Um menino no espaço - 2ª parte escrita por Celso Innocente


Capítulo 20
Telepatia




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Alguns dias depois, preparado para ir à piscina, estava de sunga, deitado em minha cama, assistindo a um vídeo, o qual eu mesmo gravara, com bonitas imagens de Leandra, no bonito jardim daquela residência, quando a porta se abriu e entrou o senhor Frene, que vendo as imagens na tevê, sentou-se em minha cama e insinuou:

— Bonitas imagens! Você aprendeu muito a usar a filmadora. Está apaixonado por Leandra?

— Acha? Ela é muito mais velha do que eu!

— Isso não tem problema!

— Quando ela já era adulta, eu nem sei onde que eu estava!

— Nem seus bisavôs sonhavam em nascer! Não?

— Puxa! Partindo dessa hipótese, dá pra imaginar o quanto ela é velha!

— Que isso Regis! Ela é bastante jovem!

Sentei-me na cama, abracei e beijei o rosto do senhor Frene.

— O que você deseja garoto? — Perguntou-me.

— Não disse nada!

— Você não me beija de graça!

— Por que o senhor não me troca pelo Erick?

— Já falamos muitas vezes sobre isso.

— Ele se sentiria feliz aqui…

— Como você sabe?

— Ele está abandonado e queria vir pra cá!

— O Erick já tem onze anos, Regis! Ele não é mais de seu tamanho!

— Mas ele gostaria de vir! E ainda é criança!

— Depois de todo esse tempo, ele já deve ter mudado de idéia.

— Não mudou! Tenho certeza!

— Posso lhe conceder um desejo. Você gostaria de falar com ele?

— Posso?

— Se você quiser, eu deixo!

— Quero sim! Mas como?

— Telepatia! Transmissão de pensamentos!

— Ele vai me ouvir?

— E você o ouvirá!

— Quando?

— Que horas são agora, na Terra?

Apertei a tecla quatro de meu relógio e confirmei:

— Três e quarenta e dois da manhã.

— Então ele está dormindo agora. Quando for umas seis e meia, ele deverá acordar pra ir à escola. Será uma ótima hora, pra que vocês falem.

— Ele estuda à tarde senhor Frene! — Lembrei-o.

— Não! Agora ele estuda de manhã! Da quinta à oitava série, as crianças estudam de manhã! Ele está na sexta!

— É verdade! E como eu faço?

— Às seis e meia, a gente se encontra na sala do computador. Tudo bem?

Acenei que sim.

— Você se lembra de quando lá na Terra você estava na NASA e um homem lhe questionou sobre meu mundo? — Prosseguiu o senhor Frene.

— Como assim?

— Um dos engenheiros espaciais lhe questionou, não compreendendo o porquê de se meu planeta estar em uma distância bem maior do que a Terra em relação as estrela mães e o ano ser menor!

— Eu me lembro disso! Mas não sei nada sobre ano ou estrela!

— É que os planetas possuem duas características comuns, que os humanos usam para medir o dia, a semana e o ano; o tal movimento de rotação e translação. No movimento de rotação, o planeta gira em torno de seu próprio eixo imaginário, criando o dia. No caso, sua Terra gira assim a quatrocentos e sessenta e cinco metros por segundo, enquanto que meu querido Suster, mais pesadão devido seu imenso tamanho, gira do mesmo modo a onze mil metros por segundo, perfazendo nosso dia de trinta e duas horas...

— Como o senhor sabe tudo isso?

— Cinco mil anos de estudo! — Riu ele.

— Mas como o senhor sabe tanto sobre a Terra?

— Estudei um pouco sobre ela, para poder buscá-lo!

— Tá! — Concluí triste, sabendo que era um prisioneiro, naquele mundo perdido no espaço sideral.

— Mas ainda não lhe disse o mais incrível! Como Suster, com uma grande distância de Brina e Kristall, consegue fazer seu movimento de translação em prazo menor do que a Terra!

