Quando a Chuva Encontra o Mar: Uma Nova Seleção escrita por Laura Machado


Capítulo 81
Capítulo 81: POV Melody Hope




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Eu tinha algumas poucas horas até ter que ir embora, mas eu dispensei minhas criadas. Não me importava com a minha roupa e eu queria ficar sozinha. E tinha uma coisa que eu precisava fazer antes de ir embora. Eu precisava assinar o quadro que tinha começado do lado de Charles.
Era engraçado pensar que eu tinha estado tão nervosa por causa daquele Jornal Oficial estúpido na sexta-feira, quando eu claramente tinha problemas maiores com os quais lidar. Charles não me queria. Eu não era boa o suficiente para ele. Eu tinha perdido meu tempo, gastado meus nervos naquela droga de competição.
Tive que me segurar para não quebrar todos os quadros inacabados que ainda estavam perdidos pelo meu quarto. Eu não queria deixar o castelo como a menina descontrolada que surtou. Mas, para falar a verdade, eu não queria deixar o castelo de jeito nenhum.
Eu arrumei minhas tintas com cuidado, quase pedindo desculpas por ter pensado em descontar nelas pela minha própria falha. Eu não gostava de perder, mas eu também não iria me dar por vencida. Eu tinha que tirar alguma coisa daquilo. Eu tinha mudado, nem que fosse bem pouco. Eu tinha crescido e precisava provar isso naquele momento.
Peguei minhas malas, deixando para trás quase tudo que eu tinha usado nas últimas semanas. O quadro que eu tinha começado e terminado ali ficava para trás, deitado em minha cama. Era um pedaço de mim que eu esperava que não fossem desprezar. Mas eu parei na porta para dar uma última olhada no meu quarto, e meus olhos caíram na paisagem de fim de tarde que contrastava com os lençóis brancos da cama. Ela parecia tão esquecida, tão pequena. Eu precisava dar-lhe um pouco mais de atenção. Eu queria deixar um pouco de mim ali, mas não se fosse para esse pouco ser ignorado.
Fui até o quadro e o peguei, trazendo-o comigo no corredor. Coloquei-o junto a mim, o abraçando o mais forte que podia enquanto ainda carregava minhas malas. Eu imaginava que todas as meninas tivessem ido embora, mas quando estava virando o corredor do primeiro andar, vi que várias pessoas estavam no hall de entrada. Por instinto, me escondi atrás da parede, deixando só um pouquinho da minha cabeça para fora, só o suficiente para eu ver o que estava acontecendo. O novo rei da Alemanha estava de joelhos com Melissa na sua frente. Ela se agachou na frente dele e ele a abraçou.
Eu me senti invadindo um momento íntimo demais, apesar de que praticamente todas as outras selecionadas e a família real também os assistiam. Eu só não queria interromper, não queria roubar a atenção para mim, então me escondi de vez, de costas para a parede.
Estava me sentindo a pessoa mais inapropriada do mundo. Era claro o que estava acontecendo ali e eu tinha tido a sorte de aparecer bem na pior hora! Se pelo menos eu pudesse desaparecer!
Me virei para o lado contrário ao que levava à entrada e comecei meu caminho, mas parei assim que percebi um guarda que andava correndo em minha direção. Me senti de novo como a inadequada, sem saber para onde ir. Eu me virei de volta para o outro lado, imaginando que só estaria piorando tudo tentando fugir, mas eu não queria aparecer lá naquela hora. Parecia uma tonta, sem ter ideia do que fazer. Mas o guarda decidiu para mim.
Quando ele chegou até mim, se colocou na minha frente e eu percebi que era Thomas.
"Eu preciso falar com você," ele disse, sua urgência tão clara em sua voz quanto estava em seus olhos.
Eu tinha sido pega tão de surpresa, que nem o contestei. Na verdade, eu não sabia o que estava acontecendo. Não era como se nós tivéssemos esse tipo de intimidade, não era como se fôssemos até amigos. Eu só o tinha visto algumas vezes pelos corredores e só tinha falado com ele uma única vez, não que tivéssemos conversado sobre grandes coisas. Aquilo era tudo esquisito demais, mas eu não o impedi de me carregar para uma sala de estar vazia que estava por ali.
Ele fechou a porta atrás dele, enquanto eu continuava agarrada ao meu quadro, tentando entender o que estava acontecendo. Ele apoiou as mãos e a cabeça na porta, provavelmente pensando sobre alguma coisa, e eu só fiquei ainda mais confusa. Eu queria entender o que o estava incomodando tanto, por que ele estava tão agitado.
