Desejo e Reparação escrita por Ella Sussuarana


Capítulo 50
IV - Capítulo 48: Nossos segredos construíram uma crisálida de ar, frágil e quebradiça


Notas iniciais do capítulo

Galera, eu sei que dessa vez fresquei demais, desculpa. Foi minha culpa mesmo, eu acabei zoando demais nessa vida e acabei me dedicando cada vez menos à escrita. Porém, agora, estou de volta à minha rotina normal, tanto acadêmica quanto de escrita. Além disso, estamos no período do Nanowrimo, o que significa que este é O mês



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/523437/chapter/50

Parte IV

{Sobre a loucura, o amor e a guerra}

.

Capítulo 48: Nossos segredos construíram uma crisálida de ar, frágil e quebradiça

.

Hermione acordou sentindo-se ainda mais dolorida que na noite passada; parecia-lhe que uma manada de elefantes havia passado correndo por cima do seu corpo. Sobretudo, os seus seios, as suas coxas e a sua bunda doíam horrivelmente, de forma que ela sequer se atreveu a sair da posição em que estava para procurar Draco ou comida. Apesar de que para alguns ambos se referiam a mesma coisa, para Hermione havia uma distinta diferente entre os termos.

– Draco – murmurou ela o mais alto que conseguiu. Precisou gritar mais duas vezes, antes que Draco saísse do banheiro vestido com a calça do uniforme e enxugando os cabelos com a maior calma do mundo.

– Sentindo-se melhor, Granger?

Ele procurou uma camisa limpa no seu enorme guarda-roupa.

– Para o seu prazer, nem um pouco melhor – disse ela, sarcasticamente. – Você poderia trazer alguma pomada da enfermaria e a Gina, por favor.

– Eu tenho uma séria política contra a entrada e a permanência de grifinorianos no meu quarto.

– Nossa, é realmente uma pena saber disso – disse ela, revirando os olhos por força do hábito, mesmo que ele não fosse capaz de ver. – Traga a Gina, diga que eu preciso da ajuda dela e que é um caso de vida ou morte.

Draco levou todo o tempo necessário para vestir e abotoar sua camisa, pentear o cabelo e desarrumá-lo de forma casualmente charmosa. Logo depois, procurou o seu melhor perfume e o borrifou nos pulos e no pescoço. Só depois de se sentir satisfeito com a sua própria imagem no espelho, sentou-se na cama e, com uma voz mais suave, perguntou novamente como Hermione estava se sentindo.

– Está doendo, dentro de mim... – sussurrou ela, esfregando as mãos na face. – Como quando... Quando... – As bochechas dela foram tingidas de vermelho. Ela tentou falar novamente, mas desistiu logo. Sabia que não havia feitiço no mundo forte o bastante capaz de fazê-la falar aquilo para Draco.

– Conte-me – pediu ele.

Ela vasculhou os olhos dele, a procura de algum traço de ironia ou de deboche, mas tudo o que encontrou foi sincera preocupação. Fechou os olhos e mordeu o lábio. A dor era de certa forma semelhante àquela que havia sentido quando perdera a sua virgindade, um ardor entre as pernas, dentro da sua vagina, mas era muito pior do que isso, muito mais potente, e, dessa vez, o epicentro da dor se concentrava em outro lugar.

– Deixe para lá... – suspirou, abrindo os olhos para sustentar o olhar dele mais uma vez. – Chame a Gina, por favor.

Draco levantou-se sem dizer nada e saiu do quarto sem olhar para trás, porém Hermione havia visto o olhar firme e determinado dele; sabia que ele a traria nem que tivesse que carregá-la sobre o ombro, enquanto era chutado, mordido e socado de diferentes formas por todo o caminho do inferno até aquele quarto.

.

Horas depois, Hermione acordou com o barulho estridente de vozes ao seu redor.

– Oh, por favor, calem a boca – murmurou ela, alongando-se minimamente, um ruído doloroso escapou por sua boca. Nesse instante, todos os olhos no cômodo estavam direcionados para ela. Não havia ruído que não fosse o seu gemido de dor. Então, ela abriu os olhos para encarar seus dois melhores amigos parecendo muito preocupados, uma impaciente Gina e um mal-humorado Draco. O mundo estava exatamente como ela conhecia, para variar. Ela virou-se para Draco e resmungou: – Eu pedi para você trazer só a Gina, não para arrastá-los juntos!

– Você sabe os amigos que tem – disse Draco, revirando os olhos.

Na verdade, ela não sabia muito bem onde estava se metendo quando aceitou o convite de Harry, naquela primeira vez em que foram de trem para desbravar a estranha e misteriosa escola, que agora viam como um lar ou um santuário mágico.

Harry sentou-se na beirada da cama e tomou as mãos da amiga nas suas.

– Você está bem, Mione?

– O Malfoy a machucou de alguma forma? – Rony disse isto de forma bem séria, contudo Hermione sentiu uma súbita vontade de rir. O riso chegou aos seus olhos, iluminando-os, mas não escapou pelos lábios nem modificou a sua expressão. Draco a estava encarando, com uma sobrancelha erguida, como se perguntasse “O que é tão engraçado, Granger? Você não acredita que eu seria capaz de quebrá-la se quisesse?”.

“Você o quer?”, perguntou ela sem o falar.

“Eu poderia”, ele ergueu a outra sobrancelha.

“Esta não foi a minha pergunta. Não fuja!”.

“Falando nisso, o seu amigo idiota está lhe fazendo uma pergunta”.

