Vampiros Bons não Existem escrita por mandycarol


Capítulo 1
Ato I - Retorno


Notas iniciais do capítulo

Quando obtiver asteriscos * há notas no fim do capítulo



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Zero Kyriyuu, Brasov, 29 de Janeiro de 2010

O dia em Brasov amanheceu inacreditavelmente quente e terrivelmente quieto. A vista do castelo de Bran não é nenhum um pouco reconfortante. O único barulho vem dos turistas que conseguiram acordar cedo para uma pequena excursão, a onda de assassinatos nesta e em outras regiões tem feito o turismo regredir e os moradores a permanecerem todas as noites trancadas em suas casas. É incrível como os turistas parecem terem vindo do futuro nesta pequena região da cidade onde os moradores supersticiosos parecem os mesmo do século XIII que foram alvos de ataques tártaros-mongóis. Vivem a vida de seus antepassados e como eles fogem de criaturas inexistentes. Não consigo entender o que o diretor pretendia ao me manda para tal lugar, sabe o quanto essas crenças me deixam irritado, ele sabe o tanto que qualquer crença me deixa irritado, tudo não passa de mentiras e falsas esperanças. Não há um deus, nem ao menos um diabo, qual seria o sentido então de criaturas que chamam de vampiros. A vida já não é ruim o bastante para ter que inventar tais tolices. Porque quando morrermos será o fim, apenas o fim, o fim de tudo.
Cheguei à velha casa onde Kaien me mandara, é escura, fria e com o ar sufocante. Irei entrar e espero não ter surpresas ruins.


Kaien Cross, Bucareste, 29 de janeiro de 2010

A universidade Cross estava vazia, os corredores silenciosos, mas em breve estariam barulhentos e cheios e isso me incomodava profundamente. Num momento crítico como esse quem poderia proteger e a assegurar a vida de tantos jovens cheios de vivacidade? O que poderia segurar esses adolescentes cheios de hormônios? Os desaparecimentos continuavam e as autoridades insistiam em manter seus olhos fechados, procurando logicamente por uma gangue ou seita que seriam responsáveis por tantas mortes, mas a solução não era lógica e muito menos nosso inimigo. Ainda podia sentir o cheiro de sangue, da carnificina e ainda podia ver o corpo pálido sob a lua, mas não seu rosto. Jamais vi seu rosto. Aquele que matou tantos e continuava a beber o sangue de outros, tinha que encontrá-lo e mandá-lo ao inferno novamente. Espero que Zero tenha conseguido chegar até o local, isso também o fará crer mais e acreditar no que realmente existe. Assim que ver, o tornarei meu discípulo.

Yuuki Cross, Tóquio, 29 de Janeiro de 2010

Faz frio em Tóquio, são 19 horas da noite e estou terminando de arrumar minhas malas para a viajem à Romênia, meu pai deve me aguardar no aeroporto juntamente com meu irmão mais velho recentemente ordenado padre, Ichijou. Não fui surpreendida pela notícia de sua ordenação ao clérigo, pois desde cedo ele manifestou sua vontade pela religião. Minha mãe não gostou da notícia, mas ocupada com seu segundo casamento não interferiu. Para os outros, bem, foi um orgulho. Numa das famílias mais tradicionais do antigo e decadente país da Romênia, ter mais um membro no clero é motivo de orgulho. Creio que puxei minha mãe neste lado, ao contrário da minha fanática família sempre achei o catolicismo contraditório e fadado a questionamentos. Porém pensando bem foi bom, assim eles deixariam de comentar sobre a “vergonhosa” separação de meus pais. Minha bagagem é pequena e não levarei muito tempo para terminá-la, muitos dos meus antigos pertences continuam na minha antiga casa. Minha universidade, não é conceituada, mas me permitirá ficar mais próxima de meu pai, diretor da mesma e o único a sofrer com toda essa situação. Alguns dizem que isso lhe rendeu bons frutos, aproximando-o mais de Deus. Para mim ele se tornou um devoto vazio e sem esperanças. Terminarei de arrumar minhas malas, logo Aidou estará aqui para levá-las, partirei no vôo de 20:30.


