas eu escutasse.

– Você tem que se controlar, viemos aqui pra nos divertir, tudo o que eu mesmo preciso é que você comece a beber e faça vexame, está me ouvindo?

– Sim senhor – Respondi com indiferença, eu beberia todas.

O circo ia pegar fogo.


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