Hermione desviou o olhar à direção de Rony, que ainda encarava feio Draco enquanto demandava se ele a havia tocado de qualquer forma desrespeitosa. Mesmo se ela falasse que não, ele jamais faria isso, se eu não também não quisesse, Rony não acreditaria. Seus amigos nunca entenderiam que, apesar de Draco ser tudo aquilo o que eles pensam de pior e um pouco mais, ele também possuía honra à sua maneira e um jeito muito próprio de sentir afeição.

– Por mais surpreendente e inacreditável que pareça, Dra... O Malfoy não tem nada a ver com isso. Dessa vez – apressou-se a acrescentar.

Ela estava sem fôlego. Se não tivesse mordido sua língua, quase teria dito o nome dele na frente dos amigos. Só agora estava sendo esmurrada pelo fato de que ter o nome dele na sua língua, na sua mente, era tão natural quanto o seu próprio.

– Eu não acredito nisto, Mione – vociferou Rony.

Óbvio que ele não o faria tão fácil. Ela suspirou e se preparou para o discurso de ódio que viria em seguida.

Draco parecia estar fazendo o mesmo, porque imediatamente sua postura mudou. Cruzou os braços e encarou o ruivo com um meio sorriso de deboche pendendo para um lado do rosto, desafiando o rapaz a lhe falar, na sua cara, que ele era um arrogante presunçoso que se achava superior ao resto da humanidade mas que, na verdade, corria sempre para se esconder atrás do seu pai para se proteger ao primeiro sinal de que o clima mudaria para o seu lado.

Antes que Rony tivesse a oportunidade de lembrar todos os atos malignos já cometidos por toda a família Malfoy e de seus antepassados, Gina intrometeu-se no assunto.

– Para começo de história, defina “isso”.

– Isso o que? – perguntou a morena, confusa.

– Você disse que o Malfoy não tinha coisa alguma a ver com “isso”. O que é “isso”? Vamos, amiga, eu trabalho com detalhes e com conceitos. – A ruiva botou as mãos na cintura e ergueu o seu nariz fino. Ela parecia ser a única pessoa tentando ser racional naquela confusão toda.

– É complicado – suspirou Hermione.

– Tudo com você é complicado – disse a ruiva, revirando os seus olhos. – Deixa de enrolar e fala logo.

– Coisas aconteceram, eu acabei me machucando, mesmo que não pareça, e o Malfoy era a pessoa mais perto que encontrei para me ajudar.

– Como exatamente você se machucou?

Hermione olhou para Draco. Ele olhou de volta para dentro dos olhos dela e sussurrou:

– Diga.

Já que as coisas tomariam esse rumo, teria que ao menos sair daquela posição de bola e sentar-se propriamente para enfrentar o burburinho que seus amigos causariam quando escutassem que ela não tinha mais pistas do que eles sobre o que teria acontecido. Ela virou-se e tentou usar os cotovelos como suporte para alçar-se para cima, porém, no momento em que seu corpo girou, sentiu como se uma peça sobressaltante do seu corpo tivesse se prendido a um órgão vital, rasgando-o ao meio. A dor foi tamanha, que ela imediatamente chorou.

O primeiro instinto de Draco era o de dar um passo a frente e ajudá-la. Contudo, eles não estavam sozinhos. Ele precisou controlar seus impulsos idiotas e dar um passo para trás, observando de longe enquanto os amigos dela se preocupavam.

Aconteceu tão rápido, que ele mal teve tempo de perceber o movimento antes que uma varinha estivesse apontada para o seu nariz.

– O que você fez com ela? E não venha me dizer que você não tem nada a ver com isso! Nós a encontramos na sua cama, chorando de dor! – brandiu Rony.

– Não foi exatamente assim que as coisas aconteceram – disse Draco, com o seu típico tom de deboche que fazia as pessoas desejarem ardentemente socá-lo até deixar a sua cara injada. Ele fez menção de afastar a varinha, mas Rony espetou sua mão com a ponta da varinha. Doeu mais do que Draco deixou transparecer. – Não precisa dessa brutalidade, Weasley! Todos aqui somos homens crescidos com modos refinados, exceto você, pelo visto. Não sei por que ainda fico surpreso.

– Abaixe a varinha, Rony – demandou Hermione com a voz ainda fraca e abafada. – Por favor... Deixem-me a só com a Gina. – Antes que seus amigos pudessem abrir a boca para contrariá-la, ela perguntou: – Malfoy, você trouxe o que pedi?

– Está em cima da mesa – falou ele, andando em direção à porta do quarto. – Sigam-me seus babacas.

Harry e Rony não pareciam dispostos a tirar os olhos de cima da amiga mais uma vez, porém Hermione implorou para que fossem, dizendo que não demoraria mais de dez minutos para que estivessem todos reunidos novamente e para que ela pudesse explicar o que aconteceu. Ademais, Gina lançou um olhar fuzilador na direção dos dois.

Eles seguiram Draco, mas muito devagar, de forma que este precisou agarrá-los pelos pulsos e jogá-los para fora do quarto, fechando a porta quando já se encontravam do outro lado.

– O que devo fazer? – perguntou Gina.

– Pegue a pasta de ervas que está em cima da mesa, por favor. Eu acho que posso fazer o resto, mas caso doa demais, bem... Eu gostaria que a passasse em mim, massageando a região dolorida.