Zero Kyriyuu, Brasov, 29 de Janeiro de 2010

Meu braço esquerdo ainda sangra, apesar do curativo feito pelo médico o sangue continua a manchar as ataduras, quais têm que trocar constantemente. Maldito Kaien! Para onde aquele louco havia me mandando? E o que era aquilo? Ao entrar na casa, comecei a tatear no escuro e procurar por algo que acendesse uma luz, neste momento pude sentir algo cortar meus braços, como se o rasgasse num corte profundo. Usei meu isqueiro para ver o havia me “arranhado”, então me deparei com um homem coberto em trapos. Porém aquilo não era humano. As paredes manchadas de vermelho e um forte cheiro de sal e ferro enchiam o local que era pútrido e fétido, era sangue e logo encontrei a fonte, o corpo de uma mulher jazia no chão, pelas roupas era uma camponesa, provavelmente uma moradora local. Aquela criatura se alimentava da mulher, sugando-a por suas presas, tive nojo. Ele provavelmente estava se alimentava calmamente até notar minha presença, seus olhos eram vermelhos e parecia desnorteado, confuso, o sangue que agora escorria de um dos meus braços o incitava. O monstro começou a correr em minha direção e era bastante veloz, estava encostado à porta e sem armas em mãos, agi por instinto e abri a porta atrás de mim, tinha que sair dali. Então contemplei a criatura se tornar cinzas, frente aos meus olhos. A mulher ainda no chão respirava de modo ofegante, ela não era a única no local, mas era a única que não cheirava a podridão.
Peguei a jovem e apoiei em um dos meus braços com bastante dificuldade e a levei até o hospital local, algumas enfermeiras se recusaram a nos atender, dizendo que fomos vitimas de vampiros, queria poder dizer ao contrário, porém pela primeira vez daria razão a aquelas histórias que considerava mito. Por sorte um dos médicos me reconheceu e aceitou nos atender, era amigo de Kaien, até onde a influência daquele diretor podia chegar? Na realidade eu desconfiava que tudo havia sido planejado por aquele diretor de aparência idiota. O médico nos levou a um quarto com duas macas, um enfermeiro colocou a moça sobre um das macas e me sentei na outra.  Ele começou a limpar suas feridas enquanto o médico olhava meu ferimento. A moça estava com o corpo coberto de hematomas, ela provavelmente havia brigado com a criatura até por fim não conseguir mais, quando a encontrei seu corpo estava desfalecido e junto com as diversas marcas no corpo haviam mordidas e não apenas no seu pescoço, mas também no pulso e perto do seio.
– Não é nada sério. – sibilei.
– Tem razão. Não é nada sério. – ele parecia aliviado. – Não se comparado a ela. – apontou para a moça e sorriu de modo irônico. - Radu, faça o curativo, eu cuidarei da moça. – ordenou ao enfermeiro.
O enfermeiro fez o curativo agilmente e quando terminou me dispensaram para voltar ao hotel. Pergunto-me o que fizeram com a moça. Agora está tarde, amanhã voltarei ao hospital para vê-la.


Kaien Cross, Bucareste, 29 de janeiro de 2010

São quase meia-noite, acabo de receber o telefonema de Baldwin*, Zero esteve em seu hospital algumas horas mais cedo, coberto de sangue e carregando uma moça no colo. Ao notar minha reação no telefone, ele tratou de me acalmar ao dizer que ele estava bem e seguro e não havia sido mordido. Para mim foi um alívio, não me perdoaria caso o meu plano tivesse conseqüências tão desastrosas. Eu sabia do quanto eu tinha ido longe, mas também compreendia ser necessário. As pessoas têm perdido sua fé e estão deixando de ir as igrejas*, temo pela segurança deles e somos poucos os que podem protegê-los das criaturas das trevas. Agora Zero acreditava e creio que sua forte índole e a ancestralidade de seu sangue falariam mais alto.
A jovem moça que ele chegou carregando não teve a mesma sorte, mordida por um vampiro, ela estava condenada a se tornar um ser da noite que nada mais beberia além de sangue e pior, um animal sem consciência.
– Ela tentou atacar Radu quando acordou, amarramo-la na maca e a cedamos. – dissera Baldwin.
– Entendo.
– O que faremos com ela Kaien? – perguntou o doutor num certo tom aflito.
– Arranque a cabeça. – falei friamente após analisar a situação.
– Mas isso...
– É necessário. – completei sem lhe dar espaço para questionamentos.
Agora a jovem deve estar repousando em seu túmulo, a família que a tanto a procurava chorando por seu falecimento tão brutal. Vítima de violência e decapitação. Porém agora ao menos seus parentes têm uma cova sobre qual chorar, um corpo a receber, com sua transformação feita de modo incompleto seu corpo não virara cinzas.
O que mais me intriga é quem a transformara, um vampiro completo, recém criado, insano, sedento, mas ainda assim completo. Será que alguém está se sentindo solitários demais?