— Girando mais rápido! Lógico! — Conclui com cara de sabido.

— Nem só! — Discordou ele. — Como Suster consegue transladar entre duas estrelas gigantes?

Dei de ombros. Era muito complicado, para meus meros doze anos terráqueos.

— Na verdade, Suster, como fica na órbita entre duas estrelas, não consegue girar em torno de nenhuma delas, então, gira em um movimento elíptico, em um vácuo permanente. É como se você fosse uma peça metálica e estivesse entre dois grandes campos magnéticos, cada um deles puxando para seu lado e assim, você permanece perdido no centro, girando então curiosamente à mesma velocidade de sua Terra em uma órbita maluca menor: pouco mais de seiscentos e oito milhões de quilômetros...

— Menor!?... Tudo isso e o senhor diz menor?

— A órbita de sua Terra é de novecentos e sessenta e cinco milhões de quilômetros!

— Chega disso! — Passeia a mão sobre a cabeça. — Estou ficando cada vez mais confuso.

Ele se levantou e saiu. Na porta de saída, virou-se dizendo:

— Seis e meia, na Terra!

— O que que tem?

— Na sala do computador!

A imagem no vídeo exibia Luecy com suas gozações. Levantei-me, desliguei o vídeo e a tevê, coloquei um short e uma camiseta e me retirei do quarto, indo ao encontro do pátio, nos fundos daquela mansão. Deitei-me em uma esteira de acrílico, próximo a piscina, coloquei os braços sobre os olhos e fiquei pensando, na conversa que teria com meu amiguinho da escola, que era muito carente.

Quando fui raptado na Terra, Erick estava morando próximo à minha casa, pois a mulher com que ele morava perto da igreja de Fátima, havia brigado com a mãe dele e então o expulsou de sua casa. A mulher que então cuidava dele, era muito boa, mas seu marido era um alcoólatra e ofendia muito meu amiguinho, chamando-o principalmente de vagabundo.

Durante as três horas que faltava para ele acordar, passei ali na piscina. A princípio, ali deitado, pensando; pouco depois, incentivado por Leandra, que chegara, me despi novamente e fomos nadar e brincar na água. Ela era realmente uma garota muito linda; aparentando pouco mais de vinte anos e ali, de maiô, estava ainda mais linda. Gostava muito de estar comigo; aliás, como todos naquele planeta. Eu também, entre todos, preferia estar com ela, pois alem de minha amiga, era muito carinhosa e jamais caçoara ou judiara de mim. Dentro d’água, me pegava no colo e me jogava para o alto, só para me ver cair de mergulhão dentro da água. Eu, como tinha muito tempo, como já disse, usava muitas vezes esse tempo na piscina e com isto, me tornara exímio nadador. Era como todos dizem: um verdadeiro peixinho dentro d’água. Leandra não era minha namorada, mas era minha amiga predileta; tão amiga, que se dependesse dela, já teria me devolvido a meus pais, há muito tempo.

Luecy surgira com minha filmadora, registrando toda minha façanha com Leandra. A princípio não havia notado, depois, quando o vi, fingi ignorá-lo. Eram cenas, as quais eu queria mesmo que fossem registradas; cenas para serem guardadas para sempre.

As horas passaram rápidas e quando, saindo da piscina e olhando meu relógio na esteira, notei que já eram seis e vinte da manhã, na Terra.

— Leandra, preciso ir agora! — Insinuei.

— Por quê?

— Tenho um encontro muito importante, agora!

— Com quem? Uma namorada?

— Não! — Ri. — Minha namorada é você!

— Então fique comigo!

— É muito importante! Depois eu te conto! Tá?

Acenou que sim e então saí apressado. Limpei os pés no tapete de entrada e fui até meu quarto, apanhei uma toalha no armário, me enrolei nela e corri até a sala do computador. O senhor Frene estava sentado em sua poltrona, diante do monitor desligado.