Gina acenou e moveu-se rapidamente, entregou o pote aberto à amiga. Hermione desabotoou a camisa e, em seguida, abriu o fecho do sutiã, retirando-o com cuidado, inclinou-se minimamente para pegar um pouco da pasta esverdeada e passá-la sobre o seio direito, massageando-o com delicadeza. Cada vez que seus dedos pressionavam-no, sentia dor. Era suportável, mas muito desconfortável e ainda sim existente, de forma que sua respiração tornava-se falha e alta. Gina via a expressão que a amiga fazia, mas não emitia nenhum julgamento ou pergunta, por mais que quisesse.

– Ajude-me a tirar a saia, por favor.

Hermione estava nua na frente da amiga. Deveria sentir-se envergonhada, como a outra garota, que evitava encarar suas partes íntimas, porém a única coisa que lhe importava no momento era se livrar da sensação de dor. Ela virou-se na cama, emitindo um som sôfrego, e ficou de barriga para baixo.

– Eu não posso fazer esta parte por mim mesma – disse Hermione, tentando disfarçar o sofrimento em sua voz.

– Você quer que eu massageie suas costas com a pasta?

– Da cintura até as pernas, por favor...

– Tudo bem... – Era sorte, de fato, que Hermione não pudesse ver a vermelhidão no seu rosto, já que Gina estava de costas para ela.

As mãos de Gina eram firmes, mas suaves. Vez por outra, Hermione emitia um ruído ou remexia-se desconfortável, querendo aliviar a pressão da dor. Não foi até Gina ter tocado com um pouco mais de força a bunda dela, que as lágrimas ameaçaram novamente cair olhos de Hermione. Esta afastou-se brutalmente da outra garota e encolheu-se num canto.

– Está doendo muito?

– S-s-im – murmurou Hermione, tentando conter as lágrimas.

– Você tem que aguentar um pouco mais, ok?! Só mais um pouco e não mais sentirá tanta dor.

Hermione acenou de maneira quase imperceptível. Gina voltou ao seu trabalho, pressionando as mãos de um jeito mais delicado sobre a pele da amiga. Hermione sentia cada um de seus músculos tensos, seu corpo estava preparado para fugir para longe daquele toque; se não o fazia era por causa do grande autocontrole da mente, que o segurava no lugar, demandando que permanecesse rígido. Ela estava tremendo, as lágrimas caindo vagarosas por sua bochecha, criando uma mancha no travesseiro e outra menor na cama.

O resultado não foi exatamente imediato como Hermione queria. Levou cerca de quatro minutos, talvez muito mais na concepção de tempo relativo dela, para que sentisse sua pele pinicar, como se bichinhos a mordiscassem. Não doía, gerava uma rápida sensação de dormência nos seus membros, seguida, enfim, pelo alívio da tensão e da dor.

Soltou um suspiro de prazer. Seu corpo estava pesado. Queria poder dormir, mas sabia que aquela ainda não era a hora certa para isto. Então, pediu que Gina a ajudasse a se vestir e sentar na cama. Não foi uma tarefa fácil para a ruiva, porque a amiga não colaborava. Os membros de Hermione não tinham qualquer firmeza, estavam todos incapacitados de sustentar um movimento por mais de dois segundos. Hermione mal conseguia mantê-los erguidos, enquanto Gina deslizava a camisa por seus braços.

Ao final, Gina já estava sem um pingo de paciência para tolerar o drama dos meninos. Foi muito contrariada que gritou para que eles entrassem no quarto.

Harry e Rony analisaram Hermione. Na opinião deles, ela não parecia nem um pouco melhor que antes. Draco manteve-se à distância, escorado no apoio da janela.

– Precisávamos mesmo ter saído? – perguntou Rony, sentindo-se parcialmente traído.

– O que você contou para a Gina que não poderíamos ter escutado? – foi a vez de Harry ser dramático.

Como Gina já tinha perdido a paciência, ela simplesmente disse:

– Sim, vocês precisavam dar o fora daqui, porque Hermione estava nua e alguém precisava passar a pasta de ervas sobre ela! E ela também não me agraciou com nenhum tipo de informação sigilosa. Nesse quesito, estamos todos no mesmo barco, exceto o Malfoy, suspeito.

Ela olhou pelo canto dos olhos para o loiro que fingia estar distraído apreciando a visão das partículas de ouro líquido brilhando nas águas do lago.

Se Draco a escutou, ele fingiu que não o fez.

– Vocês se lembram do que aconteceu depois daquela nossa conversa, ontem à noite? – falou Hermione. O tom da voz dela era incerto. Ela sentia-se como se estivesse andando por sobre gelo quebradiço.

– Sim. Nós estávamos voltando para o Salão Comunal, quando encontramos o Blaise no meio de uma briga com o Malfoy – disse Harry.

– Só para variar um pouco, a cara do Malfoy estava inchada – completou Rony, sorrindo. – Eu adoro o seu namorado um pouco mais toda vez que ele ensina uma boa lição a um sonserino.

– Ele é um sonserino – lembrou-o Draco.

– Não por escolha, estou certo!

Draco riu em escárnio. Ninguém entendeu. Mas o que haveria para entender, afinal? Ele era um Malfoy, ele tinha respeito por nada. E nenhuma sensibilidade para se incomodar em se comportar como o contexto exigia.