Yuuki Cross, Bucareste, 30 de Janeiro de 2010

O meu quarto é quente e úmido, um tanto diferente da noite fria de Budapeste. Ele está do mesmo modo de como me lembrará. Cheguei de madrugada, avião se preparava para pousar, meus cintos já estão apertados e senti a ansiedade me corroer juntamente com as lembranças de minha infância. Mas qual seria o motivo? Eu sabia que em parte era esse clima que pousava sobre a Romênia, este clima sombrio. Mas por outro lado as palavras de minha mãe ao se despedir marcaram minha mente.
– Não dê ouvidos para certas coisas que pai diz, ele é apenas vítima daqueles velhos tolos - disse antes do meu avião partir e eu com ele.
Eu entendia sobre o que ela falava, ela se referia as velhas superstições e mitos contados pelos anciões, porém era difícil acreditar que apesar de tudo Kaien leva-se a sério tais histórias.
No aeroporto meu pai e meu irmão mais velho, Ichijou, me receberam com belos sorrisos no rosto, os dois pareciam duas crianças que acabavam de receber sorvete de seus sabores preferidos.
– Bem vinda Yuuki! – disse Ichijou após quase se estatela com meu pai para ser o primeiro.
O jovem loiro me abraçou fortemente, retribuí o abraço e o fitei em seguidafixada nos seus incríveis olhos verde, os quais não conseguia imaginar combinando com a batina de padre da tradicional Igreja Ortodoxa Romena. As pessoas se aglomeravam a nossa volta e começavam a comentar, afoitas. Meu irmão vestia roupas casuais, uma camiseta e um jeans, o que o fazia parecer mais um modelo, porque em nada em seu rosto o deixava menos deslumbrante.
– Então decidiu desapontá-las? – apontei para as meninas perto de nós. Ele olhou pros lados sem entender e levou um tempo para que “pegasse no tranco”.
– Sim. – disse simplesmente ruborizando. Como ele era fofo.
– Yuuki minha querida! – disse meu pai animadamente após empurrar o próprio filho para o lado e me dando um forte abraço de urso.
– Pai? E-eu... – minha voz começava a falhar.
– Eu minha princesa, estava morrendo de saudades do papai não é? – falava rapidamente em seu casual tom animado.
– Não consigo respirar. – consegui dizer.
– Me perdoe! – disse ele me soltando. – Eu fiz de novo. – ficou vermelho.
– Vamos para casa? – Ichijou apareceu recomposto de repente. – Mais uma das famosas culinárias do papai esta te esperando. – Fiz uma careta e todos riram.
Fomos para casa na combe do meu pai, ele adorava colecionar velharias, porém aquela já passava da hora de ir para o ferro velho, sentia que podia parar a qualquer momento.