— Por que essa toalha? — Perguntou ele.

— Estava na piscina!

— Não teve tempo de tomar banho?

— Me esqueci da hora! O senhor não vai ligar o televisor com a Terra?

— Claro que sim! Mas antes tenho que lhe pedir uma coisa.

— O que é?

— Você terá uma pequena surpresa! Promete ficar calmo?

— O que aconteceu com o Erick?

— Ele está muito bem!

Ligou o monitor, apertou algumas teclas no computa-dor e então vimos a Terra se aproximando, como no zoom de uma câmera fotográfica potente. Vi o Brasil... Minha cidade... Minha rua... Minha casa... E meu quarto. Tive realmente uma surpresa: Erick, de cabelos castanhos, curto, dormia tranqui-lo em minha cama.

— O que ele está fazendo lá, senhor Frene?

— Com certeza, está morando com seus pais!

— Dormindo na minha cama?

— Coitado Regis! Ele não tem uma família decente!

— Não me importa que ele more em minha casa! Até havia falado sobre isso com minha mãe; mas ela disse que não poderia. Acho que mudou de idéia. Mas tinha que dormir na minha cama?

Poucos segundos depois, minha mãe chegou ao lado da cama e o chamou:

— Erick, hora de levantar!

Ele abriu os olhos, se espreguiçou, enquanto minha mãe fôra acordar as demais crianças.

— Regis, ele está acordado. Concentre-se e não pense em mais nada, a não ser no nome dele, como se você o estivesse chamando por várias vezes. Eu estarei em silêncio, mas ele te ouvirá!

Então firmei os olhos no monitor e em pensamentos comecei a chamá-lo:

— Erick… Erick… Erick… Você está me ouvindo?…

A oitenta e sete anos-luz dali, o garoto olhou para o teto espantado e perguntou:

— Regis! É Você?

— Sim, sou eu Erick! Lembra-se de mim?

— Onde você está?

— Em Suster é claro!

— Como eu posso te ouvir?

— O senhor Frene me deixou falar com você!

— Como assim? Quando você vai voltar?

— Não sei!

— Por quê?

— Ele quer que eu fique aqui pra sempre!

— E você vai ficar?

— Não quero ficar!

— Eu estou morando em sua casa!

— Eu sei!

— Como?

— Estou vendo você!

— Duvido!

— Claro que estou!

— Então fale: que cor é minha roupa?

— Se você se descobrir eu posso ver!

Ele se descobriu e eu disse:

— Short azul e camiseta amarela.

— Que magnífico Regis!

— Parece o Zico da seleção brasileira! — Brinquei.

— Por que eu não posso te ver?

— Não tem como! Você está grande!

— E você? Que tamanho está?

— Igual quando saí daí!

— Que esplendido! Você continua criancinha?

— Ficando aqui em Suster, eu não cresço jamais!

— Tem certeza que não estou sonhando?

— De um beliscão em seu braço pra ver! — Ironizei rindo.

O bobão fez isso mesmo. E fez até careta, ao perceber que doeu.

— E minha mãe, como está? — Perguntei-lhe sério.

— Ela está bem, Regis! Sente muita sua falta! Vive falando em você! Mas sabe onde você está!

— Você pede pra ela não sofrer por minha causa?

— Claro que falo!

— E diga a ela, que fiquei contente em ter deixado você morar aí! Quanto tempo faz que você está aí?

— Uns dois meses!

— E sua mãe?

— Ela só me visita de vez em quando! Faz uns dez dias que ela esteve aqui.

— Você ainda gostaria de vir pra Suster?

— Se gostaria!? Aí deve ser legal à beça! Por que você não pede a eles pra me buscar? Eu me tornaria seu fiel companheiro!

— Outro dia volto a falar com você, Erick! Agora você precisa ir à escola!

— Ainda está cedo!