– Eu não lembro nada disso – falou Hermione, subitamente. – Não lembro estarmos voltando para a Grifinória nem termos os encontrado, muito menos o que aconteceu depois disso. A primeira coisa que me lembro ao abrir os olhos é estar deitada num corredor vazio e escuro, e que eu estava com muito frio, com muita dor e medo de algo que não sei o que é. Eu comecei a vagar pelos corredores sem ter a menor ideia para onde queria ou deveria ir. Eu estava me sentindo tão perdida e desolada... E assustada. Terminei batendo na porta dele – falou ela, olhando de relance para Draco. Na noite passada, aquele havia sido o seu primeiro e, talvez, único pensamento lúcido, ir até ali, para que pudesse desabar nos braços dele. – O que quer que tenha acontecido nesse tempo entre eu apagar e acordar assustada, não deve ter sido bom. Eu realmente estou muito dolorida. Contudo, o estranho é que não há qualquer marca ou corte no meu corpo. Há apenas a sensação agonizante de dor e de que há algo muito errado comigo.

Ali estava o silêncio incômodo e arrastado. Hermione procurou o olhar de Draco, mas ele estava demasiadamente concentrado em algo distante no horizonte.

– Alguém deveria falar com Zabine, averiguar o seu lado da história – falou Draco, para a surpresa de todos. Na sua voz, havia algum resquício de sarcasmo mesclado com raiva, algo que somente Hermione conseguiu identificar.

Pela sua expressão, ele não parecia interessado no que aconteceria dali em diante, contudo a forma como sustentava o olhar de Harry indicava que ele esperava que o menino de ouro fosse fazer algo a respeito disso.

– Nós vamos – disse Harry, deixando bem claro que o “nós” não incluía o Malfoy. – Gina, você pode ficar aqui com a Mione por enquanto?

– De jeito nenhum – brandiu Draco.

– Ele tem uma séria política contra a permanência de qualquer um, sobretudo grifinorianos, no quarto dele – disse Hermione, sem esconder a ironia em sua voz.

Ela esperava que seus amigos rissem para atenuar a atmosfera de tensão que pairava no quarto quase como uma entidade viva. Contudo, eles a encararam como se ela fosse um objeto muito obtuso e improvável de existir. Harry quase disse “Ele tem problemas contra a permanência de qualquer ser humano ao redor dele, porém ele sempre faz questão de abrir uma brecha para te ter na cama dele”. No último segundo, ele mordeu a língua e engoliu o ódio.

– Eu não confio em você perto dela – O que Harry realmente quis falar era outra coisa não muito diferente.

– Lamentável, Potter.

– Harry... – começou Hermione.

– Como eu posso ter certeza que ele não irá machucá-la ainda mais?!

– Ele não irá. – Harry e Rony e Gina abriram a boca para retrucá-la, mas Hermione os cortou antes mesmo que começassem: – Eu estou cansada e dolorida, a minha cabeça está começando a doer por causa do barulho de vocês. Eu só queria ficar um tempo em paz, por favor.

Por fim, seus amigos cederam.

– Certo, mas assim que falarmos com o Blaise, voltaremos aqui para conferir se você está melhor – disse Gina, apertando a mão da amiga para garanti-la que estaria ali no instante que precisasse de qualquer coisa. – Vamos, meninos.

Eles se foram, mas não sem lançar um último olhar ameaçador em direção ao sonserino.

No momento em que a porta fechou-se, Draco afastou-se da janela.

– Precisa de alguma coisa? – perguntou ele.

– Se não fosse pedir demais, gostaria que me ajudasse a me deitar – pediu ela.

Draco acenou brevemente. Ele a segurou pela cintura e muito delicadamente a abaixou, até que estivesse deitada sobre a cama, os cabelos dela espalhados pelo travesseiro. Sem que ela precisasse pedir, ele fechou as cortinas com um movimento da varinha. O breu preencheu o quarto, e Hermione fechou os olhos. Draco sentou-se na poltrona ao lado da cama. Certamente, deveria fazer algo de melhor com o seu precioso tempo, mas não conseguia afastar o sentimento de que precisava estar ali ao lado dela, se mostrar útil de alguma forma. Dizia para si mesmo, como as mentiras que se contam para atenuar o peso da verdade, que tinha uma dívida com ela, daquele tempo em que realizara um feitiço errado e quase enlouquecera completamente. Se não fosse por ela, estaria ainda agonizando no chão, experimentando repetidamente o mesmo pesadelo. Se não fosse por ela, dificilmente acreditava que pudesse ter melhorado. Ele devia a sua vida a ela.

– Draco – sussurrou ela, de olhos bem fechados. – Faz cafuné em mim, por favor.

– O que você pensa que eu sou? – bufou ele. – Eu não mantenho a minha reputação gloriosa de cafajeste distribuindo cafunés para a primeira mulher que aparecer.

Mesmo que ela estivesse de olhos fechados, ele tinha certeza que ela havia revirado os olhos.

– Não seja um babaca comigo! Isso vai me ajudar a dormir. Por favor – pediu ela numa voz manhosa, para a qual Draco não sabia como dizer “não”.

– Esta será a primeira e última vez – prometeu ele.

– Será nosso segredinho.

– Mais um...

Ele suspirou e ergueu-se da poltrona. Aqueles segredos que eles cultivavam muito perto do coração seriam ainda a causa da morte dos dois.

Deitou-se na cama ao lado dela, chutando os sapatos para fora dos pés.

– Eu não pedi para você se deitar comigo – falou ela, fingindo que reclamava da atitude impulsiva dele.

– Não me negue meus pequenos prazeres – sussurrou ele no ouvido dela. Ele estava sorrindo, assim como ela.