Mas o que quer que fosse, tendo a ver comigo ou não, eu fui começando a me sentir culpada por não ajudá-lo. Sem soltar meu quadro, coloquei de leve uma mão no seu ombro. Mas ao invés de consolá-lo, eu o assustei, fazendo-o se virar de uma vez para mim.
"Desculpa," falei, dando alguns passos atrás.
"Não," ele balançou a cabeça, franzindo as sobrancelhas. Ele parecia tão culpado, tão acabado por trás de seu uniforme, eu quase não o reconhecia. "Não precisa se desculpar," ele disse, "eu é que tenho que pedir desculpas."
Ele esfregou a nuca e passou a mão pelos cabelos, bagunçando-os completamente. Me lembrou de quando eu tinha o encontrado no corredor sem querer. Ele parecia outra pessoa. Tinha sido tão confiante, tão descolado aquele dia, e ali estava ele, todo nervoso e impaciente por deus sabia o quê!
Eu pensei em falar alguma coisa mil vezes, mas não sabia ser muito delicada, não sabia ainda qual era o problema. E estava com medo de falar a coisa errada. Ele buscava palavras em sua cabeça, enquanto meus dedos estavam agarrados à tela na minha frente.
"Tem alguma coisa que eu possa fazer?" Eu perguntei, tentando deixar a minha voz baixo o suficiente para não lhe causar mais alarde.
Seus olhos encontraram os meus e ele balançou a cabeça, pensando alguma coisa que eu não sabia o que era. Me senti um pouco tonta, completamente ignorante ao enorme problema que ele então tinha. Eu só não estava entendendo o que eu tinha a ver com aquilo, porque ele estava descontando em mim.
"Você está indo embora," ele disse, quase sussurrando.
Eu só concordei com a cabeça.
"Você está indo embora," ele repetiu, dessa vez parecendo que estava mais pensando alto do quem qualquer coisa.
"Estou," falei, sentindo o desânimo daquela situação tomando conta de mim.
Eu estava indo embora, estava deixando o palácio de uma vez por todas. Eu nunca mais voltaria ali, tudo que tinha acontecido dentro daqueles cômodos viria uma lembrança fugaz, que talvez me fizesse questionar se tinha mesmo acontecido.
Levantei meus olhos de volta para os deles um segundo antes de ele andar até mim e segurar meu rosto com as duas mãos, levando-o até ele, encostando meus lábios nos seus, fazendo todos os meus pensamentos virar pó. Não pude soltar meu quadro, apesar de querer muito. Ele me puxava para ele, sem se importar com a tela dura que tinha entre nós, como se ele precisasse me ter e não conseguisse me largar.
Mas meus pensamentos foram tomando forma entre nossos beijos e eu fui me dando conta de onde estávamos, de quem éramos.
"Espera," falei, me afastando só um pouco dele.
"Me desculpa, eu-" ele começou a falar, mas quando eu levantei uma mão, pedindo para parar, ele deixou suas palavras morrerem.
Eu precisava pensar, eu precisava tomar um ar. Meus dedos estavam suados no meu quadro e já não aguentavam mais o peso da minha mala. Fui até uma poltrona e os soltei ali, tentando ganhar tempo para entender o que estava acontecendo.
Eu não tinha certeza de muita coisa. Eu sabia que tinha sido eliminada, então já não tinha nenhum compromisso com o príncipe. Mas não sabia se ele considerariam aquilo como traição do mesmo jeito, afinal, eu ainda estava sob seu teto. Mas era o Thomas!, eu pensei. Quem se importava com uma punição tola quando era ele que estava ali, logo atrás de mim?
Me virei para encontrá-lo sentado em um sofá, o rosto enterrado nas mãos. Ele continuava parecendo perdido e eu senti um impulso de consolá-lo. Comecei a andar até ele, mas ele me percebeu antes que eu estivesse do seu lado. Ele se levantou, culpa já tomando conta dele.
"Me perdoe, Lady Melody," ele disse, implorando com os olhos para que eu aceitasse suas desculpas. "Eu não sei o que me deu, me desculpe. Eu deveria ter pensado antes-"
Dei o último passo que tinha entre nós, calando-o com um beijo. Ele pareceu surpreso primeiro, mas suas mãos encontraram seu caminho de volta até meu rosto, enquanto eu o abraçava com toda a força que tinha. Eu fiquei na ponta de pé, mas foi fácil quando ele colocou uma mão nas minhas costas, me fazendo arquear em sua direção, me sustentando. Seus lábios foram descendo dos meus para meu queixo, meu pescoço, até meu ombro, e eu me deixei curtir seu toque na minha pele. Mas eu os queria de volta na minha boca, então me agachei até meus lábios encontrarem os deles e me levantei de novo, trazendo-o comigo.