Antes que continuasse a falar com meu amiguinho, o senhor Frene desligou o monitor, tirando a minha concentra-ção.

— O senhor não vai mesmo me trocar por ele?

— Lembre-se de nosso acordo!

©©©

O tempo continuou passando monótono. E pratica-mente minha única diversão, era mesmo, como já disse, brincar na piscina; às vezes sozinho, outras vezes acompanhado por Leandra; conversava e brigava muito com Luecy... Ia à televisão... Ao parque de diversões. Mas nunca tive o prazer de conhecer os verdadeiros médicos, que salvaram a vida de Paulinho, na época do acidente. O senhor Frene, sempre me prometia que eu os conheceria, mas como Merlin era muito distante de Malderran, a viagem sempre era adiada. Também, ele jamais aceitou buscar Erick na Terra, pois eu não queria a simples presença dele; queria mesmo era ser trocado por ele, o que os susterianos não aceitavam.

Eu continuava um mero menino, com todo o tempo ocioso, sem fazer praticamente nada de útil... Sem conhecer praticamente ninguém de meus supostos pais alienígenas, me sentindo como sempre, um obsoleto boneco de brinquedo, daquela residência dos governantes de um planeta gigante.

Na Terra era então, vinte e três de Novembro de um mil novecentos e oitenta e três; sexagésimo quinto ano em Suster. Havia acabado de me levantar, abri as grandes cortinas negras de meu quarto e corri ao banheiro para minhas necessidades fisiológicas, depois lavar o rosto e escovar os dentes. Estávamos nos primeiros quinze minutos daquele dia e a estrela Brina, já surgia no horizonte, avisando à Kristall, que era hora dela desaparecer, indo pros lados de Merlin.

Segui para a sala do computador, sentei-me na poltrona do senhor Frene e tentei fazê-lo funcionar. Tive uma surpresa: ao acionar a tecla que o ligava, um pequeno led azul se acendeu, disparando um alarme em forma de bip. Assustei-me e tentei desligá-lo, sem, contudo conseguir.

Não se passou trinta segundos e o senhor Frene apareceu:

— O que você está fazendo aqui, Regis?

— Tentando ver minha família na Terra!

Desligou o alarme dizendo:

— Você não consegue ligá-lo! Ele foi reprogramado e apenas uma pessoa pode usá-lo. Eu!

— Não confia mesmo em mim!

— Se confiasse você teria mexido!

— Senhor Frene: lembra daquela cirurgia que o senhor queria fazer em mim?

— O que tem ela?

— O senhor ainda quer fazê-la?

— Não a faremos contra sua vontade!

— Eu quero fazê-la!

Ele se espantou e perguntou:

— Por quê?

— Sinto muita falta da Terra! Meu coração vive doente! O senhor disse, que fazendo esta cirurgia, tudo isso vai passar.

— Vai mesmo!

— Eu quero fazê-la! Agora!

Abraçou-me; beijou meu rosto e disse:

— Então vamos tomar café, rápido, para irmos ao hospital.

Aproximadamente uma hora depois, acompanhado por Leandra e o senhor Frene, estava naquele gigante hospital.

Duas moças, aparentando vinte anos, me cumpri-mentaram, me levando a seguir para uma grande sala, com grandes e diferentes aparelhos; todos em metal.

— Regis, tire a roupa! — Pediu-me uma delas.

— Pra quê? Se a cirurgia é na cabeça?

— É preciso tirar a camiseta! — Insistiu uma delas. —Esse relógio e esse aparelho no pescoço, também serão necessários tirar.

— Se eu tirar este aparelho do pescoço, vocês não mais me entenderão!

— A gente o usa emprestado, se for o caso!