Então, ele passou as mãos por entre os cachos dela, para logo depois fazer pequenos movimentos circulares com os dedos na cabeça dela.

– Obrigada – disse ela, pressionando-se nele.

Minutos depois, a respiração dela estava estável. Seu peito oscilava minimamente.

Ela não foi a única a cair no sono.

* * *

– Está na hora de colocar as cartas na mesa, Blaise – disse Rony, jogando suas duas palmas das mãos abertas em direção ao parapeito da janela, causando um som estridente, nem um pouco tão intenso quanto a dor que sentiu em seguida. Ele mordeu o lábio inferior, a face contorcida numa careta, os olhos brilhando com lágrimas que ameaçavam cair se ele não segurasse o rosto virado para cima.

Harry lançou-lhe um olhar que dizia explicitamente “Amigo, para! Você está me fazendo passar vergonha”.

Apesar da dor, Rony considerou que valeu a pena. Ele havia visto um filme de trouxa certa vez, em que um homem lança tal quote antes de causar grande destruição no cenário e partir para a briga. Ele achou genial. Quando finalmente tinha uma ótima oportunidade de se usar da mesma frase de efeito, não poderia a deixar passar.

Gina, por sua vez, revirou os olhos e torceu para que o babaca do seu irmão tenha se machucado, só para aprender uma lição do jeito difícil.

Blaise limitou-se a encarar o ruivo com uma expressão de confusão.

– Eu não tenho nenhuma carta aqui comigo... – disse ele, com um ar de inocência que fazia Gina pensar que ele era realmente fofo.

– É uma expressão trouxa – falou Harry. – Rony quis dizer que você deveria nos contar toda a verdade agora.

Blaise abriu a boca em forma de “O” e soltou uma exclamação – Oh!

– Eu não estou entendendo... Aconteceu alguma coisa com a Hermione? – perguntou ele, olhando de um grifinoriano para o outro.

– Quando não? – disse Gina, sem a pretensão de soar sarcástica. Na verdade, ela só estava cansada de se preocupar com a amiga.

– Ela está bem?

– A resposta é bastante relativa...

– Desembucha, Blaise! O que aconteceu entre vocês dois na noite passada? – falou Rony, intrometendo-se no meio da conversa que o sonserino e a sua irmã estavam tentando ter. Ele, literalmente, meteu-se na frente da irmã.

– Saía da minha frente, Ronald! – gritou Gina, empurrando o irmão para o lado.

Por muito pouco, Harry não foi atingido, pego desprevenido na extremidade da discussão. A conversa entre eles mal começou e já estava tomando um rumo perigoso. A única coisa que o garoto podia fazer era suspirar.

– Hermione não está bem, ela está sofrendo. Dessa vez, nem ela sabe o motivo... Simplesmente não se lembra do que aconteceu na noite passada, as últimas horas foram apagadas da sua mente. A única coisa da qual lembra é de ter acordado sozinha num corredor – esclareceu Harry, esperando que assim pudesse chegar ao ponto que queria mais rápido do que as tentativas ridículas de Rony de retirar alguma confissão de Blaise.

– Explica a história direito para ele – falou Gina.

– Eu não acho que ele quer saber de tudo...

– Ele merece saber toda a verdade também!

– Ok, ok... – Harry passou as mãos pelos cabelos, de forma exasperada. Não queria ter que ser aquele quem informaria que a namorada do rapaz à sua frente estava, atualmente, sozinha no quarto de outro homem, na presença do inimigo, e que este estava sendo o responsável por cuidar dela. Novamente.

Como eles haviam parado ali mesmo?

Harry inspirou bastante ar e, no instante em que o soltou, as palavras voaram para fora da sua boca. Ele contou detalhe por detalhe de como a história se desenrolara até o exato momento em que os três – Rony, Gina e ele – receberam a missão de escutar o segundo lado da história, na esperança de que Blaise teria algo a mais a acrescentar e de que essa informação seria a peça que faltava no gigantesco quebra-cabeça que era a vida de Hermione. Ao terminar o relato, ele esperou pela reação de Blaise, quem estava conseguindo manter-se muito bem contido durante todo o seu extenso monólogo.

– Então? – murmurou Harry, incomodado com o silêncio que se perpetuava. Nem Rony havia ousado soltar alguma piada sem graça. Ainda.

– Ontem, depois que vocês partiram, Hermione e eu esclarecemos certas dúvidas. É um assunto particular que condiz somente a nós dois – falou Blaise.

A forma como ele mantinha-se contido, calmo, sério, uma rocha imperturbável, estava deixando Harry louco. Havia Blaise escutado bem sobre a parte em que Hermione fora parar no quarto do Malfoy? Se Harry alguma vez soubesse que Gina havia passado sequer cinco minutos no quarto do Malfoy, ele com certeza estaria subindo a parede, enquanto arremessava bolas de fogo para todos os lados, como um louco que delira combater gnomos invisíveis.

– Qual era o tom dessa conversa? – questionou-o Gina.

– Eu me mostrei bastante compreensível – falou Blaise, sustentando o olhar firme da ruiva. – E Hermione estava triste e arrependida... Nós conseguimos chegar a um acordo, algo que seria melhor para ambos. Eu a perdoei, e ela me prometeu que aquele havia sido um caso isolado.

Gina piscou, alarmada. Tinha entendido direito? Hermione o havia traído? Com quem? Oh! Não, ela jamais faria isso... Contudo, Hermione não era ela mesma já há algum tempo...