Zero Kiriyuu, Brasov, 30 de janeiro de 2010

Acabo de retornar do hospital, logo que acordei tomei um banho e segui para em direção a ele procurar notícias da jovem moça que deixara ontem, porém não foi uma visita feliz. Logo que entrei uma das enfermeiras foi avisar o doutor de meu retorno, ela parecia aflita e senti que as notícias não seriam boas, quando o médico apareceu com um rosto sorridente que tanto se assemelhava a aquele diretor maluco eu tive a certeza que nada de bom sairia daquela boca. Mesmo assim a notícia da morte da camponesa me deixou transtornado e diria que até um pouco revoltado. Percebi meu corpo estremecer com a notícia, meus olhos semicerrados sobre o médico enquanto ele por trás de seus óculos os abaixava, naquele momento eu soube que havia algo mais, algo que queria esconder de mim ou não poderia falar, devido a uma ordem de Kaien ou não. Agora dentro de mim algo flamejava e ansiava saber a verdade, como ela foi parar daquele jeito? Como morreu? E quem realmente a matou? Nada iria conseguir neste local.
Decidi voltar para Bucareste, as aulas logo iniciariam e tinha deveres a cumprir, devido mais uma vez a aquele diretor. O que ele pretendia? E que parte de mim estaria envolvido nisso? Algo grande estava prestes a me envolver e a minha sensação é que não gostaria nenhum um pouco dela. Arrumo minhas malas e preparo-me para me despedir das ruínas da Igreja de São Bartolomeu e da colina Timpa*** que tanto combinam com esse cenário de Brasov. Já consigo ver os milhares de corpos empalados e a igreja queimando, o mundo agora aos meus olhos está ainda mais manchado de sangue e isso tende a piorar.


Yuuki Cross, Bucareste, 30 de janeiro de 2010

Passamos o dia animadamente, papai nos contos uma dúzia de lendas romenas como fazia quando eu e Ichijou éramos pequenos, confesso que não fico mais tão a vontade de ouvi-las do que quando era criança, talvez porque não veja mais todo aquele misticismo e magia envolta delas e algumas até me parecem bárbaras demais. Porém as ouvi com o mesmo sorriso no rosto que expressava meu querido pai e apesar de tudo era uma amante da história. Dentre elas, havia uma que eu não cansava de ouvir, a história do Rio da Princesa, que em sua versão romântica me satisfazia, mesmo que fosse triste. Logo após o almoço ele me levou para visitar a universidade, ela era grande e seus estabelecimentos eram antigos, tudo dava um grande ar medieval ao local, aquilo me agradava apesar do frio e melancolismo passado pelas paredes de pedras grossas, a biblioteca era grande e já notei ali o meu refúgio onde poderia passar horas. A noite começou a cair e o cansaço veio, as horas da viagem de Tóquio, mas o tempo andando pelo campus fez meu corpo sentir.
Ichijou me mostrou carinhosamente onde seriam meus aposentos enquanto Kaien saia para resolver assuntos de trabalho, fiquei com pena dele por ter disposição de passear comigo tão perto das aulas começarem, espero que ele não tenha atrasado com seus compromissos. Abri a porta de meu quarto e tive uma surpresa.
– Duas camas? – me virei para Ichijou para indagá-lo.
– Sim, aqui são os aposentos da ala feminina da universidade Cross. Irá dividir o quarto com uma colega. Algum problema?
– Não, nenhum. – disse incerta.
– Não se preocupe, selecionamos bem a sua companheira. – ele abriu um sorriso. Decidi não questioná-lo e tentar saber quem tinha em mente, ao contrário de nosso pai uma simples pressão não o faria falar e entendi que seu sorriso dizia “segredo”. – E nossa mãe? – perguntou ele após um instante de silêncio.
– Ela está bem. – disse tentando imitar algo que se assemelhasse com um sorriso. – Está feliz. – conclui com um suspiro.
– Que bom que ao menos ela conseguiu seguir em frente. – falou numa clara referência a Kaien. – Preciso ir! Retornar a casa dos padres. – seu sorriso voltou ao rosto.
– Obrigada por hoje. – e ele saiu.
Sozinha no quarto escuro, eu liguei um dos abajures do lado de minha cama. Casada demais para desfazer as malas procurei uma roupa e tomei um banho. Deixei meu corpo cair na cama e senti meus músculos relaxarem, logo adormeci.
Estava frio e o lugar onde estava era alto, talvez uma torre. Meu coração estava apertado e uma grande dor me afligia, podia ouvir a água do rio logo abaixo de mim, mesmo que distante. A dor em meu peito era insuportável, tinha que encerrá-la... Para sempre. Joguei-me para frente e deixei que meu corpo caísse, depois não senti mais nada.


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Notas finais do capítulo

*Baldwin significa amigo corajoso**Fato verídico***A igreja de São Bartolomeu (1260) foi queimada por Drácula. E a colina Timpa foi onde ele empalou centenas de comerciantes locais e em seguida se sentou para comer em meio as vítimas.Fonte: Livro Em busca de Drácula e outros vampiros



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