Já despido de tais apetrechos, puseram-me em uma mesa cirúrgica, idêntica às da Terra, amarraram meus dois pulsos e em seguida, arrastou à mesa, sob um dos grandes aparelhos, baixou uma peça tipo capacete, que envolveu quase toda minha cabeça. Uma delas se retirou, a outra colocou meu aparelhinho tradutor em seu pescoço e me perguntou:

— Você tem certeza de que quer fazer isso?

Acenei que sim:

— Depois não haverá jeito de se voltar atrás!

— Vai doer?

— Não! Você não sentirá nada! Vai dormir durante umas três horas! Quando acordar já estará tudo pronto!

— Está bem!

— Regis, se você não quiser a gente não faz!

— Eu quero!

— Por que você quer essa cirurgia?

— Estou sofrendo muito!

— Vamos fazer o seguinte: a gente aguarda mais uns dois dias e você pensa melhor!

— Eu já pensei!

O senhor Frene e Leandra entraram. Leandra sentou-se a meu lado, me abraçou e me perguntou:

— Rao faster is creny?

— Que língua mais doida, Leandra! — Ironizei.

— Não mudou de ideia? — Especulou o senhor Frene, em meu idioma.

— Não senhor!

— O que iremos fazer, Regis, é irreversível! Não há jeito de voltarmos atrás!

— Fazendo a cirurgia eu nunca mais irei sofrer! Não é verdade?

— Você jamais sentirá saudades da Terra!

— Quero fazer!

— Está certo! Você dormirá e quando acordar já estará feito.

Os dois já iam se retirando:

—Senhor Frene! — Chamei-o.

Retornou e perguntei-lhe triste:

— Sabe que dia é hoje?

— Claro! Dia de seu aniversário!

Luecy, apesar de muito gozador, também me era muito útil em responder muitas perguntas duvidosas e esclarecer certos enigmas; um deles era as datas de meus aniversários susterianos e por isso, sabia que estava então, completando dezenove anos de idade, naquela data. Na Terra, ainda eram doze anos e meio.

Vi a moça acionando alguns botões; a seguir, um leve zunido da máquina, que se ligou. Um minuto depois, eu me encontrava adormecido.

Sentia o peso daquele aparelho em minha testa. Os olhos cerrados e a consciência viva. Foi então, que comecei a sonhar com meu pai e minha mãe me chamando para eles. Sonhei com minha escola e meus coleguinhas de sala. Vi a Beth... o Erick... e os demais, do mesmo tamanho meu e na mesma sala de terceira série primária, enquanto que a realidade era outra. Sonhei com Paulinho, todo ferido, pelo acidente que já acontecera há muito tempo.

©©©

Duas horas depois, acordei e vi o senhor Frene sentado em uma poltrona a meu lado.

— O que houve? — Perguntei-lhe.

— Nada! — Negou-me ele.

— Quanto tempo a cirurgia levará pra fazer efeito?

— Não fará efeito!

— Por quê?

— Não a fizemos!

— Por quê?

— Não é o que o seu coração deseja!

— Como assim?

— Seu coração não deseja esquecer-se da Terra!

— E eu vou continuar sofrendo?

— Iremos apenas adiar a cirurgia!

— Meu coração é só um pedaço de carne, senhor Frene! Lembra? Foi o senhor quem disse isso!

— Mas não é o que sua alma deseja!

— Não consigo entender o senhor! Estava louco pra fazer esta cirurgia, que me faria esquecer da Terra pra sempre e então ficar aqui. Quando eu autorizo, o senhor muda de ideia e não faz!

— Daremos um tempo!

— Então tire este aparelho de mim, me desamarre e me leve embora! — Fiquei deveras nervoso.

Ele se levantou, chamou uma moça, que me libertou daquilo tudo. Levantei-me, vesti minha camiseta, minha botinha, meu relógio e meu aparelhinho tradutor e então, acompanhado por Leandra e o senhor Frene, voltamos à residência.

Antes de chegar, estando dentro do carro em movimento, ainda perguntei:

— O senhor ainda pretende me trazer ao hospital?