Ela olhou para os amigos. Eles pareciam confusos, mas não chocados com o que acabaram de escutar. Mais um minuto e eles entenderiam o que Blaise havia acabado de revelar nas entrelinhas.

Um minuto depois. Ali estava o choque expresso nos olhos deles!

– Espere um momento – indicou Rony, erguendo um dedo como se pedisse permissão para se manifestar. – Você e a Mione discutiram porque ela fez algo ruim, certo?

– Sim – sussurrou Blaise.

– Ela o traiu?

Blaise não respondeu, mas todo o seu corpo ficou rígido.

– Com quem? – perguntou Harry, injuriado. A Hermione que ele conhecia não seria capaz de fazer tal coisa jamais!

Gina foi a única a ter a sensibilidade de mudar de assunto.

– O que aconteceu depois?

– Eu me ofereci para deixá-la na porta da sua Casa, porém ela disse que precisava de algum tempo sozinha. Para refletir – falou ele, sem emoção no tom de voz. Seu maxilar continuava tenso, uma pequena veia protuberante na lateral do queixo. – Eu fui dormir. Fim da história.

Harry e Rony prendiam as suas línguas rebeldes. Agora, eles estavam mais interessados em saber no que deu em Hermione para traí-lo do que saber o desfecho daquela noite. Gina cruzou os braços e encarou Blaise. Ele a encarou de volta. Seus olhos eram a visão da escuridão. Havia nada dentro deles.

.

Hermione acordou com suaves beijos no seu pescoço. Ela virou-se na cama, sentindo um peso sendo pressionado no seu ombro esquerdo. Os beijos subiram em direção do seu queixo. Houve um movimento na cama, um som de arfar, então algo se elevou sobre ela. Uma única vela estava acessa, depositada numa escrivaninha na outra extremidade. A sua luz era fraca, mal permitia que a mulher distinguisse as formas do rosto do sujeito à sua frente. Contudo, havia aquele azul nos olhos dele, algo que ela jamais poderia esquecer ou confundir.

Ele abaixou-se para beijá-la do jeito que raramente fazia. Aquele era o seu tipo de beijo favorito, o único que falava sem precisar de palavras. E ele dizia, firme e forte, “Eu a adoro. Eu quero mostrá-la o quanto eu a adoro, Hermione”. Os lábios dele percorreram a curvatura do seu queixo e desceram pelo pescoço em direção ao vale entre os seus seios, onde ele distribuiu leves mordidas. Ela apertou-o pelo cabelo, indicando que queria que ele a mordesse daquela forma que somente ele sabia que a faria perder o controle imediatamente. Apesar do aperto dela, ele deslizou para baixo, puxando o short e a calcinha dela para fora do seu corpo, jogou-os para o lado, não dando a menor importância para onde fossem aterrissar.

Quando ele beijou a extremidade da sua barriga, a sua respiração oscilou. Nada comparado à descarga elétrica que percorreu o seu corpo no instante seguinte, no momento em que os lábios dele tocaram o seu clitóris e a língua dele roçou sobre a região. Secretamente, ela sempre quis saber como seria se ele a beijasse onde mais necessitava. Agora, ele fazia muito mais que isso. Com a língua estendida sobre a entrada da vagina dela, ele fazia movimentos, causando fricção, enquanto seus lábios fechavam-se sobre os dela, criando uma região de pressão densa, segurando-a, intensificando-a, até que escutasse Hermione gemer mais alto. Então, aliviava a pressão. Hermione remexia-se, as pernas tensas, a cabeça rolando de um lado para o outro, com os olhos entreabertos, assim como a boca. Ela se sentia tão viva, podia sentir que cada pequeno toque dele ardia na sua pele, mesmo onde a sua respiração batia suave. Estava tão impaciente, ansiosa, queria que ele a devorasse. Ele abriu a boca e o fez. Os seus dentes cravaram-se na pele sensível dela, afundaram-se, rasgando pele, músculo, veias, o que estivesse no caminho. Ela gritou em dor. Antes que pudesse afastá-lo, ele sacudiu a cabeça e, com um bruto e feroz movimento, arrancou-lhe um pedaço da carne, devorando-o em seguida. O sangue manchando-lhe o queixo, os lábios formando um sorriso macabro. A visão dela tingiu-se de vermelho. Sua própria vida esvaindo-se de onde outra deveria começar.

Ela gritou ainda mais alto quando ele abaixou-se para devorá-la mais uma vez. Ele cortou-a ainda mais fundo, comendo da carne entre as pernas dela. Ela contorcia-se, lutava para tirá-lo de cima de si, mas estava tão fraca; cada movimento que fazia, só lhe causava mais sofrimento.

Até mesmo o seu grito morreu.

.

Hermione acordou chorando, um grito preso na garganta. Ela o libertou abruptamente, ao sentir um beijo na sua face. Estava apavorada. A lembrança do pesadelo ainda real, a dor latejante existente, persistente, na pele. Ela lutou para afastar-se da criatura, porém ela mantinha braços fortes ao seu redor.

– Hermione, sou eu! Sou eu, Draco!

Essas palavras, o significado que elas carregavam, deveriam causar repulsa, raiva latente em Hermione. Então, por que lhe transmitiam segurança e alívio? Como se somente o fato que essas palavras carregavam fosse o bastante para assegurá-la de que não haveria mais visões terríveis para assombrá-la nem antigos bruxos retornando das lendas para destruir o seu mundo.

