Malfoy mexeu as costas, desconfortável, olhou para o horizonte, o sol já se punha ao longe, sorriu para a cor alaranjada que tomava conta do céu, suspirou pesadamente brincando com a pena entre seus dedos, sorriu mordendo o lábio inferior ao apreciar seu trabalho. Estava sentado em uma grande pedra solitária em um lugar pouco movimentado dos jardins de Hogwarts, não queria correr o risco de que alguém o descobrisse por ali... Tocou a folha com a ponta da pena novamente, sem pressa em seus traços, havia desenhado durante a tarde toda, mas não importava, ele gostava até, carregou um pouco mais no sombreado aqui e ali e fechou os olhos como que para visualizar sua musa.

– Estou perdido... - Ele murmurou abrindo os olhos novamente, sim, ele estava perdido desde o dia em que cometera o terrível erro de reparar. Ele lembrava-se muito bem de como tudo começara, lá estava ele em toda a sua superioridade sonserina empenhando-se em colocar aquela sujeitinha de sangue sujo em seu devido lugar, ela revirava os olhos, a cena não era novidade, ela abriu a boca para responder-lhe a altura quando a mente do loiro subitamente parou de funcionar, por que seus olhos estavam presos no maldito fio castanho que grudara em seus lábios, e aquele foi o ponto em que a linha do ódio que o segurava firmemente arrebentou, obrigando-lhe a jogar-se para dentro de um precipício sem fim. E naquele momento ele reparou como os lábios de Hermione Granger eram tentadoramente corados e carnudos, e pareciam tão macios... Draco precisou de todo o seu autocontrole e força de vontade, e um pouquinho de força física para não estender a mão e tirar o bendito fio castanho daqueles lábios, que ele pensou serem totalmente beijáveis. Malfoy ficou tão chocado com os próprios pensamentos, que não retrucou as palavras ásperas que lhe eram lançadas, apenas virou as costas quase correndo até seu dormitório com sua mente a milhão. Não, ele não poderia ter esses pensamentos, não por ela. Lembrava-se muito bem da época de negação, passara duas semanas inteiras a infernizando mais do que o necessário, e então tentara passar três longos dias sem cruzar seu caminho com o dela. Fora torturante. E quando ele finalmente confessara a si mesmo que, sim, achava os lábios da Granger completamente beijáveis, nesse ponto a coisa desandou de vez, e pegou-se observando não só os lábios, mas a forma como as bochechas dela coravam quando estava com raiva, ou envergonhada, o brilho em seus olhos ao se deparar com algum livro novo ou um problema que desafiasse sua inteligência, ou os cachos chocolate que balançavam conforme andava, e Merlin, o sorriso. Não que ela sorrisse para ele, mas de longe ele observava quando ela sorria para a roda de amigos, fazendo Draco perder o chão por alguns instantes. Mas o que ele poderia fazer? Eram inimigos declarados, ela o odiava e ele também deveria odiá-la, como mandava o figurino, mas como diabos ele iria lidar com toda aquela atração? E então, em uma chuvosa manhã de quinta-feira ele rabiscou suas primeiras linhas em uma folha em branco, seus pensamentos estavam nela, e quando deu por si tinha desenhado um par de olhos castanhos, desde então tem preenchido todos os pergaminhos e folhas em branco que encontra pela frente, havia completado mais de três cadernos com seus rabiscos e traços, e tinha de confessar, ele era bom naquilo.

E ali estava ele, no que se tornou sua válvula de escape, afastou o caderno de si para observar seu desenho, estava tão concentrado que não ouviu passos se aproximando, sentiu aquele cheiro de lavanda e fechou os olhos, podia sentir seu perfume em qualquer lugar, mais essa para adicionar a lista

– Malfoy – Ela disse a poucos passos, Draco desabou da pedra em que estava, indo parar com as costas no chão pelo susto

– Granger! - Ele ralhou tentando se recompor enquanto seu coração falhava algumas batidas, Hermione reprimiu uma risada

– Você bem mereceu! Me mandaram avisá-lo de q... - Hermione parou o meio da frase com o cenho franzido e recolheu o caderno que caíra no chão, Draco sentiu sua garganta apertar e arrancou-lhe o objeto das mãos de forma rude, gritando um “Não” desesperado, ela o olhou assustada

– Mas o que é isso Malfoy? - Perguntou em seu típico olhar desafiador

– Não é da sua conta! - Ele retrucou carrancudo, ela arqueou uma sobrancelha

– Claro que é da minha conta, aquela sou eu! Por um acaso estava me desenhando? - Draco sentiu suas mãos suarem, a garganta estava seca e seu rosto parecia que tinha sido pressionado contra uma lareira acesa

– Não seja ridícula, é claro que não é você! - Ele tentou um tom indignado, mas sua voz falhara

– Não sou idiota Malfoy, aquela sou eu! - Ela bateu o pé impaciente, ele arrebitou o nariz – Deixe-me ver – Ela estendeu a mão, o loiro soltou uma risada nasalada

– Não vou deixar que toque em minhas coisas e contamine tudo!

– Não seja infantil Malfoy, dê-me o caderno! - Ela insistiu, autoritária, ele o pôs para trás das costas e ela esticou os braços na tentativa de tomá-lo a força, Draco estremeceu com o gesto infantil da castanha mas não se intimidou, levantou o caderno no alto onde ela não poderia alcançá-lo, ele riu com a visão de Hermione dando alguns pulinhos a esperança de pôr as mãos em seu caderno de desenho, ela desistiu, cansada, e cruzou os braços a frente do corpo com os lábios crispados

– Não tem graça Malfoy! - Ela disse o fazendo soltar uma gargalhada, com o gesto ele baixou a guarda

– Accio Caderno – Hermione disse com um aceno de varinha, sorriu vitoriosa pouco antes de sair correndo de um Draco furioso

– Devolva-me Granger, isso não pertence a você! - Ele berrava a plenos pulmões sem se importar com um ou outro aluno que passava por ali, Hermione abaixou os olhos para o caderno e seus pés pararam de correr, ela entreabriu os lábios olhando estática para o desenho. Era um desenho dela, com os cabelos voando ao vento, um sorriso sincero no rosto e um brilho intenso no olhar, ele lhe captara com tanta emoção que não pode evitar que seus olhos marejassem, Draco a alcançou ofegante e arrancou o caderno de suas mãos sem arriscar-se a olhá-la, deu as costas para ela e já estava a caminho do castelo quando uma mão pequena lhe agarrou o ombro, Draco prendeu a respiração

– É lindo... - Ela disse referindo-se ao desenho, ele não esperava por aquilo, soltou o ar sentindo seus pulmões em protesto, ela afastou a mão esperando pacientemente que ele se virasse para encará-la – Você tem talento – Ela viu as palavras escapulirem de sua boca, ele olhou para os sapatos passando as mãos nervosamente por entre os fios loiros da nuca com uma carranca no rosto

– Sobre... sobre isso... - Ele tentou se explicar mas nada lhe vinha a mente, e foi quando Hermione deu um passo a frente e inclinou-se na ponta dos pés colado seus lábios aos dele, Draco fechou os olhos sentindo seu corpo estremecer, e tudo ao seu redor pareceu sumir de repente, levou a mão até o rosto de Hermione acariciando a bochecha macia com o polegar, ela sorriu contra seus lábios e se afastou

– Mandaram avisá-lo que sua mãe está aí. – Ela disse pouco antes de se retirar dali com certa leveza nos passos, Draco sorriu para si tocando a ponta de seus dedos em seus próprios lábios, ele tinha razão, os lábios de Hermione Granger eram realmente macios.