— Não sei! Não tivemos coragem de submeter você àquela cirurgia!

— Por quê? Ela é perigosa?

— Nem um pouco! Mas faria você ser diferente!

— Como o senhor sempre dizia: eu não sofreria mais e seria sempre feliz aqui em Suster. Passaria a ser uma criança susteriana!

— Será?

— O maior erro do senhor, foi escolher a criança errada! Poderia ter escolhido uma que não tivesse família e ela agradeceria.

— Já falamos sobre isso! Sua escolha foi um acaso!

— Mas teria que ser muito burro, pra acreditar que eu aceitaria isso feliz da vida!

Leandra só escutava e às vezes ria.

— Não nos preocupamos com o caso de você ter família, pois a ideia inicial era de fazermos tal cirurgia em seu cérebro, assim que chegasse à nosso mundo.

— O senhor tentou, mas eu não concordei.

— Porque eu lhe pedi permissão! A ideia inicial era de fazermos a tal cirurgia, sem que você soubesse!

— O quê? — Me espantei.

— Isso mesmo! Lhe tapearíamos, lhe doparíamos e lhe submeteríamos à cirurgia. Quando você acordasse, nem se lembraria mais de um lugar chamado Terra e passar a amar a nós e nosso mundo, seria questão de horas.

— O senhor... planejava... fazer isso? — Questionei-lhe chorando.

— Sim!

— É cruel!

— Eu sei!

— Por que não fez?

— Pelo que você disse! É cruel! Não tive coragem! Por isso, que tentei convencê-lo a fazer, de própria vontade.

Eu estava com o rosto banhado de lágrimas.

— É tão cruel, que mesmo agora, você autorizando, não tive coragem.

— Isso significa que o senhor também tem sentimentos! Então sabe que estou sofrendo! Por isso aceitei a tal cirurgia.

— Você é só uma criança! Por isso tive que ponderar em sua decisão! Ainda acho que ela é muito cruel!

— Não sei se o amo ou se o odeio!

©©©

O senhor Frene, não consentia que eu me comunicasse com a Terra, mas naquele dia, vinte e cinco de Dezembro, deixou que falasse novamente com Erick. Então, quando ele acordou, antes de se levantar, ouviu minha voz em pensamento. Eu que o observava pelo computador, perguntei-lhe:

— Sabe que dia é hoje, Erick?

— Regis! — Admirou-se ele.

— Você sabe?

— É natal!

— Ganhou algum presente?

— Ganhei um relógio de pulso! Minha mãe esteve aqui, ontem e me trouxe.

— Eu também tenho um relógio incrível!

— O meu é calculadora!

— O meu também! E ele marca a hora em Suster e na Terra.

— Então que horas são agora?

— Aí é sete e vinte da manhã!

— Aí onde você está também é natal?

— Não! Aqui não teve Jesus!

— Eu passei de ano! Sabia?

— E a Beth?

— Também passou! O Leandro, o Fernando, a Regina, o Luecy…Todos passaram pra sétima série.

Fiquei triste; levantei-me da poltrona, saí da sala e fui direto a meu quarto, onde, chorando, deitei-me de bruços. O senhor Frene entrou em seguida, sentou-se a meu lado.

— O que houve? — Perguntou-me.

— Todos passaram pra sétima série; só eu que ainda estou na terceira!

— Só que você continua uma criança e eles já são adolescentes!

— Mas eu continuo burro!

— Quando recomeçarem as aulas na Terra, você vai assistir todos os dias pelo computador. Tudo bem?

— Qual aula?

— Terceira série, é claro!

— E vou poder passar de ano?

— Alem do mais, vou arranjar um professor extra pra você! Quer?

Acenei que sim, me sentando na cama. Ele me abraçou dizendo:

— Então pare de chorar.

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Notas finais do capítulo

Agora sim: Faltam apenas dois capítulos. A não ser que eu precise dividi-los.



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