Ela abriu os olhos. O quarto estava escuro. Precisou piscar várias vezes antes que seus olhos se adaptassem à escassez de luz. Ali, diante dela, estavam aqueles olhos azuis, tão preocupados e duros.

– Você vai me machucar? – sussurrou ela, vasculhando o olhar dele, em busca de qualquer sinal que o denunciasse.

– Nunca – disse ele, sem hesitar.

Ela permitiu que ele a abraçasse. Mais que isso, permitiu-se abraçá-lo. Pela primeira, não se sentiu enojada, culpada ou desconfortável nos braços dele.

.

Para Gina, deveria existir somente duas opções para justificar a demora do Malfoy a abrir a porta daquele seu maldito quarto: 1) ou ele tinha uma satisfação sádica ao assisti-los murmurando seu nome, enquanto batiam mais forte na porta e ficavam cada vez mais impacientes; 2) ou ele esperava que, se demorasse demais, eles iriam desistir e voltar para perturbá-lo mais tarde. Quando esta hora chegasse, ele ignorá-los-ia novamente, até que entendessem a mensagem “Não devo ser perturbado nos meus aposentados jamais”.

Quando a porta finalmente abriu, Gina soltou um longo suspiro.

O Malfoy continuava próximo à janela, distante do movimento ao redor de Hermione. Mas, dessa vez, havia algo de diferente na atmosfera do quarto. Gina não tinha certeza o que era, mas logo iria descobrir.

Rony começou o relato contando como os três encontraram Blaise. Logo, Harry começou a soltar pequenos comentários para complementar a fala do amigo. Hermione escutava tudo com muita calma, mesmo que estivesse nervosa e preferisse que eles pulassem para a parte mais importante.

Gina, então, notou o que havia de diferente. Era Draco e Hermione, obviamente. Ela continuava a parecer pálida e doente na cama, porém menos atormentada. Enquanto Draco... Apesar de ele estar distante, todo o seu corpo e a sua atenção estavam nitidamente voltados para Hermione. Ele parecia tenso, aflito... Gina até ousaria dizer que o que o rapaz sentia era preocupação.

– Isso é tudo? – perguntou Hermione, no mesmo segundo que os amigos se calaram.

– Blaise disse que isso é tudo o que aconteceu – falou Rony.

– E vocês acreditam na palavra dele?

Porque era Draco e porque cada uma de suas palavras estava envenenada com sarcasmo, Hermione escolheu ignorá-lo.

– Não totalmente. – Para a surpresa de todos, foi Gina quem falou. Todos os olhares voltaram-se para ela, nenhum mais delirante que o de Draco. – Ele estava estranho enquanto falava... Bem, pode ser só loucura da minha cabeça ou uma interpretação errada...

– Eu não diria a mesma coisa – disse Draco. – Por que você pensa que ele estava “estranho”?

– Defina “estranho” – pediu Hermione.

– Enquanto conversávamos, parecia que só uma pequena parte da atenção dele estava focada no assunto, como se tivesse metros d’água entre nós e as palavras chegassem somente como um som difuso até ele. Mesmo assim, quando nós contamos sobre o que lhe aconteceu, ele pareceu preocupado, mas não surpreso. Na verdade, ele só pareceu surpreso e, devo dizer, particularmente irritado na parte em que os garotos bobões aqui comentaram que você acabou no quarto do Malfoy de novo. Ele parecia como se realmente pudesse arrancar a primeira cabeça com cabeleira loura que visse pela frente. Porém... Até essa reação parecia contida, como se a sua mente estivesse muito distante do problema e mal pudesse compreender sobre o que falávamos.

Hermione afundou-se na cama. Pela expressão no seu rosto, Gina poderia jurar que ela estava pensando que havia acabado de machucar os sentimentos do seu namorado de novo.

– Eu acho que há mais para ser dito... Pela forma como ele reagiu – completou a ruiva, sustentando um par de olhos azuis.

Pela primeira vez na história, um Malfoy e um Weasley concordaram em algo.

– Ela está certa. Eu não confiaria em nada que o Zabini falou. Eu sei que você acha que falo isso somente por que o odeio–em parte, é verdade–, porém ele está escondendo coisas de todos nós há bastante tempo. Ele está jogando um jogo perigoso com Dolores, Hermione.

– O que? – falou ela, mais alto do que deveria. Ela piscou, perplexa. – O que você quer dizer.

– Não serei eu quem a contarei. Por que não pergunta ao seu querido e leal cavalheiro?

Eles encararam-se. A atmosfera do quarto tornou-se pesada mais uma vez. Aquela era a hora de sair de fininho, pensou Gina, cutucando os seus dois amigos.

– Eu me lembro de ter uma ou outra tarefa acumulada, e vocês, rapazes?

– Claro... Hermione, você precisa de mais alguma coisa? – perguntou Rony.

– A gente pode ficar aqui, se você quiser – disse Harry.

– Nem pensem nisso – latiu Draco, enquanto mantinha o olhar cravado em Hermione.

Gina, Harry e Rony entreolharam-se, incertos sobre com quem exatamente Draco estava falando. A conclusão a qual todos chegaram foi que deveria ser com Hermione.

– Estão esperando que eu os chute para fora do meu quarto? – falou Draco, com uma voz autoritária e cruel.

– Hermione... – começou Harry.

– Eu ficarei bem. Obrigada rapazes – disse ela, sustentando o olhar do Malfoy. – Gina, você poderia voltar mais tarde para me ajudar a tomar banho e aplicar a pomada no corpo?