Quando ele me sentou devagar no sofá atrás de mim, eu comecei a lembrar de tudo que estava errado com aquilo. Eu não podia me deixar me perder nem por mais um segundo.
"Thomas," eu disse, empurrando seu rosto de mim só os centímetros necessários para que eu pudesse falar. "Eu preciso ir."
Seus olhos se abriram e encontraram os meus, e eu pude ver o que aquilo fazia com ele.
"Eu não quero que você vá," ele disse, me dando um beijo rápido.
"Eu não quero ir também," falei, enquanto ainda brincava com o cabelo da sua nuca. "Mas eu não posso ficar aqui."
Ele passou o dedo pelo meu rosto, quase como se estivesse me desenhando, e eu me perguntei porque tudo aquilo tinha que ter acontecido bem naquela hora, bem quando eu estava indo embora.
"Me escreve?" Ele perguntou do nada.
Eu comecei a me levantar, o que o fez sair de cima de mim.
"Você quer que eu te escreva?" Perguntei, só para ter certeza de que não estava imaginando.
Eu podia jurar que aquilo era alguma coisa que não aconteceria duas vezes. Quem sabe uma vez na vida e outra na morte.
"Quero," ele disse, pegando a minha mão que estava no meu colo. "Se não quiser, não precisa," disse, já um pouco decepcionado.
Ele não entendia que eu é que não achava que ele fosse se importar comigo assim. Nós dois estávamos na mesma posição, achando o outro mais importante que nós. Aliás, importante demais para olhar para nós.
"Eu adoraria," eu disse, dando uma apertada na sua mão de volta.
Ele levantou os olhos para os meus e sorriu de um jeito que me deixou muito encabulada. Era como se ele tivesse me vendo de verdade pela primeira vez, entendendo tudo do que eu era feita. Senti minhas bochechas ficarem vermelhas e ele se inclinou para me beijar de novo, delicadamente. Era engraçado como quanto mais perto ele chegava de mim, mais vergonha eu tinha. Mas, ao mesmo tempo, mas bonita eu me sentia.
Depois de alguns últimos minutos de beijos adoráveis, nós nos separamos e eu fui até as minhas coisas. Aquele quadro era tosco, eu conseguiria fazer um bem melhor. E eu tinha pintado uma boa parte dele com o príncipe. Mas era tudo que eu tinha para lhe dar, então me virei para Thomas com ele nas mãos.
"Enquanto a minha primeira carta não chega," falei, oferecendo-lhe o quadro.
Ele ficou muito surpreso e muito honrado, sem acreditar que eu realmente estava lhe dando algo meu, enquanto eu achava aquilo pequeno demais para ele.
"Para mim?" Perguntou, franzindo a sobrancelha daquele jeito perdido e graça dele.
"Para você," falei, rezando para ele gostar.
Acho que gostou, pois me abraçou forte, um abraço de obrigado e adeus. Quando me afastei dele, vi que ele parecia bem mais calmo do que antes, o que me fez perguntar se todo aquele incômodo dele antes tinha sido por minha causa.
Mas não, eu não seria louca o suficiente para acreditar nisso.
Eu o deixei para trás, agora só com minha mala. Ele ficou parado na porta da sala onde tínhamos estado, enquanto eu andava de volta para a entrada. Vi Melissa com o rei da Alemanha indo para o outro lado do corredor, para longe da porta. Abigail abraçava Gabrielle com tanta força que as duas balançavam, tentando se equilibrar. Annabel estava longe de todo mundo, segurando suas malas, sem olhar quase ninguém nos olhos, enquanto Jenny abraçava todos.
Quando cheguei até elas, eu resolvi que ia também me despedir de todo mundo. Menos de Victoria. Não porque eu não queria, mas porque ela não estava em lugar nenhum ali. Quando chegou a minha vez de me despedir da rainha, senti minhas pernas fraquejarem. Mas tinha uma coisa que eu precisava falar para ela e aquela seria a minha única chance. Eu precisava que ela soubesse de uma coisa.
"Rainha America," eu falei, fazendo-lhe uma reverência. "Eu espero que a Vossa Majestade saiba a honra que foi para mim conhecê-la e poder aprender tanto com a senhora."
Ela tinha uma expressão triste no rosto, mas abriu um sorriso e colocou seus braços em volta de mim, me abraçando forte. Eu lhe retribui o abraço, aproveitando para apertá-la o máximo que podia, tanto quanto eu sempre tinha querido fazer.
"Manda um beijo para a Marlee por mim?" Perguntei, quando estava me afastando.
"Pode deixar," ela disse, concordando com a cabeça.
E diz pra ela que eu quero o filho dela para mim, eu acrescentei na minha cabeça.


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