– Posso passar aqui depois do jantar, aproveito e trago algo para você comer.

– Obrigada!

– Nós estamos indo – disse Gina, puxando os amigos para fora do quarto.

.

Eles estavam sozinhos novamente. Hermione podia sentir a tensão sobre a sua epiderme, como uma segunda camada de pele. Ela sentou-se na cama com certa dificuldade, soltando ocasionais gemidos de dor. Draco não fez menção de ajudá-la, seu único movimento foi aproximar-se da cama, onde ele poderia estender-se soberano diante dela; aqueles seus olhos frívolos encarando-a como se quisessem devorá-la. Ela não estava intimidada pela presença dele.

– Conte-me o que sabe! – ordenou ela, encarando-o com a mesma expressão de quem está pronto para começar uma guerra.

– Não! Eu quero ter o prazer de saber que ele será o único a arruinar seu coração no final.

– Você disse que não iria me machucar.

– Eu não estou machucando-a – disse ele, logo cortando o suplício dela. – Ele irá! Eu só estou a alertando de que ele é um mentiroso.

Hermione desviou o olhar do dele. Ela ficou quieta, ponderando como deveria se sentir sobre a omissão de uma informação trivial e sobre aquela afirmação contra o caráter de Blaise.

– Mesmo se ele for de fato um mentiroso, como alega, e eu não acredito que ele o seja; eu não tenho o direito de ficar brava nem de acusá-lo de algum crime. Pois não há nada que ele possa ter feito que eu não tenha feito pior. Eu venho mentindo para ele por muito tempo, sobre diferentes coisas... – A pausa foi longa. Hermione quase se perdeu em seus devaneios, mas a voz de Draco a lembro de que não estava sozinha.

– Você não tem a intenção de machucar qualquer ser humano quando faz o que precisa para proteger-se.

Ele falou isso com tamanha segurança, que Hermione riu sem humor.

– Você não pode afirmar isso – disse ela, com um tom de voz suave. – Todas as mentiras, tudo o que fiz... Eu estava bem consciente de cada ato meu, mesmo quando não tinha certeza se esta era a realidade ou parte de uma alucinação. Não são as meias verdades o que me incomodam mais, mas a traição do pensamento... Se ele pode perdoar meus pecados, devo fazer o mesmo em relação aos dele.

– Você não o ama.

No momento, aquela verdade a assustava mais do que qualquer outra coisa.

– Metade do tempo, mal sei se esta é a realidade. Minha mente está frágil e confusa há bastante tempo. Como poderei ter certeza de assuntos tão delicados como estes do coração? – Em cada palavra que não disse, em cada movimento que não fez, ela podia escutar o grito em seus ouvidos “Diga! Diga! Diga!”. – Eu preciso tentar fazer o que acho certo e melhor para mim e para aqueles que possam ser afetados por minhas decisões.

– Esta é a realidade, Hermione! E no mundo real, você não deve brincar com os sentimentos das pessoas.

– Como você pode estar tão certo? – gritou ela, afundando as unhas na carne da mão.

Diga!

– Eu estou aqui com você e – segurou as mãos dela entre as suas – eu posso senti-la.

– Esta é exatamente a base da minha dúvida! – Ela apertou as mãos dele forte, antes de soltá-las. – Em que universo você poderia segurar-me com tamanha delicadeza, e eu poderia pensar...

Ela fechou os olhos e mordiscou o canto dos lábios.

– Pensar o que?

Ela sentiu a respiração dele na sua bochecha.

– Pensar se isto seria um sonho, porque esse seria o único motivo lógico de ter tais devaneios... E pensar que... – ela respirou pesadamente. – E se esta for a realidade? Eu não sei o que seria pior.

Ele aproximou-se. Ela sabia que ele iria beijá-la. Foi por isso que se afastou.

– Não faça isso, por favor. Eu não estou me sentindo bem.

Ele deu o espaço que ela precisa para respirar sem tragar a essência dele.

– O que você quer, Hermione?

Ela também sabia muito bem ao que ele se referia. Como não tinha resposta para dar, ela apenas sussurrou:

– Venha dormir.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Tenho 4 coisinhas para dizer:
1) Sim, o título remete ao sinistro livro fictício que vai parar nas mãos do Tengo, em 1Q84;
2) Enquanto andei sumida, andei escrevendo e desenvolvendo minha próxima fanfic. Irei lançá-la em meados de dezembro. Enquanto isso, postarei trechos dela no meu tumblr: http://so-tur-nos.tumblr.com/post/132334474151/trecho-do-1-cap%C3%ADtulo-de-dance-with-the-devil ;
3) Carol Reimberg, sua fofa, muito obrigada de coração pelo comentário! Fiquei super feliz e emocionada de saber que ainda tem gente que acompanha e ama essa história. Ela já está bem próxima do final, e para mim está sendo difícil dizer adeus. Dedicarei o próximo capítulo especialmente a você;
4) Que tema de redação mais destruidora foi essa a do enem?! Amei muito! Até eu queria ter feito essa redação! Espero que vocês tenham arrasado e sambado muito na cara do patriarcado, além de terem lembrado da violência psicológica e institucionalizada que nós mulheres sofremos todos os dias. Quanto aos meninos, espero que vocês tenham repensado o lugar de privilégio que ocupam. Venham trocar ideias comigo, pfv! Vamos desconstruir paradigmas juntos :*



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Desejo e Reparação" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.